ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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1641 - Vol. 41 / Edição 1 / Período: Janeiro - Abril de 1975
Seção: Trabalhos Originais Páginas: 09 a 14
ELECTROCOCLEOGRAFIA - INFORME PRELIMINAR*
Autor(es):
Pedro Luiz Mançabeira Albenaz**,
Maurido Malavasi Ganança***,
Eduardo de Moraes Baleeiro****
Yotaka Fukuda*****

A resposta elétrica ao nível da janela coclear resultante da estimulação sonora é conhecida há muitos anos. Há dois componentes principais: o microfonismo coclear (CM), descrito por Wever e Bray em 1930, e os potenciais de ação do nervo acústico (AP), cujos principais componentes, N1 e N2 foram estabelecidos por Derbyshire e Davis em 1935.

Os potenciais cocleares no homem foram detectados pela primeira vez por Fromm, Nylen e Zotterman em 1935. Lempert, Melmer, Wevet e Lawrence, em 1947 tentaram utilizar esses potenciais para obter informações clinicas, mas dificuldades técnicas interromperam essas tentativas, uma vez que em apenas metade dos pacientes os registros eram satisfatórios.

Em 1959 Rubem, Bordley e Lieberman, utilizando eletródios colocados na membrana da janela coclear, através de via de acesso transmeática realizada em sala cirúrgica especialmente blindade, lograram obter registros precisos e informações preciosas em alguns pacientes selecionados. Rubem e seus colaboradores podem ser considerados os pioneiros da utilização dos potenciais cocleares com objetivos diagnósticos em termos de localização de lesão.

O advento dos computadores para obtenção de médias (mediadores), responsável pelo desenvolvimento da audiometria de respostas evocadas, permitiu a simplificação do registro de potenciais cocleares, transformando em estudo clínico esse recurso anteriormente limitado a uns poucos centros de pesquisa. A soma de grande número de respostas permite destacá-las do ruído inerente ao registro. Aran (1967), Yoshie (1967) e Sobmer e Feinmesse (1967) foram os principais originadores deste método.

A utilização da electroeocleografia na Escola Paulista de Medicina data de fins de 1973. O equipamento que utilizamos é um polígrafo Medelec com dois mediadores de 100 pontos, acoplado a um audiômetro Amplaid especialmente adaptado para a produção de cliques, cliques filtrados e tons puros fragmentados.

A técnica que utilizamos é essencialmente a mesma de Aran. O electródio ativo é situado ao nível do promontório (transtimpânico).

Este informe diz respeito a 19 electrococleogramas, em parte realizados com objetivos educacionais (crianças com surdez congênita, distúrbios de aquisição de linguagem ou disfunção cerebral), em parte para complementação diagnóstica em disacusias neuro-sensoriais. O levantamento desses casos foi devido a um questionário mundial efetuado pelos Drs. Davis e Beagley, para coleta de dados de todos os pesquisadores deste setor.

Resultados

Este informe preliminar apresenta os resultados obtidos em 19 exames electrococleográficos (ver Quadro I).

Os pacientes foram divididos em dois grupos, a saber:

Grupo I - pacientes em que o principal problema era a avaliação do grau de perda auditiva.

Grupo II - pacientes que haviam sido submetidos a outros testes audiológicos, nos quais a ECochG foi realizada para a obtenção de informes diagnósticos adicionais.

Os pacientes do Grupo I foram em número de 11, com idades variando de 3 a 7 anos (mediana 4 anos). Em todas essas crianças a obtenção de audiogramas por condicionamento e a pesquisa de respostas corticais evocadas foi impossibilitada pela incooperação dos pacientes. Todas as crianças suficientemente cooperantes, que permitiram ao menos a colocação de fones, foram preferencialmente testadas por ERA e não ECochG.

Estes pacientes foram submetidos a anestesia geral por ketamina. Na maioria das vezes foi ministrada uma premedicação à base de atropina e diazepam.

Em três casos de crianças sem linguagem, sem testes audiológicos disponíveis, a ECochG mostrou limiares normais. Em dois casos não foi possível evidenciar qualquer resposta. Nos seis outros pacientes as respostas evidenciaram limiares elevados.

Os pacientes do Grupo II foram em número de 8, com idades de 12 a 53 anos (mediana 25). Em todos o exame foi realizado com anestesia tópica (spray de lidocaína a 10%).

As indicações para ECochG neste grupa foram as seguintes:

Disacusia neuro-sensorial sem etiologia esclarecida: 2
Disacusia neuro-sensorial por meatos acústicos estreitos: 2
Suspeita de surdez psicogênica: 1
Otosclerose coclear: 1
Neurinoma do acústico: 1

O caso remanescente foi um controle realizado em estudante de Medicina com audição normal. No caso de suspeita de surdez psicogênica a ECochG foi o único exame a permitir a verificação real da perda auditiva.

Conquanto nossos resultados devam ser considerados como preliminares, acreditamos que a ECochG pode, em determinadas circunstâncias, fornecer respostas específicas em determinados tipos de patologia coclear ou neural. A figura 1 mostra as respostas obtidas em uma paciente com um neuroma do acústico à direita. Tratava-se de um tumor totalmente intrameático, mas com perda auditiva intensa, e a dosagem de proteína na perilinfa, realizada com o teste de Silverstein, foi elevada. Nota-se a presença de respostas largas, com um pequeno pico positivo. Os limiares a ECochG foram discretamente inferiores aos da audiometria tonal.

Em um dos casos de meatos acústicos internos estreitos observou-se latência elevada e constante, ou seja, invariável com a intensidade dos estímulos.



QUADRO I. Dados de 19 electrococleogramas realizados na Disciplina de Otorrinolaringologia da Escola Paulista de Medicina.



FIG. 1. Respostas de uma paciente com um pequeno neuroma do acústico (respostas alargadas, com um pequeno pico positivo). A paciente foi submetida a uma ressecção total do tumor através da fossa média.



No caso de otosclerose coclear, em que há indícios de compressão ao nível do M.A.I., o registro das respostas a um clique filtrado de 1 KHz demonstrou um microfonismo coclear com amplitude nitidamente superior à amplitude dos potenciais de ação (figura 2).

Comentários

A ECochG é um exame de simples realização, permitindo a obtenção de dados fidedignos sobre a audição mesmo em pacientes totalmente incooperantes. O equipamento que utilizamos se tem comportado de forma estável e segura.

Em vários pacientes a ECochG foi o único exame auditivo passível de ser conseguido. Nos outros casos houve excelente correlação das limiares electrococleográfieos (AP) com as respostas às freqüências altas (em torno de 4 KHz) do audiograma.

Acreditamos que a maior experiência com o método e a utilização de outras respostas elétricas, em particular o CM, permitirá o diagnóstico diferencial, pelo menos em alguns casos, entre os diferentes componentes das disacusias neuro-sensoriais.

ELECTROCOCLEOGRAMA



FIG. 2. ECochG de uma paciente com otosclerose coclear. Nota-se nítido contraste entre a amplitude do microfonismo coclear e dos potenciais de ação do nervo acústico.



Bibliografia

1. Wever, E. G. & Broy, C. W.: Auditory Nerve Impulses. Science, 71: 215, 1930.
2. Dorby Uro, A. J. & Davis, H.: The Action Potential of the Auditory Nerve. Amer. Jour. Physiol., 113: 476, 1935.
3. Lempert, J.; Meltzer P. E.; Wever, E. G.; & Laurrence, M.: Cochbogram and its Clinical Application. Arch. Otolaryngol. 22: 477, 1947.
4. Ruben, R. J.; Bordley, J. E.; and Lieberman, A. T.: Cochlear Potentials in Man. Laryngoscope 71: 1141, 1961.
5. Aran, J. M.; Portmann, C. L; Delaunay, J.; Pelerin, J. & Lenoir, J.: L'électrocochléogramme: méthodes et premeu résultats chez l'enfant. Rev. Laryngol. (Bordeaux) 90: 615, 1969.
6. Yosbie, N.: Auditory nerve action potential responses to diks ia man. Laryngoscope 78: 198, 1968.
7. Sohmer, H. & Feiomester, M.: Cochlear potentials recorded from the external ear in man. Ana. Otol., 76: 427, 1967.




* Trabalho realizado na Clínica Otorrinolaringológica (Departamento de Cirurgia) da Escola Paulista de Medicina, com equipamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
** Professor Titular.
*** Professor Assistente-Doutor.
**** Auxiliar de Ensino da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, Bolsista da CAPES na EPM.
***** Residente (R-3).
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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