IntroduçãoAs lesões destrutivas ósseas do meato acústico externo correspondem a achados pouco freqüentes, dentre as patologias do ouvido externo.
Entre essas afecções podemos citar:
1- Tumores malignos do meato acústico externo. Primitivos (carcinomas, sarcomas) e metastáticos de mama, rim, pulmão e próstata (Curtin)1.
2- Ceruminomas - Tumores às vezes com componente maligno, levando a destruições amplas do meato acústico externo (Campana e cols.)2.
3- Keratosis obturans - Colesteatoma de conduto externo, podendo levar a alargamento por absorção óssea. Quando acompanhados de sinusite e bronquiectasias, constituem a Sindrome de Mournier - Kuhn (citado por Abelló y Pinart)3.
4- Reabsorção óssea por retenção de descarnação córnea, ocorrendo nos estreitamentos ou estenoses traumáticas e iatrogênicas do meato acústico externo.
5- Histiocitose X - Em especial nos casos de granuloma eosinófilo. Segundo Nolph and Luikin4 e Shuknecht and Papaspyrouss, granulação e fístula óssea no canal externo sugerem histiocitose X.
6- Mieloma múltiplo - Com lesões esteolíticas múltiplas, atingindo toda a calota craniana.
7- Otite externa maligna - que provoca grandes destruições ósseas no osso temporal. Atingindo em especial pacientes diabéticos descompensados.
8- Tumor glômico jugular - Com invasão do assoalho da caixa e eventualmente da parede inferior do recesso de Mayer.
9- Radionecrose - Pós-radioterapiá para tumores da faringe (observação pessoal).
10- Granuloma de colesterol - Correspondente ao caso que será descrito e comentado.
Apresentação do casoM.N.R., 15 anos, feminino, branca. Atendida em maio de 1985, com queixa de otorréia direita há 2 anos, em caráter intermitente, fétida, abundante, sem conteúdo mucoso ou hemorrágico. Nega otalgia, hipoacusia e zumbido.
Ao exame O.R.L., destacamos apenas a otoscopia direita onde nota-se formação arredondada, vermelho pálida, não pulsátil, fazendo saliência na região do "sinus de Mayer", obstruindo uma pequena porção da luz do meato.
Antecedentes pessoais - Trauma craniano há mais ou menos 5 anos, com saída de pequena quantidade de sangue pelo meato acústico externo, sem saber precisar o lado.
Figura 1
Estudada sob o ponto de vista audiológico e radiológico. Audiometria normal (fig. 1)
Estudo radiológico - Tomografia Multidirecional do osso temporal direito: Lesão destrutiva extensa da parede óssea inferior do meato acústico externo, bem visível tanto em corte frontal (fig. 2), como em corte sagital (fig. 3).
Estudo radiológico do crânio, coluna e bacia, não mostrou lesões similares.
Submetida a exérese da tumoração, a qual foi realizada por via transmeática, praticamente sem sangramento, sendo o material retirado, friável, pouco sangrante, arredondado, mais ou menos do tamanho de uma avelã. Deixando após a exenteração da mesma, como leito, uma grande cavidade óssea, recoberta de pele no fundo da parede inferior do meato acústico externo. Membrana timpânica íntegra.
O exame anátomo-patológico mostrou: "Granuloma formado por tecido conjuntivo frouxo vascularizado, zonas de hemorragia e fendas losângicas que são preenchidas por cristais de colesterol envoltos por histiócitos e células gigantes multinucleadas, tipo corpo estranho. Pequenos fragmentos de tecido ósseo".
Correspondendo ao quadro histopatológico de um granuIoma de colesterol (fig. 4).
Após 2 anos, a paciente mantémse assintomática.
DiscussãoVários autores tentam explicar a origem peculiar desse tipo de granuloma (Plester and Steinbach)6.
Sadé7 admite que o mesmo ocorre nos distúrbios tubários, havendo uma diminuição do PO2 e aumento do PCO2. O próprio líqüido que se acumula no ouvida médio, na afite secretora, principalmente do tipo "glue", é rico em cristais de colesterol, o que ocorre em especial no hemotímpano idiopático.
Já Friedmann8 aceita que, na gênese do granuloma de colesterol, a hemorragia tecidual seria, juntamente com a degradação de hemoglobina em hemossiderina, o ponto de partida para a cristalização do colesterol. Sendo a pressão negativa "ex-vácuo" do ouvido médio a causa do rompimento capilar.
Nomura9 acha que o início seria a otite média secretora, provindo o colesterol por via sangüínea, começando a depositar e cristalizar. As pontas agudas dos cristais sendo as responsáveis pela ruptura dos capilares do tecido de granulação nas visinhanças das mesmas, súrgindo assim a hemorragia.
Entretanto, até hoje não se conseguiu explicar porque o colesterol cristaliza na intimidade do tecido.
O granuloma de colesterol da caixa e da mastóide apresentam baixa agressividade.
Os localizados na ponta do rochedo seriam explicados pelo bloqueio de células aéreas da região, com conseqüente hipoxia como desencadeante do processo. Nessa localização, esses granulomas mostram-se, freqüentemente, bastante destrutivos, digerindo às vezes grande parte da pirâmide petrosa (House and Brackmann) 10.
Na localização apresentada em nosso caso, não encontramos citação na literatura.
Uma explicação razoável para o caso acreditamos ser o trauma craniano anterior, que poderia ter levado a uma hemorragia tecidual, dando origem, segundo a teoria de Friedmanna, à localização excepcional dessa patologia.
SummaryThe autors report a case of cholesterol granuloma in the external auditory canal, producing a large destructive bone injury of itself.
The hypothesis suggested for this localization would be: after five-years skull-trauma.
It wasn't found in the medical literature summons for this discovery.
Bibliografia1. Curtin, H.D.: CT of Acoustic Neuroma and Others Tumors of the Ear. The Radiologic Clinics of North America.
2. Campana, D.R.; Gazel, M.A.; Granato, L.; Lopes, Z.A.: Adenoma de Glândulas Ceruminosas do Ouvido Médio (ceruminoma). Apresentação de um caso. Rev. Brasileira de O.R.L. n° 1 vol. 45- 1979.
3. Abello, P.; Pinart, A.: Sinusitis. Monografias Del Hospital De La Santa Cruz Y San Pablo. Editorial Lye. Barcelona, 1962.
4. Nolph, M. B.; Luikin, G.A.: Histiocytosis X. The Otolaryngol. Clinics of North America- vol. 15, number 3. August 1982.
5. Schuknecht, H.E.; Papaspyrous, S.: Histiocitosis X. Otolaryngol. Head Neck Surg. 88: 544-547, 1980.
6. Plester, D.; Steinbach, E.: Cholesterol Granuloma. Otolaryngol. Clinics of North America-vol. 15, number 3, August, 1982.
7. Sadé, J.; Teitz, A.: Cholesterol and Cholesteatoma. Acta Otolaryngol, 95: 547 - 533, 1983.
8. Friedmam, I.: Pathology of the Ear. Blackwell Scientific Publication, 1974. Nomura, Y.: Cholesterol Metabolism in Cholesteatoma and Cholesterol Granuloma. Ann. Otol. Rhinol. Laryngol. Supplement 112 - July - August, 1984. vol. 93, number 4,part 2.
10. House, J.L.; Brackmann, D.E.: Cholesterol granuloma of the Cerebello pontine angle. Arch. Otolaryngol., vol. 108, August, 1982.
Endereço para correspondência:
Clinica de O.R.L. - Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo.
Rua Castro Alves, 60 - 6° andar - São Paulo. Capital. CEP 01532.
Trabalho apresentado na VII Reunião Científica da Sociedade Brasileira de, Otologia -Recife.
*Chefe da Clinica O.R.L. do Hospital Público Municipal de São Paulo.
** Residentes da Clinica O.R.L. do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo.
*** Estagiários da Clínica O.R.L. do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo.
**** Assistente do Serviço de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina da U.S.P.