ISSN 1806-9312  
Domingo, 28 de Abril de 2024
Listagem dos arquivos selecionados para impressão:
Imprimir:
1564 - Vol. 65 / Edição 5 / Período: Setembro - Outubro de 1999
Seção: Artigos Originais Páginas: 380 a 383
Anatomia Cirúrgica da Lâmina Crivosa do Etmóide.
Autor(es):
João A. C. Navarro*;
Jesus C. Andreo**;
Paulo L. Navarro***;
Ricardo L. Navarro****.

Palavras-chave: osso etmóide; lâmina crivosa; fossa anterior do crânio

Keywords: ethmoid bone; cribiform plate; anterior cranial fossa

Resumo: Introdução: A lâmina crivosa do osso etmóide (LCE) é uma das regiões mais frágeis da junção craniofacial, sujeita a traumas acidentais e cirúrgicos freqüentes, além de invasões tumorais e comunicações espontâneas, com extravazamento de líquor cefaloraquidiano, através das fístulas liquóricas. Objetivo: O propósito deste trabalho é contribuir para o melhor conhecimento da localização anatômica da lâmina crivosa do osso etmóide, na prevenção das fístulas liquóricas. Material e Método: Através de medidas diretas e ao RX, das distâncias entre a lâmina crivosa, lâmina orbital do frontal (LOF) em 20 crânios macerados e 10 cabeças de indivíduos adultos, de ambos os sexos, formolizadas a 10%, obtiveram-se os seguintes resultados em média: distâncias (LCE/LOF), diretas e radiográficas em crânios, foram 15,0 mm e 16,7 mm e, em cadáveres, 16,4 mm e 15,0 mm respectivamente. Conclusão: A distância LCE,/LFO pode variar, com freqüência, em função da presença de expansões celulares supraorbitais; porém, a localização anatômica da LCE é bastante estável.

Abstract: Introduction: The cribiform plate of the ethmoid bone, in the craniofacial region, is an area of great surgical risk. Surgical and accidental traumas and tumoral pathologies are frequent in the interorbital space. Expontaneous cerebrospinal rhinorrhea is observed in the ethmoidal and sphenoidal parts of the nasal roof. Purpose: The aim of this study was to contribute to the knowledge of the ethmoid bone's cribiform plate localization, to prevent surgical risk and avoid cerebrospinal rhinorrhea. Material and Methods: In the direct and radiographic observations of 20 skulls and 10 formalized heads, mensurations were made of distances between the ethmoid bone's cribiform plate (CPE) and the frontal bone's orbital plate (OPF). Conclusion: The direct and radiographic mensuration range of the skulls were 14.0 mm and 14.5 mm of the heads were 15.0 mm and 20.5 mm, respectively. The CPE/OPF distance depends on ethmoidal cells expantion into the orbitonasal spaces but the CPE anatomical localization is very stable.

INTRODUÇÃO

Concentra-se no etmóide, especial na sua lâmina crivosa, a região mais frágil da transição craniofacial. Essa delgada lâmina óssea apresenta uma superfície endocranial voltada para a fossa anterior do crânio; e, outra, exocranial, que participa do teto da cavidade do nariz1, 5, 6, 7, 10, 13, 16, 11.

Anatomicamente, a lâmina crivosa dispõe-se ao redor e posteriormente á crista galli, como uma ferradura, próximo ao plano horizontal (Figura 2). De constituição delgada e frágil,
e toda perfurada pelos forames crivosos, em número aproximado de 20. Sua forma e dimensão variam em função do tipo crânio e sexo, além de estar sujeita à compressão e sobreposição por células etmoidais, que podem se avolumar e estender-se sobre a lâmina crivosa e a órbita, modificando o espaço interorbital e, conseqüentemente, sacrificando o espaço reservado aos bulbos olfatórios. A crista galli pode, com relativa freqüência, ser pneumatizada por uma ou mais células etmoidais5, 6, 7, 15, 16, 19, 11.

O fato anatômico de a dura-máter da fossa anterior do crânio evaginar-se da superfície cranial para os forames crivosos, acompanhando as respectivas terminações vasculares e nervosas, viabiliza uma comunicação que, embora microscópica, pode, espontânea ou patologicamente, tornar-se veículo de drenagem craniofacial, com extravasamento de líquor cefalorraquidiano, resultando em fístula liquórica (rinoliquorréa), além da disseminação de patologias para e do espaço encefálico. A literatura refere à drenagem liquórica para linfonodos nasais e retrofaríngeos, através da lâmina crivosa do etmóide17, 3, 9, 7, 14, 15, 16, 11.

Diante das variáveis anatômicas que podem ocorrer em função dos fatores acima, propôs-se um estudo osteológico e em cadáveres, para contribuir ao melhor conhecimento da forma, disposição e relações anatômicas dessa importante lâmina.

MATERIAL E MÉTODO

Na realização desse trabalho foram utilizados 10 cabeças formolizadas e 30 crânios macerados, fios ortodônticos, paquímetro (Maub), filmes radiográficos e aparelho de raios X odontológico.

Os fios ortodônticos foram posicionados conforme as Figuras 1, 3 e 4. Em seguida, foram realizadas medições diretas das distâncias da lâmina crivosa ao fio tangente à lâmina orbital do frontal (LCE/LOF-direta), utilizando-se o paquímetro (Figura 5). Na seqüência, foram esfetuadas radiografias com incidência póstero-anterior das cabeças e dos crânios, já com os fios posicionados. Com base nos resultados radiográficos (Figura 6), foram tomadas as medidas das distâncias da lâmina crivosa ao fio tangente à lâmina orbital frontal (LCE/LOF-raios X).



Figura 1. Representação esquemática dos fios ortodônticos posicionados em relação à lâmina crivosa do etmóide (LCE) e a lâmina orbital do frontal (LOF).



Figura 2. Fossa anterior do crânio, óssea: 1. lâmina orbital do osso frontal; 2. forame cego; 3. fóvea etmoidal; 4. crista galli; 5. lâmina crivosa do osso etmóide; 6. asa menor do osso esfenóide; 7. forame óptico; 8. processo clinóide anterior.



Realizou-se análise dos dados obtidos, através da comparação das médias, valores mínimos e máximos obtidos entre cabeças formolizadas e crânios macerados.

RESULTADOS

Através de medidas diretas em crânios e cadáveres (Figuras 3,4 e 5), a altura da lâmina crivosa (LCE), em relação à lâmina orbital do frontal (LOF), apresentou valores mínimos de 9,0 mm e 10,0 mm; máximos de 19,0 mrn e 20,0 min, respectivamente. Radiograficamente (Figura 6), os valores foram 12,0 mm e 14,0 mm mínimos; 21,0 mm e 27,0 mm máximos, respectivamente.



Figura 3. Fossa anterior do crânio, óssea, com fios ortodônticos apoiados: 1. na lâmina orbital do frontal; 2. no forame cego; 3. na lamina crivosa do etmóide; 4. asa menor do esfenóicle; 5. processos clinóides anteriores.



Figura 4. Fossa anterior do crânio de cadáver, revestida pela duramáter: posicionamento elos fios ortodônticos idêntico ao da Figura 3, para as observações diretas e radiográficas. l. lâmina orbital cio frontal (I.OF); 2. forame cego; 3. lâmina crivosa cio etmóide (LCE).



Figura 5. Fossa anterior do crânio, revestida pela dura-máter: haste do paquímetro apoia-se na lâmina crivosa (3) e no fio ortodôntico sobre a lâmina orbital do frontal (1), para medir a distância LCE/LOF; 2. fio ortodôntico introduzido no forame cego (apoio).



Figura 6. Imagem radiográfica póstero-anterior (PA) cio crânio ósseo: fios ortodônticos sobre a lâmina crivosa do etmóide (1), sobre a lâmina orbital do frontal (2) e introduzido no forame cego (3).


Quanto às médias, não houve diferença significaste em relação aos lados. Nas medidas diretas e os RX da relação LCE/ LOF, em crânios, observaram-se 14,0 mm e 14,5 mm e nos cadáveres, 15,0 mm e 20,5 mm, respectivamente.

DISCUSSÃO

A delgada e frágil lâmina crivosa do etmóide é a parte central desse osso, juntamente com sua lâmina perpendicular e a crista galli, conectando as suas duas porções laterais, denominadas complexo, labirinto ou "massas" laterais do etmóide, totalmente pneumatizadas pelas células etmoidais. A lâmina crivosa, em forma aproximada piramidal ou retangular, às vezes muito alongada, mas freqüentemente mais regular, de 12,0 a 25,0 mm, em média, dispõem-se em "ferradura" ao redor da crista galli, envolvendo-a latero-posteriormente. É toda perfurada por minúsculos forames crivosos, em número aproximado ele 20, distribuídos regularmente e, em sua maioria, aos lados da crista galli. Por eles, as terminações dos nervos olfatórios, originadas na mucosa pituitária ou olfatória, nos níveis mais superiores da cavidade do nariz, alcançam os bulbos olfatórios, alojados nos sulcos ou lojas olfatórias, sobre a lâmina crivosa do etmóide. A dura-máter forra essas lojas e se projeta nos forames crivosos, como minúsculos tubos, envolvendo cada terminação olfatória1, 5, 6, 7, 15, 11. Sabe-se que os pedículos vasculonervosos etmoidais, que chegam por lateral e posterolateral da lâmina crivosa, atravessam-na em direção à cavidade do nariz, bilateralmente, também envolvidos pelos prolongamentos da dura-máter, mas o fazem por forames individuais, separados daqueles que conduzem as terminações olfatórias. Autores referem à passagem de canalículos linfáticos por esses fórames, drenando em direção à cavidade do nariz e à lateral e retrofaringes5,10,14,15,16,11.

Nos idosos e senis, os forames crivosos em geral podem torna-se mais amplos, viabilizando o extravazamento do líquor para a cavidade do nariz, como fístulas liquóricas espontâneas5,10,14,15,16,11.

Diante da fragilidade natural da lâmina crivosa do etmóide, a sua resistência mecânica aos traumas cramofaciais e as invasões tumorais é muito pequena, reforçada em muito pela própria dura-máter e pelo periósteo e mucosa do teto da cavidade do nariz. A literatura refere à presença de forames crivosos no recesso frontal, em função de prolongamento anterior da lâmina crivosa do etmóide (Stopka, apud Lawson)6.

As células etmoidais anteriores apresentam, com freqüência, expansões de suas paredes superiores e laterais em direção à fossa anterior do crânio e as órbitas, respectivamente. Nestes casos, as células etmoidais ultrapassam o plano da lâmina crivosa, o que pode ser facilmente observado em cortes tomográficos coronais. Esse desnível denominado "fóvea etmoidal", pode variar muito com médias de 5,0 mm, 5,9 mm e de 16,0 mms5, 6, 18. Nesse trabalho, as medidas referem-se à distância entre a lâmina crivosa do etmóide e a lâmina orbital do frontal (LCE/LOP), na qual está incluída a fóvea etmoidal.

Além desse tipo de expansão cranial, as células também podem crescer na direção do plano medial, da crista galli, reduzindo os espaços das lojas olfatórias5, 15, 19, 11. São freqüentes deiscências das paredes craniais das células etmoidais, em especial nos casos de expansões celulares etmoidais muito acentuadas2, 7, 10, 12, 13, 15, 16, 19,11.

CONCLUSÃO

A lâmina crivosa (LCE) é uma formação anatômica relativamente estável, não apresentando diferenças quanto à localização no plano axial, segundo os lados direito e esquerdo.

A altura da lâmina orbital do frontal (LOF) em relação à lâmina crivosa do etmóide (LCE) é variável, devido à freqüência de expansões celulares entre elas.

As médias das distâncias LCE/LOF foram: diretas em crânios, 14 mm e em cadáveres, 15 mm; indiretas (RX), em crânios, 14,5 mm e, em cadáveres, 20,5 mm.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. ALYEA VAN, O. E. - Nasal sinuses:: An anatomic and clinicai consideration. Baltimore, Williams and Wilkins, 1951.
2. BAGATELLA, F.; GUIRALDO, C.R. -The etmoidal labyrinth. An anatomical and radiologic study. Acta Otonrinolaryngol., 403, p.1-19, 1983.
3. HIRSCH, O. - Sucessful closure of cerebrospinal fluid rhinoa hes by endonasal surgery. Arcb. Otolaryngol, 56, p.1-12, 1952.
4. KAINZ, J & STAMMBERGER, H. - The roof of the anterior ethmoid: A place of least resistênce in the skull base. Arnericam Journal of Rhinology., 3(4), p.191-199, 1989.
5. LANG, J.; BRESSEL, S.; PAHNKE, J. - Sphenoidal sinus, clinical anatomy of the aprroaches to the hippophyseal region. Gegenbaurs Morpbologisc Jahrbuch., 134, p. 291-307, 1988.
6. LAWSON, W. -The intranasanasal ethmoidectomy: Evolution and an assessement of the procedure. Laryngoscope, 104(6), Suplemento 64, 1994.
7. MATTOX, D. E. et al. - Anatomy of the ethmoid sinus. Otol. Clin. of North America, 18(1), p. 3-14, 1985.
8. MELONI, F.; MINI, R.; ROVASIO, S.; STOMEO, F.; and TEATIN, G. P. - Anatomic variations of surgical importance in ethmoid labyrinth and sphenoid sinus. A study of radiological anatomy. Surg. Radiol. Anat. 14: 65-70, 1992.
9. MONTGOMERY, W. W. - Cerebrospinal rhinorrhea. Otolaryngol. Clin. Norih. Am., 6 p.757-71, 1973.
10. MOSHER, H. T. - The surgical anatomy of the etmoidal labyrinth. Annals Otology Rhinology Laryngology, 18(4), p.870-901, 1929.
11. NAVARRO, J. A. C. - Cavidade do Nariz e Seios Paranasais. Bauru, All Dent, 1997.
12. OHNISHI, T. - Bony defects and dehiscences of the roof of the ethmoid cells. Rhinology., 19, p.195-202, 1981.
13. OHNISHI, T. et al. - Endoscopic microsurgery of the ethmoid sinus. Am. J. Rhinol., 4, p.119-27, 1990.
14. ROUVIÉRE, H. -Anatomie des lymphatiques de l homme. Paris, Masson,1932.
15. SIEUR, C. & JACOB, O. -Recherches anatomiques, cliniques et opératoires sur les fosses nasales et leurs sinus. Paris, Rueff, 1901.
16. STAMM, A. C. -Microcirurgia naco-sinusal. Rio de Janeiro, Revinter, 1994.
17. STAMM, A.; MEKHITARIAN-NETO; L.; BRAGA, F. M.; SOUZA, H. L. - Microcirurgia transnasal no tratamento da rinoliquorréia. Rev. Bras. de Otorrinolaringologia, 58(3), p. 176-84, 1992. 18. TESTUT, L. - Traité d'anatomie humaine. v.2, Paris, Libraire Octave Doin, 1921.
19. VIDIC, S. B. - Extreme development of the paranasal sinuses. Ann. Otol., 78: 1291-98, 1969.




*Professor Titular da Disciplina de Anatomia da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo.
**Professor Doutor da Disciplina de Anatomia da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo.- Médico- R2, do Instituto Penido Burnier, Campinas /SP.
***Acadêmico da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo.

Endereço para correspondência: Prof. Dr. João A. C. Navarro -Disciplina de Anatomia
Faculdade de Odontologia de Bauru - Universidade de São Paulo - Alameda Dr. Octávio P. Brisola, 9-75 - 17043-101 Bauru /SP. Telefone: (014) 235-3226 - E-mail: jnavarro@usp.br

Artigo recebido em 1- de junho de 1999. Artigo aceito em 9 de agosto de 1999.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


Imprimir:
Todos os direitos reservados 1933 / 2024 © Revista Brasileira de Otorrinolaringologia