ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
2478 - Vol. 66 / Edição 4 / Período: Julho - Agosto de 2000
Seção: Artigos Originais Páginas: 343 a 346
POTENCIAIS EVOCADOS AUDITIVOS EM PACIENTES COM CORONARIOPATIA.
Autor(es):
Fabiana O Pereira*,
José A. A. Oliveira**.

Palavras-chave: potenciais aditivos, BERA, cronariopatia, cardiopatia, infarto

Keywords: ABA, heart disease, coronary disease, heart attack

Resumo: Introdução: O BERA tem demonstrado possuir alta sensibilidade para evidenciar alterações metabólicas diversas, sabidamente a diabete, a hipertensão e a dislipidemia. Poucos são, entretanto, os trabalhos que relacionam o comprometimento da condução elétrica em cóclea e tronco cerebral associado com lesões isquêmicas do miocardio ou ateroscleróticas. Objetivo: Neste estudo, através do ABR, pretendeu-se avaliar o comprometimento da circulação do tronco cerebral associada com a doença isquêmica do miocárdio. Material e método: Foram avaliados 24 pacientes com cardiopatia isquêmica, tendo de 38 a 76 anos de idade (média de 56 anos), sendo 18 do sexo masculino e seis do sexo feminino. Estes pacientes foram comparados com 24 voluntários sem patologias, com idade variando entre 45 e 76 anos (média de 61 anos), sendo 13 do sexo masculino e 11 do sexo feminino. Foram avaliadas as latências das oxidas I,III e V, os interpicos I-III, I-V e III-V e as amplitudes das ondas I e V. Resultados: Foi evidenciada diminuição da amplitude da onda V no grupo dos coronariopatas em comparação com o grupo controle. Conclusão: concluiu-se que a coronariopatia, que leva à cardiopatia isquêmica, poderia estar relacionada com o comprometimento da microcirculação sangüínea em tronco cerebral, através da diminuição da amplitude da onda V encontrada neste estudo.

Abstract: Introduction: ABR has demonstrated to have high sensibility to show several metabolic disturbances, as diabetes, hypertension and dislipidemia. There are, although, few studies that relate abnormalities in conduction from cochlea to inferior colliculus with ischemic heart lesions or aterosclerosis. Purpose: in this study, with ABR, we intended to evaluate abnormalities in brainstem vascular microcirculation associated with heart ischemic disease. Material and method: 24 patients with ischemic heart disease were evaluated, with mean age of 56 years (varying from 38 to 76 years), being 18 males and six females. These patients were compared to 24 normal volunteers, with age varying from 45 to 76 years (mean age of 61 years), 13 males and 11 females. Latencies of waves I, III and V, interpeak latencies I-III, I-V and III-V and peak amplitudes of waves I and V were evaluated. Results: Peak amplitude of wave V was diminished in patients with ischemic heart disease if compared to volunteers. Conclusion: Ischemic heart disease could be related to abnormalities in brainstem vascular microcirculation, seen through diminution in wave V amplitude.

INTRODUÇÃO

O ABR é um método não invasivo de avaliação neurofisiológica e que possui alta sensibilidade para detecção de respostas elétricas cerebrais com a estimulação auditiva, em intensidades variadas com cliques3.

Sabidamente, algumas alterações metabólicas, como hipertensão, dislipidemia1, diabete2 ou lesões isquêmicas geram alterações ou na velocidade ou na intensidade, com quê os impulsos elétricos ocorrem, da cóclea ao tronco cerebral.

Tem-se demonstrado que o BERA, realizado em altas intensidades, pode evidenciar tais alterações metabólicas com alta sensibilidade. Contudo, poucos são os estudos que relacionam as lesões isquêmicas cardíacas ou ateroscleróticas com alterações nos impulsos elétricos centrais, tanto em velocidade quanto em intensidade de condução.

Um desses estudos a citar é o de Karamitsos4, que comparou, através do ABR, pacientes com e sem coronariopatia. Evidenciou-se, nesse trabalho, que pacientes com coronariopatia apresentavam alterações importantes em amplitude e latência de ondas em nível de tronco cerebral. Contudo, não foram evidenciadas alterações em latência ou amplitude de onda do nervo coclear.

Sabe-se que a aterosclerose, que acomete tão comumente pacientes com coronariopatia, ocorre generalizadamente. Acomete, então, também alguns outros órgãos, denominados órgãos alvo, tais como cérebro pulmões, rins e retina. Tem-se, atualmente, atribuído à cóclea também a designação de órgão alvo. Já é bem determinado que o acometimento destes órgãos alvo por lesões ateroscleróticas aumenta consideravelmente o risco de eventos isquêmicas do miocárdio.

OBJETIVOS

Através do exame de ABR de curta latência, pretende-se avaliar a existência de comprometimento funcional do nervo coclear até o colículo inferior em pacientes com doença isquêmica do miocárdio.

Pretende-se avaliar, através do ABR, a amplitude e a latência dos impulsos elétricos da cóclea ao colículo inferior, comparando tais resultados com os de indivíduos sadios.

MATERIAL E MÉTODO

Foram avaliados 24 pacientes com coronariopatia isquêmica, sendo que 18 haviam sofrido de infarto agudo do miocárdio e seis possuíam angina instável. Estes pacientes eram neurologicamente assintomáticos, sendo 18 deles do sexo masculino e seis do sexo feminino. A idade variava de 38 a 76 anos (com a média de 58 anos). Alguns deles apresentavam patologias associadas, a remarcar diabete (DM), hipertensão arterial sistêmica (HAS) e dislipidemia (DLP), distribuídos de acordo com o demonstrado no Gráfico 1.



Gráfico 1. Distribuição de patologias associadas, diabete (DM), dislipidemia (DLP) e hipertensão (HAS) nos pacientes com coronariopatia.



Estes pacientes foram comparados com 24 voluntários também neurologicamente assintomáticos e sem nenhuma das patologias citadas acima, sendo 13 do sexo masculino e 11 do sexo feminino, com idade variando de 45 a 76 anos (com a média de 61 amos).

Todos os pacientes foram avaliados audiologicamente, com otoscopia, audiometria tonal com índice de reconhecimento da fala (IRF) e imitanciometria, tendo sido descartadas as orelhas com alteração moderada em qualquer desses exames.

Os pacientes foram então submetidos ao ABR, com click sem polaridade alternada na frequência interestímulo de 11.4/segundo e intensidade de 90 dB em cada uma das orelhas. Foram avaliadas as amplitudes das ondas I e V, as latências das ondas I, III e V e os interpicos de latências I-III, I-V e III-V em cada um dos exames.

Todos os sujeitos avaliados estavam cientes dos exames a que seriam submetidos, concordando com os mesmos. Este trabalho foi avaliado e aprovado pela Comissão de Ética Médica do Hospital das clínicas da FMRP-USP.

Os resultados dos pacientes coronariopatas foram comparados com os dos voluntários através do teste-t de Student, para amostras com número diferentes.

RESULTADOS

Audiometria

Os resultados de audiometria, imitanciometria e IRF dos pacientes com coronariopatia foram semelhantes aos controles, tendo sido descartados dois exames (uma orelha de cada paciente) de coronariopatas, devido a limiares abaixo de 40 Db em freqüências altas (acima de 2000 Hz). Os resultados médios de limiar em cada freqüência, em controles e em coronariopatas são ilustrados melhor no Gráfico 2.



Gráfico 2. Média de limiares audiométricos (em dB) em cada uma das freqüência (em Hz).



Gráfico 3. Comparação de latências de ondas I, III e V(em ms) entre pacientes com coronariopatia e controles.



Gráfico 4. Comparação de interpicos de latências da ondas I-III, I-V e III-V (em ms) entre coronariopatas e controles.



Gráfico 5. Comparação de amplitude de ondas 1 e V (em ms) entre coronariopatas e controles.



ABR

Os resultados evidenciados, quando comparadas coronariopatas aos controles, demonstram uma diminuição da amplitude da onda V, diferença esta significativa estatisticamente (p<0,05). Em relação à amplitude da onda 1 a diferença não foi estatisticamente significativa.

Não houve diferença significativa estatisticamente em relação às latências das ondas I, III e V, ou aos interpicos de ondas I-III, I-V e III-V.

Os resultados apresentados são melhor ilustrados nos Gráficos 3, 4 e 5.

DISCUSSÃO

Os resultados observados neste estudo evidenciam uma diminuição da amplitude da onda V em coronariopatas em relação aos controles. Isto demonstra que há um comprometimento, mesmo que sutil (uma vez que a amplitude é menos sensível que a latência), em circulação no nível de tronco cerebral em pacientes coronariopatas em relação aos controles, mais especificamente em nível de colículo inferior.

Em estudo semelhante a este apresentado, Karamitsos e colaboradores5 relatam alterações importantes no nível de circulação de tronco cerebral em pacientes coronariopatas, com aumento na latência das ondas III, IV e V e diminuição da amplitude das ondas I e V, quando comparados pacientes coronariopatas e controles. Estas alterações não foram significativas em nosso estudo. A diferença dos resultados entre os dois trabalhos poderia ocorrer devido, por exemplo, ao tempo de instalação da coronariopatia, o que poderia influenciar sobre a circulação cerebral. Este fator não foi determinado em nenhum dos dois estudos, o que dificulta a comparação. É remarcável que o número de pacientes estudado, apesar de significativo, não foi grande o suficiente para podermos concluir de fato quanto à razão de ser desta diferença. Outro fator não comparado por não ter sido ilustrado no trabalho supra citado são as alterações metabólicas que inevitavelmente acompanham a coronariopatia, alterações estas que comprovadamente alteram o ABR, como diabete e dislipidemia.

Sabe-se que algumas patologias, entre elas o diabete2 e a dislipidemia1, levam a alterações em BERA, tanto em nível de cóclea quanto em nível de tronco cerebral. Em alguns outros estudos, experimentais em animais4, a cóclea foi considerada órgão diretamente afetado pelas patologias em microcirculação sangüínea, assim como pulmões, rins, olhos e coração. A função coclear, avaliada através da amplitude e latência da onda I, não foi comprometida neste estudo em coronariopatas, assim como no trabalho cie Karamitsos5.

CONCLUSÃO

Este estudo confirma a hipótese de que patologias em microcirculação sangüínea que culminem em cardiopatias isquêmicas podem levar também a alterações em microcirculação cerebral, apesar dos resultados serem pouco expressivos, apenas pela diminuição da onda V.

Neste estudo, contudo, não foi confirmada a hipótese de que a microcirculação em cóclea também estaria afetada, hipótese esta aventada em animais, mas ainda não confirmada em nenhum estudo com o ABR em humanos.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS

1. BEM DAVID, J.; PRATT, H.; LANDMAN, L. et al. - A comparison of auditory brainstem evoked potencials in hiperlipidemic and normolipidemie subjects. Laryncoscope 1986 98: 186-189.
2. BULLER, N.; SHVILLI, Y.; LAURIAN, N. et al. - Delayed brainstem auditory evoked responses in diabetic patients. J Laryngol Otol 1988;102:357-360.
3. CHIAPPA, K. H.; ROPPER, A. H. - Evoked potencials in clinical medicine. N Engl J Med 1980; 305:1140-1147.
4. KARAMITSOS, D. G.; NICHOLAS, G. et al. - Brainstem auditory evoked potencials in patients with ischemic heart disease. Laryngoscope 1996; 106: 54-57.
5. SIDMAN, J. D.; PRAZMA, J. et al. - Cochlea and heart as end organs in small vessels disease. Am Otol Laryngol 1988, 97: 912.




* Médica Residente do Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/ SP.
** Professor Titular e Chefe do Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/ SP.

Trabalho apresentado no 1° Congresso Triológico de Otorrinolaringologia, em São Paulo/ SP, nos dias 13 e 14 de novembro de 1999.
Endereço para correspondência: Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo.
Avenida dos Bandeirantes, 3900 - 11096-900 Ribeirão Preto/ SP - Telefone: (0xx16) 602-2803 - Fax: (0xx16) 033-0186.
Artigo recebido em 1° de janeiro de 2000. Artigo aceito em 1° de junho de 2000.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia