ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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179 - Vol. 26 / Edição 6 / Período: Novembro - Dezembro de 1958
Seção: Trabalhos Originais Páginas: 61 a 65
NISTAGMO E VERTIGEM DE POSTURA (*)
Autor(es):
Dr. ANTONIO CORRÊA

(*) Palestra no Seminário da Clínica O.R.L. em 4-10-1956.

CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO

Vertigem de postura é o desequilíbrio sentido por um paciente quando a sua cabeça toma certas posições no espaço fora daquela considerada normal que é a posição erecta. Quando ao lavar o rosto, ao se barbear, ao rodar ou fletir a cabeça, ao se deitar ou se levantar, a pessoa sente "tontura", sem perder a consciência ou a visão, provavelmente é portadora de uma vertigem de postura ou de posição. Examinado na posição vertiginosa, chamada posição crítica, provavelmente o doente apresentará um nistagmo vestibular, isto é, de caráter rítmico e de tipo variado, seja horizontal, vertical, rotatório ou misto.

Existem casos de dissociação nistagmo-vertigem, em que o doente com vertigem de posição não tem nistagmo, ou tem nistagmo de posição e não tem vertigem.

O nistagmo de postura, foi pela primeira vez, bem estudado, por Barany (1921) ao descrevê-lo em pacientes que colocados na posição de decubito dorsal com rotação da cabeça sentiam vertigem. Tais pacientes tinham audição e função vestibular dos canais semicirculares normais, assim como o exame neurológico não revelava anormalidades. Mantida a posição crítica da cabeça, o nistagmo tinha alguns segundos de latência, aparecia durante um período inferior a trinta segundos, portanto de duração curta e, batia sempre numa direção fixa.

Suspeitou, Barany, que se tratava de pacientes com afecção do sistema otolítico, sistema encarregado do equilíbrio estático, que tem os seus órgãos receptores nas máculas útriculares (ouvido interno) e as vias nervosas centrais fazendo parte do sistema vestibular.

Estes sintomas foram descritos também por muitos otologistas que concordaram com a hipótese de uma lesão do ouvido interno, até que Dix, Hallpike e Cawthorne confirmaram a hipótese, descrevendo a histopatologia de um caso de nistagmo de posição, com lesões na mácula utricular. Tratava-se de um doente com êste único sintoma vestibular, sem distúrbios da função auditiva e do sistema neurológico. A êstes casos chama-se de nistagmo de posição paroxístico benigno, pela sua evolução com remissões é cura expontânea.

Barany descreveu também um outro tipo de nistagmo de postura com caracteres diferentes do paroxístico benigno. Trata-se de um nistagmo que muda de direção conforme a posição da cabeça, e tem uma duração prolongada ou permanente, enquanto fôr mantida aquela posição. Diz-se então que é um nistagmo tônico ou infatigável, muito bem estudado por Nylen - (1931) que, classificou-o como do tipo 1 ou de direção variável, diferenciando-o daquele de direção fixa e duração curta, que ele denominou de tipo 11, dado o valor diagnóstico de cada tipo de nistagmo.

O nistagmo tipo 1, de direção variável, tem sido encontrado nas lesões do sistema nervoso central, com preferência nas afecções da fossa craniana posterior. Nestes casos si o sistema utricular (otolítico) está afetado nas suas conexões centrais, é uma hipótese bem aceita, e confirmada na clínica. CS importante é lembrar que Nylen descreve cãsos .de encefalite e tumores endocranianos, em que o nistagmo de postura foi o primeiro sintoma alertador da doença. A regra será a presença de outros sintomas ,e sinais para o lado do aparelho coclear, do aparelho canalicular (canais semicirculares) do aparelho ocular ou do sistema neurológico.

Na clínica encontra-se um 3.° tipo de nistagmo de postura, que é o irregular, transitório ou tipo III de Nylen, cuja direção é ora fixa, ora variável, mesmo nas posições idênticas da cabeça. A sua presença tem sido assinalada com maior freqüência nas lesões endocranianas.

O nistagmo de postura significa sempre uma lesão vestibular, orgânica ou funcional, nas suas porções periféricas ou centrais. Deduz-se daí a importância do conhecimento dêste sintoma não só para o otologista como para o neurologista, na orientação diagnostica das afecções supra e infratentoriais. Como o sistema vestibular é sujeito às doenças infecciosas, tóxicas, alérgicas e vasculares, ao clínico geral também interessa conhecer, examinar e interpretar um nistagmo e uma vertigem de postura:

ETIOPATOGENIA

A etiopatogenia provável destes sintomas é a seguinte:

l.º) Doenças do sistema nervoso central, principalmente da fossa posterior: encefalites, tumores, abcessos, arterioesclerose, hemorragias, tromboses, distúrbios vaso-motores e encefalopatias postraumáticas.

2.°) Doenças do labirinto (ouvido interno) e do primeiro neurônio vestibular: labirintite serosa, doença idiopática de Menière, hemorragias, atrofias e degenerações do órgão neuro-sensorial ou dos gânglios de Scarpa, inflamações e tumores retrolabirínticos.

3.º) Afecções que podem lesar o sistema vestibular: intoxicações labirínticas, (quinino, salicilato, CO, álcool), alergia, infecções agudas ou crônicas, infecção focal, distonia neuro-vegetativa e trauma craniano.

TÉCNICA DO EXAME

Em todo paciente vertiginoso ou com suspeita de lesões do labirinto ou do sistema nervoso central, pesquisa-se o nistagmo e a vertigem de postura. Não há necessidade de aparelhagem especializada, bastando uma mesa comum de exame.

Em primeiro lugar, coloca-se o paciente sentado, com a cabeça erecta e pesquisa-se o nistagmo expontâneo nos olhares para as diferentes direções. Desde que o nistagmo de postura pode estar presente em qualquer posição da cabeça excepto a erecta, deve-se ter a certeza de que não estamos diante de um nistagmo expontâneo intensificado e mais evidente em outras posições, porém, diante de um nistagmo de postura.

Passa-se em seguida a examinar os olhos, colocando o paciente nas posições de decubito dorsal, decubito lateral direito e lateral esquerdo, e por último na posição supina com a cabeça pendida.

Os movimentos serão executados com velocidade uniforme, evitando a excitação cinética dos canais semicirculares, e apoiando a cabeça do doente, para efetuar o movimento conjunto da cabeça e do tronco e reduzir os estímulos de origem cervical.

Pede-se ao doente para contar quando sente a vertigem, e para não fechar os olhos, que serão examinados na postura adequada durante alguns segundos no período de latência, e até mais de trinta segundos si houver nistagmo, a fim de determinar a sua duração e suas características.

O nistagmo e a vertigem de posição são interpretados em conjunto com os exames da função auditiva, dos canais semicirculares e do sistema nervoso, visando o diagnóstico da afecção causal.

O nistagmo de postura tipo 1, de direção variável, sem latência, duração prolongada, sem vertigem ou com vertigem ligeira, é comum nas doenças do sistema nervoso central que lesam os centros ou vias vestibulares, de modo direto ou indireto. Nestes casos encontra-se também, com freqüência outros sintomas e sinais canaliculares (provas vestibulares), auditivos e neurológicos.

Lembrar a possibilidade de ser o nistagmo de posição o único sinal de uma lesão endocraniana, conforme assinala Nylen e, também o de ser mais freqüente que o nistagmo expontâneo nos tumores da fossa posterior. Este A. dá grande importância ao nistagmo de postura, vertical, que aparece na posição de cabeça pendida em decubito dorsal, como um sinal de tumor supratentorial. Nesta posição haveria uma perturbação circulatória no tronco cerebral com perturbação do equilíbrio tônico dos centros vestibulares e o aparecimento do nistagmo de posição.

O nistagmo de postura tipo II, de direção fixa de pouca duração, fatigável, com período de latência, é freqüentemente acompanhado de vertigem. Distingue-se aqui dois grupos de afecções causais: 1.º) Doenças vestibulares periféricas, tendo distúrbios da audição e dos canais semicirculares (Menière, labirintoses, hemorragias, degenerações e tumores); 2.º) Doenças em que o nistagmo de posição é isolado, sem sintomas cocleares, canaliculares e neurológicos, e constituindo o grupo clínico do nistagmo de postura paroxístico beningno, de localização incerta, relacionado com afecções, gerais (intoxicação, distonias neurovegetativas e infecções). Este nistagmo tem possibilidades de desaparecer expontâneamente ou apresentar recidivas após períodos de remissões, mas, sempre com caráter benigno, e sem outros sinais que lembrem uma moléstia grave ou progressiva.

O nistagmo de postura tipo III, irregular na sua direção, ora fixa, ora variável, pode ser encontrado em lesões vestibulares periféricas ou; centrais, cuja etiopatogenia será esclarecida por outros dados semiológicos.

A terapêutica sintomática objetiva reduzir a sensibilidade neuro-vestibular pelo uso de sedativos centrais (barbitúricos, brometo de cloral), sedativos neuro-vegetativos (beladona, atropina, hiosciamina) e sedativos vestibulares (piridoxina, e difenidramina 8 cloroteofilina).

A terapêutica etiológica, mais racional, dependerá do diagnóstico de uma lesão endocraniana, de uma lesão do labirinto, ou de um nistagmo de postura paroxístico benigno. Neste último caso a extirpação de focos infecciosos, a correção de distonias neuro-vegetativas, o equilíbrio de estados alérgicos e vasculares concorrem para resolver o problema.

PRAÇA DA REPÚBLICA, 386 - 5.º ANDAR - S. PAULO
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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