As estenoses cicatriciais da laringe, são tão raras quanto dificil e longo o seu tratamento.
Das técnicas tôdas descritas até hoje, parece-nos a mais eficiente, aquela relatada por John B. Erich (*) da Mayo Clinic. Tinhamos um caso em nosso serviço, no Hospital Central da Aeronáutica, no Rio de janeiro, de um soldado, A. I. R., branco, com 23 anos de idade, que sofrêra um acidente de aviação, no Ceará, em 1942, lesando a região anterior do pescoço, com grande traumatismo da laringe; transportado para o Hospital de Fortaleza, aí deu entrada apresentando fratura da laringe, intensa reação inflamatória e acentuada dispnéia. Foi imediatamente praticada unia traqueotomia. Três mêses depois foi-nos o paciente enviado para o nosso Hospital.
Pelo exame, verificamos a traqueotomia baixa; pelas laringoscopias diretas e indiretas, notamos o deslocamento da aritenóide direita fraturada, acavalgando a aritenóide do lado posto. Cordas vocais espessadas, congestas e unidas por tecido cicatricial, produzindo obstrução quasi total da glote. Epiglote muito espessada e desviada para a esquerda.
Pelo exame externo verifica-se depressão da metade esquerda da cartilagem tireóide que também foi fraturada, com eliminação de um sequestro. Apresentava consolidação da cartilagem cricóide, também fraturada.
As tomografias confirmam a extensa lesão cicatricial, produzindo estenose quasi total da laringe.
Nessa ocasião usamos a técnica de Moure, descrita por Portmann, com laringofissura, resseção do tecido cicatricial e dilatação progressiva com tubos de borracha, deixados na cavidade, por dias seguidos.
Um ano e meio depois, foi feita a plástica para fechamento da ferida cirúrgica e retirada da cânula. O doente passou bem durante 4 mêses, voltando em seguida, de novo, com dispnéia. Feita nova traqueotomia e laringofissura, verificou-se novamente a estenose da laringe, por tecido cicatricial, que renitentemente, apareceu.
Quando regressamos dos EE. UU., depois de ter assistido o próprio Erich em caso semelhante ao nosso, decidimos usar a sua técnica, cujos resultados foram excelentes. Operação realizada em 21 de Maio de 1945.
Anestesia local. Foi retirada a cânula traqueal, durante a operação; laringofissura; resseção de tôdo o tecido fibroso cicatricial, que fecha a luz da laringe, com o bisturi simples. Resseção sub mucosa das cordas vocais e da aritenóide direita. Erich coloca então na cavidade um enxerto de pele, forrando tôda a face interna da laringe, com o fim de evitar o reaparecimento da granulação; êste enxerto é retirado da côxa ou do ventre e envolto em um tampão de esponja, com as dimensões da laringe, com o fim de não só fixar o enxerto no local, como também manter a dilatação da laringe; sendo o tampão retirado dez dias depois, ficando o enxerto aderido às paredes internas da laringe.
No nosso caso, não usamos o enxerto de pele, ficando somente o tampão de esponja no local, logo acima da cânula traqueal, até a região da glote.
Fig. 1 - Tomografia da laringe
Dez dias depois foi retirado o tampão e feito o molde de substância acrílica, conforme mostra a figura 3; êsse molde é feito antes em cêra ou massa, usada pelos dentistas, que se amolda dentro da cavidade laringeana, juntamente com a cânula traqueal, passando depois para o molde acrílico definitivo, que deve ser perfurado.
O molde de substância acrílica deverá ficar pelo menos seis mêses no lugar; não é irritante para os tecidos, como é a borracha; os curativos devem ser feitos sem se mexer no molde, apenas retirar a cânula cada dois dias para limpeza e o mandril diariamente, tantas vezes quantas forem necessárias.
Sete mêses depois tendo o doente ficado durante trinta dias sem o molde e sem a cânula, foi realizada a plástica, para fechamento da laringe, pela técnica de Jackson.
Quatorze mêses depois o doente estava bem.
O ano passado, quatro anos portanto da operação, continuava o paciente em perfeitas condições.
Ajudou-nos nessa operação, o nosso Assistente M. A. Salaverry.
Fig. 2 - Molde acrilico, perfurado no centro.
Fig. 3 - Molde e canula vistos de perfil
Fig. 4 - Molde e canula vistos de frente, na posição que devem ficar na laringe.
Fig. 5 - Laringe e traqueia dez dias depois de operadas, prontas para receberem o molde e a canula.
Fig. 6 - O molde em posição, ficando a ponta superior, acima da glote.
Fig. 7 - Molde e canula em posição
COMENTÁRIONa estenose cicatricial traumática da laringe, em regra, o primeiro socorro a ser feito por ocasião do traumatismo, é a traqueotomia.
O tratamento posterior consiste em adotar um método que evite formação de tecido granuloso, após a retirada do tecido cicatricial, que é a causa da estenose.
De tôdos os processos descritos até hoje, o melhor é o do enxerto de pele forrando a cavidade laringeana ou o simples emprêgo de um molde feito em material acrílico, que pôde permanecer longos mêses em contacto com os tecidos, sem irritá-los.
ABRIGED INFORMATIONThe author studies the cirurgical treatment of Extensive cicatricial Stenosis of Larynx, recommending Erich's method, which he adopted in one of his Clinical Hospitaler Cases, in which other techniques have failed. The method consists of resection of cicatricial tissue after the laringofissure with or without setting in of insertion of the skin graft in the operated cavity and a mould of an acrilic material moulded to proper case, same is left in that place during six months, being the "canula traqueal" attached to the mould itself, as the canula are taken off and the plastic is made for the closing of the larynx. The cure is complete and permanent.
(*) Erich, John B. - Treatment of extensive cicatricial Stenosis of the Larynx or the Trachea. Archives of Otolaryngology 43:343-350 (May) 1945.