INTRODUÇÃOA sinusite maxilar é uma das patologias mais freqüentes que motivam o paciente a procurar o otorrinolaringologista. Na maioria das vezes a história clínica e o exame otorrinolaringológico completo são suficientes para se firmar o diagnóstico, porém, em casos duvidosos, recorre-se ao estudo radiológico.
A possibilidade do uso da ultrassonografia (USG) no diagnóstico de patologias dos seios paranasais foi mencionado pela primeira vez por KEIDEL 6, em 1947. O primeiro estudo ultrassonográfico dos seios maxilares foi realizado por KITAMURA e KANEKO7 , em 1965, usando o método A-mode, baseado na identificação de ecos em cavidades aéreas que normalmente são impenetráveis ao ultrassom. Ecos regulares intermediários foram interpretados como massa de tecido mole. A visualização de eco da parede posterior após área sonolucente foi considerada como sugestiva de secreção no seio.
Em 1969, KITAMURA8 introduziu o método B-mode no diagnóstico da sinusopatia. O ar no seio reflete toda a energia do ultrassom. Na sinusite, a parede posterior do seio maxilar é visível após uma área sonolucente. Desde então, a técnica do exame ultrassonográfico vem sendo aprimorada e incluída na rotina clínica (Freiburg V).
MANN9, 1979, reportou a possibilidade de diferenciação de secreção, sangue, tecidos benignos e malignos usando três níveis diferentes de amplificação.
Vários estudos comparativos entre exame radiológico e ultrassonográfico no diagnóstico e seguimento da sinusite maxilar aguda foram realizados (REVONTA, 1989) 2, concluindo que a ultrassonografia e o exame físico associados são muito confiáveis no diagnóstico inicial e parecem ser mais fidedignos que a radiografia para o seguimento dos pacientes em tratamento.
A ultrassonografia é um método de baixo custo, inócuo, pois não expõe o paciente à radioatividade, podendo ser repetido várias vezes e ser usados em pacientes nos quais se deve evitar a exposição à radiação (p.ex.: gestantes, crianças). Em crianças oferece vantagens por ser de fácil realização, não necessitando que a criança permaneça imobilizada, corno no caso da realização da radiografia, além de ser de mais fácil interpretação, visto que a radiografia nos oferece relativa dificuldade, pelo fato dos seios estarem ainda em desenvolvimento.
O objetivo desse estudo foi avaliar a confiabilidade do método no diagnóstico da sinusite maxilar, comparando-se com o diagnóstico radiológico.
PRINCÍPIOS BÁSICOS DO DIAGNÓSTICO ULTRASSONOGRÁFICO
O ultrassom representa a vibração em um meio, acima do limiar de audibilidade humana. O ultrassom pode ser gerado e detectado até 1000 MHz, mas na prática médica, usa-se, geralmente, as freqüências entre 2 e 20 MHz, e no estudo dos seios paranasais entre 2 a 6 MHz.
Existem 2 métodos de se apresentar o eco no osciloscópio. Quando o eco detectado reflete a linha base, produz o chamado A-mode, o qual nos dá uma informação unidimensional sobre os tecidos "alvos" ao longo do eixo do transdutor.
A outra forma de apresentar o eco é no osciloscópio chamado de B-mode. A linha base não é visível e o eco é apresentando como pontos brilhantes. O brilho dos pontos correlacionam-se com a intensidade do eco. O B-mode ou tomografia ultrassonográfica provê uma informação bidimensional dos tecidos.
Na literatura encontramos trabalhos realizados basicamente com o método A-mode. Este estudo foi realizado utilizando-se o método B-mode, o qual, em nossa experiência, traduz a imagem de maior precisão e definição.
CASUÍSTICA E MÉTODOSForam avaliados 40 pacientes, sendo 23 do sexo feminino e 17 do sexo masculino, na faixa etária de 5 a 50 anos, cuja média de idade foi de 25 anos. Os pacientes foram atendidos no Pronto Socorro de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo, no período de 01 de janeiro a 30 de setembro de 1991.
Os pacientes avaliados apresentavam suspeita clínica de sinusite, cujas queixas principais e exame otorrinolaringológico foram relacionados na tabela 1. Foram submetidos à realização de RX de seios da face, nas incidências de Waters e Caldwell, na posição deitada (devido à rotina técnica de realização deste exame pelo serviço de urgência) e ao exame ultrassonográfico dos seios maxilares.
TABELA 1 - Quadro Clínico
O aparelho ultrassonográfico utilizado foi do tipo B-mode ALOKA 630 com transdutor setorial de 5 KHz. Foram estudados os seios maxilares bilateral mente, totalizando 80 seios.
Após a confinação diagnóstica, os pacientes foram tratados segundo a rotina do departamento, com antibiótico via oral, descongestionante sistêmico e lavagem nasal.
RESULTADOSObserva-se que a sinusite foi classificada como unilateral em 12 pacientes (30%), e bilateral em 28 (70%) pelo exame ultrassonográfico. Ao exame radiológico, observou-se sinusite unilateral em 17 (42,5%) e bilateral em 23 pacientes (57,5%), tabela 2.
TABELA 2
Na tabela 3, comparamos o diagnóstico radiológico com o ultrassonográfico, verificando-se que, dos 17 seios considerados norteais ao RX, apenas 10 (59%) foram considerados normais à USG; e, que, 2 seios (8%) considerados normais à USG, apresentaram imagem sugestiva de edema de mucosa ao RX.
TABELA 3
Quando ao RX verificamos espessamento ou velamento (59 seios) observou-se alto grau de concordância com USG, que revelou espessamento de mucosa e/ou presença de líquido em 55 seios (93%).
Em 4 seios que, ao RX, se suspeitou de imagem cística, verificamos concordância em 2 seios (50%), sendo que nos outros 2 casos, a USG revelou conteúdo líquido e espessamento da mucosa. Pudemos, no entanto, verificar a presença de cisto em 2 casos à USG, que o RX não revelou.
Nas tabelas 4 e 5 apresentamos um quadro comparativo entre o RX e a USG, tendo-se como base:
- sensibilidade = N° de anormais / total de anormais
- especificidade = N° de normais / total de normais
DISCUSSÃOPara a análise deste estudo, devemos fazer algumas considerações técnicas sobre o diagnóstico ultrassonográfico.
O seio maxilar é uma cavidade óssea que normalmente é preenchida por ar, sendo, portanto, de difícil avaliação ultrassonográfica. Quando é acometido por uma sinusopatia, preenche-se de líquido, formando um meio que conduz as vibrações sonoras, permitindo a visualização da cavidade. Conclui-se que, quando ao exame não conseguimos visualização de imagem, provavelmente o seio é normal, visto que qualquer patologia sinusal altera a drenagem natural pelo óstio ao nível de meato médio, a qual depende da preservação anatômica e fisiológica das células da mucosa e do movimento ciliar.
TABELA 4
TABELA 5
Quando se visualiza liquido no seio maxilar, não implica que este esteja infectado. Neste estudo consideramos que o líquido visualizado era infectado, uma vez que a seleção dos pacientes foi feita, tendo como base, a suspeita clínica de quadro de sinusite maxilar.
Na presença de líquido, pode-se avaliar principalmente, a parede posterior, sendo possível, inclusive, mediroespessamento da parede mucosa (o que seria importante na avaliação evolutiva da sinusopatia). Não se consegue visualizar espessamento de parede caso não haja líquido na cavidade.
Quando se tem pouco líquido e/ou presença de ar no seio, o exame se torna prejudicado.
FIGURA 1- Normal
FIGURA 2- Edema de Mucosa Maxilar
FIGURA 3
Acreditamos que a USG é um exame de alta confiabilidade, quando tecnicamente bem realizado, tendo-se em mente as considerações relacionadas acima.
Ao compararmos o diagnóstico radiológico com a USG, termos que, dos 80 seios estudados, 17 (21%) foram considerados normais ao RX e 12 (15%) foram considerados normais à USG.
Deve ser considerado, no entanto, que destes 17 casos, normais ao RX, 7 (41 %) deles apresentaram espessamento de mucosa e/ou líquido em cavidade, contrastando com 2 casos (8%) em que se considerou a USG corno sendo normal, mas ao RX se visualizou edema de mucosa. No entanto, esses dois casos apresentavam imagens duvidosas, de interpretação dúbia, provavelmente devida a presença de pouco líquido.
Diante de 59 casos com espessamento de mucosa ou velamento ao RX, 55 (93%) apresentavam concordância com a USG, sendo que dos 64 casos com espessamento e/ou líquido, 59 (92%) apresentaram concordância com o RX, comprovando a alta confiabilidade do exame em questão.
Quanto a avaliação da presença de cistos, notamos uma concordância de apenas 50%. Deve-se considerar que estes estudo é um projeto piloto, em que pretendemos aprimorar nossa técnica. A casuística de cistos também foi pequena (apenas 4 casos).
Comparando-se as tabelas 4 e 5, observa-se que:
- a sensibilidade da USG é maior em relação ao RX;
- a especificidade da USG é menor em relação ao RX.
Essa análise permite nos concluir que a USG se mostrou mais sensível que a radiografia. Quanto à especificidade, deve ser considerado que nenhum exame mais específico foi realizado, como por exemplo, a tornografia computadorizada, que pudesse classificar a sinusopatia de um modo mais preciso. Acreditamos que a especificidade da USG se apresentou inferior ao RX, em função, principalmente da menor sensibilidade que este apresenta em detectar alterações sinusais precoces, diminuindo o número dos quadros tidos corno normais.
Novos estudos devem ser realizados a fim de aprimorar a técnica e avaliar sua utilidade no acompanhamento evolutivo dos quadros de sinusopatias, seus diagnósticos diferencias, bem como no acompanhamento de pacientes gestantes ou crianças.
CONCLUSÃOOs autores concluem que a USG é um exame de alta sensibilidade e confiabilidade, quando tecnicamente bem realizada, no diagnóstico da sinusite maxilar, apresentando as vantagens de ser um método de baixo custo, inócuo e de fácil realização.
BIBLIOGRAFIA1. REV ONTA, M.: Ultrasound in the diagnosis of maxillary and frontal sinusitis. Acta Otolaryngol, Supp1 370: 1-55, 1980.
2. REVONTA, M. KUULIALA ILKKA: The diagnosis and follow-up of pediatric sinusitis: Water's view radiography versus ultrasonography. Laryngoscope, mar/89, vol 99, n°- 3, 321-324.
3. DRUCE, H.M.; HEIBERG, E.; RUTLEDGE, J.: Imaging in chronic sinusitis: Disparity between radiographic and ultrasound interpretation. American Journal of Rhinology. Spring 1988, vol. 2, n° 2, 61-64.
4. ROHR, A.S.; SPECHER, S.L.; SIEGEL, S.C.; KATZ, R.M.; RACI-IELEFSKY, G.S.: Correlation between A-mode ultrasound and radiography in the diagnosis of maxillary sinusitis. J. Allergy Gin. Immunol, vol. 78, N"- 1, 58-61, July 1986.
5. SHAPIRO, G.C.; FURUKAWA, C.T.; PIERSON, W.E.; GILBERTSON, E.; BIERMAN, W.: Blended comparison of maxillary sinus radiography and ultrasound for diagnosis of sinusitis. J. Allergy Clin. Immunol., vol. 77, n° 1, 59-64, Jan. 1986.
6. KEIDEL, W.: 1947. Über die Verwendung des Ultraschalls in der Minischen Diagnostik. Artzliche Fotschung 1, 349.
7. KITAMURA, T.; KANEKO, T.: 1965. Le diagnostic dos affections du sinus maxillaire par ultrasons impulsifs. Ann Otolaryngol (Paris) 82, 711.
8. KITAMURA, T.; KANEKO, T.; ASANO, II.; MIURA, T.: 1969. Ultrasonic diagnosis in otolaryngology Eye. Ear Nose Throat Mon 48, 329.
9. MANN, W.: Diagnostic ultrassonography in paranasal sinus disease: a 5-year review. ORL 41: 168, 1979.
* Médicas Residentes da Clinica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
** Médico Preceptor da Clórica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP.
*** Professor Associado da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da USP.
**** Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da USP.
***** Médico Supervisor do Departamento de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Este trabalho foi realizado ta Clínica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP e no LIM-32 (Serviço do Prof Dr. Aroldo Miniti).
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