INTRODUÇÃOA atresia ou agenesia de coarias é uma afecção pouco comum, com freqüência de 1 em 8.000 a 9.000 nascidos vivos. Coaria é uma palavra grega que significa funil, e agenesia, atrofia de parte do organismo por parada do desenvolvimento na fase embrionária. Foi descrita pela primeira vez por Roederer, em 1755, porém coube a Otto, em 1829, a sua divulgação. O tratamento cirúrgico teve início com Emmert, em 1851. Von Uffenorde, em 1909, realiza a primeira cirurgia corretiva por via transsepta11.
Sua etiologia baseia-se na persistência da membrana buconasal embrionária, que separa a cavidade nasal do estomadeo. Cinnamond descreve outra gênese possível pela presença de células epiteliais na cavidade nasal que se proliferam entre a 1 e 8 semanas de vida intra-uterina. A teoria embriopatogênica sugere a associação da atresia de coarias com malformações craniofaciais e cardíacas (como ocorre no Charge4, na síndrome de Di George etc.) que se deve a alterações na formação, proliferação e migração das células da crista cefálica neural (neurocristopatias), de onde se diferenciam as células mesenquimais, contribuindo- para a gênese facial e cardíaca.
A atresia de coaria unilateral é mais freqüente que a bilateral, sendo o lado direito o mais afetado. A incidência nas mulheres é maior (2:1). O recém-nascido apresenta apenas a respiração nasal, sendo necessárias de duas a três semanas para que aprenda a respirar pela boca, motivo pelo qual torna-se uma emergência médica quando a atresia de coarias é bilateral.
Desde que foi descrita, vários procedimentos cirúrgicos foram recomendados para a remoção da placa atrésica. As vias de acesso são -as seguintes: transnasal, utilizada principalmente para recém-nascidos e crianças muito pequenas; transpalatina, com muita aceitação para crianças maiores e adultos; e ainda as vias transseptal e transantrah, muito pouco utilizadas. Todas essas abordagens podem ser feitas de várias maneiras, utilizando-se a luz convencional ou com auxílio do microscópio cirúrgico ou do endoscópio. A curetagem das coarias foi um dos procedimentos cirúrgicos utilizados. Alguns autores empregam o laser para esta cirurgia.
Fraser, em 1910, classifica a atresia coanal em 90 % óssea e 10 % membranosa. Brown e colaboradores", após revisão cuidadosa de 47 tomografias computadorizadas e 16 casos pessoais, acreditam ser a classificação de 29 óssea, 71 % ósseo-membranosa e de 0 % membranosa.
APRESENTAÇÃO DE CASOSO estudo consta de seis casos de agenesia coanal (cinco unilaterais e um bilateral), diagnosticados em nosso serviço entre 1993 e 1996, sendo cinco do sexo feminino e um do masculino, com idade variando de 8 a 41 anos (Tabela 1). O diagnóstico baseou-se na história clínica, exame físico, fibroscopia, auxiliado por radiografias contrastadas ou tomografia computadorizada nasossinusal (Figuras 1 e 2). Todos os pacientes foram tratados cirurgicamente sob anestesía geral pela via transpalatina, ressecando-se o vômer posterior anormal e a lâmina pterigóidea medial. A retirada de parte do osso vômer na sua porção posterior amplia o orifício coanal e esta medida objetiva evitar a reestenose. O tubo utilizado foi de silicone ou polietileno com tempo de permanência variando de 15 a85 dias (Tabela 1). O molde apresentava forma cilíndrica apenas na coaria e era fixado no septo nasal cartilaginoso através de ponto transfixante (Figuras 3, 4 e 5).
RESULTADOSForam operados pela via transpalatina seis casos. O resultado foi satisfatório em todos eles, tornando pérvias as cavidades nasais após a retirada da placa atrésica.
A abertura obtida no nível das coarias operadas não foi homogênea em todos os casos. Dois pacientes (números 2 e 5 da Tabela 1) apresentaram tecido de granulação na área operada e, após várias cauterizações, mantiveram o neo-orifício; porém, com diâmetro bem mais reduzido que o esperado. Todos os pacientes conseguiram assoar a(s) cavidade(s) do nariz, com maior ou menor facilidade, em função do tamanho do orifício coanal recém-formado.
Nossos achados são concordantes aos da literatura no tocante à predominância do sexo feminino e com respeito ao lado acometido.
Neste período em estudo, não consideramos os casos de bloqueio coanal não congênito e também aqueles associados com outras malformações (por exemplo, Charge: coloboma, doença cardíaca (heart), atresía de coaria, retardo no crescimento e desenvolvimento incluindo o sistema nervoso central (SNC), hípoplasia genital em homens, deformidades do ouvido (ear) incluindo deficiência auditiva).
A revisão da literatura revela basicamente a classificação de Fraser e a de Brown e colaboradores" quanto à constituição da imperfuração coanal. Com o detalhamento do exame físico pela fibra ótica, da tomografia computadorizada e dos próprios achados cirúrgicos de nossos casos, somos partidários da segunda classificação. inexistência de bloqueio apenas membranoso.
A tomografia computadorizada é um exame radiológico muito importante para o estudo da atresia de coarias, pois mostra serem uni ou bilateral as dimensões da placa atrésica e sua constituição, e por facilitar o planejamento cirúrgico. A atresia de coaria gera urna questão de controvérsia de acordo com sexo, idade, tipo, fossa nasal do tubo e tempo de sua permanência com relação- à sua constituição; a técnica cirúrgica mais indicada e o tipo do molde endonasal utilizado. No recém nascido, melhor seria a técnica transnasal com ampliação através do microscópio cirúrgico ou do endoscópio.
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Figura 1. Corte axial de tomografia computadorizada mostrando a atresia coanal bilateral.
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Figura 2. Corte axial de tomografia computadorizada evidenciando a estase de secreção no nível das coanas.
A via transpalatina, proposta inicialmente por Brunk (1909) e popularizada por Owens", oferece a melhor exposição e a menor porcentagem de reestenose. Devido às suas possíveis complicações (alteração do crescimento lateral do maxilar, do desenvolvimento do arco dental superior, da formação de fístulas), é reservada a crianças maiores de seis anos e a adultos. Alguns parâmetros são concordantes entre as técnicas cirúrgicas por via endonasal e a transpalatina: a reincidência, que pode ocorrer; os resultados, satisfatórios. Com respeito à morfologia do palato quando em ogiva, torna-se um fator limitante para a via transpalatina. O campo cirúrgico é reduzido na via endonasal. A incidência de fístula é maior na abordagem transpalatina.
Adotamos a via transpalatina mediana e não a de Owens", na qual incisava o palato duro de forma arqueada acompanhando o rebordo alveolar, por acreditarmos na sua simplicidade e apresentar raras complicações. A técnica baseia-se na incisão da linha média do palato com extensão de 1 cm para anterior e para posterior do ponto de transição palato duro e palato mole (Figura 6). Descola-se o retalho mucoperiosteal do lado afetado ou dos dois lados, nos casos de atresia bilateral. Os retalhos são afastados com fios de catgut 2-0 ancorados, após desinserção da musculatura do véu na margem posterior do palato duro (Figura 7). Retira-se parte do osso palatino, junto da sua margem livre, e da placa atrésica. Em seguida, incisa-se e rebate-se a mucosa que obliterava o de acordo com sexo, idade, tipo, fossa nasal do tubo e tempo de sua permanência com relação- à sua constituição; a técnica cirúrgica mais indicada e o tipo do molde endonasal utilizado. No recém nascido, melhor seria a técnica transnasal com ampliação através do microscópio cirúrgico ou do endoscópio.
A via transpalatina, proposta inicialmente por Brunk (1909) e popularizada por Owens", oferece a melhor exposição e a menor porcentagem de reestenose. Devido às suas possíveis complicações (alteração do crescimento lateral do maxilar, do desenvolvimento do arco dental superior, da formação de fístulas), é reservada a crianças maiores de seis anos e a adultos. Alguns parâmetros são concordantes entre as técnicas cirúrgicas por via endonasal e a transpalatina: a reincidência, que pode ocorrer; os resultados, satisfatórios. Com respeito à morfologia do palato quando em ogiva, torna-se um fator limitante para a via transpalatina. O campo cirúrgico é reduzido na via endonasal. A incidência de fístula é maior na abordagem transpalatina.
Adotamos a via transpalatina mediana e não a de Owens", na qual incisava o palato duro de forma arqueada acompanhando o rebordo alveolar, por acreditarmos na sua simplicidade e apresentar raras complicações. A técnica baseia-se na incisão da linha média do palato com extensão de 1 cm para anterior e para posterior do ponto de transição palato duro e palato mole (Figura 6). Descola-se o retalho mucoperiosteal do lado afetado ou dos dois lados, nos casos de atresia bilateral. Os retalhos são afastados com fios de catgut 2-0 ancorados, após desinserção da musculatura do véu na margem posterior do palato duro (Figura 7). Retira-se parte do osso palatino, junto da sua margem livre, e da placa atrésica. Em seguida, incisa-se e rebate-se a mucosa que obliterava o
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Figura 3. Formato do molde intranasal apresentando formato cilíndrico apenas em sua porção posterior.
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Figura 4. Presença do mole na cavidade nasal.
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Figura 5. Fixação do mole no nível do septo nasal cartilaginoso através de ponto transfixante.
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Figura 6. Via transpalatina com incisão na linha mediana interessando palato duro e mole.
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Figura 7. Exposição da placa atrésica afastando-se os retalhos mucoperiosteais e fazendo a sua exérese.
CONCLUSÃOO resultado satisfatório na maior parte dos casos nos leva a concluir que a via transpalatína para a correção da atresia coanal deve ser reservada para adultos e crianças maiores de seis anos de idade. O tipo de tubo utilizado deve ser o mais inerte possível, importando o seu formato cilíndrico apenas na coana para permitir o arejamento dos seios da face, e a menor retenção de muco. A fixação do tubo deve ser no nível do septo nasal cartilaginoso, evitando lesões na columela e no vestíbulo nasal, com maior tolerância por parte do paciente, o que concorre para o sucesso do tratamento.
Não se deve descuidar da limpeza nasal e aspiração regular, atentando para agir com cauterizações dos tecidos de granulação, e recorrer à anestesia geral quando necessário for para este fim.
O uso do corticóide tópico, após a retirada do tubo, parece ser útil para reduzir a formação de tecido de granulação.
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* Professora Instrutora cio Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo e Mestre em Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
** Professor Doutor Chefe de Clínica do Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo.
*** Residente do Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo.
Trabalho realizado no Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de São Paulo. Endereço para correspondência: Rua Doutor Cesário Mota Júnior, 112, 4º andar-01277-900 - São Paulo /SP-Telefone/Fax: (011) 222-8405. Artigo recebido em 2 elementos setembro de 1997. Artigo aceito em 18 de agosto de 1998.