INTRODUÇÃOA tonsilectomia é um cios procedimentos cirúrgicos mais antigos, descrita há cerca de 2.000 anos, por Celso Cornélio10. As indicações do procedimento cirúrgico mudaram durante este período e foram estabelecidos critérios para a realização do mesmo, que passaram a ser mais bem definidas proporcionando um benefício crescente ao paciente. Já a adenoidectomia foi introduzida em meados do século XIX, associado ou não à tonsilectomia.
As técnicas cirúrgicas vêm sofrendo diversas modificações, primeiro com a dissecção tonsilar, descrita por Worthington (1907), seguida pelo uso de guilhotina (Whillis Y. Pybus, 1910), sendo a ligadura dos vasos sangrantes, ou não, preconizada por Cohen (1909)10. Tais técnicas evoluíram, tendo como princípio básico a restrição de complicações, e sendo o sangramento, a mais comum e a mais temida delas10. Abaixo dessas premissas, tem-se introduzido a cauterização com diatermia como alternativa às ligaduras clássicas6; e a crioamigdalectomia, à eletrocoagulação, em casos selecionados. Benninger (1996) e Rothstein (1993) em estudo retrospecivo, observaram níveis de sangramento mais baixos, com a tonsilectomia por eletrocautério, se comparada â dissecção fria, fato este hão comprovado por estudo de Sanchez Del Hoyo10. Maniglia5 obteve baixos níveis de sangramento no pós-operatório imediato e tardio com o uso, no leito cirúrgico, de subgalato de bismuto associado à adrenalina. Recentemente, o laser tem sido mais uma opção para a realização desse procedimento3,11. O presente estudo tem como objetivo avaliar a eficácia do subgalato de bismuto como agente hemostático no intra-operatório de tonsilectomias.
MATERIAL E MÉTODOForam utilizados, neste estudo, trezentos e doze pacientes, submetidos à tonsilectomia e/ou adenoidectomia, por residentes do primeiro ano do Departamento de Otorrinolaringologia e Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FAMERP, de São José do Rio Preto/ SP. Todos os procedimentos foram realizados sob anestesia geral, com entubação oro-traqueal. A posição padrão de Rose foi utilizada em todos os casos. A adenoidectomia foi realizada por curetagem, com o uso de Curetas Curvas de Shambaugh.
A tonsilectomia foi realizada por dissecção, da seguinte forma: Uma incisão mucosa a 2 mm da margem medial do pilar anterior foi realizada com uma lâmina de bisturi n° 12 sendo deslocada com o dissector de Hurd, lateralmente, para expor a cápsula da tonsila, que é segura pela pinça de Hallis e tracionada medialmente. A pinça curva de Kelly é introduzida entre a cápsula da tonsila e o músculo construtor superior da faringe, promovendo uma dissecção no sentido inferior. Com o uso do dissector serrilhado, a tonsila é totalmente deslocada da musculatura até sua retirada no polo inferior.
Gazes embebidas em uma pasta de subgalato de bismuto, obtida pela mistura de 10 gramas do metal com 10 ml do soro fisiológico a 0,9%, são colocadas na fossa tonsilar por um período de 5 minutos. O mesmo procedimento é realizado no lado oposto e no leito cirúrgico de adenoidectomia. Após o tempo determinado, irrigação é realizada corri solução de soro fisiológico a 0,9%. A seguir, o paciente seria extubado, quando em condições adequadas e transferido a sala de recuperação anestésica. Foram excluídos deste estudo cinco pacientes por ausência de informações no prontuário.
As indicações cirúrgicas foram divididas em cinco categorias básicas:
1) Obstrução das vias aéreas superiores.
2) Infecções de repetição.
3) Obstrução das vias aéreas superiores, mais infecção de repetição.
4) Amigdalite crônica (caracterizada por halitose, retenção de restos alimentares e sintomas relacionados).
5) Abscesso peri-amigdalino.
RESULTADOSDos trezentos e sete casos incluídos neste trabalho, 43,65% (134) eram do sexo masculino; e 56,35% (173), cio sexo feminino. A média de idade do sexo masculino foi de 7,54 anos e 9,95 para o feminino (Tabela 1).
Em relação à faixa etária e a indicação cirúrgica (Gráfico 1), observou-se que a média de idade para os sintomas obstrutivos foi de 6,38 anos; infecções de repetição isoladamente foram de 7,85, ambas indicações com média de 7,05 anos; amigdalite crônica e o abscesso peri-amigdalino tiveram 21,25 e 21,00 anos de média, respectivamente.
Os sintomas obstrutivos constituíram a indicação mais freqüente do procedimento, cola 43% (132) de indicações cirúrgicas; a seguir, vem o mesmo sintoma obstrutivo associado à infecção de repetição, com 36,48% (112); infecções de repetição perfazem 16,29% (50); a tonsilite crônica, 2,93% (9) e o abscesso peri-amigdalino, 1,30 (4) (Tabela 2).
Sem dúvida, o procedimento associado, adenoamigdalectomia, respondendo por 64,5% dos casos (198), foi o mais freqüente, seguido de tonsilectomia, com 22,8% dos casos (70); e a adenoidectomia, como único procedimento, perfez 12,7% do total.
Do total de trezentos e sete procedimentos realizados, apenas um caso necessitou de reintervenção cirúrgica, cerca de seis horas do procedimento inicial, sob anestesia geral. Tratava-se do pós-operatório imediato de um paciente portador de abscesso peri-amigdalino, onde não foi observada melhora com o tratamento clínico, sendo indicada tonsilectomia. Não houve óbitos na nossa casuística.
TABELA 1- Relação dos procedimentos cirúrgicos por sexo.
TABELA 2 - Relação entre a indicação cirúrgica e o sexo.
DISCUSSÃOO subgalato de bismuto é um metal pesado, relativamente insolúvel, de pobre absorção e forte poder adstringente5. Segundo estudos de Thokidottik e colaboradores14, foi demonstrado que esse metal pesado atua na cascata da coagulação, por meio da via extrínseca, especificamente no fator XII ou Hageman, causando, assim, uma aceleração na atividade hemostática. Além dessa comprovação laboratorial, acredita-se em seu efeito adstringente sobre a área cruenta. Nenhum efeito colateral ou tóxico tem sido descrito na literatura como agente hemostático4.
Em estudos realizados por outros autores, quanto à efetividade do método cirúrgico e a percentagem de sangramento pós-operatório, foi demonstrado por Maniglia e colaboradores5 (1989) a extrema efetividade do subgalato de bismuto como agente coadjuvante na adenotonsilectomia, obtendo um índice de 0,28% de sangramento no período pós-operatório, num total de 1.428 casos.
Os resultados obtidos por este serviço - cujo índice de sangramento, no período pós-operatório, foi de 0,33%, em um total de 307 casos operados-comparam-se satisfatoriamente com a literatura. Levando-se ainda em consideração que os procedimentos foram realizados por residentes em treinamento e que o único caso a necessitar de reitervenção cirúrgica foi o de um pós-operatório imediato, de um paciente portador de um abcesso peri-amigdaliano, confirmando os achados de maior incidência de sangramento pós-operatório nestes indivíduos - quando em comparação com a tonsilectomia-, devido a outras indicações8, observamos que a aplicação no leito cirúrgico de uma pasta de subgalato tem comprovada ação hemostática em tonsilectornias e adenoidectomias
Gráfico 1. Indicação dos procedimentos cirúrgicos por média de idade e de sexo. IR: infecções de repetição; AP: abcesso periamigdalino; O: obstrução; AC: amigdalite crônica
CONCLUSÃOA utilização do subgalato de bismuto como agente hemostático em tonsilectomias é algo recente na longa história cirúrgica otorrinolaringológica, devendo ser melhor divulgada a sua importância e eficácia no controle da hemorragia pós-operatória; mas, pelos dados anteriormente citados, conclui-se que tal técnica cirúrgica pode ser exeqüível por qualquer especialista da área, dispensando instrumentos de alto custo e complexidade e. g. laser, apresentando um dos mais baixos índices de complicações hemorrágicas, quando em comparação com a literatura.
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* Médico Otorrinolaringologista, Pós-Graduando da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP.
** Professor Adjunto do Departamento de otorrinolaringologia e Serviço de cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP.
*** Médico(a) Otorrinolaringologista.
**** Residente do 3° ano do Departamento de Otorrinolaringologia e Serviço de cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP.
Instituição: Departamento de Otorrinolaringologia e Serviço de cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina de José do Rio Preto/ SP.
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Artigo recebido em 17 de maio de 1999. Artigo aceito em 13 de abril de 2000.