ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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2665 - Vol. 64 / Edição 5 / Período: Setembro - Outubro de 1998
Seção: Relato de Casos Páginas: 520 a 524
Relato de Tumor Incomum do Espaço Parafaríngeo: Artéria Carótida Interna Redundante.
Autor(es):
Tânia M. L. Gonçalves*;
Aureliano C. Barreiros**

Palavras-chave: neoplasmas da cabeça e pescoço, faringe, parafaringe

Keywords: head and neck neoplastus, pharynx, parapharynx

Resumo: O espaço parafaríngeo é uma região virtual, em forma de pirâmide invertida, localizada profundamente no pescoço. Os tumores do espaço parafaríngeo são raros e mais de 70% dessas massas são benignas. Os tumores mais freqüentes são, nessa ordem, das glândulas salivares maiores e menores, neurogênicos, paragangliomas, linfomas e miscelânea. Neste último grupo, encontra-se a artéria carótida interna redundante. Lesão incomum desse espaço, sobre ela relatamos um caso. Os tumores da região parafaringeal apresentam manifestações clínicas semelhantes e inespecíficas. A tomografia computadorizada e a ressonância magnética são os métodos diagnósticos de escolha para esses tumores.

Abstract: The parapharyngeal space is a potential region, shaped like an invertdd piramid, located deep in the neck. The tumors of the parapharyngeal space are rare, and more than 70% of these massas are benign. The most frequent tumors are, respectively, of the major and minor salivary glands, neurogenic, paragangliomas, lymphomas and miscellaneous. In this last group the redundant internal carotid artery is found. It is a lesíon uncommon of that space and about which we report a case. The tumors of parapharyngeal region have similars and nonspecifics clinical manifestations. Computed tomography and ressonante magnetic image are the diagnostic methocis of choice for that tumors.

INTRODUÇÃO

Tumores do espaço parafaríngeo são lesões relativamente incomuns da cabeça e pescoço e constituem-se em massas cote diversas origens histológicas, tanto benignas quanto malignas'. Vários nomes vêm sendo usados para designar o espaço virtual localizado lateralmente à faringe superior e região amidalina. Ele tem sido denominado de espaço faríngeo lateral, espaço pterigomaxilar, espaço faringomaxilar, espaço pterigofaríngeo, espaço pterigomandibular e espaço parafaríngeo. A literatura mais recente tem usado o termo espaço parafaríngeo) 3.

Ele está localizado profundamente no pescoço, com seus limites formando uma pirâmide invertida, cuja extensão superior é a base do crânio e o ápice é o corpo maior do osso hióide (Figura 1).

O espaço parafaríngeo contém estruturas importantes como as artérias carótida interna; maxilar interna e alveolar inferior; a veia jugular interna; os nervos lingual, aurículo temporal, 1X, X, X1 e XII pares cranianos; o tronco simpático cervical; e numerosos nódulos linfáticos.

Entre a grande variedade de massas do espaço para faríngeo, incluem-se tumores primários que surgem de estruturas do próprio espaço e de outros adjacentes acometendo o por invasão ou deslocamento. Os tumores dessa região compreendem apenas 0,5% dos da cabeça e pescoço, e mais de 70% deles são benignos. Os tumores das glândulas salivares (parótida e glândulas salivares menores intrínsecas desse espaço) respondem por 40 a 50% de todos eles, sendo o do lobo profundo da glândula parótida o tipo mais comum de tumor desse espaço; neurogênicos, por 10 a 20%; paragangliomas, por 10 a 15%; linfomas, por 5 a 10%; e os demais formando uma miscelânia por 15 a 25% (Tabela 1). Este último grupo possui grande variedade de lesões, como abcessos, trombose da veia jugular, lipoma, lipossarcoma, fibrossarcoma, rabdomiossarcoma tumor carcinóide, tumor metastático, cisto branquial, hemangioma, hibernoma, leiomioma, teratoma, linfangioma e artéria carótida interna aberrante' S,' ",9'°; sendo o último o objeto do presente estudo. Som e colaboradores (1984)' relataram três casos de artéria carótida interna redundante em 104 pacientes estudados, o que corresponde a somente 2,9% deles.O objetivo deste trabalho é apresentar um caso de tumor do espaço parafaríngeo causado por artéria carótida interna redundante, atendido por nós, e discutir sua abordagem diagnostica.

RELATO DO CASO

Paciente com 45 anos de idade, do sexo feminino, faioderma, foi atendida no ambulatório de Otorrinolaringologia do anexo São Geraldo do Hospital das Clínicas da FM-1IFMG. Ela relata em sua história que, há cerca de um ano, após engolir fragmentos de massa para modelar prótese dentária numa consulta odontológica, vinha apresentando a sensação de corpo estranho preso à faringe (globus faringeos) e que esta se intensificava após tosse, êmese ou outro fator irritativo. Sua história médica pregressa constava de quadro alérgico intermitente, acompanhado de rinorréia, espirros, prurido no nariz, garganta e lábios, desencadeado por alergênicos e cujo início a paciente não conseguia precisar. Também relatou doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), cia qual, atualmente, queixa-se de discreto desconforto abdominal pós-prandial e pirose. A paciente negou ser etilista ou tabagista. Os antecedentes familiares nada revelaram que fosse digno de nota.



Figura 1. Visão do espaço parafaríngeo em corte coronal e sua posição em relação à orofaringe.



Ao exame otorrinolaringológico, foi detectada pequena massa, de 0,5-1,0 cm de diâmetro, pulsátil, fazendo saliência na parede lateral direita da orofaringe, parcialmente recoberta pelo pilar posterior, mais facilmente visível quando a paciente deglutia e sem qualquer sinal flogístico. Como hipóteses diagnosticas, que determinassem o sintoma faríngeo, foram propostas: manifestação otorrinolaringológica da doença de refluxo, aneurisma de artéria carótida malformação vascular e tumor glômico. A tomografia computadorizada (TC) do pescoço com contraste foi solicitada como propedêutica complementar. Instituiu-se tratamento para a DRGE, cole base na sintomatologia. Com o tratamento, houve melhora apenas da pirose e do desconforto pós-prandial, sugerindo não ser a DRGE a causa do sintoma referido. Já a TC mostrou a artéria carótida interna alongada, fazendo protrusão na parede lateral direita da orofaringe, sendo este sinal compatível com o diagnóstico de artéria carótida interna redundante (Figuras 2, 3 e 4), explicando o desconforto faríngeo da paciente. A conduta frente a este diagnóstico foi expectante. Serão realizados acompanhamento e avaliação clínica anual.

DISCUSSÃO

Apesar da grande variedade de sinais e sintomas (Tabela 2) causados pelos diversos tumores do espaço parafaríngeo, esses são inespecíficos. Tumores desta região apresentam manifestações clínicas similares, pois ocorrem em espaço confinado que é circundado por osso ou fáscia espessa por todos os lados, com exceção da parede medial e a borda inferior abaixo do ramo da mandíbula. Como resultado dessa configuração anatômica, a manifestação clínica predominante de tumor desse espaço é massa deslocando a parede lateral ou posterior ela orofaginge e/ou contínua abaixo do engulo da mandíbula, que pode ser notada ou sentida à alpação externa. Esta detecção clínica só é possível dando o tumor atinge dimensões superiores a 2,5-3,0 cm e diâmetro.

Entre os sinais e sintomas relatados na literatura, a paciente apresentou massa pulsátil fazendo saliência na parede lateral direita da orofaringe e sensação de corpo estranho ria faringe, nessa ordem de importância. Carrau e colaboradores relataram a sensação de corpo estranho em 6% dos seus casos e a presença de massa faríngea em 51% dos casos, sendo este sinal e/ou a presença de massa cervical as manifestações clínicas mais comumente encontradas em tumores desse espaço. Cabe ainda ressaltar o grande número de pacientes que apresentaram massas assintomáticas






Figura 2. TC axial do pescoço com contraste. Fasta imagem está no nível da região oroparafaringeal e mostra a artéria carótida interna direita aberrante (seta escura), fazendo protrusão na parede lateral direita da orofaringe.




Figura 3. TC coronal do pescoço com contraste, mostrando as artérias carótidas internas tortuosas e redundantes em seus trajetos e a artéria carótida interna direita insinuando-se em direção a orofaringe-(setas escuras).



Figura 4. TC do pescoço com contraste, utilizando sistema helicoidal. Este sistema permite visão tridimensional da posição e trajeto aberrantes da artéria carótida interna direita no pescoço (seta escura).






O espaço parafaríngeo é região difícil de ser avaliada clinicamente, devido à sua profunda localização no pescoço'. Os exames propedéutícos complementares mais utilizados no diagnóstico pré-operatório dos tumores do espaço parafaríngeo são: TC, ressonância magnética, arteriografia e punção aspirativa3. Som e colaboradores' relataram cerca de 88% de acerto em diagnósticos préoperatórios de tumores do espaço parafaríngeo usando a TC. Com o advento da ressonância magnética, a origem do tumor pode ser estabelecida acima de 96% dos casos pré operatoriamenteG. A arteriografia deve ser indicada para aquelas massas que necessitam de maior esclarecimento' e para planejamento cirúrgico.

A ressonância magnética é considerada por vários autores melhor método que a TC, principalmente para avaliar estruturas vasculares como a artéria carótida interna, já que tem resolução de imagem superior e não necessita do uso de contraste intravenoso 3. A despeito disso, em nosso meio, utilizamos a TC com contraste como método inicial, por motivo de custo e facilidade de acesso. Ela nos elucidou o diagnóstico sem a necessidade de outros métodos propedêuticos. Som e colaboradores' relataram uso de TC com contraste em três casos de artéria carótida interna redundante (aberrante) evitando a necessidade de arteriografia.

A utilização de punção aspirativa ou biópsia intraoral em casos como o relatado pode ser potencialmente catastrófica'.

No caso descrito, optamos pela conduta expectante com avaliação anual da paciente. Também foi ressaltado o perigo de medidas intervencionistas, inadvertidamente, sobre essa massa, como: intubações, amidalectomia, punção, se confundida com abscesso amidaliano, biópsia e punção aspirativa, entre outras.

CONCLUSÕES

1 - Os tumores do espaço parafaríngeo são raros e, entre eles, a artéria carótida interna aberrante é muito incomum.

2 - Tumores desta região apresentam manifestações clínicas semelhantes e inespecíficas.

3 - A tomografia computadorizada e a ressonância magnética são os métodos diagnósticos de escolha.

4 - Medidas intervencionistas em casos semelhantes podem ser catastróficas.

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* Professora Adjunta de Otorrinolaringologia do Departamento de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (FM-UFMG) - Belo Horizonte /MG. Doutora em Otorrinolaringologia pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM).
** Aluno do Décimo Período do Curso de Graduação - Período da FM-UFMG - Belo Horizonte /MG.

Instituição: Ambulatório de Otorrinolaringologia do Anexo São Geraldo do Hospital das Clínicas da FM-UFMG. Endereço para correspondência: Tânia M. L. Gonçalves - Rua Santa Catarina, 1313, 41 andar - 30170-081 Belo Horizonte /MG Telefone: (031) 291-8939 - Fax: (031) 337-5702. Artigo recebido em 8 de janeiro de 1998_ Artigo aceito em 16 de março de 1998.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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