ISSN 1806-9312  
Domingo, 28 de Abril de 2024
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2092 - Vol. 61 / Edição 4 / Período: Julho - Agosto de 1995
Seção: Relato de Casos Páginas: 329 a 332
TUMORES MALIGNOS DO SEIO FRONTAL: RELATO DE 3 CASOS.
Autor(es):
Siomara Bambirra*,
Sulene Pirana*,
Ossamu Butugan**,
Edigar Rezende de Almeida***,
Aroldo Miniti****,
José Alexandre M. da Silva.

Palavras-chave: Neoplasmas, seios paranasais

Keywords: Neoplams, paranasal sinus

Resumo: Tumores malignos do seio frontal são muito raros. Até 1971, apenas 139 casos haviam sido descritos. O diagnóstico clínico é difícil por terem evolução lenta e insidiosa e por não apresentarem características radiológicas específicas. Muitas vezes são diagnosticadas como muco de piocele tendo o seu tratamento retardado. Apenas o estudo histopatológico confirma o diagnóstico. O prognóstico permanece ruim pelo diagnóstico tardio e pela pequena experiência quanto ao melhor tratamento pela raridade dos casos.

Abstract: Primary malignant tumours of the frontal sinus are extremely rare. Until 1971 only 139 cases were described. Clinically the diagnosis of this tumours is difficult because of the slow and insidious process and the lack of characteristics clinical and radiological features. Generally, they are diagnosed as mucocele or pyocele and remain undetected for a longtime. The diagnosis is confimed only by histological examination. The prognosis remain extremely poor what is attributed to the advanced stage on presentation and the little experience to determine what line of treatment will give the best results.

INTRODUÇÃO

Os tumores malignos que se originam dos seios paranasais são muito raros, constituindo apenas 7% dos tumores que acometem o ser humano1. Os de origem primária no seio frontal são ainda mais raros e a sua ocorrência foi até desacreditada por alguns autores2, 3. O primeiro caso foi relatada em 1907'. Representa apenas 0,3% dos tumores dos seios paranasais4. Em um estudo de 66 anos de carcinoma de seios paranasais, apenas 1 era de seio frontal2. Uma revisão da literatura revelou 134 casos bem documentados até 19706, e até 1971, 139 casos. Os fatores etiológicos não são conhecidos, sendo postulados os genéticos, ambientais (componentes de petróleo, cromo e níquel, pó de madeira)7. Predominam no sexo masculino, na proporção de 5:1 em relação ao sexo feminino3, em caucasianos e na 5ª e 6ª décadas. Seu diagnóstico é tardio na maioria dos casos pela ausência de sintomas característicos ou achados radiológicos específicos.

Entre os sinais e sintomas mais freqüentemente relatados temos: edema localizado, dor, abaulamento progressivo em região fronto-orbitária, alterações oculares, rinorréia pio-sanguinolenta, epistaxe e obstrução nasal3, 6, 8, 9, 10, 11.



Figura 1. M. C. P., edema palpebral superior direito, abaulamento da raiz nasal, epífora e prejuízo da abertura ocular à direita.



Figura 2. M. Q. J., edema palpebral superior esquerdo, edema da região fronto-nasal esquerda.



O exame físico revela alterações como: abaulamento frontal e/ou supra-orbitário, alterações palpebrais, alterações locais da pele, alterações oculares entre outros3, 8.

O exame radiológico simples dos seios da face, na maioria das vezes se limita a demonstrar opacificação do seio frontal associada ou não a comprometimento ósseo local e extensão para as adjascencias8, 10, 12.

A incidência precisa dos diferentes tipos histológicos é desconhecida, mas existe predomínio dos carcinomas epidermóides5, 6, 11, 13, 14.

Pela raridade, achamos oportuno descrever nossa experiência com os 3 casos atendidos em nosso Serviço, relatando as dificuldades diagnósticas e a conduta adotada.

CASUÍSTICA

Os três pacientes foram atendidos na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo no período de 1970 à 1994.

Caso 1: M. C. P., feminina, 64 anos, branca. Há OS meses edema palpebral superior direito, algia frontal, epífora, xerostomia, obstrução nasal e epistaxe. Há 03 meses progressão do abaulamento palpebral e da algia frontal com prejuízo da visão ipsilateral pelo edema: local (figura 1). O exame loco-regional revelou abaulamento da região frontal com invasão das regiões orbitária e glabelar à direita, endurecido c doloroso à palpação, sem sinais logísticos. Sem alteração à rinoscopia anterior e posterior-. Ausência de linfadenopatia cervical. Fundoscopia normal. Foi realizada punção do seio frontal sem saída de secreção. A planigrafia revelou erosão da órbita com presença de sequestro ósseo e à tomografia computadorizada evidência de comprometimento da parede posterior do seio frontal. Foi internada com hipótese diagnóstico de osteoimielite frontal recebendo antibioticoterapia de amplo espectro, sendo submetida à cirurgia por acesso bicoronal, visualizando-se processo tumoral em correspondência com o seio frontal direito com erosão de aproximadamente 90% da parede posterior, com exposição da difira-máter, sem comprometê-la. Havia acometimento do teto tia órbita direita e ampla comunicação com labirinto etmoidal direito. Foi realizada exérese parcial da massa tumoral, mucosa do seio e periósteo. O exame anátomo-patológico revelou carcinoma adenocístico invasivo. A paciente foi submetida a radioterapia pós-operatória, tendo abandonado o seguimento.

Caso 2: M. Q. .1., feminina, 61 anos, branca. Há 0,5 meses edema palpebral superior esquento. Há 02 meses flor e aumento do edema para região fronto-nasal esquerda e dificuldade para visão (figura 2). Nega queixa de obstrução nasal ou epistaxe. O exame físico revelou abaulamento da região fronto-nasal e edema palpebral superior esquerdo, indolor à apalpação, de consistência sólida e sem sinais flogísticos.



Figura 3. Tomografia computadorizada mostrando massa em região frontal corra extensão para região intracraniana.



À rinoscopia anterior e posterior não foi observada nenhuma alteração. Ausência de linfadenopatia cervical. Radiografia simples revelou opacificação de todo seio frontal esquerdo com apagamento do contorno orbitário súpero-interno esquerdo, dados confirmados pela planigrafia. Foi submetida à cirurgia por via coronal, sendo encontrada massa tumoral ocupando seio frontal direito, com exposição da dura-máter. Foi realizada exérese do tumor na sua quase totalidade. O exame anátomo-patológico revelou carcinoma indiferenciado. Foi feita complementação terapêutica com radioterapia. Paciente não retornou para seguimento.

Caso 3: J. B., masculino, 58 anos, branco, referia abaulamento progressivo, doloroso em região frontal mediana com piora há 18 dias. Negava febre, obstrução nasal ou alterações oculares. O exame loco-regional mostrou abaulamento frontal fibroelástico e indolor à palpação. A rinoscopia, notou-se presença de pólipo cm fossa nasal esquerda. O exame radiológico dos seios da face revelou velamento bilateral de ambos os seios frontais e extensa lesão lítica em região frontal com extensão para região etmoidal. À tomografia computadorizada, observou-se massa em região frontal coro expansão para região intracraniana (figura 3). O paciente foi submetido à cirurgia por acesso bicoronal, revelando massa em região frontal mediana com erosão de paredes internas e externas dos seios frontais com aderência à dura-máter e tecido celular subcutâneo. A massa foi ressecada em sua totalidade. O exame anátomo-patológico revelou carcinoma epidermóide moderadamente diferenciado e invasivo. O paciente foi encaminhado para radioterapia, abandonando o tratamento.

DISCUSSÃO

A neoplasia maligna dos seios frontais é rara e poucos citada nos livros e revistas apesar de causar dor, abaulamento frontal e edema palpebral com grandes dificuldades diagnósticos. Seu diagnóstico é difícil e tardio, urna vez que os seios frontais não exercem nenhuma função vital; o processo é lento e insidioso pela falta de. características clínicas e radiológicas bem definidas.

O período médio entre o início dos sintomas e o diagnóstico é de aproximadamente 3 meses, quando a doença já se encontra, na maioria dos casos, erra estado avançado15. Erra nossos casos, este também foi o tempo médio de diagnóstico.

Em nosso serviço, num período de 24 anos tivemos apenas estes 3 casos, o que confirma a raridade desta afecção.

Os exames clínico c radiológico não são específicos o que nos levou a considerar outros diagnósticos mucocele, piocele, osteoma, tumores císticos, osteomielite, mestástases, invasão de tumores das adjascências), ficando o tumor maligno primário do seio frontal corno diagnóstico de exclusão. Na nossa casuística, 2 casos2, 3 tiveram diagnóstico inicial de mucocele frontal e o outro1 de osteomielite frontal.

O estudo anátomo-patológico é o único meio para o diagnóstico definitivo e preciso16. A abordagem terapêutica permanece um desafio e a pequena casuística dos autores não permite estudo comparativo entre as modalidades de tratamento para verificar-se sua eficácia, não sendo possível estabelecer-se linha terapêutica definitiva. A opinião geral porém, fala a favor da associação cirurgia-radioterapia. A radioterapia também pode ser exclusiva como tratamento paliativo nos casos de irressecabilidade18. A conduta adotada nos 3 casos apresentados foi esta; infelizmente, não pudemos obter o seguimento, uma vez que os pacientes o abandonaram.

O desenvolvimento da cirurgia crânio-facial vem se apresentando como alternativa que permite ressecção ampla em tumores avançados que junto com a radioterapia pós-operatória seria usada como tentativa de melhorar o prognóstico, que na literatura em geral se apresenta sombrio. Brownson et al6 descreveram em sua revisão da literatura apenas um paciente com sobrevivência acima de 5 anos.

A disseminação metastática é infrequente, sendo a extensão intracraniana e as alterações visuais as complicações mais importantes6, 17.

Os fatos expostos demonstram a importância de se documentar todos os casos de neoplasia do seio frotal para que possamos compreender melhor a história natural e a evolução desta patologia. A descrição destes 3 casos tem também o intuito de chamar a atenção dos especialistas para o diagnóstico dessa doença que, apesar de rara, traz muita dor e sofrimento ao paciente e seus familiares; alertando para a sua ocorrência, poderemos fazer diagnósticos mais precoces tentando melhorar o prognóstico.

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* Pós-Graduandas da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
** Professor Associado da Clínica de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
*** Professor Doutor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
**** Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Trabalho realizado na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica e LIM 32 do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Serviço do Professor Aroldo Miniti.
Endereço para correspondência: Av. Prof. Enéas de Carvalho Aguiar, 255, 6° andar, sala 6001 - São Paulo - SP - Brasil - CEP 0.5403-000.

Artigo recebido em 22 de março de 1995.
Artigo aceito em 10 de maio de 1995.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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