INTRODUÇÃOA azelastina é potente e seletivo antagonista dos receptores Hl da histamina, inibindo também a liberação da histamina armazenada nos mastócitos e basófilos. Assim sendo, tem se mostrada como fármaco eficaz no tratamento da rinite alérgica perene, tanto no quadro agudo quanto a longo prazo 7,8. Além disso, a azelastina antagoniza os efeitos de outros mediadores da inflamação, quais sejam o PAF (fator ativador das plaquetas) e os leucotrienos C4 e D41,. Atuando sobre neutrofilos e plaquetas, inibe a formação de leucotrieno B, e da tromboxana B2, respectivamente`. Mais recentemente, foi demonstrado que a azelastina reduz a expressão da molécula de adesão intercelular 1 (ICAM-1), nas células epiteliais nasais, o que impede a adesão e conseqüente migração de eosinófilos. A azelastina é também capaz de inibir a formação de radicais livres de oxigênio e, atuando sobre células musculares lisas, inibe a entrada e a liberação intracelular de cálcio, o que inibe a contração do músculo liso. Portanto, a azelastina é substância cuja ação antiinflamatória vai muito além de sua ação anti-histamínica. Ao contrário dos anti-histamínicos orais, cujos efeitos começam a manifestar-se apenas algum tempo após sua administração, atingindo sua máxima eficácia somente um ou dois dias depois, e apresentam efeitos adversos sistêmicos, dentre os quais se destaca a sonolência, a azelastina spray nasal tem-se destacado pelo rápido início de sua ação farmacológica, pois é aplicada sobre a mucosa afetada, e pela raridade de eventos adversos relevantes, dado que é muito pouco absorvida. O objetivo deste estudo clínico foi avaliar a eficácia e a tolerabilidade da azelastina spray nasal comparada à loratadina comprimidos no tratamento da rinite alérgica perene.
MATERIAL E MÉTODOSEste é um estudo comparativo, duplo-cego, duplo-placebo, randomizado, no qual os pacientes receberam tratamento para rinite alérgica perene de duas semanas de duração.
Foram incluídos neste estudo 56 pacientes ambulatoriais, com diagnóstico confirmado de rinite alérgica perene por dois anos; de ambos os sexos, com idade entre 18 e 65 anos; com soma inicial de escores dos sinais e sintomas de rinite alérgica de no mínimo oito pontos. Não foram incluídos neste estudo pacientes com anomalias anatômicas nasais, infecção aguda do trato respiratório, rinite de etiologia alérgica duvidosa, asma brônquica, história de terem sido hipo/dessensibilizados nos últimos dois meses, ou sob tratamento sistêmico ou nasal com corticosteróides, ou com qualquer droga que pudesse modificar a evolução da doença. Os pacientes foram aleatoriamente designados a um dos dois grupos de tratamento: grupo azelastina, onde os pacientes receberam azelastina spray nasal e placebo de loratadina comprimidos; grupo loratadina, onde os pacientes receberam placebo de azelastina spray nasal e comprimidos de loratadina. Todos os pacientes foram orientados a aplicar um jato (0,14 ml) de azelastina (substância ativa - 0,14 mg ou placebo) em cada narina duas vezes ao dia e a tomar um comprimido de loratadina (substância ativa - 10 mg ou placebo) uma vez ao dia. Não foi permitido o uso concomitante das seguintes medicações: qualquer agente de administração intranasal; outros antihistamínicos; agentes inibidores da liberação de mediadores, aspirina e outras drogas antiinflamatórias não esteroidais; broncodilatadores, descongestionantes, expectorantes, antitussígenos; agentes que afetassem o sistema nervoso autônomo (anticolinérgicos, antidepressivos, simpaticomiméticos); tranqüilizantes maiores e menores, e depressores do sistema nervoso central; terapias dessensibilizantes O pesquisador avaliou clinicamente os pacientes em três ocasiões: no pré-tratamento (visita 1), no 7`-' (visita 2) e 14°- dias de tratamento (visita 3), analisando os sinais e sintomas da rinite. A eficácia do tratamento foi avaliada através da evolução dos sinais e sintomas da rinite e da avaliação global do investigador ao final do estudo. A tolerabilidade do tratamento foi verificada pela ocorrência ou não de eventos adversas. Para a análise estatística dos dados foram utilizados testes paramétricos e não paramétricos, com nível de significância de 5% (Mann-Whitney, Fisher, Friedman, teste Z).
RESULTADOSForam avaliados 56 pacientes. Os dois grupos foram homogêneos quanto à idade, sexo, peso e altura (Tabela I). Não foram relatadas ocorrências de doenças concomitantes, nem o uso de medicações concomitantes ao tratamento no decorrer do estudo. Os pacientes foram avaliados quanto aos sintomas de rinite nas três visitas clínicas realizadas. A evolução da doença foi verificada separadamente para cada um desses sintomas, de acordo com a classificação por escores: 0=ausente, 1=leve, 2=moderado e 3=intenso. Na visita 3 a melhora da rinorréia propiciada pelo uso da azelastina foi superior à da loratadina, o que foi estatisticamente significante (Figura 3). Na avaliação dos demais sintomas de rinite os dois tratamentos foram estatisticamente equivalentes (Figuras 1, 2, 4, 5). A eficácia do tratamento foi avaliada tanto pelo pesquisador (Figura 7) quanto pelo paciente (Figura 6), durante as visitas 2 e 3. Os grupos foram estatisticamente semelhantes, tendo a resposta terapêutica sitio considerada excelente ou boa na maioria dos casos. O pesquisador e o paciente também opinaram quanto à tolerabilidade do tratamento (Figuras 8 e 9). Os dois grupos não diferiram estatisticamente, tendo sido considerada excelente ou boa na maioria dos casos. Nenhuma reação adversa séria foi registrada: no grupo azelastina, que também recebeu placebo de loratadina, houve um relato de cefaléia, um de tosse e quatro de irritação nasal. No grupo loratadina, que também recebeu placebo de azelastina, houve relato de quatro casos de irritação nasal, além de um relato de gosto amargo.
Figura 1. Regressão da intensidade dos espirros antes e após tratamento da rinite alérgica com loratina ou azelastina.
Figura 2. Regressão da intensidade do prurido nasal antes e após tratamento da rinite alérgica com loratina ou azelastina.
DISCUSSÃOSem dúvida, os anti-histamínicos estão entre os principais medicamentos utilizados no controle dos sintomas dos pacientes portadores de rinite alérgica. Atualmente, sabe-se que seu mecanismo de ação não se restringe apenas ao antagonismo dos receptores para a histamina ou à inibição da liberação da histamina pelos mastõcitos, mas sim a uma série de outros efeitos. Um aspecto fundamental no tratamento da rinite alérgica é sabermos que ela é na realidade um processo inflamatório. Tanto a azelastina quanto a loratadina são anti-histamínicos capazes de controlar a fase imediata, pelo efeito anti-histamínico propriamente dito, e a fase tardia, por inibirem a expressão de ICAM-1 nas células endoteliais da mucosa nasal, inibindo a adesão e migração de eosinófilos, resultando em diminuição da inflamação. Como conseqüência, teremos uma diminuição do efeito dos antígenos e irritantes inespecíficos sobre o nariz. Os resultados deste nosso trabalho mostram que existe uma redução dos sintomas dos pacientes já na primeira semana de uso da medicação, sendo que este efeito aumenta na segunda semana após tratamento da rinite alérgica com loratidina ou azelastina.
Figura 3. Regressão da intensidade da rinorréia antes e após tratamento da rinite alérgica com loratidina ou azelastina.
Figura 4. Regressão da intensidade do edema da mucosa nasal antes e após tratamento da rinite alérgica com loratidina ou azelastina.
Figura 5. Regressão da intensidade da obstrução nasal antes e após tratamento da rinite alérgica com loratidina ou azelastina.
Figura 6. Eficácia do tratamento - opinião do paciente.
No caso dos anti-histamínicos administrados por via sistêmica, é fácil entendermos sua ação diminuindo os sintomas oculares. A azelastina spray nasal também reduz os sintomas oculares, apesar de ser muito pouco absorvida. Isto se explica, pois estes sintomas oculares podem ser resultantes da ação direta do antígeno nos olhos ou conseqüência da liberação de mediadores na mucosa nasal, que acabariam produzindo seus efeitos à distância, à semelhança da síndrome sino-brônquica. Portanto, diminuindo-se a reação alérgica nasal, não haveria reação ocular.
Fato de extrema importância no uso de medicamentos e sua relação custo-benefício. Entre os vários aspectos que esta relação envolve, neste trabalho analisamos sua eficácia tolerabilidade. Na opinião dos pacientes e do pesquisador, existe predomínio de avaliações excelente e boa em relação a moderada ou ausente. Além disto, a incidência de reações adversas foi pequena nos dois grupos. No grupo que recebeu azelastina e placebo de loratadina, quatro pacientes referiram irritação local, um tosse, e um cefaléia, ao passo que no grupo que recebeu loratadina e placebo de azelastina, quatro apresentaram irritação nasal, e um sensação de gosto amargo.
A melhora dos sintomas nasais e oculares verificada neste estudo confirmou que a azelastina spray nasal é tão eficaz quanto a loratadina no tratamento da rinite alérgica perene. Contudo, a melhora da rinorréia propiciada pela azelastina foi superior à oferecida pela loratadina. Além disso, no final do estudo, a avaliação global dos investigadores para ambos os tratamentos foi excelente ou boa na maioria dos pacientes. Ambas as drogas foram bem toleradas. Concluindo, a azelastine spray nasal mostrou-se ser tão eficaz quanto a loratadina no tratamento da rinite alérgica perene.
Figura 7. Eficácia do tratamento - opinião do investigador.
Figura 8. Tolerabilidade aos medicamentos - opinião do paciente.
Figura 9. Tolerabilidade aos medicamentos - opinião do investigador.
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* Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
** Assistente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Artigo recebido em 3 de junho de 1997. Artigo aceito em 19 de dezembro de 1997.