J. A. S. Jr., branco, 12 anos, residente em Santos, veio pela primeira vez a consulta a 13 de abril do ano passado. Contam os pais que, aos 4 anos de idade, em Iguape, brincando á porta de casa, onde no momento parára um cavalo, recebeu um couce que, atingindo o lado direito da face, lhe quebrou alguns dentes, além de fraturar o maxilar superior desse lado. Foi tratado pelo medico da cidade, Dr. Alvaro Fortes, que o deixou restabelecido. Por ocasião da segunda dentição, os dentes do lado direito nasceram em desalinho. Em 1932, residindo em Santos, seus progenitores notaram que, do lado oposto, - maxilar superior esquerdo -, onde os dentes tinham nascido aparentemente perfeitos, havia na gingiva, por cima de um deles, um pequeno orificio que supurava. O dentista consultado declarou tratar-se de uma. fistula. Apesar de feito, com o maximo cuidado, o tratamento prescrito, 2 mezes depois a fistula ainda supurava. Novamente ouvido o dentista diagnosticou sinusite, dizendo haver necessidade de intervenção medica. Foi consultado, então, um especialista de Santos que mandou radiografar a arcada dentaria superior esquerda e prescreveu banhos de luz e inhalações mentoladas nasais, que foram feitas sem nenhum resultado, como era de esperar, por mais de trinta dias. Recrudescendo a molestia. já então com supuração fétida e abundante pela narina esquerda, foi o pequeno levado, a conselho de um cirurgião-dentista amigo, ao meu distinto colega, radiologista, Dr. Moura Gogliano, que lhe fez a radiografia da cabeça, que passo, copiada, ás vossas mãos, e que revelou a existencia de sinusite maxilar dupla, mais acentuada á esquerda, e de um dente canino, ectopico, no seio maxilar esquerdo, quasi ao nivel do angulo supero-interno da cavidade.
Trazido ao meu consultorio, examinei-o cuidadosamente e indiquei intervenção cirúrgica, que se realizou, sob anestesia regional, a 15/4. Na ocasião de anestesiar o nervo sub-orbitario, notei que, atravessadas as partes moles, a agulha caía numa cavidade cheia de puz, sem encontrar a parede ossea anterior do seio maxilar. De fato, feita a incisão e descoladas estas partes moles, a parede anterior mostrava-se inteiramente destruida, como se tratasse de um doente já operado de sinusite maxilar. Limpa a cavidade, com retirada das fungosidades e puz existentes, bem no ponto assinalado pela radiografia foi encontrado o doente ectópico-canino, que ao ser retirado deixou vir comsigo, preso á porção radicular, um grande cisto dentigero, que se achava para fóra do seio maxilar na zona correspondente ao etmoide anterior.
Achando-se as raizes do 1.° molar superior esquerdo dentro do antro, foi este dente extraido no ato operatorio.
Confiei o exame anatomo-patologico da peça ao meu distinto colega Dr. Marcos Lindenberg, que, apesar de repetidas solicitações, não me fez chegar ás mãos o seu laudo, que, diz ele, confirma o diagnostico clinico.
Muito embóra os cistos do maxilar superior de origem dentaria, mesmo os do tipo folicular ou dentigero, não constituam raridades clinicas, o presente caso tem, como acabais de vêr, varios aspetos interessantes (dente heterotopico, não incluido no interior do cisto; desenvolvimento deste no ramo ascendente do maxilar superior; etc., etc.), motivo pelo qual foi trazido a plenario.
A Malassez, devemos a elucidação da patogenia desses cistos, que são, como todos nós sabemos, tumores benignos do maxilar superior.
Nas intervenções praticadas para extraí-los, deve ser sempre utilizada a anestesia regional e nunca a narcose geral, salvo rarissimas exceções.
Fig. 1
Fig. 2 - Cisto dentigero (Fotografia com ligeiro aumento)
Fig. 3 - Cisto dentigero (Fotografia com ligeiro aumento)