INTRODUÇÃOOs tumores do espaço parafaríngeo são raros e podem pertencer a extensa variedade de tipos histológicos. O espaço parafaríngeo é região de difícil acesso ao exame clínico, sendo conhecido por diferentes nomes (espaço parafarígeo lateral, espaço faringomaxilar, espaço pterigofaríngeo e espaço ptérigo mandibular)1, 2, 3.
O espaço parafaríngeo é virtual, posicionado lateralmente à faringe superior e à região amigdaliana, apresentando a forma de pirâmide invertida, com seu assoalho na base do crânio e seu ápice no corpo maior do osso hióide. A base é formada pela asa maior do osso esfenoidal, com os forames oval e espinhoso. A parede lateral é formada, de anterior para posteriormente, pela lâmina pterigóide medial, ramo ascendente da mandíbula, lóbulo profundo da glândula parótida, parte do ventre posterior do músculo digástrico. A parede medial é formada pelo músculo constritor superior da faringe, músculo tensor do véu palatino e músculo levantador do véu palatino. Considera-se a parede posterior como sendo a fascia pré-vertebral. Essa fascia separa o compartimento parafaríngeo do retrofaríngeo.
Figura 1. Adenoma pleomórfico pré-operatório.
Figura 2. Adenoma pleomórfico pré-operatório.
Figura 3. Adenoma pleomórfico pré-operatório.
Figura 4. Adenoma pleomórfico avaliação pós-operatório.
O processo estilóide e seus músculos, que são direcionados inferior, anterior e medialmente, divide o espaço em dois compartimentos: o espaço pré-estilóide e o espaço retro-estilóide. O espaço pré-estilóide contém ramos do nervo mandibular e o espaço retro-estilóide contém a artéria carótida interna, nervos cranianos IX, X, XI e XII, o tronco simpático e os nódulos linfáticos faríngeos laterais2, 3.
O ligamento estilo-mandibular, que é a condensação da fascia estilo-hióidea, inserido no ângulo da mandíbula, é uma importante consideração anatômica, desde que com a base no crânio e o ramo ascendente da mandíbula, ele forma o "túnel estilo mandibular", através do qual os tumores do lóbulo profundo da parótida podem projetar-se4. O nervo facial é posicionado superficialmente ao espaço parafaríngeo, podendo ser deslocado lateralmente pelos tumores, devendo ser identificado durante as suas remoções.
Desde que a base das paredes posterior e lateral são ósseas, os tumores tendem a crescer medialmente, deslocando a fossa amigdaliana ou o pálato mole, ou inferiormente, produzindo abaulamento externo na região do ângulo da mandíbula. A invasão dos músculos pterigóideos pode produzir trismo5, 6. Envolvimento da divisão mandibular do nervo trigêmio pode resultar em deficiências motoras ou sensitivas e o envolvimento de nervos cranianos ou do tronco simpático pode produzir as devidas paralisias6.
O objetivo deste trabalho é apresentar os casos de tumores do espaço parafaríngeo, por nós tratados e discutir as possibilidades diagnósticas e os meios de tratamento atuais.
RELATO DOS CASOSCaso n° 01 - Paciente de 29 anos deidade, sexo feminino, apresentou-se com história de massa na faringe, crescimento lento e progressivo e disfagia a alimentos sólidos. O exame físico revelou "massa" submucosa, deslocando a parede lateral da faringe e a fossa amigdaliana direita, estendendose além da linha média. Tomografia computadorizada revelou a presença de massa, 8x5 cm, no espaço parafaríngeo direito (Fig. 1). A remoção cirúrgica foi realizada, através de incisão cervical clássica, sem mandibulotomia, cujo diagnóstico histológico foi de adenoma pleomórfico. Seguimento pós-operatório de 4 anos.
Figura 5. Arteriografia carotídea paraganglioma.
Figura 6. Linfoma pré-operatório difuso linfocítico.
Figura 7. Carcinoma mucoepidermóide pré-operatório,
Figura 8. Avaliação pós-operatório.
Caso n° 02- Paciente do sexo feminino, 22 anos de idade, apresentou-se com história de lesão na faringe, cuja biópsia, realizada em outro serviço, revelou o diagnóstico de adenoma pleomórfico. O exame físico mostrou a presença de abaulamento da região amigdaliana e pálato mole, no lado esquerdo. A tomografia computadorizada revelou a existência de uma lesão ovóide, de 5x3 cm, no espaço parafaríngeo esquerdo (Fig. 2), que foi removida cirurgicamente, através de acesso trans-oral, cujo diagnóstico histológico foi adenoma pleomórfico. Seguimento pós-operatório de 3 anos.
Caso n° 03 - Paciente do sexo feminino, de 56 anos de idade, com queixa de "massa" na faringe, lado direito e discreta disfagia a alimentos sólidos. O exame físico revelou presença de lesão submucosa, com moderado desvio da fossa amigdaliana medialmente. Tomografia computadorizada revelou a presença de lesão de contornos regulares, ocupando o espaço parafaríngeo e com provável envolvimento do lóbulo profundo da glândula parótida (Fig. 3). A remoção foi realizada através de acessos combinados, trans-oral e cervical sem mandibulotomia. Seguimento pós-operatório de 2 anos (Fig. 4).
Caso n° 04 - Paciente de 32 anos, sexo feminino, apresentou-se com história de lesão nodular na região cervical direita. Exame físico evidenciou presença de nódulo pulsátil, na região júgulo-digástrica. A arteriografia carotídea foi compatível com tumor de corpo carotídeo (Fig. 5), tendo a paciente sido submetida a tratamento cirúrgico que confirmou, através de exame histológico, o diagnóstico de paraganglioma.
Caso n° 05 - Paciente de 22 anos de idade, sexo masculino, refere massa cervical, de crescimento lento, na região júgulo-digástrica direita. Foi submetido a exploração cirúrgica, sendo o exame histológico compatível com tumor de origem neural (Schwanoma vagal). Não foi submetido à tomografia computadorizada na ocasião.
Caso n° 06 - Paciente de 37 anos de idade, do sexo feminino, apresentou-se com história de massa cervical direita, evolução de 9 meses, de crescimento lento. Tomografia computadorizada revelou presença de lesão expansiva do espaço parafaríngeo (Fig. 5). Foi submetida a tratamento cirúrgico, através de acesso cervical, cujo diagnóstico histológico foi compatível com linfoma difuso linfocítico, pouco diferenciado. Foi submetido à radioterapia complementar, apresentando-se no 6° mês pós-tratamento.
Caso n° 07 -Paciente de 66 anos de. idade, sexo feminino, apresentou-se com história de lesão, com evolução de 03 meses, na cavidade oral, lado esquerdo.
Figura 9. Carcinoma mucoepidermóide pré-operatório.
Figura 10. Carcinoma adenóide-cístico pré-operatório.
O exame físico, revelou presença de abaulamento do pólo superior da fossa amigdaliana e pálato mole, à esquerda. Tomografia computadorizada mostrou presença de massa ovóide, contornos regulares, no espaço parafaríngeo esquerdo (Fig. 7). A remoção foi realizada através de acesso trans-oral, cujo diagnóstico histológico foi de carcinoma mucoepidermóide, pouco diferenciado. A paciente recebeu tratamento complementar de radioterapia (5000 cGy). Seguimento pós-operatório de 3 anos (Fig. 8).
Caso n° 08 - Paciente com 36 anos de idade refere massa cervical direita, crescimento lento, evolução de mais ou menos 1 ano. Exame físico revelou massa endurecida, móvel 2x3 cm, dolorosa à palpação, na área júgulo-digástrica direita. Punção aspirativa foi inconclusiva. Tomografia computadorizada revelou presença de lesão de 2x2, no espaço parafaríngeo direito (Fig. 9). Foi submetida a exérese cirúrgica. O diagnóstico histológico foi compatível com carcinoma muco epidermóide, baixo grau de malignidade. Foi recomendada radioterapia complementar. Apresenta-se com evolução de 5 meses.
Caso n° 09 -Paciente de 58 anos de idade, sexo feminino, apresentou-se com história de lesão da cavidade oral, recorrente, com aumento progressivo. Refere que foi submetida a procedimento cirúrgico, seguido de radioterapia, no mesmo local, há 22 anos. O exame físico mostrou presença de lesão causando abaulamento do pálato mole, lado esquerdo. A tomografia computadorizada revelou presença de massa, de contornos irregulares, ocupando os espaços mastigatórios e parafaríngeo esquerdo (Fig. 10). Foram realizadas três biópsias cujos laudos foram inconclusivos. A paciente foi submetida à remoção cirúrgica da massa através de acesso trans-oral, cujo diagnóstico histológico definitivo foi compatível com carcinoma adenóide-cístico. Foi recomendada radioterapia complementar. Encontra-se no 6° mês pós-tratamento.
DISCUSSÃOOs tumores do espaço parafaríngeo são raros e representam 0,5% de todos os tumores da cabeça e pescoço s. A maioria dos tumores são benignos1, 2.
Os quatro maiores tumores primários que ocupam o espaço parafarígeo são massas do lóbulo profundo da glândula parótida, lesões da glândulas salivares menores, neuromas e tumores glômicos (paraganglíomas), sendo que os tumores das glândulas salivares maiores e menores são responsáveis por 40 a 50% de todas as massas; tumores neurogênicos por 17 a 25%; tumores gl8micos por 10 a 15%. Os restantes 10 a 33% dos casos representam variado grupo de lesões que incluem nódulos linfáticos patológicos, cistos branquiais, lesões lipomatosas e outros raros tumores1, 7.
No diagnóstico diferencial pré-operatório utilizam-se tomografia computadorizada, ressonância magnética, arteriografia e punção aspirativa8.
Ocorre abulamento da parede lateral da faringe, quando as lesões atingem diâmetros superiores a 2,5 em, podendo ser detectadas clinicamente. Não existe achado condizente com exame físico que permita a diferenciação entre urna massa de lóbulo profundo da parótida de uma lesão extra-parotídea7. O melhor método para realizar esta distinção é a visualização de um plano de tecido adiposo entre o lóbulo profundo da parótida e o aspecto póstero-lateral da massa7.
O radiologista pode diferenciar os tumores do lóbulo profundo da glândula parótida das massas extraparotídeas em todas as lesões, de tamanho pequeno a moderado, porque. é somente nas grandes lesões que o plano de tecido gorduroso pode estar presente mas não visível, pelas imagens de tomografia ou ressonância.
A diferenciação entre as massas intra e extra-parotídeas é melhor realizada por meio de, ressonância magnética, devido as suas localizações no espaço pré-estilóideo ou compartimento anterior do espaço parafaríngeo, causando desvio posterior da artéria carótida interna. Quando consideradas as massas ovóides extra-parotídeas, se o tumor for primariamente uma lesão de baixa atenuação pela TC, o mais provável diagnóstico é o de neurofibroma. Se o tumor apresentar significante captação de contraste, provavelmente o diagnóstico será neuroma ou paraganglioma. Os neuromas, posicionados posteriormente, tendem a deslocar a artéria carótida interna anteriormente9. Desde que esta artéria é melhor identificada pela imagem de ressonância magnética, este deve ser o exame de escolha, para diferenciar os quatro principais tumores que ocorrem neste espaço cervical, o que permite ao cirurgião escolher o melhor acesso para a remoção destas lesões9, 10.
Com relação à escolha do acesso cirúrgico para a remoção destas tesões benignas, não vasculares, optamos pela utilização da via trans-oral nos casos de tumores pequenos extra-parotídeos, pois apesar do procedimento cirúrgico ser enucleação virtual do tumor, ocorre baixa incidência de recorrências, comparada ao uso do mesmo método, indicado para remover tumores intra-parotídeos (5 a 20% de recorrência)2.
Utilizamos os acessos combinados em uma oportunidade, quando não foi possível a remoção total do tumor por via trans-oral (caso n° 03).
Para os tumores maiores e com origem intra-parotídea, indicamos o acesso cervical, sem mandibulotomia, o que julgamos desnecessário para tumores benignos.
A radioterapia complementar deve ser indicada para os tumores malignos, cujas margens cirúrgicas de ressecção apresentarem comprometimento ou para os tumores com estadiamento avançado12, 13.
CONCLUSÃO1 - Os tumores do espaço parafaríngeo são raros.
2 - O diagnóstico deve ser realizado por meio de tomografia computadorizada e imagem por ressonância magnética.
3 - A escolha do acesso cirúrgico depende do tamanho e da localização da lesão.
4 - Radioterapia complementar deve ser indicada para pacientes portadores de tumores malignos.
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* Professor Adjunto Responsável pela Disciplina de Otorrinolaringologia e Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital de Base -Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP.
** Médico contratado da Disciplina de Otorrinolaringologia e Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital de Base - Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP.
*** Médico Residente da Disciplina de Otorrinolaringologia e Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital de Base - Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP.
Instituição: Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/ SP - Hospital de Base - São José do Rio Preto/ SP.
Endereço para correspondência: José Victor Maniglia, Rua Ondina, 45, Bairro Redentora, CEP 15015-200, São José do Rio Preto/ SP.
Artigo recebido em 30 de junho de 1995.
Artigo aceito em 18 de julho de 1995.