ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
2372 - Vol. 59 / Edição 1 / Período: Janeiro - Março de 1993
Seção: Artigos Originais Páginas: 33 a 35
O FORMALDEÍDO DA ESTERILIZAÇÃO DE HOMOENXERTOS PROCESSADOS EM BANCO DE TECIDOS PARA IMPLANTES OTOLÓGICOS.
Autor(es):
Adriana P. Miranda*
Deise M. da Costa**
Rosirene P. Gessinger***
Roberto Matusiak****
Amoldo Linden*****

Palavras-chave: ouvido médio, transplante homólogo

Keywords: middle ear, transplantation homologous

Resumo: Os laboratórios que processam homoenxertos devem ter o máximo de cuidados na esterilização do material para implante. Neste trabalho realizamos o teste de esterilidade para bactérias e fungos em 55 amostras da solução tamponada de formaldeído 4%, que é utilizada para conservação e esterilização dos homoenxertos otológicos processados no Banco de Tecidos para Implante Otológicos do HCPA-UFRGS. O tempo de estocagem do material foi de 26 dias a 9 anos. São apresentados os resultados obtidos, bem como uris comentário sobre as soluções empregadas na conservação de homoenxertos em geral.

Abstract: The laboratories that process homografts have to be careful about the sterilization of the material for implants. On this work a sterility test was dope for bacteria and fungi of 55 samples of 4 % buffered formaldeyde solution used for conservation and sterilizatiom of otologic homografts processed at the Tissues Bank for Otologic Implants. The period was from 26 days to 9 years. The results obtained are presented as well as a comment about tire solution used in homografts conservation.

INTRODUÇÃO

Durante os últimos 30 anos, os tecidos para implantes otológicos têm sitio utilizados pela comunidade médica nacional e internacional.

Todos os avanços conseguidos decorrem tio aperfeiçoamento das técnicas de obtenção, manuseio e acondicionamento adequado destes materiais.

Considerando a existência de várias soluções para preservação de homoenxertos otológicos, o Laboratório de Tecidos para implantes Otológicos da Faculdade de Medicina na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Hospital de Clínicas de Porto Alegre, optou pela solução de formaldeído a 410, que entre outros fatores, demonstrou ser adequada para conservação dos homoenxertos por nós processados.

MATERIAL E MÉTODOS

Para atingirmos o objetivo de testar, através da análise para bactérias e fungos, a solução de imersão dos tecidos processados no Banco de Homoenxertos da Faculdade de Medicina da UFRGS e HCPA1, armazenados desde 1981 visando obter dados sobre o grau de esterilização alcançado, valemo-nos de 55 amostras acondicionadas individualmente cm frascos especialmente fabricados para este fim, tendo como solução conservante e esterilizante o formaldeído tamponado pH neutro a 410, assim distribuídas; 8 com fragmento de osso, 6 com corte de menisco, 14 com martelo, 6 com cartilagem, 5 cota PROT (Prótese de Reconstituição Ossicular Total), 7 com dura-máter, 2 com PROP (Prótese de Reconstituição Parcial) e 6 com bigorna.

Os períodos de imersão nesta solução variaram de 26 dias a 9 anos, tendo a seguinte distribuição anual: 1981 - 1 amostra; 1982 - 2 amostras; 1983 - 1 amostra; 1988 - 23 amostras; 1989 - 8 amostras e 1990 - 11 amostras, conforme Tabela 1.

As provas de esterilidade preconizadas pela Farmacopéia Brasileira2, foram realizadas em dois meios de cultura, adaptando-se o volume para 2 ml cada amostra (líquido conservante) foi inoculado em um tudo contendo 20 ml de caldo Triglicolato de Sódio, adequado para o crescimento de bactérias aeróbias e anaeróbias, inclusive esporulados, incubado em estufa a 350°C por uma semana, e acompanhado de provas de esterilidade do meio (sem inóculo algum) e controle de crescimento (inoculado com cepa de STÀPHYLOCOCCUS AUREUS). Igual volume de cada amostra foi inoculada e um segmento tubo contendo 20 ml de sabourand modificado, próprio para o crescimento de fungos, incubado em estufa a 22°C por duas semanas e acompanhado de provas de esterilidade do meio (sem inóculo algum) e controle de crescimento (inoculado com cepa de CANDIDA sp). Foram consideradas negativas as provas onde não foi constatada nenhuma evidência de crescimento microbiano.

RESULTADO

Das 55 amostras, nenhuma apresentou resultado positivo para o crescimento de bactérias e/ou fungos.

DISCUSSÃO

O Banco de Tecidos para Implantes Otológicos da Faculdade de Medicina da UFRGS e HCPA, vem, desde a sua criação, em 1981, processando tecidos utilizados na restauração da audição no ouvido médio, cujas deficiências podem ser resolvidas com implantes e/ou enxertos .

Os tecidos (cartilagem, dura-máter, corte de menisco, fragmento de osso, martelo e bigorna), cuidadosamente obtidos de necrópsias de pacientes que não apresentavam doenças infecto-contagiosas ou câncer, bem como as próteses de reconstituição ossicular parcial e total, PROP e PROT, respectivamente, confeccionadas a partir de um disco de osso comparo de tíbia e uma haste de teflon3, são submetidos a um processamento laboratorial, que culmina na imersão em solução tamponada de formaldeído a 4% e posterior estocagem.

Durante os vários anos de processamento dos tecidos e próteses combinadas, o Banco de Homoenxertos tem uma constante preocupação no tocante ao item esterilização, já que uma possível contaminação destes materiais põe em risco todo o procedimento e sucesso cirúrgico.

Verificamos, portanto, a partir deste trabalho, que nas 55 amostras testadas não houve crescimento de bactérias e/ou fungos cm nenhuma delas. Este dado nos permite inferir que a solução de formaldeído 4% está plenamente adequada como agente esterilizador, urna vez que obteve 100% de sucesso para o item esterilização.

Por se tratar de uni trabalho que utiliza-se de material estocado e pronto para ser usado, deparamo-nos com a impossibilidade de obter mais amostras de anos anteriores (apenas urna amostra de 1981 e 1983 e duas de 1982), assim como a inexistência de material nos anos de 1985, 1986 e 1987. Entretanto, julgamos que o número total de amostras, principalmente pelo fato de não ter havido contaminação em nenhuma delas, é suficiente para nos certificar quanto à eficácia deste agente químico.

Desde 1960 os Homoenxertos otológicos são usados para reconstrução do ouvido médio e em timpanoplastias. A partir desta época, muitas pesquisas sobre Homoenxertos e sua conservação são executadas por otologistas4.

Na preservação de materiais para implantes otológicos usam-se preferencialmente três soluções: Cialit, introduzido para uso otológico por Marquet; álcool isopropílico, introduzido por Glasscock e House; e fortnaldcído introduzido por Perkins.



TABELA 1 - Distribuição anual dos homoenxertos.



Além destas soluções, a irradiação com frio-seco é mencionada na literatura5.

Marquet4 em um artigo de revisão publicado em 1977, diz que Cialit permite ao enxerto manter sua complacência natural, enquanto que formaldeído causa o enrrigecimento tecidual.

Ao longo destes anos, o Banco de Homoenxertos da UFRGS e HCPA tem verificado que os tecidos utilizados na reconstituição timpânica, fixados e conservados em formaldeído, não apresentaram nenhum enrijecimento tecidual, sendo perfeitamente manipuláveis pelo cirurgião.

Para Feenstra5 a meta de qualquer processo de preservação é manter o produto morfologicamente intacto, por isto, sua opção em preservar tímpanos em álcool 70%.

Para Perkvis4 Cialit funciona somente como um agente esterilizante e o álcool causa efeitos de alteração química pela desidratação.

O glutaraldeído é comumente usado no controle físico e biológico das propriedades estruturais infra e intermoleculares do colágeno6.

Estudos sobre a eficácia do glutaraldeído (0,2 e 0,5%), pH 7,4 e formaldeído (4%), pH 5,5 mostram que ambos são capazes de eliminar MYCOBACTERIUM CHELONEI, BACCILUS SUBTILIS, CLOSTRIDIUM SPOROGENES, ASPERGILLUS NIGER, CANDIDA ALBICANS, ESCHERICHIA COLI, PSEUDOMONAS AERUGINOSA E STÀPHYLOCOCCUS AUREUS7. Sua, sobre esporos apresenta significativa vantagem quando comparado a outras combinações como hipocloritofáleo. Sua ação tem capacidade de inativas o antígeno HBV (vírus da hepatite B)9, 10, 11, bem como torná-lo não-infectante11.

O uso de formaldeído para processar tecido valvular cardíaco é recomendado somente para manter a esterilização, após preliminar estabilização tecidual com glutaraldeído6.

Nos últimos anos, uma das maiores preocupações é a transmissão da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), através de materiais contaminados com sangue. Estudos concluem que o vírus HIV apresenta sensibilidade a desinfecção química similar a de outros vírus e que a sua exposição à solução de glutaraldeído al 013 % pode ser adequada na desinfecção destes materiais

O aprimoramento das técnicas de obtenção e preservação dos tecidos para implantes tem sido exaustivamente testadas. A correlação dos dados encontrados viabilizam o aperfeiçoamento da forma de empregar as soluções utilizadas na conservação destes materiais, bem como o descobrimento de outras talvez até mais eficientes das que hoje são empregadas.

CONCLUSÃO

Os dados obtidos nos possibilitam descartar insucessos cirúrgicos causados pela existência de bactérias e/ou fungos; e que o formaldeído é um agente capaz de manter e esterilizar estes materiais enquanto estocados.

Todas as formas para evitar contaminação devem ser preconizadas, pois isto é essencial para garantirmos o sucesso na utilização dos homoenxertos otológicos.

BIBLIOGRAFIA

1. LINDEM A.: Tecidos para implantes otológicos-Banco de homoenxertos. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, 50(3): 2-4, 1984.
2. Farmacopéia dos Estados Unidos do Brasil 2ª edição, (2): 977-982, 1959.
3. LINDEM A.; ROITHMANN R.: Ossicular chain reconstruction a combined prothesis with organic and synthetic material. Laryngoscope, vol 101 (3): 436-437, 1991.
4. GLASSCOCK, M.E.; JACKSON C.G.; KNOX G. W.: Can acquired immunodeficiency syndrome and creutzfeldt - Jacob disease. Arch Otolaryngol Head Neck Surg, vol. 144 nov, 1988.
5. STALOFF, R.T.; ROBERTS B.: Preservation of otologic homografts. Am. J. Otol, 7. 214-217, 1986.
6. SPEER, D.P.; CHPVIL M.; ESKELSON C.D.; ULREICH J.: Biological effects of residual gluturatdehyde in glutaraldehydetanned collagen biomaterial. Journal of Biomedical Materials Research, 14: 753-764, 1980.
7. WOODROOF, E.A.: Use of glutartldehyde and formaldehyde to process tissue heart valves. Journal of Bionengineering 2(1): I-9, 1978.
8. GORMAN, S.P.; SCOTT, E.M.; HUTCHISON, E.P.: Hypoclorite effects on spores and spore form of Bacillus sublilis and on a spore lytic enzyme. J. Appl. Bacteriol, 56: 293-303,1984.
9. BOUDOUMA, M.; ENJALBERT, L.; DIDIER, J.: A simple method for the evaluation of antiseptic and delinfectant virocidal activity. J. Virot. Methods, 9: 271-276, 1984.
10. ADLER-STORTHZ, K.; SEHULSTER, L.M.; DREESMAN, GR; HOLLINGER F.B.: Effect of alkaline glutaraldeyde on hepatitis B virus antigen. Eur. J. Clin. Microbiol. 2:316-320, 1983.
11. BOND, W.W.; FAVERO, M.S.; PETERSEN, N.J.; EBERT,LW.: Inactivation of hepatitis B vinca by intertuediate to hight level a: sinfentant chemicals. J. Clin. Microbiol. 18: 535-538,1983.
12. RESNICK, L.: Stability and inactivacion of HTLV-III/LAV under clinical and laboratory enviroments. DAMA 225: 1887-1891, 1986.
13. SPIRE, B.; BRRE-SINOUSSI, F.; MONTAGNIER, L.; CHER MANN, J.C.: Inactivation of lynphadenopathy associated virus by chemi. cal disifectants. Lancer, 899-901, 1984.




* Bióloga Bolsista do CNPq
** Médica Otorrinolaringologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre
*** Médica Residente do 3°ano de Otorrinolaringologia do HCPA
**** Bioquímico do Laboratório de Microbiologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre
***** Professor de Otorrinolaringologia na Universidade federal do Rio Grande do Sul. M.Sc. em Citologia. Orientador do Trabalho.

Hospital de Clínicas de Porto Alegre - Departamento de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do RS.

Apoio CNPq.

Endereço para correspondência: Dr. Arnaldo Lindeu - Rua Ramiro Barcelos, 2350 Zona 18 - 90210 - Porto Alegre - RS - Brasil.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia