ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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1947 - Vol. 63 / Edição 5 / Período: Setembro - Outubro de 1997
Seção: Artigos Originais Páginas: 453 a 456
ATROFIA DA MEMBRANA TIMPÂNICA EM PACIENTES IMPLANTADOS COM PRÓTESE OSSICULAR SUBSTITUÍVEL DE HIDROXIAPATITA. UM ESTUDO PRELIMINAR.
Autor(es):
J. R. Garcia Berroeal M D., Ph.D.,
M Pinilla M .D.,
R Ramírez-Camacho M.D., Ph.D.

Palavras-chave: Próteses de substituição ossicular, hidroxiapatita, orelha média

Keywords: Ossicular replacement prosthesis, hydroxilapatite, middle ear

Resumo: O uso de biomateriais para reconstrução da cadeia ossicular implica diferentes problemas á sua utilização em outras regiões do organismo ao estar submetidas a estímulos mecânicos e químicos continuadamente variáveis. As características da implantação e recomposição da prótese são responsáveis pelos falhos funcionais devidos à expulsão ou deterioro do implante. O último material proposto para sua elaboração foi a hidroxiapatita, com base na sua semelhança química com a mineralização óssea. No presente trabalho analisamos a compatibilidade das próteses de substituição ossicular fabricadas com hidroxiapatita em procedimentos reconstrutivos da orelha média.

Abstract: The use of biomaterials for reconstruction of the ossicular chain in the middle ear involves a different approach than it is to other regions of the organism as they are subjected to chemical and mechanical changes.- The type of implantation and the composition of the prosthesis are responsible for functional failures that result in deterioration or extrusion of the implant. Hydroxilapatite has been the last material developed in base of its chemical similarity with bone formation. In the present study we analyze the acceptance of the ossicular replacement prostheses made of hydroxilapatite in middle ear surgery.

INTRODUÇÃO

Avanços no desenvolvimento dos biomateriais constituem a base da tecnologia dos implantes, por permitirem o restabelecimento da função da estrutura alterada e a adaptação ao meio ambiente do corpo humano. Infelizmente, também representam com certa freqüência a causa do falho do implante. Contrariamente ao que sucede com outras engenharias, a Biomédica tem um escasso número de materiais para construir implantes o que implica importantes limitações no desenho. Em 1976 a FDA começou a regular o desenvolvimento dos implantes médicos, ainda que até 1987 não se normalizassem os procedimentos de fabricação e os testes- necessários para a construção dos novos materiais1.

Avanço e aperfeiçoamento dos implantes médicos requerem a estreita colaboração entre cirurgiões e engenheiros para propor soluções frente aos problemas cirúrgicos. Não seria desejado somente que os materiais fossem estáveis, biocompatíveis e elásticos, mas também que provocassem uma débil resposta inflamatória com formação de uma cápsula firme de tecido fibroso. Algumas especificações para o material implantável ideal enumeram-se na Tabela 1.

Os biomateriais empregados em Otorrinolaringologia podem dividir-se em quatro categorias, segundo a natureza de seu material: metais, cerâmicas, polímeros e materiais compostos. Na maioria, destes materiais foram comercializados antes de que em 1976 fossem regularizados pela FDA, e muitos deles foram empregados clinicamente antes de serem submetidos a um rigoroso teste de biocompatibilidade.

Nos últimos 40 anos diferentes procedimentos cirúrgicos foram desenvolvidos no campo da Otorrinolaringologia para a reconstrução da cadeia ossicular prejudicada por diferentes tipos de otite média crônica. Na década de 60, otologistas experimentaram com materiais inertes reconstruir a cadeia ossicular. O emprego de próteses de polietileno gerou grandes expectativas a curto prazo, já que o paciente recuperava a audição num alto número de casos; contudo, infelizmente, quando o polietileno contactava com a membrana timpânica, existia uma elevada expulsão através da membrana timpânica, com quê o paciente perdia a recuperação auditiva inicial. Diferentes materiais inertes, tais como Teflon, Nylon e arame de aço, foram empregados com resultados similares. A utilização de enxertos ossiculares autólogos e homólogos provocou um grande entusiasmo ante os bons resultados funcionais conseguidos, em ausência de expulsões e do escasso número de deterioros dos mesmos'. Uma experiência similar ocorria com as cartilagens3. Não obstante, na década dos anos 80, com o aparecimento de enfermidades transmissíveis como AIDS, hepatite B e encefalopatias por vírus lentos4, 5, cessou o emprego de materiais biológicos, e favoreceu o desenvolvimento de um novo biomaterial, a hidroxiapatia.

TABELA 1 - Especificações do material ideal peça implante.

- Não modificável fisicamente,por líquidos tissulares.
- Clinicamente inerte.
- Não desenvolve uma corpo estranho.
- Não cancerigênico.
- Não alérgico.
- Estruturalmente estável.
- Capaz de fabricar-se na forma desejada.
- Esterilizante.
- Capaz de formar uma união viva ao tecido.
- Capaz de atuar como transportador e liberador de medicamentos.
- Capaz de controlar a liberação de proteínas, como a proteína morfogênica do ossos

O objetivo da presente investigação e a análise da aceitação das próteses de substituição ossicular fabricadas com hidroxiapatita em procedimentos reconstrutivos da orelha média.

PACIENTES E MÉTODO

Um estudo retrospectivo foi empregado sobre pacientes (nove mulheres e sete homens) operados por diferentes procedimentos reconstrutivos da orelha média utilizando-se próteses de hidroxiapatita. Onze enfermos foram diagnosticados de Otite Média Crônica (OMCC) e cinco de Seqüela Otorréica (lesão tímpano-ossicular com mucosa normal e trompa funcionaste, sem atividade infecciosa durante anos). Em três casos foram empregados um PORP (Partial Ossicular Replacement Prostheses) e em treze um TORP (Total Ossicular Replacement Prostheses), intercalando-se em seis pacientes um fragmento de cartilagem autóloga entre a meseta da prótese e membrana ou enxerto timpânico. O seguimento médio mínimo foi de 11 meses. Realizou-se um seguimento otomicroscópico mensal na consulta a parte das explorações convencionais (acumetria, audiometria tonal liminar).

RESULTADOS

Encontramos um índice de expulsão de 18,7% (um paciente com seqüela otorréica e dois pacientes com otite média crônica colesteatomatosa) após um seguimento médio de 11 meses (período: 4 e 21 meses) depois da implantação (Figura 1).



Figura 1. Número de expulsões e atrofias do enxerto ou membrana timpânica, segundo patologia presente.



Atrofia da membrana timpânica ou enxerto foi observada em 5 dos 16 pacientes estudados (31,2%) após um seguimento médio de 15,5 meses (período 3 a 30 meses) (Figura 1). Nestes pacientes a meseta da prótese era completamente visível à otoscópia (Figura 2); contudo, a prótese não foi expulsa através da perfuração. Nem as expulsões, nem as atrofias do enxerto viram-se alteradas pela interposição do fragmento cartilaginoso entre a prótese e o enxerto timpânico.

A audiometria tonal liminar mostrava uma perda pré-operatória média, nas freqüências 250, 500, 1.000 e 2.000 Hz, de 55.6 dB (período 23.3 a 83.3 dB). A audiometria pós-operatória para as mesmas freqüências mostrava uma perda média de 48.6 dB (período 15 a 91.6 dB).

DISCUSSÃO

Hidroxiapatita como material de implante no ouvido médio teve um rápido incremento em seu uso a partir de 1970. A composição química da hidroxiapatita (Ca10 (PO4)6 (OH)2 é similar à substância principal do tecido ósseo vivo. Uma porcentagem de 60 a 70 do osso está constituída por hidroxiapatita. A diferença dos implantes de fosfato tricálcico (Ca3) (PO4)2) e bio-silicatos como ceravital: a hidroxiapatita apresenta menos tendência a degradar-se. Estudos experimentais em animais indicavam que a hidroxiapatita não induz a encapsulação fibrosa, o que não está de acordo com nossas observações6, mas evidencia uma forte união entre o implante e o tecido ósseo. Grote7 publica que todos os implantes realizados orelha média de ratos induziu a uma infecção, integraram-se sem sinais de expulsão e foram cobertos por mucosa normal.



Figura 2. Imagem otoseópica de paciente afetado por otite média crônica colesteatomatosa, após dois anos de implantação de um TORP de hidroxiapatita. Observa-se uma intensa atrofia da membrana timpânica produzida pela prótese (visível pela transparência timpânica).



Estas descobertas são comparáveis aos descritos em ouvidos humanos pelo mesmo autor8, 9, nos casos em que se reexplorou o ouvido médio para melhorar a audição, as próteses de hidroxiapatita estavam envoltas por uma capa de mucosa idêntica à que se forma ao redor das próteses ósseas. Não se pôde demonstrar qualquer deteriorização das próteses. Também não se observou presença de aderências ou granulações.

Ainda que a hidroxiapatita tenha mostrado uma excelente bio-compatibilidade em diferentes trabalhos experimentais e clínicos, o alto índice de atrofias de enxerto ou membrana timpânica observado em nossa investigação (31,2%), apesar de intercalar-se um fragmento de cartilagem autóloga entre a prótese e enxerto, independentemente da patologia tratada, nos proporciona sérias interrogações a respeito do desenho da prótese empregada.

Em uma tentativa de fazer cessar a expulsão das próteses, modificou-se o desenho inicial destas, introduzindo-se uma pequena depressão para alojar o cabo do martelo e limitar a mobilidade da prótese10.

De acordo com Wehrs11, as próteses devem ser empregadas em ouvidos livres de atividade infecciosa antes da realização da reconstrução. Se bem que teoricamente, a prótese não seja afetada pelo processo infeccioso, o enxerto pode não cicatrizar e a prótese ser expulsa. Também a recorrência do colesteatoma pode deslocar o implante e anulara recuperação auditiva. Em nosso estudo, dois pacientes afetados de seqüela otorréica e três com otite crônica ativa apresentaram atrofia do enxerto ou da membrana timpânica. Ainda que esta incidência represente 12,5% e 18,7%, respectivamente, o escasso número de pacientes incluídos necessita de uma futura avaliação.

Fatores como pressão mecânica constante, produzida pelo som, contato da meseta da prótese com superfície inferior da membrana timpânica, assim como a isquemia que pode produzir-se sobre a precária vascularização do tecido cicatricial, podem ser causas das atrofias e perfurações secundárias descritas. O desenho das próteses com sistemas de amortecedores mais parecidos a união da cadeia ossicular, poderia diminuir estas complicações.

Por outro lado, tampouco cremos que seja idônea a fabricação da haste com Plastipore, como existem em algumas próteses atuais, e se é mais cômodo para o cirurgião sua manipulação na mesa de operação, colocando um material com alto índice de expulsão em contato com a platina. Estas circunstâncias exigem a continuação de investigações de novos materiais, assim como combinações entre estes e desenhos mais sofisticados que diminuam o número de atrofias da membrana timpânica, responsáveis pelas perdas recorrentes de audição e da necessidade de novas intervenções cirúrgicas.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Dra. Carmen Amorim-Gaudêncio, pela sua leitura crítica e tradução para o Português deste artigo; e ao Dr. Ulisses Pinto Brandão, pela sua colaboração.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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6. PINILLA, M.; GARCÍA BERROCALJR.; RAMÍREZ-CAMACHO, R.; BUJÁN, J.; JORGE HERRERO, E. - Biomaterial in the reconstruction of the human middle ear. J. Med. Science. Mat. in Med., 6.- 745-748, 1995.
7. GROTTE, J. J.; VAN BLITTERSWYK, C. A.; KUIJPERS, W. - Hydroxilapatite ceramic as middle ear implant material: animal experimental results. Ann. Otol. Rhinol. Laryngol., 123: 1-5, 1986.
8. GROTTE, J. J. - Development of a total artificial middle ear prostheses. Rev. Laryngo1Otol. Rhinol.(Bordeau)102: 56
9. GROTTE, J. J. - Tympanoplasty with calcium phosphate. Areh. Otolaryngol. Head Neck Surg., 110: 197-199, 1984. 10. WEHRS, R. E. - Incus replacemeent prosthesis of hydroxilapatite in middle ear reconstruction. Am f Otol., 10: 181-182, 1989.
11. WEHRS, R. E. - Hydroxilapatite implants for otologic surgery. Otolaryngol. Clin. North Am., 28: 273-286,1995.




Serviço de Otorrinolaringologia da Clínica Puerta de Hierro. Universidade Autônoma de Madri.
Endereço para correspondência: Dr. J. R. García Berroeal - Servicio de ORL da Clinica Puerta de Hierro - C/ San Martín de Porres, 4 - 28035 - Madrid - España. Tlf. 1-3162240 ext.5409. Fax. 1-3730535

Artigo recebido em 24 de junho de 1997. Artigo aceito em 27 de agosto de 1997.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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