Nos pacientes vertiginosos com audição normal é necessário colocar em evidência certos sinais eletronistagmográficos que nos permitam detectar alterações cerebelares precoces, antes que se instalem as atarias típicas que são quadros adiantados dessas patologias. Daí a importância do otologista, pela atenção que deve ter na apreciação de casos com síndromes vertiginosos mas com o aparelho periférico labiríntico e auditivo normal.
O cerebelo exerce uma função inibitória sobre o sistema vestibular, tal fato ocasiona nos pacientes com lesões cerebelosas uma liberação da principal manifestação da atividade labiríntica que é o nistagmo, produzindo uma série de alterações como: fixação visual deficiente, acompanhamento deficiente de um objeto que se movimenta no campo visual e alterações dos movimentos oculares desencadeados por estimulação labiríntica. Este trabalho tem a finalidade de mostrar as alterações eletronistagmográficas em pacientes com síndrome vertiginosa e que eram portadores de tumores cerebelares.
MATERIAL E MÉTODOEstudamos 4 pacientes de 16, 12, 8 e 39 anos, sendo três do sexo masculino e o outro feminina. Os três primeiros foram operados de neoplasias cerebelares (neuroblastomas) e o último de um aneurisma da artéria basilar que comprimia o cerebelo, mas que não apresentava sinais de lesões bulbares ou pontinas. Todos queixavam-se de tonturas em crises há bastante tempo, tendo exame neurológico normal e nada aparecendo no campo otorrinolaringológico. Um dos pacientes tinha um nistagmo espontâneo que só surgia com os olhos abertos e pequena ataxia. Nenhum dos pacientes se queixava de sintomas auditivos como zumbidos e diminuição da acuidade. A audiometria de todos confirmou os achados clínicos da anamnese. Foram submetidos à prova eletronistagmográfica com pesquisa da supressão durante a estimulação labiríntica clássica, ao exame de acompanhamento pendular e optocinético, na fixação de pontos alternantes e a prova calórica. Após serem enviados ao neurocirurgião e diagnosticada amassa expansiva na fossa posterior por arteriografias e pneumoen cefalografias e no último caso tomografia computorizada, foram operados com craniotomia subocipital e extraído o tumor.
RESULTADOSApós o estudo clínico e otorrinolaringológico completo dos pacientes foi realizada a eletronistagmografia com olhos abertos e fechados, as provas de acompanhamento visual pelo pêndulo e cilindro de Bérányi. Na Figura n° 1 temos o estudo de um dos pacientes, que se superpõe fielmente aos demais. É o paciente de 8 anos do qual foi extraído um neuroblastoma do hemisfério cerebelar de 2,5 por 3,0 cm, do lado esquerdo. No traçado 1 vemos um grande nis tagmo calórico e falha nítida da supressão (entre as flechas) ao abrir e fixar os olhos. No traçado n° 2 vemos a excitação labiríntica feita com ar a 20° no lado esquerdo mas permanecendo o paciente com os olhos abertos durante a prova. O nistagmo é excelente, paroxístico mas que suprime-se ao fechar os olhos. No traçado n° 3 o acompanhamento pendular sacádico típico de lesão cerebelar e na fixação do olhar para a direita a 20°, no traçado 4 a oscilação ocular de adaptação. No traçado n° 5 vemos o acompanhamento de rotação de um cilindro com linhas verticais, com nítida assimetria e nistagmo de grande intensidade. Não havia nistagmo espontâneo e posicional com olhos fechados.
Os demais pacientes apresentaram as mesmas alterações eletronistagmográficas, com variações nas intensidades dos batimentos nistágmicos. Todos os problemas eram, à semelhança das manifestações neurológicas motoras, ipsilaterais, como é clássico na patologia cerebelar.
Os resultados, portanto, que se obtém na eletronistagmografia são grandes batimentos nistágmicos durante as provas calóricas clássicas, seguidas de falha da supressão quando se abrem os olhos, intensificação da resposta com a prova feita com olhos abertos e deficiência nas provas de acompanhamento ocular.
DISCUSSÃOO diagnóstico diferencial entre os problemas vestibulares e cerebelares nos pacientes portadores de vertigem foi muito bem estudado por Miller Guerra (1) e são considerados modelares. O sinal de Romberg e o nistagmo não são considerados sinais de patologia cerebelar primitiva. Na atrofia cerebelosa os estudos realizados por Pierre Marie, Foix e Alajouanine (2) demonstraram que o desequilíbrio é secundário a uma ataxia de localização eletiva no cerebelo.
Nos movimentos oculares o cerebelo pode afetar diretamente o sistema óculo-motor por ter uma ação inibitória sobre o vestibular. Desencadeada, portanto, uma atividade labiríntica por qualquer tipo de estimulação, a função cerebelar exerce um freio de regulação sobre esta motricidade, atuando de maneira discriminatória sobre estes movimentos como o realiza o botão vertical de controle da Imagem de televisão.
Em uma lesão vermiana ou do hemisfério cerebelar esta ação não se executa e libera os movimentos, aparecendo as alterações eletro-nistagmográficas descritas no caso. Em todos os pacientes existiram estas alterações que já foram muito bem estudados por Stround e Rauchbach (3), Coats (4) e Toríbio Rodriguez (5). Uma alteração patológica cerebelar precoce pode ser detectada pela eletronistagmografia quando se realiza a prova calórica com olhos abertos e fechados, se o nistagmo for mais intenso e paroxístico com os olhos abertos é sinal de patologia cerebelar, como aconteceu nos três casos de tumores e do aneurisma que comprimia o hemisfério do cerebelo. A patologia é sempre 1p81lateral ao batimento da componente lenta. A falha da supressão ocorreu em todos os casos mas não é patognomõnica de patologia cerebelar pois ocorre em outras lesões do tronco cerebral. Uma assimetria do nistagmo optocinético com alteração do acompanhamento pendular pode ser ocasionada por lesão do hemisfério cerebral ou cerebelar como demonstrou Coats (6).
Os pacientes estudados eram todos portadores do que se denomina dissociação cócleo-vestibular, isto é, tinham somente patologia vestibular que apareceu nitidamente no exame eletronistagmográfico.
Descobertas estas alterações foram encaminhados ao neurocirurgião que após confirmá-las com arteriografias e pneumoencefalografias nos três primeiros e tomografia com putorizada no último, foram operados.
SUMÁRIO E CONCLUSÕESEstudamos quatro pacientes que apresentavam vertigens e exame auditivo normal, mas que na eletronistagmografia tinham falha da supressão durante o estímulo calórico ao abrir os olhos, alterações nítidas do acompanhamento visual ao estímulo optocinético e pendular. A prova calórica com olhos abertos era de muito maior resposta do que com os olhos fechados. Todos eram portadores de lesões tumorais cerebelares compressivas do mesmo lado do batimento da componente lenta do nistagmo.
SUMMARYThe author estudied four patients with dizziness and normal auditive exam. This patients didn't had norma electronystagmography. Ali of that had compressive cerebellar lesion in the same side of slow component of nystagmus
BIBLIOGRAFIA1. MILLER, Guerra, P. - La sé méiologie cérebelleuse et la séméiologie vestibulaire. Revue Neurologique 96:699, 1958.
2. MARIE, P., Foix, Ch., Alajouanine, Th. - Del'atrophie cérebelleuse tardive à préciominance corticale. Revue Neurologique 7: 849,1922.
3. STROUD, M.H., Rauchbach, E. - Caloric and optokinetic nystagmus in cerellar patients. Ann. Otol. 85:136,1976.
4. COATS, A. - Central electronystamographic abnormalities. Arc. Otolaryngol. 92: 43, 1970.
5. RODRIGUEZ, T. - Signos electronistagmograficos de lesiones de Ia fossa posterior y tronco cerebral. Trabalho apresentado na Soc. Rioplatense de ORL em 27 de outubro de 1973.
6. COATS, A. - Central and peripheral optokinetic asymetry. Ann. Otol. Rhinol. Laryngol. 77: 938,1968.
ENDEREÇO DO AUTOR:
Rua Lopo Gonçalves, 511
90000 - Porto Alegre - RS
*Trabalho realizado no serviço de Otorrinolaringologia do HCPA.
**Chefe do Departamento de Oftalmo-Otorrinolaringologia da UFRGS