ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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2423 - Vol. 59 / Edição 4 / Período: Outubro - Dezembro de 1993
Seção: Artigos Originais Páginas: 279 a 280
Paralisia facial periférica idiopática em gestantes.
Autor(es):
Ana Helena Chagas Ramos*
Tanit G. Sanchez**
Ricardo Ferreira Bento***

Palavras-chave: paralisia facial, gravidez

Keywords: facial paralisis, pregnancy

Resumo: Diversos autores salientam a gestação como sendo um fator de risco no desenvolvimento de paralisia facial periférica (PFP) idiopática. Os autores estudaram 12 pacientes que desenvolveram PFP idiopática durante a gestação ou período puerperal, entre 1983 a 1992, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Observaram que durante a evolução, as pacientes apresentaram regressão do quadro, á exceção de 2 casos que permaneceram com seqüelas. O objetivo do trabalho foi acompanhar a evolução do quadro, bem como investigar uma possível etiologia e associação com fatores de risco.

Abstract: Many authors believe that pregnancy is a risk factor for the development of idiopathic peripheral facial palsy (PFP). In this paper the authors studied 12 patients with PFP during pregnancy or immediate after childbirth between 1983 and 1992 in the "Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo". They observed that all the patients presented very good recovery of sintoms with 2 patients with little sequels. They make a evolution study and a possible ethiological suggestion.

INTRODUÇÃO

A paralisia facial periférica idiopática é uma mononeuropatia do VII par craniano, de aparecimento súbito, etiologia desconhecida e evolução favorável na grande maioria dos casos.

A sua associação com a gestação foi descrita pela primeira vez por Sir Charles Bell, em 18301, onde se observou um caso com recorrência de paralisia facial periférica em três gestações consecutivas, 3 casos de PFP bilateral no período puerperal e outros 3 casos de PFP unilateral desenvolvido no final do período gestacional.

Essa incidência aumentada da PFP em gestantes foi confirmada por Hilsinger (1975)2, o qual estabeleceu esta relação baseada em estudos populacionais, Segundo seus estudos, a incidência de PFP em mulheres grávidas ou no período pós-parto imediato é 3,3 vezes maior em relação a mulheres não grávidas na mesma faixa etária.

Outro estudo populacional realizado por Prescott3, em Cape Town, mostrou que 12% dos casos femininos de PFP idiopática eram de mulheres gestantes e na população local, a taxa de gestação no mesmo período era de 5 % da população feminina. O objetivo do trabalho foi acompanhar a evolução do quadro e avaliar possíveis etiologias e associação com fatores de risco.

CASUÍSTICA

Este estudo, de caráter retrospectivo, foi realizado na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo entre 1983 e1992.

Foram selecionadas todas as pacientes que desenvolveram PFP durante a gestação ou no período puerperal cujos dados de prontuário permitiram estabelecer uma evolução precisa. Uma paciente foi excluída do estudo por apresentar suspeita etiológica de herpeszoster. Foram acompanhadas, efetivamente, 12 pacientes cuja idade variou de 18 a 42 anos (média = 26,5 anos).

A avaliação da PFP na primeira consulta foi realizada através de um score internacional subjetivo (Portmann,1985)4, levando-se em conta o grau de comprometimento dos diversos ramos do nervo facial. O mesmo era feito na última consulta, quando a recuperação atingiu seu estágio final. Todas as pacientes foram submetidas a anamnese, exame físico completa, audiometria, impedanciometria e exames laboratoriais (hemograma, glicemia, RSS) seguindo-se uma rotina estabelecida no serviço na tentativa de se pesquisar uma possível etiologia para PFP.

Optou-se por não realizar tratamento medicamentoso. À exceção de 2 pacientes que já estavam fazendo uso de corticóides quando da primeira consulta. Realizou-se seguimento dos casos visando avaliação da evolução da patologia.

RESULTADOS

Neste estudo, a idade média das pacientes foi de 26,5 anos. Das 12 pacientes acompanhadas, uma desenvolveu a PFP no 1° trimestre da gestação, uma no 2° trimestre e cinco no último trimestre. As cinco pacientes restantes desenvolveram o quadro durante o período puerperal.

Os exames laboratoriais apresentaram-se normais, à exceção de uma paciente diabética com glicemia de jejum de 244 mg%. Todas as gestações evoluíram sem interc ocorrências. Uma das pacientes apresentou hipertensão arterial sistêmica durante a gestação e outra evoluiu com pré-eclâmpsia.

A evolução da PFP foi favorável em todos os casos. Apenas duas pacientes (16,6%x) apresentaram discretas seqüelas na avaliação final porém seu score ficou entre 16 e 20, sendo considerado como ótima recuperação.

DISCUSSÃO

Em nosso estudo, obtivemos uma concordância com os dados da literatura, segundo os quais a incidência da paralisia facial periférica em gestantes predomina no 3° trimestre da gestação e no período puerperal.

Várias hipóteses têm sido aventadas para explicar este fato. A complexidade das alterações fisiológicas durante a gestação sugere que a paralisia facial gestacional é multifatorial. O líquido corpóreo total aumenta com o decorrer da gestação, notadamente no 3° trimestre, podendo levar a um edema do nervo com conseqüente lesão de natureza isquêmica. Nota-se uma grande correlação entre a época de máximo volume extracelular nas grávidas e a época do pico de aparecimento da PFP idiopática nas gestantes,

Alguns autores inferiram, por estudos soro16gicos e de imunofluorescência, que a PFP idiopática representa uma resposta imune a um vírus, especificamente do tipo herpes-vírus5, 6.

As gestantes demonstraram maior susceptibilidade a infecções por herpes simplex e talvez por outros vírus7. A imunossupressão materna durante a gestação, causada em grande parte pelo aumento de corticosteróides circulantes, pode predispor à reativação de infecções virais8, 9, 10. Esta hipótese é corroborada pelo fato de 100%x das pacientes com PFP idiopática terem evidências de infecção prévia pelo herpes simplex vírus2.

Outra hipótese a ser considerada é a de que a congestão venosa causada pela retenção hídrica da gravidez aumentaria a possibilidade de formação de microtrombos ou êmbolos, causando oclusão vascular da "vasa nervorum" com conseqüente isquemia do nervo facial11.

Outras associações como hipertensão, toxemia ou número de gestações anteriores não foram comprovadas em nenhum estudo. Segundo MAY (1980)12, a recuperação espontânea não parece ser tão boa quanto em mulheres não grávidas, o que não foi observado neste trabalho.

CONCLUSÃO

A paralisia facial idiopática em gestantes apresentou neste estudo evolução favorável na maioria dos casos, semelhante à apresentada em mulheres não grávidas. O tratamento deve ser conservador não se administrando nenhuma droga específica nestes casos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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3. PRESCOTT, CAL: Idiopathic facial nerve palsy (the effect of treatment with steroids). The Journal of Laryngology and Otology, 102.403-407, 1988.
4.PORTMANN, M.: Conclusions of the international over all assessment system adopted for grading facial movements. In: International Symposium on the Facial Nerve, 5.p.43-4, Bordeaux, 1984. Proceeding. Paris, Massor, 1985.
5.ADOUR, K.K.; BELL, D.N. and HILSINGER, R.L. Jr.: Herpes simplex virus in idiopathic facial paralysis (Bell's palsy). JAMA, 223: 527530, 1975.
6. MULKENS, P.S.J.Z.; BLUKER, J.D. and SCHRODER, F.P.: Acute facial paralysis: A virological study. Clin. Otolaryngol, 5: 305-310, 1980.
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12. MARY, M.: Bell's palsy: Diagnosis, prognosis and treatment (update 1980). Sing Rounds, 13 (1): 38-48, 1980.




* Pós Graduando da Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
** Residente de 3º ano da Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
*** Professor Associado da Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Trabalho realizado pela Disciplina de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e L1M-32 (Serviço do Prof. Dr. Aroldo Miniti).

Trabalho apresentado no XXXI Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia - São Paulo - 1992.

Endereço dos Autores: Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - Rua Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 - 6° andarsala 6021 - CEP 05403-000 - São Paulo - SP - tel.: (011) 280-0299.
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