ISSN 1806-9312  
Sábado, 23 de Novembro de 2024
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1459 - Vol. 65 / Edição 2 / Período: Março - Abril de 1999
Seção: Relato de Casos Páginas: 167 a 170
Granuloma de Células Gigantes de Seio Maxilar: Relato de Um Caso.
Autor(es):
Guilherme Franche*,
Marinez B. Barra**,
Luís Hauth***,
Jaime L. Arrarte****,
Adriana de Carli****,
Fernanda Peduzzi*****

Palavras-chave: granuloma de células gigantes, seio maxilar, seios paranasais

Keywords: giant cell granuloma, maxillary sinus, paranasal sinuses

Resumo: O gronuloma de células gigantes é uma lesão benigna e rara, que acomete preferencialmente a mandíbula e a maxila, podendo ser localmente agressiva e resultar em grande destruição tecidual em casos avançados. Neste artigo é apresentado um caso de granuloma de células gigantes no seio maxilar de uma paciente jovem, que foi manejado cirurgicamente através de uma maxilectomia parcial. Os autores ressaltam os principais aspectos dessa doença através de uma revisão bibliográfica.

Abstract: Giant cellgranuloma is a benign and rare lesion that generally involves the mandíbule and maxilla, may be locally aggressive and result in extensive tissue destruction in advanced cases. In this article, the authors reported a case of giant cell granuloma in the maxilar sinus in a young patient, that was surgically treated by a partial maxillectomy. The authors show the main aspects of this disease by a literature review.

INTRODUÇÃO

O termo granuloma de células gigantes (GCG) foi utilizado inicialmente por Jaffe, em 1953, para designar uma lesão benigna que afetava a mandíbula e que era, histologica e clinicamente, diferente do tumor verdadeiro de células gigantes encontrado nos ossos longos¹. Ele afirmava que a lesão não era uma neoplasia verdadeira; e, sins, uma reação reparativa à hemorragia, havendo uma relação com o trauma mecânico.

A partir deste relato inicial, várias séries de pacientes com essas lesões têm sido descritas, não só envolvendo a mandíbula, como também outras regiões do crânio (maxilar, células etmoidais, temporal, esfenóide, frontal e cavidade orbitária)2-7.
O objetivo deste artigo é descrever um caso de GCG no seio maxilar e células etmoidais numa paciente adulta jovem, e discutir os principais tópicos desta doença.


APRESENTAÇÃO DE CASO CLÍNICO



Figura 1. Tomografia computadorizada de seios paranasais, em corte coronal, demonstrando lesão insuHativa ocupando fossas nasais, seio maxilar direito e células etmoidais.



Paciente do sexo feminino, branca, com 29 anos de idade, natural de Rio Pardo /RS e procedente de Porto Alegre, consultou no Serviço de Otorrinolaringologia do CHSCPA com queixas de obstrução nasal unilateral à direita há três meses, acompanhada de edema palpebral e cefaléia fronto-parietal. Referia também abaulamento na fossa nasal direita e emagrecimento de 4 a 5 kg em três meses. Na história patológica pregressa referia trauma cranioencefãlico há três anos. No exame físico evidenciou-se a presença de lesão vegetante, violácea, de superfície irregular, sangrante à manipulação, ocupando toda fossa nasal direita. A lesão deslocava o septo nasal para a esquerda.

Realizou-se estudo tomográfico computadorizado dos seios paranasais, verificando-se um processo expansivo, insuflativo, com grânulos calcificados em seu interior ocupando fossa nasal direita, seio maxilar e células etmoidais com invasão da órbita direita (Figuras 1 e 2). A biópsia incisional foi interpretada como granuloma reparativo de células gigantes. Os exames complementares estavam dentro dos padrões da normalidade (cálcio, fósforo e palato hormônio séricos, provas de função tireõidea e Rx simples de mãos).

Foi realizada uma maxilectomia parcial direita. Durante o transoperatório, observou-se que o tumor apresentava um plano de clivagem junto aos tecidos sadios; porém, invadia o assoalho da órbita direita, que não pôde ser preservado (Figura 3). Manteve-se o palato duro, que estava livre de doença. O exame anátomo-patológico da peça cirúrgica confirmou o diagnóstico de GCG (Figura 4).

O pós-operatório transcorreu sem anormalidades. Após dois anos de seguimento ambulatorial, não se observou sinais de recidiva.



Figura 2. Tomografia computadorizada, em corte axial, demonstrando invasão da órbita direita. Observam-se septações no interior da massa tumoral.



COMENTÁRIOS FINAIS

Atualmente, há controvérsia em relação à expressão granuloma reparativo de célulasgigantes para descrever estas lesões que geralmente acometem o esqueleto craniofacial. As lesões não são granulomas do ponto de vista histológico e clínico e não são reparativas, demonstrando um comportamento neoplásico. Stolovitzky e colaboradores sugerem designa-Ias como lesões de células gigantes8.

Os GCG podem ser centrais, quando se originam diretamente cio osso, ou periféricos, quando se originam dos tecidos moles adjacentes4,9. Histologicamente, estes dois tipos não diferem. Mighell e colaboradores descrevem que os GCG cio tipo periférico são mais freqüentes que os do tipo central; porém, outros estudos não confirmam esta afirmação10.



Figura 3. Peça cirúrgica após remoção por maxilectomía parcial direita. A ponta da tesoura destaca o assoalho da órbita.



Figura 4. Células gigantes (setas) agrupadas ao redor de focos de hemorragia e envoltas em uni estroma ricamente vascular.



Estas lesões são vistas geralmente em jovens, sendo que, em uma série de 18 pacientes, mais da metade tinha idade inferior a 15 anos11. As mulheres parecem ser mais afetadas que os homens4,5,7,9,11.

A etiologia dos GCG é incerta. Jaffe havia citado o trauma como um fator desencadeante, o que não pôde ser demonstrado em outras séries1,4,6,11. No presente caso há citação, por parte da paciente, de um trauma facial contuso e grave causado por atropelamento; porém, este pode ser um achado circunstancial. Outros fatores etiolõgicos incluem distúrbios hormonais (gravidez, estrogenioterapia), hiperparatireoidismo e lesão da membrana periodôntica6,11. Os sintomas dependem do sítio inicial da lesão. Os sintomas mais comuns são: aumento de volume, lento e indolor, podendo causar deformidade facial, epistaxe, obstruçào nasal e perda ou deslocamento dentário. Entretanto, Andersen e colaboradores relatam uma série de 32 pacientes em que 30 eram assintomáticos12.

Os exames radiológicos demonstram alguns padrões específicos; porém, não- são patognontônicos do GCG. Na tomografia computadorizada parece haver dois padrões radiológicos distintos: (a) uma tesão osteolítica unilocular e (b) uma lesão multilocular cursando com septações osteõides no seu interior 7.

A histiopatogênese dos GCG parece ser do sistema mononuclearfagocitário segundo estudos imuno-histoquímicos de Carvalho e colaboradores13. Parece haver dois componentes principais: células mononucleares no estroma e células gigantes multinucleadas. As células mononucleares apresentam uma distribuição coesa, com núcleos ovóides, com citoplasma moderado e bordos celulares indistintos. As células multinucleadas estão intimamente associadas às mononucleares e mais presentes nas bordas do fragmento tecidual. Os núcleos são redondos e maiores nas células mononucleares; porém, com o mesmo padrão de cromatina. O número de núcleos pode variar de 5 a 40. O citoplasma apresenta-se amplo e denso. Alguns macrõfagos e células inflamatórias podem estar presentes no estroma14.

O diagnóstico diferencial dos GCG deve ser realizado principalmente com o tumor marrom do hiperparatireoidismo e com o tumor verdadeiro de células gigantes. O hiperparatireoidismo pode ocasionar lesões osteolíticas, clínica e histologicamente, indistinguiveis do GCG. Desta maneira, recomenda-se, como avaliação laboratorial completa, a investigação dos níveis urinários e séricos de cálcio, fósforo, AMPc, radioimunoensaio para parato-hormônio, fosfatase alcalina sérica e pesquisa de hidroxiprolinúria 4,15.

Os tumores de células gigantes (TCG) ou osteoclastomas ocorrem mais freqüentemente nas epífises dos ossos longos. O fêmur distal, a tíbia proxitnal e o rádio distal são os sítios de aproximadamente 60% dos casos 8. O TGC é caracterizado pela natureza agressiva com recorrência freqüente após excisão local e potencial para metastatização. Histologicamente, a atividade osteogênica, hemorragia, células inflamatórias e estromafibroso são menos proeminentes que no GCG. Entretanto, Stolovitzky e colaboradores salientam que o GCG e o TCG parecem ser um continuum de uma mesma entidade patológica 8.

O tratamento primário é eminentemente cirúrgico e a técnica é definida em função do sítio e do tamanho da lesão. As lesões mandibulares são geralmente tratadas com excisão local, curetagem e até mandibulectomia parcial com reconstrução a partir ele enxerto de osso ilíaco. As lesões maxilares podem ser tratadas com simples excisão local até maxileetomia, como neste caso 5,11. A recorrência das lesões varia entre 10 e 15%; entretanto, os GCG localmente agressivos têm um índice de recidiva maior 9. Nos raros casos em que a excisão completa da lesão não pode ser conseguida, pode se adicionar radioterapia após a cirurgia. Entretanto, deve se ter em mente que pode haver transformação sarcomatosa 4,5. Harris descreve bons resultados em três pacientes tratados com 0,5 mg (100 UI) de calcitonina sintética humana, via subcutânea, diariamente, por no mínimo um ano 15.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. JAFFE, H. L. - Giant cell reparative granuloma, traumatic bone cyst and fibrous ( fibro-osseous ) dysplasia of the jaw bones. Oral Stir Oral Med. Oral Pathol., 6.159, 1953.
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3. FRIEDBERG, S. A.; EISENSTEIN, R; WALLNER, L. J. - Giant cell lesions involving the nasal acessory sinuses. Laryngoscope, 79: 763, 1969.
4. CIAPPETTA, P.; SALVATI, M.; BERNARDI, C.; RACO, A.; DI LORENZO, N. - Giant cell reparative granuloma of the skull base mimicking an intracranial tumor. Surg. Neurol., 33: 52, 1990.
5. POTTER, B. J.; TINER, B. D. - Central giant cell granulomal: Report of a case. Oral Sur Oral Med. Oral Pathol., 75:286, 1993.
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10. MIGHELL, A. J.; ROBINSON, P. A.; HUME, W. J. - Peripheral giant cell granuloma: a clinical study of 77 cases from 62 patients, anda literature review. Oral Dis., 1: 12, 1995.
11. TALLAN, E. M.; OLSEN, K. D.; MCCAFFREY, T. V.; KRISHNAN UNNI, K.; LUND, B. A. - Advanced giant cell granuloma: A twenty-year study. Otolaryngol. Head Néck Surg., 110: 413, 1994.
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13. CARVALHO, Y. R.; LOYOLA, A. M.; GOMEZ, R. S.; ARAUJO, V. C. - Peripheral giant cell granuloma. An immunohistochemical and ultrastructural study. Oral Dis., 1: 20, 1995.
14. KAW, Y. T. - Fine needle aspiration cytology of central giant cell granuloma of the jaw: A report of two cases. Acta Cytol., 38: 475, 1994.
15. HARRIS, M. - Central giant cell granulomas of the jaws regress with calcitonin therapy. Br. J. Oral. Maxilofac. Surg., 31: 89, 1993.




*Médico do Serviço de Otorrinolaringologia do Complexo Hospitalar Santa Casa de Porto Alegre (CHSCPA).
**Professora Auxiliar de Anatomia Patológica do Departamento de Patologia da Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCMPA).
*** Cirurgião de Cabeça e Pescoço do Hospital Santa Rita do CHSCPA.
****Médico(a) Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do CHSCPA.
*****Médica Estagiária do Serviço de Otorrinolaringologia do CHSCPA.

Trabalho apresentado na VIII Jornada Sul-Brasileira de Otorrinolaringologia, em Canela /RS, em 31 de maio de 1997. Instituição: Complexo Hospitalar Santa Casa de Porto Alegre - Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (CHSCPA- FFFCMPA). Endereço para correspondência: Jaime L. Arrarte - Rua Quintino Bocaiúva, 673 - Moinhos de Vento - 90440-051 Porto Alegre /RS. E-mail: arrarte@voyager.com.br Artigo recebido em 21 de julho de 1998. Artigo aceito em 13 de outubro de 1998.
Indexações: MEDLINE, Exerpta Medica, Lilacs (Index Medicus Latinoamericano), SciELO (Scientific Electronic Library Online)
Classificação CAPES: Qualis Nacional A, Qualis Internacional C


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