INTRODUÇÃOTraqueotomia é conhecida há mais de dois mil anos e suas indicações bem conhecidas. Estas incluem combinações de parâmetros clínicos e laboratoriais, principalmente gasimétricos e foram discutidos por vários autores. 1,2,3,4.
MATERIAL E MÉTODOSEste trabalho revisa 120 pacientes submetidos à traqueototnia. Todos estes procedimentos foram feitos pela Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Botucatu, nos últimos 15 anos. Foram excluídos do estudo os pacientes portadores de neoplasias cervicofaciais e os submetidos à traqueotomia em outros hospitais e posteriormente encaminhados ao nosso hospital.
Neste grupo de 120 pacientes, revisamos as indicações das traqueotomias em relação à causa primária da admissão dos pacientes no hospital, separando-os em grupos etários e sexo.
Após a revisão, colocamos os resultados em tabelas numeradas de 1 a 5.
RESULTADOSEstudamos 40 pacientes do sexo feminino e 80 do sexo masculino. A idade variava de recém-nascido a 80 anos, sendo que cerca de 33% dos pacientes estavam no grupo etário de 20 a 39 anos.
Em relação à causa primária de indicação de traqueotomia, a doença infecciosa aguda predominava no grupo de 0 a 19 anos; sendo que no grupo de 20 a 39 anos a principal causa era politraumatismo, a maioria devido a acidentes com veículos automotores.
Observamos nos pacientes com traumatismos e traqueostomia, um amplo predomínio do sexo masculino em relação ao feminino.
TABELA 1- Distribuição dos paciente segundo grupo etário e sexo.
TABELA 2- Distribuição por grupo etário 0-19 anos e etiologia. 24 pacientes.
No grupo 40 a 59 anos, 14 pacientes relacionavam-se com doenças infecciosas agudas e 16 distribuíram-se entre traumas (5), acidente vascular cerebral (5) e seis, após complicações cirúrgicas ou entubação orotraqueal prolongada.
No grupo de 60 anos ou mais, 50% dos pacientes tinham como causas primárias doenças infecciosas agudas, inclusive duas indicações por tétano.
Quanto as complicações em si encontramos 6 pacientes com estenose traqueal após intubação.
DISCUSSÃOEmbora os termos traqueostomia é traqueotomia sejam usados indiferentemente por vários autores5,6, em nosso trabalho adotamos o termo traqueotomia como procedimento cirúrgico que abre a traquéia através das diferentes camadas da linha média do pescoço, sendo que a ferida cirúrgica cicatrizaria por segunda intenção, e a abertura mantida por cânula traqueal2,4.
A maioria de nossos procedimentos cirúrgicos foram precedidos de entubação orotraqueal, sendo a traqueotomia realizada como primeiro procedimento apenas em ferimentos de laringe, trauma facial e difteria. Cabe ainda observar que a entubação naso-traqueal apresenta inúmeras vantagens em relação à orotraquéal e à própria traqueotomia: como o uso de cânulas mais finas, tomando a decanulação mais difícil principalmente em crianças e pacientes com agitação psicomotora 7,8. Na entubação orotraqueal utiliza-se tubos de diâmetros maiores, podendo ocorrer deslocamento do tubo durante a fase inspiratória principalmente com o uso de ventiladores, traumatismo da parede traqueal e de entubação e retenção de secreção. Nos últimos anos estamos adotando a entubação naso-traqueal como rotina e para tanto necessitamos cada vez mais de uma melhor adequação e treinamento das equipes5,9. Mesmo assim encontramos apenas seis pacientes, com estenose traqueal após intubação correspondendo a 5%, não sendo diferente de outros autores que citam entre 4 a 8,5%10. Atribuímos estes resultados a condições citadas anteriormente da entubação oro-traqueal, mas devemos salientar outras causas como a própria doença básica, o tipo de material de intubação e o próprio ato de intubação em si.
TABELA 3- Distribuição por grupo etário 20-39 anos e etiologicos. 41 pacientes.
Apenas em 1 caso, após aderência da cuff à parede laríngea e traqueal, tivemos a formação de sinéquia e estenose subglótica. Este paciente fora anteriormente submetido à cirurgia para correção de fissura palatina e entubação oro-traqueal. Revisando os procedimentos adotados neste caso, descobrimos que o tubo fora esterilizado a quente com amolecimento do "cuff".
Em 2 casos a estenose subglótica desenvolveu-se semanas após a intubação o que já fora relatado em trabalho anterior9, sendo assim orientávamos todos os pacientes e seus familiares para retornarem ao ambulatório durante o primeiros 6 meses, para melhor controle dos mesmos.
Em relação às complicações da traqueotomia, fora as imediatas e mesmo assim de fácil previsão e correção, não tivemos outras complicações. Mesmo a decanulação que alguns autores citam de difícil execução, sendo esta mais comum em crianças, em nosso trabalho quase não a observamos, talvez por adotarmos um critério de decanulação progressiva e, se necessário, a sedarão e retirada da cânula enquanto a criança estava dormindo. É também verdadeiro que em 2 casos encontramos dificuldades na decanulação mas estas foram associadas a trauma extrínseco de laringe e conseqüentemente a causa etiológica em si.
Ainda sobre a estenose traqueal, não a encontramos após a traqueotomia. Relacionamos esta observação ao procedimento cirúrgico, sendo este realizado quase sempre pela mesma equipe cirúrgica e pelo mesmo tipo de técnica, realizando-se apenas a incisão vertical no 3°- e 4o anéis traqueais11. Podemos observar uma mudança em relação as indicações da traqueotomia sendo as causas etiológicas, como as traumáticas, mais evidentes nos grupos entre 20 a 39 2,12,13
TABELA 4- Distribuição em relação ao grupo etário 40-59 anos e etiologia.
TABELA 5- Distribuição dos pacientes segundo o grupo etário 800 anos ou mais e etiologia. 24 pacientes.
Quanto às doenças infecciosas agudas em nosso trabalho, as indicações foram principalmente nos grupos 0-19 e 60 anos ou mais. Já a análise do grupo 40 a 59 anos foi prejudicada, pois eliminamos deste trabalho inúmeros pacientes com doenças neoplásicas cervico-faciais submetidos a traqueotomia. Ainda assim observamos que, em relação às doenças infecciosas agudas, talvez a principal importância da traqueotomia e doenças infecciosas de vias respiratórias sejam a limpeza da árvore traqueobrônquica do que qualquer outra consideração.
Assim, os resultados satisfatórios destes 120 pacientes permitem-nos afirmar com convicção que a intubaçâo e traqueotomia, desde que realizadas por equipes com razoável nível de treinamento e preparo, minimizam as eventuais complicações, devendo como tal ser uma preocupação constante de qualquer serviço hospitalar.
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* Professor Assistente Doutor, Departamento de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Botucatú - UNESP.
Trabalho realizado pela Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Botucatu. UNESP. Botucatu, S.P., Brasil - CEP 18610.
Este trabalho mostra a experiência da Disciplina de Otorrinolaringologia no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, em um período de 15 anos.
Endereço do autor: Prof.Dr.Jair Cortez Montovani -
Depto. Oftalmologia e Otorrinolaringologia Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP Botucatu - SP - Brasil - CEP 18610.