I. INTRODUÇÃO
Forçoso é reconhecer que, dada a ubiquidade do ruído, em qualquer cidade jamais será possível construir hospital ou escola em local isento de ruído incomodativo.
A sua própria existência, aliás, em quantidade considerada tolerável, não só é permitida como é mesmo necessária. O silêncio, sabemos, é desconfortaste e é tão intoleravel quanto o ruído em quantidade lesiva.
O que se deseja é que, pelo menos os nosocômios e os estabelecimentos de ensino estejam situados em locais os menos ruidosos possíveis e onde não seja permitido que - após a sua instalação - venha a se superpôr ruído de natureza estranha, tais como o produzido pela passagem de veículos pesados, o uso imoderado de busina, sereia ou então a construção vizinha de fábricas ou oficinas.
O problema do ruído em S. Paulo é grave: está a exigir medidas sanitárias enérgicas e imediatas.
Procuramos estudá-lo em relação a dois grupos de estabelecimentos de capital importância na vida humana: as escolas e os hospitais.
Em relação à sonoridade dos locais em que se encontram, tais estabelecimentos, de modo geral, podem ser agrupados em três categorias:
1. os que foram construídos em locais impróprios, inicialmente, em franca desobediência aos mais elementares princípios de higiene;
2. os que resultaram da adatação de prédios já existentes em locais ruidosos; e
3. os que foram construídos em locais satisfatórios, mas que como o progresso, as condições de sonoridade ambiental se tornaram impróprias.
Podemos dizer que, em S . Paulo, poucas são as escolas e os hospitais em que o impacto ruidoso não se faça sentir de maneira danosa. Tanto é assim que, hoje, a tendência é construí-los em locais residenciais, afastados das ruas de grande trânsito (Morumbi, p. ex.). A finalidade desse propósito é, como se vê, afastar o ruído externo, particularmente aquele que provém da rua (sempre evitável ou possível de ser minorado), restando sómente o ruído interno, advindo da própria vida do estabelecimento (inevitável mas também possível de ser minorado).
Sabendo do problema, procuramos estudá-lo. Visitamos algumas dessas casas, a fim de examiná-las, medir-lhe o ruído dos compartimentos, comparando-os com o de suas ruas. Procuramos ouvir médicos, enfermeiros e doentes, diretores de escolas, professores e alunos.
Verificamos que o ruído em S. Paulo é uma realidade, apesar da existência da Lei n.º 4.805 ("Dos ruídos urbanos e da proteção ao bem estar e ao sossêgo público"), regulamentada pela Prefeitura Municipal, segundo o Decreto n.º 3.962 de 28 de agôsto de 1958.
Sabemos todos que o ruído é necessário em determinadas dosagens; reconhecemos que com o advento do progresso e do crescimento constante da população, os estabelecimentos em fóco se fazem cada vez mais necessários e em locais não muito afastados; todavia, o que causa espécie é que não serão utilizados os recursos ou medidas protetoras contra o ruído em tais casas; nem das construídas nem naquelas em construção.
A conseqüência é que tanto os doentes como os alunos continuam sob o efeito agressivo dessa modalidade de energia. A desobediência às leis é completa; o desrespeito ao doente e ao aluno é total; a incompreensão e a falta de colaboração é geral. Entre nós, MONTEIRO & PENA (1963), ao estudarem e medirem o ruído em diversas unidades escolares do Rio de Janeiro, encontraram cargas altamente lesivas. Chamaram a atenção para a necessidade de se aplicarem medidas preventivas a fim de proteger a saúde física e mental do escolar.
No presente estudo preocupámo-nos não só com escolas públicas - onde o acesso foi mais fácil - mas estendemos nossas pesquisas a alguns hospitais. Faz êle parte de um estudo mais longo que estamos realizando, da medida de níveis de ruído em diversos ambientes de trabalho em S. Paulo.
Antes de apresentar os nossos resultados, faz-se necessário lembrar os níveis de ruído admitidos como normais, tanto para o período diúrno como noturno e, os níveis para o descanso e sono e para os ambientes considerados silenciosos. (Gráfico n.º 1).
Gráfico n.º 1
Vemos, por êste gráfico, que qualquer carga somatória aos níveis estabelecidos os ultrapassa e pode concorrer para desencadear perturbações físicas otológicas, gerais e psíquicas. Entre estas, cumpre citar as que mais interessam os escolares e doentes em geral: o nervosismo, a insônia, a distração, etc..
Assim, todo ruído noturno que sobrepujar os 30 dB, ou ruído diúrno que ultrapassar os 60 dB estarão dentro das referidas condições e serão capazes de determinar as citadas lesões, particularmente quando forem repetidos e descontínuos, como sóe acontecer com os ruídos em geral.
Todo trabalho médico e de Engenharia Sanitária consiste, pois, em se conhecerem os níveis de ruído do ambiente e conduzi-tos aos limites adequados, utilizando todos os meios que a ciência tem ao seu alcance.
II. INSTRUMENTO, TÉCNICA E MATERIAL
O instrumento utilizado foi o SOUND-SURVEY METER (Tipo 1.555-A), gentileza da EUTEX de S. Paulo. (Foto n.º 1).
Trata-se de pequeno e prático aparelho que indica o nível do ruído e outros sons em têrmos de um padrão tomado como referência. Consiste em um microfone, um atenuador calibrado, um amplificador e um indicador de níveis. É de pequeno pêso, de fácil uso, transportável permitindo a leitura imediata, de acôrdo com o que foi estabelecido pela A.S.A. (American Standard for Sound-Level Meters for the Measurement of Noise and other sound) (American Standárd Associations - N. York).
Foto n.º 1
O aparelho é graduado em decibéis acima de uma referência (habitualmente 0,0002 (d/cm2). Como o nosso ouvido responde às várias freqüências de modo desigual, em vários níveis sonoros, o aparelho é construido de modo a que a sua sensibilidade seja igual à do ouvido, segundo ORSINI.
A sensibilidade do aparelho é especificada em 3 "curvas de resposta" (A. B. e C.), conforme o nível sonoro a ser medido.
Assim, segundo PETERSON & BERANEK (1956), as posições das faixas correspondem às seguintes medidas em decibéis:
Ao utilizarmos o instrumento nas mensurações, fizemo-las com base em dois princípios: paciência e cuidado. Repetíamos medidas tantas vêzes quantas julgávamos necessárias.
Procuramos também uniformizar a técnica, a fim de evitar eventuais erros de leitura.
Reconhecemos que, muitas vezes, os níveis de ruído eram de tal órdem, de evidente ação traumática, que poderíamos dispensar aparelhos de mensuração, se a finalidade de nossas observações fôsse sómente a de verificar a presença do agente morbígeno.
Na prática das medidas cuidamos, tanto quanto possível, evitar a interferência de oscilações materiais, colocando o aparelho a certa distância do corpo tal como mostra a fotografia.
As mensurações foram realizadas no meio geométrico da sala de aula ou do quarto do paciente, procurando não alterar as condições em que se encontravam êsses compartimentos em relação ao ruído, isto é, mantendo as janelas ou portas abertas ou fechadas.
A posição do aparelho em relação à fonte ruidosa foi sempre a mesma: o fone colocado lateralmente à origem.
No início de nossas pesquisas seguimos o conselho de GEIGER (1955): girar o aparelho a fim de que as leituras registrem flutuações sonoras. Posteriormente, notamos que tais flutuações eram de tal ordem a não influenciar a média dos resultados finais. E, assim, uniformizamos a pesquisa utilizando sempre a mesma e já referida posição do aparelho.
Como dissemos, procuramos ouvir médicos, enfermeiros e doentes ou professôres, diretores e alunos submetidos à carga sonora dos respectivos ambientes e sua ação maléfica, seja no tratamento, no repouso e em seu estado psíquico, seja no andamento e no aproveitamento didático.
Quanto ao horário, as medidas eram tomadas nos períodos de atividade, isto é, de dia; algumas, as dos hospitais, eram repetidas á noite. Realizamos também mensurações noturnas numa escola.
Tomamos três medidas para cada faixa, em períodos diversos de sonoridade, o que nos dá a média aproximada da realidade ruidosa do ambiente.
Para ter uma idéia do trauma sonoro do ambiente em estudo, realizamos medidas na rua enfrente ao prédio, em tôrno de seu jardim ou hall de entrada quando existentes. Tal procedimento permitiu avaliar a penetração do ruído nos locais em exame.
O nosso material de observação para as medidas de níveis de ruído, constou de casas de ensino primário e hospitalares da capital de S. Paulo. Desejamos prosseguir nas mensurações em outras escolas, secundárias, diúrnas e noturnas, bem como outros hospitais.
Escolhemos propositadamente tais estabelecimentos a fim de salientar a existência, entre nós, de ruído em níveis prejudiciais à saúde mental e física, bem como destacar a localização imprópria dos mesmos.
III. DETERMINAÇÃO DE NÍVEIS DE RUÍDO
a) em estabelecimentos escolares
1. Grupo Escolar S. Paulo
Situação: R. da Consolação esquina da R. Antônia de Queiroz. (Foto n.º 2).
Prédio moderno de 3 andares, sendo um térreo; com 5 metros de recuo do passeio.
Todas as salas de aula estão situadas na frente do edifício.
Foto n.º 2
Freqüência: 1.300 alunos, distribuídos em 14 salas, em média 35 alunos por classe.
Cursos: primário e pré-primário, êste em número de dois. Períodos de funcionamento: 8-11 hs. ; 11- 14 hs. e 14-17 hs.
O trânsito da R. da Consolação é intenso, tanto de dia como de noite e menor na R. Antônio de Queiroz.
Na R. da Consolação há tráfego de bondes (linhas "Avenida" e "Pinheiros") em ambos os sentidos e de veículos (ônibus, caminhões, automóveis) num único sentido.
As mensurações foram realizadas das 10 às 12 horas; as salas estavam sem alunos, em virtude de, na ocasião, as professôras se encontrarem em seminário, nessa e em outras unidades escolares.
Resultados das medidas, expressos em média:
Na R. da Consolação em frente ao prédio
A: 75 dB
B: 85 dB
C: 90 dB
Na R. Antônia de Queiroz em frente ao prédio
A: 70 dB
B: 80 dB
C: 80 dB
Como se vê, os níveis de ruído, mesmo nas salas vasias, são tão intensos que ultrapassam os admitidos para o período diurno.
Tivemos a oportunidade de conversar com algumas professôras que se encontravam presentes durante a mensuração; revelaram-nos que durante as aulas são obrigadas a suspender as explicações até que o ruído termine. Veêm-se ainda obrigadas a fechar as janelas, ficando prejudicadas a luminosidade é a aeração do ambiente.
Com nossas explicações, compreenderam logo porque os alunos, muitas vêzes são incapazes de fazer operações de matemática elementar e dar sinônimos fáceis. Salientaram ainda a frequência com que elas se tornam disfônicas, atribuindo isso ao uso imoderado da voz alta para que seus alunos possam ouvir.
2. Grupo Escolar Oscar Thompson
Situação: R. Lins de Vasconcelos esquina da R. Herminio Lemos (Bairro do Cambuci).
Numa esquina fronteiriça ao Grupo há um posto de gasolina e de lavagem de automóveis. Em sua frente (à R. Lins de Vasconcelos) há um ponto de parada de ônibus.
Tôdas as salas ficam na parte anterior do prédio, portanto em frente às R. L. de Vasconcelos e H. Lemos.
Freqüência: 1.170 alunos, distribuidos em 12 salas. Cursos: pré-primária, primário e classe para débeis mentais, em número de 37 classes.
Período das aulas: 7,40 - 10,40 hs. ; 10,50 - 13,50 hs. e 14-17 hs. A escola fica situada na parte superior de uma elevação de terreno. Seu prédio é de construção nova e moderna; tem 2 andares (um térreo e o primeiro andar). No andar térreo funcionam salas de aulas, salas da diretoria, da auxiliar da diretoria e gabinete dentário. No primeiro andar há salas de aula e uma pequena bibliotéca.
O trânsito da R. Lins de Vasconcelos é intenso, em ambos os sentidos, com muitas linhas de ônibus e permitindo a passagem de automóveis e caminhões. O seu tráfego maior é das 12 às 14 horas. O local do prédio do Grupo Escolar é ligeiramente em declive, obrigando os veículos ao uso do motor em maior intensidade; devido a encontrar-se numa esquina, há ainda o uso constante de buzinas. Na R. Herminio Lemos, o ruído é muito menos intenso.
Período das mensurações: das 9,30 às 12 horas; classes em pleno funcionamento.
Resultado das medidas, expressas em média:
Na R. Lins de Vase. em frente ao Grupo
A: 88 dB
B: 91 dB
C: 98 dB
Na R. H. de Lemos em frente ao Grupo
A: 60 dB
B: 65 dB
C: 65 dB
Andar térreo
No hal interno do Grupo
A: 66 dB
B: 70 dB
C: 78 dB
No jardim do Grupo:
A: 71 dB
B: 80 dB
C: 88 dB
Andar térreo
Sala da Diretoria: Em frente à R. da Consolação
A: 60 dB
B: 66 dB
C: 73 dB
Primeiro andar
Segundo andar
Primeiro andar
As queixas das professoras são idênticas às do Grupo Escolar S. Paulo: ruído intenso a perturbar as aulas; necessidade de utilizar voz alta; com conseqüente disfonia constante; necessidade de fechar as janelas com conseqüente distúrbios da luminosidade da sala e da aeração. As queixas em relação ao aproveitamento dos alunos também são idênticas às de suas colegas.
Ouvimos também os alunos; no geral, as mesmas queixas das professoras.
b) em estabelecimentos hospitalares
Situação: esquina de importantes avenida e rua.
Prédio moderno com um andar térreo è 8 andares, dos quais 7 destinados às atividades pròpriamente hospitalares e o último às intervenções cirúrgicas. Em cada andar há 11 quartos individuais, enfermarias, maternidade e berçário.
O trânsito é intensíssimo em ambas as vias. Ligam bairros importantes e servem ao escoamento de veículos com cargas pesadas. Acresce que na esquina do Hospital há um semáforo, obrigando os veículos a parar muitas vêzes; em sua saída o ruído dos motores e das buzinas é mais forte.
As mensurações foram feitas entre 9,30 e 12 horas. Segundo informações do diretor, médicos e enfermeiros do Hospital, o ruído mais intenso nas primeiras horas da manhã e no entardecer (18 - 20 hs.)
Resultados das mensurações, em média:
Realizadas na rua, em frente ao Hospital
A B C
85 95 100 em frente à Rua
83 90 95 em frente à Avenida
Andar térreo
A B C
Hall de entrada 75 85 90
Sala da Diretoria 70 74 80
Primeiro andar (destinado ao almoxarifado e outros departamentos do Hospital)
A B C
Em frente ao elevador 85 85 85
Segundo andar
A B C
70 75 85 Hall do elevador
65 75 80 Quarto n.º 210
(Os demais quartos não permitiram medir por estarem ocupados)
Terceiro andar
A B C
70 80 80 Hall do elevador
65 75 80 Quarto n.º 308
Quarto andar
A B C
65 72 73 Hall do elevador
63 72 82 Maternidade
Sexto andar
A B C
62 70 75 Hall do elevador
65 75 80 Quarto n.º 611
Sétimo andar
A B C
65 75 75 Hall do elevador
73 73 85 Quarto n.º 708
65 75 75 Berçário
Oitavo andar
A B C
65 75 75 Hall do elevador
65 75 84 Sala de cirurgia
Todos os quartos estão situados na frente do prédio, isto é, fazendo face para ambas as vias.
O uso de cortina e o fechamento das janelas são os recursos para minorar o ruído, o que prejudica a aeração.
Não há tratamento acústico nas salas e nos quartos; para a devida confirmação, atentem-se para os níveis de ruído registrados nas dependências destinadas à maternidade, berçário e sala de cirurgia.
Situação: Em importante via.
Prédio antigo, adatado, (era antes moradia), onde funcionam Hospital e Pronto-Socorro. Recuado do passeio uns 5 metros; há recuos laterais para estacionamento de carros dos médicos e ambulâncias. Tem um andar térreo e mais dois outros. No andar térreo há o hall de entrada, onde funcionam o PBX, a recepção e o escritório da Diretoria, além de um pequena almoxarifado. Junto ao hall, fazendo frente à rua, 2 enfermarias de mulheres, juntas. Na parte posterior há uma sala de cirurgia de maior vulto, uma sala de cirurgia menor, sala de curativos e quartos para doentes. No primeiro andar há 2 enfermarias contíguas, para homens e uma sala de cirurgia. No segundo andar, há uma enfermaria.
Capacidade do Hospital: aproximadamente para cem doentes. O trânsito desse trecho da rua é intenso com linhas de bondes ("Avenida", "Angélica" e "Pinheiros") em ambos os sentidos, e um único sentido para veículos, para os bairros (automóveis, ônibus, caminhões, etc.). Nas proximidades do Hospital, do outro lado da rua, há ponto de parada de bondes e de ônibus.
Fizemos medidas de dia e à noite, respectivamente às 14 horas e às 24 horas.
Antes de apresentarmos os resultados das medidas, queremos registrar que a maior intensidade do trânsito se faz (segundo depoimento dos doentes) na madrugada, às 4 horas, quando se inicia
o tráfego; a partir dessa hora a intensidade do ruído aumenta até atingir o máximo à tarde e à noite - entre 18 e 20 horas -. Há referência ainda à grande intensidade do ruído a uma hora da madrugada, ocasião do recolhimento dos bondes. O período de trégua é depois desse recolhimento até 4 horas quando se reinicia o tráfego dos bondes.
Apresentaremos conjuntamente os resultados das medidas realizadas nos períodos diurno e noturno:
Andar térreo
Na rua, em frente ao Hospital:
A B C
83 93 93 De dia
85 95 105 De noite
Hall de entrada:
A B C
75 75 80 De dia
70 80 85 De noite
Enfermarias contíguas, de n.º 2 (6 leitos) e n.º 3 (8 leitos) situados em frente à rua:
A B C
82 73 92 De dia
80 85 85 De noite
Sala de cirurgia
A B C
65 70 85 De dia
60 65 85 De noite
Quartos de fundo:
A B C
65 65 70 De dia
65 65 70 De noite
Primeiro andar
Enfermarias contíguas de n.º 11 (7 leitos) e n.º 12 (8 leitos) situadas em frente à rua:
A B C
82 80 85 De dia
80 75 85 De noite
Enfermaria n.º 14 com 7 leitos; situados lateralmente à rua, voltada para o pátio
A B C
70 80 85 De dia
70 75 75 De noite
Enfermaria n.º 15 com 5 leitos; situada lateralmente à rua, voltada para o pátio:
A B C
75 80 85 De dia
70 70 85 De noite
Corredor:
A B C
75 80 90 De dia
75 85 85 De noite
Sala de cirurgia:
A B C
70 70 75 De dia
65 65 85 De noite
Segundo andar
Enfermaria com 8 leitos, situada em frente à rua:
A B C
65 80 85 De dia
65 70 75 De noite
Os pacientes acham que o ruído é mais incomodativo à noite, pois havendo ruído de menor intensidade no Hospital, o movimento do tráfego dos bondes se torna insuportável, dando-lhes a impressão de "estarem no inferno" ou que "a casa vem abaixo" ou que os bondes estão passando dentro do quarto".
Os pacientes mais jovens referem que suportam mais o ruído, os mais idosos são menos tolerantes, ficando mais nervosos.
Por ocasião da nossa mensuração noturna (às 24 horas) encontramos doentes acordados, principalmente os que das enfermarias situadas em frente à rua. O motivo era o ruído.
Os pacientes queixaram-se também do ruído diurno produzido pela movimentação da ambulância do Hospital e carros dos médicos bem como dos trabalhos do Hospital (recepção, visitas, trânsito de maca, etc.).
Acreditamos ser dispensável a apresentação de mais outros casos, constantes de nosso estudo, semelhantes aos acima relatados, pois que julgamo-los suficientes, eis que são meramente exemplificativos de uma situação que reina em numerosos dos citados estabelecimentos de S. Paulo.
A nossa intenção, nestas pesquisas, é despertar o interêsse dos estudiosos, sejam médicos, engenheiros, legistas ou professôres, para êsse problema, o qual até o presente - ao que parece - não tem merecido a devida atenção e o necessário de quem de dever.
IV. Considerações gerais
Vimos, pois, que as escolas e os hospitais por nós examinados estão submetidos a cargas sonoras intensas e em nível traumatizante. Numerosos outros estabelecimentos, com as mesmas finalidades, encontram-se, por certo, nas mesmas condições de insalubrídade sonora.
O problema parece-nos tanto mais grave quando consideramos que os grupos humanos encontrados em tais estabelecimentos - crianças e doentes (perturientes, recém-nascidos, operados, velhos, etc. ) - necessitam, como condição essencial para o aproveitamento das lições e do tratamento, de ambiente silencioso.
Assim, segundo BURGER (1964), 50% dos pacientes não são perturbados pelo ruído, os demais o são da seguinte maneira: a metade queixa-se do ruído do tipo humano e outra metade de vários outros tipos de ruídos. O A. considera como ruído do tipo humano: o lamento, a conversa, o riso, tosse, o andar das pessoas, principalmente produzidas por visitas noturnas; os outros tipos de ruídos são os produzidos pelos carros, ambulância, motores, trens, automóveis, aeroplanos, vento, chuva, elevadores, batidas de porta, queda de instrumentos, construções, consertos, etc..
Realmente tais ruídos têm influência no tratamento, segundo observaram RIBAS & FORTES, em casos de desvio das respostas das respostas terapêuticas em doentes mentais.
A ação do ruído, que já é maléfica em indivíduos adultos e em estado de higidez física e mental, é evidentemente maior naqueles grupos, devido à tenra idade de uns e às condições especialíssimas decorrentes dos estados patológicos de outro grupo.
Assim, o ruído age sôbre o metabolismo basilar, aumentado o consumo de oxigênio, a tensão sanguínea geral e intra-craniana, a sudorese, o número dos batimentos cardíacos, mesmo do feto (DWRONICK, JASIÉNSKA, SMOLARZ & WAWRIK), o ritmo respiratório e a contração da musculatura corpórea. Numerosas glândulas são afetadas pelo ruído: a supra-renal, a lacrimal, as do aparelho digestivo entre outras.
Ao atingir 140 dB o ruído desencadeia sensações desagradáveis, tais como vibração na cabeça, movimento dê ar no nariz e perda de equilíbrio, (devido à movimentação dos líquidos labirínticos), sensação de dôr e calôr na cabeça, vibrações nos globos oculares, etc..
Em relação à interferência do ruído na eficiência do trabalho intelectual, numerosos estudos demonstraram que os mais elementares trabalhos ficam prejudicados, tais como soma digital, multiplicação, encontro de sinônimos, estabelecimento de simples comparações, etc. Quando o ruído não é familiar aos escolares, as respostas em testes ou são erradas ou são lentas ou mesmo omitidas. Sabe-se que o ruído também exerce ação de distração, o que ocasiona queda da eficiência intelectual.
Mesmo nos trabalhos intelectuais de adultos exige-se coordenação sensitivo-motor, o ruído interfere danosamente nessa cordenação particularmente quando os sons apresentam características físicas diferentes e são intermitentes.
Assim, pois, todo ruído diurno que ultrapassar 30 dB e o noturno que suprepujar 60 dB já pode ocasionar em doentes e em crianças em atividade escolar os citados distúrbios; quando o nível atingir 100 dB a atuação do ruído é lesiva.
A Medicina e a Higiene Sanitária deverão utilizar-se de todos os meios para evitar a produção de ruído em níveis lesivos ou, quando existentes, eliminá-los ou diminuir-lhes a carga, tornando-os inofensivos.
O gráfico n.º 2 de BURGER, demonstra-nos como um ruído de intensidade superior à media do ruído diurno (70 dB por ex.)
pode ser indesejável naquele período e como outro de intensidade de 45 dB pode também ser intolerável durante a noite, pois ultrapassa a média ruidosa daquele período e escapa à ação aglutinante do ruído diurno.
Todo trabalho será, repetimos, destinado a reduzir o ruído do ambientes aos níveis considerados toleráveis.
Gráfico n.º 2
SUGESTÕES APRESENTADAS ÀS AUTORIDADES COMPETENTES
1. Elaborar os necessários estudos para a fixação dos níveis médios de ruído para os principais estabelecimentos das cidades, particularmente no que se refere às escolas e hospitais;
2. Enquanto não forem fixados tais níveis, adotar para os referidos estabelecimentos, os seguintes níveis médios: para o período diurno: 60 dB. para o período noturno: 30 dB. para as horas de descanso e sono: de 15 a 30 dB.
3. Solicitar das autoridades competentes o respeito à legislação que regulamenta a salubridade sonora em cada região, seja no que tange à construção de novas escolas e hospitais, seja nos cuidados contra a ação do ruído nos estabelecimentos construídos, com a finalidade de diminuir os ruídos externos (urbanos) e os internos, êstes próprios da vida de cada um dos referidos estabelecimentos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1) BURGER, J. C. - Hospital noise and the patient. South African Medical Journal 38 (30): 704-707. 1964.
2) DWORNICKA, B., JASIENSKA., SMOLARZ, W., & WAWRIK R. - Attempt of determining the fetal reaction to acustic stimulation. Acta Oto-Laryng. 57: 571-574. 1965.
3) GEIGER, P. H. - Noise-Reduction Manual. Engineering research Institute. University of Michagna. 1965.
4) MONTEIRO, A. & PENA, M. - Determinação do nível de ruído em diversas localidades do Rio de Janeiro. Contribuição ao estudo da surdez profissional. Rio. 1963.
5) ORSINI, L. de QUEIROZ - Contrôle de ruídos. Aula proferida na Fac. de Higiene e Saúde Pública de S. Paulo. Departamento de Higiene do Trabalho. Sem data.
6) PETERSON, A. P. G. & BERANEK - Handbook of noise measurement an Measurement of vibration. General Radio Co. Third Edition. Massuchetts. 1956.
7) Regulamentação da Lei n.º 4.805: "Dos ruídos urbanos e da proteção ao bem estar e ao sossêgo público". Dec. n.° 3.962 de agôsto de 1958 da Prefeitura Municipal de S. Paulo, Separata da Revista Acrópole. Novembro de 1958.
8) RIBAS, J. CARVALHAL & FORTES, J. R. de ALBUQUERQUE - Influências do ruído na Saúde mental. A propósito de episódio observado em S. Paulo. Arch. de Hig. e Saúde Pública 27 (93): 251-257. 1962.
(*) Apresentado em colaboração para o tema "TRAUMA SONORO" do XIV Cong. Brasileiro de Otorrinolaringologia, realizado no Rio de Janeiro - 9 - 13 Nov. 1965.
(**) Catedrático de Clínica Otorrinolaringologica da Fac. de Medicina da Univ. Católica de S. Paulo. Docente livre de Clínica ORL da Fac. de Medicina da USP.