IntroduçãoA doença de Paget é uma enfermidade crônica e progressiva, incidindo na população acima de 40 anos de idade, com etiologia ainda indeterminada. Segundo Rosenkantz (apud Robbins, 9); é encontrada na proporção de um em cada mil pacientes internados em hospital geral.Caracteriza-se por uma fase inicial lítica (Fig. 1), superposta por uma fase esclerótica de intensa proliferação óssea, resultando em um osso deformado e fraco (Fig. 2). É notável que o osso normal seja substituído por tecido osteóide pobremente calcificado, mole e dilatado. O tecido mole recém-formado e o osso malformado compensam em volume o processo de reabsorção e determinam o aumento de tamanho do mesmo. Apesar do aumento de volume, os ossos são muito leves, moles e porosos e possuem a consistência de pão seco (Robbins, 9).
Figura 1 - Lesão lítica inicial da doença de Paget - osteoporose circunscrita.
Figura 2 - Doença de Paget avançada do crânio. Aspecto de `flocos de algodão; espessamento da drploe; retificação dos rochedos.
Incidência
Acomete principalmente o esqueleto axial, comprometendo o crânio (ossos temporais) em 2/3 dos pacientes. Em ordem decrescente de freqüência, os ossos mais atingidos são a pelve, os ossos do crânio, fêmur, coluna, tíbia, úmero, escápula e ocasionalmente outros ossos, inclusive a mandíbula. Quanto à localização, a doençá pode ocorrer sob duas formas: monostótica ou localizada e poliostótica ou generalizada.
A tíbia é o local de predileção da primeira forma e a pelve e o sacro são os primeiros ossos atingidos na forma generalizada. Mesmo nesta forma (poliostótica) a totalidade do esqueleto é raramente atingida.
Há interesse no estudo da doença de Paget no crânio e sobretudo nos ossos temporais porque estes abrigam os órgãos da audição e equilíbrio, que também sofrem com as alterações típicas desta enfermidade.
Material e métodosForam examinados 15 pacientes portadores da doença de. Paget com e sem queixas audiológicas e analisados 30 ossos temporais nos seus aspectos clínico, audiométrico e radiológico (incidências em AP e perfil do crânio, transorbitárias de Guillen, Schuller I e 11, Chaussé-Stenvers, Bretton e tomografias hípocícloídais em AP) (Figs. 3 e 4).
Figura 3 - Foco de esclerose na região inferior do CAI (conduto auditivo interno).
Figura 4 - Foco de condensação na região superior e posterior da cóclea, com irregularidade e espessamento da mesma.
ResultadosNos pacientes examinados houve predominância do sexo masculino (oito homens e sete mulheres) e - a idade variou de 32 a 81 anos, Observou-se que a maioria dos pacientes (ó4%) apresentavam queixas audiológicas (plenitude auricular, autofonia, zumbido e hipoacusia) e vestibulares (vertigem), embora com pequena alteração ao exame otoscópico (Quadro 1).
Houve predominância de disacusia neurossensorial (40%), seguida por disacusia mista (33%), sendo nestas constantemente observado o "GAP" aéreo-ósseo (20 dB) nas freqüências graves (500 - 1000 Hz). Na impedanciometria predominou a curva tipo A (57%), seguida pelo tipo C (36%) (Quadro 2).
As manifestações radiológicas da doença de Paget no crânio foram semelhantes às encontradas em todos os outros ossos quando acometidos.
Inicia-se com uma fase lítica que ocorre principalmente no occipital e frontal, denominada osteoporose circunscrita (Fig. 1).A essa fase segue-se o aparecimento de focos de condensação, dando ao crânio a aparência de "flocos de algodão" (Fig. 2).
O envolvimento dos ossos temporais foi bilateral na maioria dos nossas Casos. Um achado comum foi a rotação dos rochedos em torno do seu eixo e retificação dos mesmos (93%) (Fig. 2).
Quadro 1 - Exame clínico
Quadro 2
No início da enfermidade, com a predominância da fase lítica, observou-se uma melhor distinção dos canais semicirculares e cóclea nas radiografias (16%).
Em fase mais avançada, as estruturas do ouvido interno já não eram tão bem evidenciadas, com vários focos de osteocondensação que predominaram na região retrococlear, entre o bordo inferior do conduto auditivo interno e o forame carotídeo (66%). Com o avanço acentuado da doença, as estruturas do ouvido interno podem estar completamente borradas, tornando muito difícil o seu exame.
Na cadeia ossicular observamos também focos de esclerose óssea com má definição dos ossículos (46%).
É importante assinalar que as estruturas acometidas tinham lesões mistas (líticas e escleróticas) e o comprometimento era no mesmo osso.
Chamamos a atenção para a precocidade dos achados radiológicos em relação aos sintomas clínicos. Temos como exemplo os pacientes sem queixas de natureza vestibular mas com alterações radiológicas do bloco labiríntico, assim como outros que apresentavam exame audiométrico normal mas com comprometimento radiológico inicial do ouvido interno e médio.
Os achados radiológicos, assim como o exame clínico e audiométrico reafirmam as descrições de vários estudiosos no assunto, como Garfield Davies (5) e George Nager (8).
ConclusãoA doença de Paget (osteíte deformante) é uma enfermidade óssea crônica e progressiva que afeta principalmente a população acima de 40 anos, sendo os homens os mais freqüentemente acometidos.
Quadro 3 - Aspectos radiológicos encontrados no crinio e ossos temporais
Compromete o crânio, com envolvimento acentuado dos ossos temporais em 2/3 dos casos. "As alterações consistem essencialmente em reabsorção e amolecimento, seguido de substituição por matriz osteóide pobremente calcificada, acompanhada por fibrose considerável" (Robbins, 9).
0 comprometimento progressivo do osso temporal resulta em alteração de posição, aumento de tamanho e mudança na arquitetura da pirâmide petrosa, conduto auditivo externo e ouvido médio.
Estas mudanças podem produzir distúrbios vestibulares (vertigem) e(ou) cocleares (hipoacusias, zumbidos, plenitude auricular e autofonia).
SummaryThe authors study 15 patients and match them with those afecied by Paget's disease, described in the world literature. Thirthy temporal bones are seen in their clínical, radiological anil audiometric paterns.
Referências1. APPLEBAUM, E.L. - Temporal bone histopatology of Paget's disease with sensorioneural hearing loss and narrowing of CAI. Laryngoscope, 87: 19.753, 1977.
2. ASHLEY, M.M. - Paget's disease and heredity. Amer J. Hum. Genet, 1.394, 1949.
3. AVIOLI, L.V. - Paget's disease (osteitis deformans). Cecil Textbook of Medicine, 2.257, 1979. 4. DAVIES, D. - Paget's disease of temporal bone. A clinical and histopathological survevy. Acta Otolaryng. (Suppl.), 242, 1968.
5. DAVIES, D. - The temporal bone in Paget's disease. J. Laryng, 84: 553, 1970.
6. DOYLE, F.H. - Radiologïc observations on bone resorption in Paget's disease. Arthritis Rheum, 23: 1.205, 1980.
7. FRIEDMAN - Paget's disease. Pathology of Ear, 1974.
8. NAGER, GT. - Paget's disease of temporal bone. Ann. Otol. Rhinol. LaryngoL, 84, 1975.
9. ROBBINS, S.L. - Osteíte deformante (Doença de Paget). Patologia Estrutural e Funcional, 1.305, 1974. 10. SHUKNECHT, H. - Paget's disease.Pathology of the ear, 374, 1974.
11. STEPHEN, M.K. - Paget's disease of bone. Harrinson's Principles of Internal Medicine, 1.860, 1980. 12. VIGNAUD, J. - Maladie de Paget.
Trabalho realizado no Hospital Universitário Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
1 - Médico Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário - UFRJ
2 - Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário - UFRJ
3 - Médica Residente do Serviço de Radiodiagnóstico do Hospital Universitário - UFRJ
4 - Médico - Staff do Serviço de Radiodiagnóstico do Hospital Universitário - UFRJ