INTRODUÇÃOA faringoamigdalite estreptocócica é uma das infecções bacterianas mais comuns da infância, podendo afectar também outros grupos etários. A grande maioria é causada par estreptococcos beta-hemolíticos do grupo A (EBHGA). Embora o tratamento, quando rapidamente iniciado, possa diminuir a morbidade associada à patologia, a principal indicação terapêutica objetiva prevenir as complicações supurativas e a febre reumática associadas a esta síndrome.
A droga de escolha para o tratamento é a penicilina. Entretanto, existe a necessidade de se buscar agentes alternativos pelo fato de alguns pacientes serem alérgicos à penicilina.
Outros pacientes, mesmo após o término do tratamento com penicilina, continuam apresentando cultura positiva para estreptococco na faringe1.
A azitromicina é um novo antibiótico do grupo dosazalídeos com um espectro de ação similar ao da eritromicina, porém com maior potência "in vitro" contra Haemophilus influenzae, Neisseria gonorrheae, Mymplasma hominis e Citrobacter diversus. Em relação ao Strrptococcus pneumoniae, Legionella, Moraxela, Stmptococeus do grupo A e D, Staphylococcus aureus, Ureplasma e Campylobacter sua atividade "in vitro" é semelhante à da eritromicina. Já em modelos animais, a azitromicina tem mostrado resultados melhores do que a eritromicina em infecções causadas por H. influenzae, S. aureus e L. pneumophila2, 3, 4, 5.
TABELA 1
Os objetivos deste estudo são determinar a eficácia, segurança e tolerabilidade da azitromicina no tratamento de pacientes pediátricos portadores de faringoamigdalite estreptocócica.
CASUÍSTICA E METODOLOGIANeste estudo aberto, não comparativo, avaliou-se 33 pacientes pediátricos portadores de faringoamigdalite estreptocócica. Os detalhes, incluindo reações adversas potenciais da droga foram plenamente explicados aos pais ou responsável legal do paciente, sendo obtido um consentimento pós-informação de cada um antes da inclusão do paciente no estudo.
Antes da admissão no protocolo, foi obtida história clínica e realizado exame físico do paciente. Nos casos de inflamação da orofaringe, foi realizado um "swab" em duplicata na superfície de ambas as amígdalas (quando presentes), loja amigdalina ou parede posterior da faringe. Um dos "swabs" foi usado para teste de diagnóstico rápido de detecção de antígeno de EBHGA, enquanto o outro foi enviado para cultura confirmatória de EBHGA.
Os pacientes foram avaliados em 3 ocasiões: no pré-tratamento (visita 1), nos dias 3-5 (visita 2) e nos dias 12-14 (visita 3). Em cada uma dessas ocasiões foram analisados e classificados os sinais e sintomas da infecção, tais como febre, letargia, irritabilidade, inflamação na orofaringe, edema e rubor nas amígdalas. Os pacientes receberam a droga em estudo antes da confirmação microbiológica da infecção, porém os pacientes com cultura negativa para EBHGA não foram incluídos na análise da eficácia, sendo considerados apenas para avaliação da tolerabilidade e segurança. Os dados de todos os pacientes que receberam a medicação foram analisados quanto à segurança.
TABELA 2
GRÁFICO 1
Os critérios de inclusão de pacientes neste estudo foram: a) pacientes ambulatoriais de ambos os sexos, com idade entre 1 e 12 anos. b) presença de inflamação faringoamigdaliana com diagnóstico rápido positivo para EBHGA e que na opinião do médico, poderiam ser tratados com um antibiótico oral. c) Assinatura dos pais ou responsável no consentimento pós-informação de acordo com os dispositivos da Declaração de Helsinque.
Os critérios de exclusão dos mesmos foram: a) tratamento com penicilina de longa ação nas últimas 6 semanas ou com qualquer agente antibacteriano nas 72 horas antes da admissão no estudo. b) história de febre reumática ou "rash" sugestivo de escarlatina. c) tratamento prévio com a droga em estudo descontinuado prematuramente. d) doenças terminais ou outras condições que impossibilitassem a conclusão e avaliação do tratamento com a droga em estudo. e) hipersensibilidade conhecida aos macrolídeos ou à azitromicina. f) tratamento com qualquer outra droga investigacional até um mês antes da admissão no estudo. g) infecções que necessitem tratamento com ouro agente antibacteriano em adição à droga em estudo. h) tratamento concomitante com ergotamina, carbamazepina ou glicosídeos digitálicos. i) evidência ou história de doenças diarréicas crônicas ou qualquer outra condição gastrointestinal que possa afetar a absorção da droga em estudo. j) resultados de cultura, obtidos antes do início do tratamento, que mostrem a presença de um patógeno resistente à droga em estudo.
A dose de aitromicina administrada foi de 10 mg/kg/dia, em dose única diária, até um máximo de 500 mg por dia, por 3 dias consecutivos. O peso do paciente no exame físico pré-tratamento foi usado para determinar a dose. Todas as doses foram administradas 1 hora antes ou 2 horas após as refeições.
GRÁFICO 2
GRÁFICO 3
RESULTADOS E DISCUSSÃOA média de idade na amostra estudada foi de 7 anos e o peso médio 30,2 kg. Houve ligeiro predomínio do sexo feminino (57,6%) e da raça branca (60,6%), como se pode ver na tabela 1.
Em relação aos sinais e sintomas da faringoamigdalite estreptocócica, 29 pacientes estavam febris no início do estudo, porém na vista 2, 28 deles já estavam afebris. Esses resultados foram altamente significativos na comparação entre o pré-tratamento e as visitas seguintes (tabela 2 e gráfico 1).
Quanto aos demais sinais e sintomas avaliados (letargia, irritabilidade, inflamação na orofaringe, edema e rubor nas amígdalas), os testes estatísticos mostraram diferenças significativas já a partir da visita 2 (tabelas 3 à 6 e gráficos 2 à 5).
Apenas 1 paciente apresentou abscesso periamigdalino no pré-tratamento, tendo desaparecIdo já na visita 2. Não foi realizado teste estatístico para este parâmetro (tabela 7).
A avaliação da eficácia do tratamento foi feita nos 30 pacientes que apresentaram faringoam igdalite com cultura positiva para Streptococcuspyogenes. Essa avaliação mostrou na visita 2, cura em 63% dos casos, melhora em 33,3% e falha em 3,3% (1 paciente), como apresentado na tabela 8 e no gráfico 6.
TABELA 3
TABELA 4
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Na visita 3, o índice de cura atingiu 96,6% (28 pacientes) e o de melhora 3,4% (tabela 8 e gráfico 7).
Na análise de eficácia global da droga em estudo, os pacientes curados representaram 93,4% enquanto o que obteve melhora representou 3,3% e o que teve falha terapêutica, 3,3% num total de 30 pacientes avaliados.
A cultura realizada nos 33 pacientes incluídos no estudo mostrou crescimento de Streptococcus pyogenes em 30 casos e de Streptococcus bovis em 3. A avaliação bacteriológica só foi realizada nos 30 casos em que houve crescimento de S. pyogenes.
Destes, houve erradicação em 29 casos (96,7%) e persistência em 1 (3,37o), tendo este último sido tratado com outro antibiótico a partir do 3° dia (tabela 9 e gráfico 8). Os 3 pacientes com S. bovis foram igualmente tratados com azitromicina e a avaliação bacteriológica final mostrou erradicação dos mesmos.
Para avaliação de tolerabilidade, todos os 33 pacientes foram analisados. Os efeitos colaterais ocorreram em apenas 2 pacientes (6,1%). Um deles apresentou diarréia em grau moderado e vômitos em grau leve, sendo que o outro teve naúseas em grau leve, ambos sem necessidade de interrupção do tratamento (tabela 10), sendo esses índices consideravelmente menores que os descritos com a eritromicina.
As concentrações plasmáticas de pico da azitromicina são mais baixas que as da eritromicina após uma dose oral equivalente, possivelmente devido à acentuada afinidade tecidual.
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Altas concentrações da droga podem ser observadas em vários tecidos como próstata, amígdalas, pulmão, rins e aparelho ginecológico num período de 24à 96 horas após a administração oral da mesma. Sua persistência é consideravelmente maior que a da eritromicina, sendo excretada na urina de voluntários por 14 dias após uma dose única de 500 mg., e por 5 semanas após o final do tratamento de 6 dias4.
Assim, a azitromicina, com sua longa meia-vida e excelente penetração tecidual, oferece espectro de ação amplo e maior potência que a eritromicina em infecções do trato respiratório superior, com terapia de dose única diária e tratamento de curta duração, o que pode constituir interessante alternativa no tratamento da faringoamigdalite estreptocócica.
CONCLUSÃOOs autores concluem que a azitromicina é antibiótico eficaz, de uso seguro e de boa tolerabilidade pelos pacientes, apresentando grande vantagem em relação ao esquema posológico de três dias de tratamento. Deste modo, pode ser usado como boa opção terapêutica à penicilina em pacientes portadores de faringoamigdalite estreptocócica.
TABELA 8
TABELA 9
TABELA 10
GRÁFICO 6
GRÁFICO 7
GRÁFICO 8
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA1. Manual of Clinical Microbiology, 4th ed. 1985, edited by E. Lennete et al. American Socity for Microbiology, Washington, D. C.
2. "Performance Standards for Antimicrobial Disc Susceptibility Test", December 1985 (NCCLS), Order Code M2-A3.
3. BARRY, A. L. and R. JONES. - Interpretative Criteria for the Agar Diffusion Susceptibility Test with Azithromycin. Journal of Antimicrobial Chemoterapy 22 (5): 637-641, 1988.
4. BARRY, A. L. and R. JONES - Quality Control Parameters for 15 mcg. Azithromycin (CP62, 993) disks. Enviado para publicação.
5. BARRY, A. - In vitro activity of CP 62, 993 compared to three other macrolides and clindamycin, including evaluation of disk suscepitibility tests. Enviado para publicação.
* Professor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
** Professor Associado da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
*** Médica Assistente e Doutoranda da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
**** Médico Residente do Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Av. Dr. Enéas de Carvalho, 225 - 6° andar - sala 6002, São Paulo - SP, CEP 05403-000.
Artigo recebido em 20 de novembro de 1994.
Artigo aceito em 10 de janeiro de 1995.