O sinos frontalis dilatans é uma manifestação patológica muito pouco conhecida entre os rinologistas. Manifesta-se como um desenvolvimento gigantesco, uma deformação, quase sempre localizada em apenas um dos sinus frontais. Há, porém, reduzido número de casos em que a anomalia é bilateral. Tratar-se-á realmente de entidade patológica? É uma questão que se pode considerar aberta, mas este distúrbio da pneumatização, por isso que quase sempre só atinge uma das cavidades, leva logicamente a acreditar que se trata de manifestação patológica. Encontramo-nos, pelo menos, diante de um sintoma de uma doença. Que doença será esta? Não possuímos, até o momento, senão algumas suspeitas, algumas hipóteses, a respeito do problema. As manifestações patológicas do sinus frontal, que se apresentam particularmente sob o aspecto de dilatação de uma das cavidades, podem resumir-se em cinco tipos: hidrocele, mucocele, piocele, pneumatocele e pneumosinus dilatans. No estudo diagnóstico. vamos fazer ou tentar fazer as diferenças entre estes tipos. É uma questão muito difícil, pelo menos no que tange à existência de processo atual ou de reliquat de estado patológico precedente.
Não é nosso intuito fazer um estudo minucioso sobre todos os aspectos do pneumosinus frontalis dilatans. Vários trabalhos sobre o assunto já têm sido publicados e fizemos pesquisa acurada sobre a bibliografia relativa ao assunto. Se houver interesse mais especializado sobre seu conhecimento, sobre todos os seus aspectos, basta recorrer ao trabalho de Bourdial, o mais completo recentemente publicado sobre o problema.
O pneumosinus frontalis dilatans apresenta algumas particularidades dignas de interesse: 1.°) é mais freqüente, quase de modo total, no sexo masculino; 2.º) a parede do sinus mais constantemente atingida pelo processo é a anterior, e vários autores consideram esta localização sintoma característico do mal; 3.°) o processo é encontrado de modo quase exclusivo nas décadas dos 20 aos 40 anos; 4.°) não apresenta em geral sintomas, à exceção da saliência frontal e de crises de cefaléia, que, aliás, não são constantes.
O diagnóstico baseia-se principalmente no estudo radiográfico, que deve ser completado pelo tomográfico. Muitos casos de pneumosinus dilatans têm sido diagnosticados por acaso, graças simplesmente ao exame radiográfico. Devemos também admitir que muitos casos não foram diagnosticados, por desconhecimento da anomalia. Nosso primeiro caso foi visto por alguns médicos que não sabiam do que se tratava. A anomalia é muito rara. Desde os primeiros casos de Meyges (1898), de Röpke (1903) de Kan (1905), quem colocou o processo em evidência foi Benjamins (1918), o autor que deu à manifestação o nome de pneumosinus frontalis dilatans. Até o momento atual conhecem-se, no máximo, uns 60 casos publicados, mas estamos convencidos de que muitos deles não parecem ser daquilo que se admite atualmente como pneumosinus frontalis dilatans.
Em longa prática rinológica, de mais de 50 anos, apenas tivemos a oportunidade de observar dois casos, cuja história passaremos a narrar. Tivemos ensejo de ver vários casos de sinus frontais enormes, mas nenhum semelhante asas dois que dão motivo a este trabalho. Observação 1 - Coaracy A. P., brasileira, branca, 45 anos, viúva, residente em Campinas, queixa-se de cefaléias frontais com irradiação para o lado direito. Perdeu a visão do O.D. em 1943 - estamos em 27 de setembro de 1970. A doente não informa qual foi a doença ocular; o olho ficou muito inflamado e o médico fez injeções intra-oculares.
Viúva há 20 anos. Quatro filhos, três do sexo masculino, o mais moço com 21 anos. Não sofreu de doenças sérias, mas é sujeita a dores gástricas e intestinais freqüentes. Nota-se certa depressão na fase, na região maxilar direita (Fig. 1). A testa apresenta aspecto normal, sem nenhuma saliência frontal (Fig. 2). As cefaléias variam de intensidade. A primeira crise muito forte verificou-se a 13 de agosto de 1970. A doente jamais texe fluxos nasais abundantes. Exame - Fossas nasais normais. Nada de anormal na boca e na garganta. Rinofaringe em condições normais. Exame radiográfico (Dr. Altair Câmera) - Incidências frontais - Sinus frontal direito enorme, mormente no sentido lateral. A cavidade apresenta septos incompletos, como se tivessem havido lojas. Para cima, na linha média, há um lóculo quase completo, aberto para baixo. O sinus é exageradamente transparente (Fig. 3). Sinus frontal esquerdo de dimensões normais. Condensação óssea na borda superior. Sinus maxilar direito ausente; não há cavidade, por menor que seja. Sinus maxilar esquerdo levemente velado (Fig. 4). Incidência de perfil (sobre o lado direito). Sinus frontal gigantesco. Parede anterior muito pouco saliente. A grande cavidade, que invade a caixa crânica, é formada pela parede posterior (Fig. 5). Paredes do crânio de espessura normal. Sela túrcica pequena. Parece fechada; uma ponte óssea liga as clinóides anteriores às posteriores. Pneumatização de intensidade moderada das mastóides.
FIG. 1 - Observação I - Depressão facial à direita (ausencia do sinus maxilar).
FIG. 2 - Observação I - Testa muito pouco abaulada.
FIG. 3 - Observação I - Sinus frontal direito muito desenvolvido; pequena loja na arte superior.
FIG. 4 - Observação I - Ausência do sinus maxilar direito.
FIG. 5 - Observação I - Sinus frontal enorme, invadindo a cavidade do crânio.
Tomografia - Corte de 2 cents. cavidade transparente. As paredes da pequena loja que existe dentro da cavidade estão bem calcificadas e a externa parece dupla. Ausência completa de sinus maxilar direito. (Fig 6). Os outros cortes não revelam nada mais digno de menção.
FIG. 6 - Observação I - Tomografia frontal. Parede dupla da pequena loja.
Exame oftalmológico - (Dr. Pauto Ariani) - Diz a doente, ter tido uma inflamação séria no O.D., seguida de cegueira, após a segunda gestação, há 27 anos. O.D. - Estrabismo convergente. Oclusão e seclusão da pupila T.n.
O.E. - Fundo normal. Vício de refração (sph + 7 cyl + 1. Eixo horizontal. V=05). Exame neurológico (Dr. Roque Balbo) - Sistema muscular, motricidade, sensibilidade: normais. Não há distúrbios dos nervos crânicos, a não ser certo grau de palidez da papila esquerda. 1 - Electro-encefalografia - Assimetria pouco pronunciada entre as regiões temporais dos dois hemisférios, com predominância à direita dos ritmos rápidos e, à esquerda dos ritmos 11 c/s com ondas eventuais de aspecto agudo (normalidade provável). 2 - Líquido céfalo-raquídeo - Normal. Reações - Pandy Weichbrodt, Nonne, Wassermann, cisticerco - negativas.
3 - Pneumo-encefalografia - Tipo fracionado com introdução de 10 ml. de ar para o sistema ventricular e 7 ml. para o espaço sub-aracnoldeo. A análise das radiografias demonstra a presença do sistema ventricular médio (4.º ventrículo, aqueducto e 3.° ventrículo) e as respectivas cisternas basais da fossa posterior com aspecto normal. A análise do sistema ventricular lateral mostra certo grau de assimetria de posição e de volume de todo o sistema ventricular lateral esquerdo, sem desvios. Espaço subaracnoídeo simétrico; cisternas interpedunculares e optoquiasmática normais.
7 X 1970. - A doente é operada do sinus maxilar esquerdo (Caldwell - Luc). Pequena quantidade de secreção mucopurulenta na cavidade. Mucosa descolada para retirada de fragmento para exame histopatológico: processo inflamatório crônico intersticial com fibrose pós-inflamatória. Afim de verificar se tratava de afecção familial, foram feitos os exames dos filhos de nossa doente e o estudo genético.
1.º filho - Vileforte, 30 anos, motorista.
Não há sintomas na área otorrinolaringológica. Não sofreu de nenhuma doença grave.
O exame o.r. laringológico nada revela de anormal. Peso 99 kg. altura 1m75.
Exame radiográfico - Sinus totalmente transparentes. Os frontais são muito grandes. Há início de formação de saliência na parede posterior. Sinus maxilares muito desenvolvidos. Pneumatização, exagerada dos temporais: células mastóideas enormes (Fig. 7).
2.° filho - Edmée, 27 anos. Goiânia.
Cefaléias frontais, às vezes no alto do crânio. Não tem náuseas.
Exame o.r. laringológico - Nada de anormal.
Exame radiográfico - Sinus bem claros. Sinus frontais, células do etmóide, sinus maxilares e esfenoidais: grandes. Sela túrcica muito pequena.
3.° filho - Josemilton, 24 anos. Goiânia.
Cefaléias diárias, sempre na metade direita do crânio.
Exame o.r. laringológico - Amígdalas hipertrofiadas, com edema; adenites cervicais.
Peso 58 kg 500; altura 1m65.
Exame radiográfico - Opacificação total do sinus maxilar direito. As demais cavidades, claras. Sinus de tamanho normal, com exceção dos frontais, que são de pequenas dimensões.
Sela túrcica muito pequena.
4.º filho - Benício, 21 anos, operador de máquinas de terraplanagem. Não se queixa de nada.
Exame o.r. laringológico - Secreção mucopurulenta, na parede posterior da faringe. Nada de anormal na rinofaringe.
Peso 62 kg altura 1,76.
Exame radiográfico - Todos os sinus claros. Sinus frontais enormes, tanto em largura, como em altura. A parede posterior apresenta duas saliências abauladas muito nítidas. Sela túrcica pequena (Fig. 8).
Exame genético (Dr. Walter Pinto Jr., Departamento da Genética da Fac. Med. Campinas, Univ. de Campinas) - "O tipo de recurrência familial encontrado na genealogia da propósita, bem como a raridade da condição mórbida em questão, não permitem excluir a hipótese de herança dominante, desde que não se indique se ela é autossômica ou ligada ao sexo. Considerando, porém, que o cariótipo da propósita revelou ser 46, XX, Dp. +, isto é, mostrou que um dos cromossomos do grupo D apresenta o braço menor aumentado, não se pode também excluir a possibilidade de ser a aparente transmissão mendeliana do pneumosinus decorrente de uma aberração cromossômica. É evidente que o caso em questão merece investigação mais ampla ou seja o estudo citogenético de outros membros do núcleo familial da propósita, tendo em vista as implicações teóricas e práticas associadas ao reconhecimento da aberração cromossômica Dp +."
FIG. 7 - Observação I - Primeiro filho. Sinus frontais enormes. Incio de abaulamento da parede posterior.
FIG. 8 - Observação I - Terceiro filho. Sinus frontais enormes. Duas saliências na parede posterior.
Comentários - Cavidade enorme do sinus frontal esquerdo, a invadir a cavidade crânica. O desenvolvimento anômalo corre por conta da parede posterior e não da anterior, como de regra. O exame sistemático dos quatro filhos mostra, em dois, embora de maneira não decisiva, que parece possível a existência de processo análogo ao da mãe, embora em fase inicial. Trata-se de um caso de pneumosinus frontalis dilatans muito grande em uma mulher. Os septos parciais nada têm de anormais, mas os que quase formam um lóculo são difíceis de interpretar. O estudo genético mostra (embora não tivesse sido possível examinar maior número de elementos da família), sinais importantes de hereditariedade. A doente é magra, de pequena estatura e não apresenta o menor sinal de perturbação hipofisária nem tireóidea.
Observação II - Benedito J.C., preto, 22 anos. Campinas, apresenta-se à Clínica Neurológica do Hospital Vera Cruz, de Campinas, por doença nervosa antiga. É hemiplégico há quase 20 anos. Ausência de sintomas otorrinolaríngicos.
Exame - Fossas nasais: mucosa rósea, aspecto normal. Nada nas conchas. Meato médio direito: nada de patológico. Não tem nem teve crises de corrimento pelas fossais nasais. Ao exame da boca e da garganta nada se nota digno de registro. Aparelho auditivo igualmente em condições normais. Exame neurológico (Dr. Roque Balbo) - História - Três dias após o nascimento, crises convulsivas à esquerda, de duração de 5/10 minutos. Estas crises se apresentavam todos os dias até a idade de um ano e meio. Entra então em estado de mal e torna-se hemiplégico. Neste estado permanece até os 14 anos, quando aparecem novas crises convulsivas. Atitude de Wernicke-Mann. marcha ceifante, hemiplegia esquerda com reflexos vivos à esquerda; ausência de sinal de Babinski. Metade esquerda do corpo hipertônica. Funções psíquicas normais. Fundo do olho - palidez bilateral pouco pronunciada das papilas. Eletro-encefalografia - Assimetria de modulação entre os hemisférios, com ausência do ritmo a direita. Conclusão: Assimetria que denota processo de tipo atrófico do hemisfério direito. Pneumo-encefalografia - Todo o sistema ventricular está impelido para o lado esquerdo, passando o ventrículo lateral esquerdo por baixo da foice. O ventrículo lateral direito, cujo pólo frontal não se mostra bem delineado em A.P., apresenta-se dilatado com perda de todas as angulações e deformado de maneira simétrica não específica. O ventrículo lateral esquerdo também não encheu o pólo frontal em A.P., apresentando-se com sua morfologia relativamente conservada, embora estando exatamente sob a foice. Na incidência P.A., o desvio do sistema ventricular é menos evidente, mas ainda se apresenta. A visibilidade das cisternas está prejudicada pela anomalia óssea.
Arteriografia da carótida direita - Grupo da artéria cerebral deslocado homolateralmente, mas muito tênue, confundindo-se com a cerebral posterior, que se encontra em posição normal. O grupo da silviana apresenta poucos vasos e está entretanto, estirada dentro de seu eixo. A cerebral posterior apresenta-se retilínea, com perda de todas as curvaturas. Arteriografia da carótida esquerda - Circulação extremamente rápida e circulação Jenosa superficial e profunda bem retardadas, desvio da artéria precalosa para o lado direito sem circulação patológica. Os exames neuro-radiológicos tendem mais a demonstrar a presença de processo atrófico do hemisfério direito, do que a de tumor ou cisto. Líquido céfalo-raquídeo - Células 1 com predominância de linfomononucleados. P.T. 22 mg%, glicose 60 mg%, cloretos 694%. Reações de Pandy, Nonne, Weichbrodt, Takata - Ara: negativas. Exame radiográfico (Dr. Altair Câmera). Posições frontais - Sinus frontal direito enorme, muito claro, a invadir o lado esquerdo, mormente na parte inferior. Sinus frontal esquerdo de tamanho médio. Pneumatização muito exagerada das mastóides (Fig. 9). Posição sagital (sobre o lado direito). Cavidade de grandes proporções, prolongando para trás um sinus frontal demasiadamente desenvolvido. Parede anterior do sinus não muito delgada. A cavidade chega, para trás, à altura do corpo do esfenóide e para cima ao alto da testa. A parede posterior do sinus é delgada, muito lisa (isto é, sem saliência) e muito nítida (Fig. 10). Pneumatização exagerada do osso temporal, incluídos a escama e o processo zigomático. Paredes do crânio de espessura normal. Tomografia frontal - O sinus frontal direito desce até o etmóide, cujas células não são percebidas. A cavidade é mais profunda em sua parte inferior externa, muito mais transparente. No corte de 5 cm, vê-se uma cavidade curva, em S, de extremidade superior e externa, muito clara (Fig. 11). Não se percebe nenhuma célula etmoidal, mas uma cavidade que prolonga para baixo o sinus frontal. O corte de 7 cm mostra o sinus frontal muito reduzido. Parece continuar diretamente até o sinus esfenoidal direito, que é muito grande (mais do dobro do sinus esfenoidal esquerdo). (Fig. 12). Tomografia sagital - O primeiro corte revela o volume do sinus frontal direito e do sinus esfenoidal homolateral. O corte de 7 cm mostra claramente a profundidade da cavidade frontal, que chega quase até à altura do sinus esfenoidal, tomando formato inteiramente diferente (Fig. 12). Dosagem das gonadotropinas hipofisárias (método de Bradbury, Brown, Bernard e Rombert), (Dr. Helion Fagundes) - Valores normais entre 10 e 25 U.R. 24 horas, expressas em E.U.R. O doente: - abaixo de 10 U.R. O estudo radiográfico do crânio da mãe (o pai é falecido) e dos dois irmãos revela sinus da face com desenvolvimento normal.
FIG. 9 - Observação II - Sinus frontal direito enorme.
FIG. 10 - Observação II - Sinus frontal gigantesco, invadindo a cavidade do crânio até à altura do sinus esfenoidal.
FIG. 11 - Observação II - Tomografia frontal. Fundo da grande cavidade frontal, com a forma de um canal em S.
FIG. 12 - Observação II - Tomografia frontal. Parte mais posterior da cavidade, entrando em comunicação com o sinus esfenoidal direito.
Comentários - Este caso é muito interessante pelas dimensões e a forma muito regular da cavidade frontal, clara, transparente e vazia. As tomografias demonstram que a cavidade muda de aspecto a medida que se aprofunda. Apresenta-se então como um canal curvo, que parece entrar em comunicação com o sinus esfenoidal, A pneumatização dos ossos do crânio é exagerada, mas o doente não apresenta um único sintoma de acromegalia; muito pelo contrário, é de pequena estatura, dando idéia de ter uns 13-14 anos. A dosagem do hormônio da hipófise (gonadotrofinas) revela insuficiência hipofisária no domínio gonadotrófico. A mãe e os irmãos apresentam ao exame radiográfico sinus de dimensões normais.
Os problemas do pneumosinus estão ligados a vários aspectos da anomalia. São os seguintes os principais: 1) o diagnóstico diferencial; 2) a questão do sexo; 3) as hipóteses etiológicas.
1 - O diagnóstico diferencial
Quando nos achamos diante de radiografias que mostram a existência de sinus frontais de dimensões excepcionais, as hipóteses diagnósticas são, pelo menos, as cinco já mencionadas: hidrocele, mucocele, piocele, pneumatocele e pneumosinus dilatans. A hidrocele é muito rara. Killian refere-se a 64 casos de coleções líquidas do sinus frontal, mas apenas cinco estavam cheios de líquido aquoso. Como diz Brüggemann, não há limites nítidos entre a hidrocele e a mucocele. É questão apenas de densidade do líquido. Não se sabe, na hidrocele se o líquido se torna mais ou menos espesso por efusão inflamatória, se como produto de um hydrops ex-vacuo. As mucoceles e as pioceles são de observação menos rara. As primeiras são de origem espontânea ou traumática. As pioceles não passam de mucoceles infectadas. As pneumatoceles são igualmente raras. Trata-se de traumas do crânio com pequenas fraturas, ou de infecções do sinus frontal por germes produtores de gás. Worms, Dediée e Grumbach admitem três tipos: 1) o extra-cerebral (extradural ou subdural); 2) o intracerebral e 3) o ventricular. Observamos, há anos, um caso em um rapaz que dera um salto na água, de grande altura. As rádios revelaram uma coleção aérea frontal. Foi feita a intervenção e, ao ser aberto o sinus frontal direito, eliminou-se grande quantidade de ar sob pressão. Exposta a parede posterior, havia perfuração da mesma. A parede foi amplamente ressecada e a duramater como a massa encefálica estavam fortemente comprimidas para trás. Há casos de pneumatoceles subcutâneas devidas a fraturas da parede anterior do sinus. Fabre reuniu 165 casos de pneumatocele, de que 7 eram devidos a infecção crônica do sinus frontal e das células etmoidais, 13 eram devidos a osteomas e 145 a fraturas frontobasais do crânio. O pneumosinus dilatans é uma dilatação, uma expansão muito grande do sinus frontal, que se apresenta completamente cheio de ar e totalmente transparente, demasiado claro, nas radiografias.
Vê-se, pois, que nos outros processos patológicos do sinus frontal, este aparece sempre com a transparência diminuida, o que é devido à presença de líquido - soro, muco, pus, e, ainda, à hipertrofia ou ao edema da mucosa. Pode, entretanto, acontecer, no pneumosinus dilatans, aparecer uma infecção secundária, com formação de líquido, como num dos casos relatados por Bourdial, o que, aliás, é de observação excepcional. É preciso admitir, porém, a hipótese, em caso de sinus frontal excepcionalmente desenvolvido e totalmente claro nas radiografias, de ter ele sido sede de um processo com retenção líquida anterior, espontaneamente escoada. Mc Nally, Stuart e Childe relatam dois casos, diagnosticados como sendo de mucocele frontal, em que, no ato operatório, a cavidade sinusal foi encontrada completamente vazia. No segundo caso dos mesmos autores, uma mulher de 20 anos apresentava uma saliência que correspondia ao sinus frontal direito. A cavidade estava vazia, mas a mãe da doente declarara que, duas semanas antes, a moça tivera verdadeira descarga de líquido pela fossa nasal. Pode-se deduzir deste caso e de outros semelhantes, que provavelmente alguns casos, presumidos de pneumosinus, nada mais são de que mucoceles espontaneamente curadas, hipótese já admitida por alguns autores. O pneumosinus pode localizar-se em um só dos sinus frontais ou em ambos. Conhecemos apenas três observações em que a anomalia era bilateral: o de Benjamins, o de Uffenorde e o de Gardel. Várias observações publicadas como sendo de pneumosinus deixam-nos em dúvida a respeito do diagnóstico. Bourdial, referindo-se aos 51 casos que conseguiu reunir, declara que "a leitura atenta da maior parte deles foi decepcionante". Têm-se tomado por pneumosinus vários casos de sinus frontais demasiadamente desenvolvidos e também, mais raramente, prováveis mucocele espontaneamente curadas. Na quase totalidade dos casos registrados, praticamente só se faz referência à parede anterior. Estudando algumas dezenas de radiografias dos sinus frontais, nota-se que a parede posterior, caracterizada pelas impressões da massa cerebral, pode por vezes apresentar saliências. O processo dilatador do pneumosinus pode perfeitamente, ao invés de atingir a parede anterior do sinus, localizar-se na posterior. A proeminência do sinus, em lugar de aparecer na fronte, revela-se para dentro do crânio. Se, como acontece na maioria dos casos, a anomalia tem por sede a tábua externa do osso frontal, este pode ficar tão delgado como uma folha de papel, como no caso de Ferreri. Esta particularidade é, na opinião de vários autores, característica do pneumosinus. Mas as mucoceles quase sempre determinam lesões ósseas semelhantes, ainda que com localização mais comum na região orbitária do sinus, em sua parede inferior. Sendo a dilatação muito mais freqüente na parede anterior, vários autores reputam este sinal muito significativo e importante. Entretanto, em nossas duas observações, a dilatação se processou às custas da parede posterior. Em dois dos filhos da doente da Observação I, o processo, apesar das grandes dimensões dos sinus frontais, parece estar se manifestando também na parede posterior. Os casos desse tipo são muito raros. Encontramos na literatura o de Bourdial (obs. 3), em que um sinus frontal gigantesco se desenvolveu dentro da caixa do crânio, formando enorme cavidade. Alguns casos apresentados como de pneumosinus não passam de pneumatização muito exagerada dos sinus, como já foi dito. Vejamos apenas um deles. Tem sido citado como de pneumosinus o caso de um crânio estudado por Parsons Schaeffer (mas o diagnóstico não é de sua autoria). Trata-se de um crânio, cuja parede interna (posterior dos sinus frontais) apresentava saliências muito evidentes. Os sinus eram enormes e sua capacidade era de 45 mi. Estes casos de pneumatização generalizada dos ossos do crânio, em que não se observa pneumatização exagerada, mas não localizada, não parecem ser de pneumosinus. Feldman estabeleceu as diferenças abaixo para fazer-se a distinção entre a pneumatocele e o pneumosinus.
Pneumatocele
1 - A coleção aérea acha-se sob uma casca delgada.
2 - A saliência pode desaparecer à pressão.
3 - A parede óssea não é íntegra.
4 - Aparecimento repentino.
5 - A cavidade pode ser de dimensões normais
6 - Pode originar-se de um
"Pneumosinus"
1 - Osso por toda parte; não há partes moles.
2 - Não desaparece à pressão.
3 - Parede óssea intacta.
4 - Origem lenta.
5 - Cavidade sempre dilatada.
6 - Jamais o inverso. "pneumosinus".
Não existe, em verdade, grande dificuldade diagnóstica entre as duas modalidades de proeminência frontal. Têm-se feito, no pneumosinus, pesquisas sobre a permeabilidade do canal nasofrontal, mas não foram conseguidas conclusões decisivas. Há casos de "pneumosinus" (Meyges, Röpke, Benjamins, Spencer Harrison, Meda, Schlosshauer, etc.) nos quais o ducto nasofrontal era obliterado por formações poliposas. Esta obliteração funcionava como válvula, o que é admitido por certos autores para explicar a protogenia do pneumosinus.
Após esta longa explanação, pode-se concluir que o diagnóstico do pneumosinus, aparentemente fácil, apresenta muitas dificuldades. O estudo radiográfico, com ou sem o emprego de líquidos de contraste, apenas permite perceber o tamanho das cavidades, sua transparência ou clareza, sua opacidade, a presença de liquido ou de lesões ósseas destrutivas nas paredes etc. Seu valor, mormente com o auxílio da tomografia, é, entretanto, total.
Pudemos perceber, em nossos casos, que os doentes apresentavam pneumatização exagerada dos ossos do crânio, mas isto não tinha nada a ver com as enormes cavidades dos sinus com pneumosinus, prova de que não há relação de causa a efeito entre o processo patológico e o mecanismo da pneumatização óssea fisiológica.
2 - A questão do sexo
As opiniões são unânimes no que diz respeito à presença quase exclusiva do pneumosinus em indivíduos do sexo masculino. Alguns autores consideram este fato característico da anomalia. Há casos, aliás raros, em que ela foi observada em mulheres. Em um dos nossos casos, tratava-se de um mulher. Tem, esta preferência do pneumosinus pelo sexo masculino, sido tomada como prova de sua origem glandular. Mas esta hipótese também se fundamenta no fato da localização quase exclusiva na parede anterior do sinus. E necessário pôr em evidência o problema endocrínico. Trataremos da questão em outra parte deste trabalho. Temos porém, necessidade de chamar desde logo a atenção para um fato de importância capital: há dois tipos de pneumosinus; 1) o que se desenvolve às custas da parede anterior do sinus e 2) o que tem por sede a parede posterior. O fato é de importância total, porque ele afasta uma das hipóteses etiológicas do pneumosinus. O sexo não pode ser considerado elemento diagnóstico digno de confiança. Se é verdade que a anomalia aparece mais freqüentemente no homem do que na mulher, este fato não possui senão valor muito relativo, no que concerne ao diagnóstico.
As hipóteses etiológicas
De acordo com Schlosshauer, há três hipóteses acerca da etiologia do pneumosinus: 1) hypertensão aérea por obliteração do ducto naso-frontal; 2) esvaziamento espontâneo de uma mucocele frontal; 3) desenvolvimento anormal da região frontal. Brüggemann apresenta ainda uma possibilidade: formação de gás por anaeróbios. Bourdial acrescenta outras causas, indicadas por outros autores: 1) traumatismo local e, principalmente, 2) distúrbios endocrínicos. Esta última hipótese parece a mais admitida nos trabalhos mais recentes. Parece muito pouco provável a primeira hipótese, a da hipertensão por ação obstrutiva de qualquer tipo de processo inflamatório. A suposição de uma mucocele que se rompeu espontaneamente. e deixou uma grande cavidade vazia, parece perfeitamente aceitável, mas apenas em alguns casos. As modificações do osso, resultante da mucocele, apresentam quase sempre aspecto que não se assemelha ao do pneumosinus, pelo menos na maioria dos casos. A terceira teoria não é uma hipótese etiológica, mas o próprio pneumosinus. Por que o osso frontal, isto é, o sinus frontal é sede desta anomalia? Qual deve ser a causa do fenômeno? Como explicar a pneumatização descontrolada, localizada tão somente em um sinus ou em parte de um sinus frontal? Se o processo oblitera o ducto em sua saída do sinus frontal ou em seu percurso. o doente sofrerá dores violentas cuja intensidade aumenta à medida que perdura a obstrução. Lembramo-nos de um caso de sinusite frontal aguda em que o doente, por causa da obstrução do canal naso-frontal, apresentava dores tão violentas, que os três primeiros médicos que o viram fizeram o diagnóstico de confusão mental: o doente gritava a plenos pulmões e rolava pelo soalho completamente fora de si. Tocando-lhe a fronte, foi provocada uma das crises e assim descoberta a causa do mal. O sinus frontal foi aberto e drenado por via nasal com uma lima de Vacher, o que deu saída a grande quantidade de pus muito espesso. A oclusão do canal nasofrontal deve sempre ser seguida de sintomatologia característica, principalmente de dores graváticas e é muito pouco provável que possa determinar dilatação óssea progressiva e lenta do tipo da do pneumosinus.
Já tratamos da segunda hipótese e não é possível fazer exclusão da probabilidade da existência de uma mucocele prévia, em alguns casos de pneumosinus. Mas não é possível admitir-se que a maioria dos casos da anomalia tenha por origem uma mucocele. Parece muito pouco admissível que o pneumosinus seja conseqüente a um traumatismo. É a hipótese que foi sugerida por Flottes e colaboradores em um caso de pneumosinus ethmoidalis. A presença de uma coleção gasosa resultante de infecção por anaeróbios parece igualmente muito discutível como causa do pneumosinus, em vista do aspecto agudo e da marcha clínica do processo. A maior parte dos autores, que se têm ocupado com o estudo da anomalia, admite como causa distúrbios endocrínicos. É uma questão muito complexa, que não pode ser concebida diante da variedade de tipos e do desenvolvimento caprichoso do processo. A pneumatização das cavidades nasais está sob a dependência, não somente do tecido de sustentação, como também da mucosa (Oltersdorf). Ela não passa de um processo muito complexo de desenvolvimento do crescimento ósseo, no qual interferem também vários outros tecidos (Bernfeld). A variabilidade da formação dos espaços aéreos seria a expressão do desenvolvimento individual, que se acha sob o comando da hereditariedade. Conhece-se a influência da hipófise sobre os órgãos de crescimento, particularmente sobre o sistema ósseo. As alterações de função desta glândula nos animais jovens causa retardamento no crescimento. É ainda Bernfeld quem assegura que "na verdade, em casos de acromegalia, acha-se uma alteração da pneumatização, no sentido da expansão dos sinus da face, mormente dos frontais. em conexão com o crescimento ósseo". Existe, segundo Zondek, uma acromegalia parcial, que, por exemplo, fica adstrita apenas aos sinus da face. Não padece nenhuma dúvida a respeito da ação das glândulas de secreção interna sobre as alterações hipertróficas do sistema ósseo. Há um fato bem conhecido: na acromegalia, os sinus da face assumem desenvolvimento excessivo. No que se refere especialmente ao desenvolvimento das cavidades pneumáticas e, em particular, dos sinus frontais, está admitido que o desenvolvimento da parede anterior está sob o controle da hipófise, pela ação do hormônio somatótropo. Se a glândula apresentar distúrbios por excesso, é possível o crescimento exagerado dos sinus frontais. Compreende-se, destarte, que a pneumatização descontrolada dos sinus frontais possa depender do hormônio hipofisário. A dificuldade está na explicação da causa do desenvolvimento dessas cavidades à custa da parede posterior, que não se acha sob a ação da hipófise, como também de uma apenas das cavidades frontais sofrer o processo de crescimento anômalo. Vimos na nossa Observação I haver um sinus frontal gigantesco e também agenesia de um dos sinus maxilares (o que é muito raro, desde Zuckerkandl). Bernfeld relata igualmente um caso de hipergenitalismo em uma mocinha de 17 anos com um sinus maxilar enorme e agenesia do frontal. Em nossa observação I deuse o contrário: um sinus frontal enorme e um maxilar ausente (do mesmo lado). "Como explicar um caso desse gênero?" - pergunta Bernfeld. em se referindo à sua observação. Mas, se está geralmente admitido que o desenvolvimento da parede anterior do sinus frontal está sob controle do hormônio somatótropo, também se assevera que o da parede posterior é condicionado pela própria massa encefálica. "A zona charneira situada entre o crânio e a face é considerada como receptor eletivo deste hormônio", (Bourdial), isto é, o somatótropo. É, pois, evidente que, nos casos de pneumosinus desenvolvidos às custas da parede posterior, não se pode admitir etiologia endocrínica, pelo menos hipofisária.
Do que foi exposto, chega-se à conclusão de que a causa ou às causas do pneumosinus continuam desconhecidas. Parece que uma causa local seria quase obrigatória, mas que causa poderia ser?
O distúrbio endocrínico não pode ser levado em consideração. Vimos dois casos de pneumosinus gigantesco em pacientes sem nenhum distúrbio hipofisário, tireóideo ou genital. Ao contrário, um deles apresentava certa deficiência hipofisária, embora discreta. A hipótese de manifestação hereditária ou familial, como parece haver na observação I, como de processo recessivo, apenas tornam a origem mais complexa. Não temos, portanto, até o momento, qualquer teoria capaz de explicar a causa ou as causas do pneumosinus frontalis dilatans.
SummaryPneumosinus frontalis dilatans is a condition little known by rhinologists. Differential diagnosis must be established.with frontal sinus hidrocele, mucocele, pneumatocele and with exagerated developed frontal sinus. The anomaly is more frequent in males and develops almost exclusively in the frontal sinus anterior wall, but there are some cases with pneumosinus formed by the posterior wall, it appeas usually after the 20 th year of age.
Symptoms are limite to frontal prominence and cephalalgia, not always present. Approximately sixty cases appear in the literature. Two new cases are presented: a 45 year old white female and a 22 year old colored male.
In order to ascertain whether the condition was hereditary, the four siblings of the woman, and the mother and the two brothers of the man were examined: two sons of the woman presented alterations in the frontal sinus posterior wall. Genetic study was made in the woman and her sons. She presented a caryotype with chromosomes type D with the little arm elongated. Diagnosis is not aiways easy and it is made through radiographic examination. Many supposed cases of pneumosinus werw spontaneously emptied mucoceles. Etiology is obscure, perhaps an hypophysarian trouble. Frontal bone anterior wall is under action of somatoprope hormone; but posterior wall is developed by action of encephalic mass. In this way, hypophysarian theory can not be accepted, particularly because the process is localized in only one of the frontal sinus. There is no proven etiology of pneumosinus frontalis dilatans.
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