ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA
Secção de Oto - nino - laringologia. Sessão de 17 de Abril de 1933
Presidida pelo Dr. Schmidt Sarmento e secretariada pelos Drs. Homero Cordeiro e Raphael da Nova, realisou-se a 17 de Abril a sessão mensal da Secção de Oto-rino-laringologia da Associação Paulista de Medicina.
No expediente, pede a palavra o Dr. Rebello Neto para se congratular com a secção pelo acrescimo de um departamento de "Cirurgia Plástica" ao Ambulatorio de Oto-rino-laringologia da Santa Casa de S. Paulo, Serviço do Dr. Schmidt Sarmento, e pelo facto tambem de ser o primeiro serviço desse molde inaugurado no Brasil. Em seguida o Dr. Mario Ottoni de Rezende usa da palavra para anunciar á casa, que já está concluido o seu relatorio sobre o têma escolhido pela Secção, para o proximo Congresso da Associação Paulista de Medicina, desejando apresenta-lo á apreciação dos colegas e certificar-se, se bem interpretou a incumbencia que lhe foi confiada; mas, para não interromper os trabalhos, lerá o referido relatorio no fim da sessão.
ORDEM DO DIA
DR. MANGABEIRA ALBERNAZ (Campinas) - "De algumas localisações raras de miíases".
Resumo: O A. estabelece uma classificação clinica para as miiases brasileiras, dividindo-as em 2 grandes grupos: 1) as provocadas por larvas de parasitismo facultativo, frequentes no nariz e no ouvido, e cujos causadores quasi exclusivos são a Cochliomyia macellaria e a Sarcophaga carnaria; 2) as produzidas por larvas de parasitismo obrigatorio, cujo causador unico no Brasil, é o berne (Dermatobia cyaniventris) e cuja presença na área oto-rino-laringologica é excecional. Os casos de localisação rara descritos pelo A. São 2 do primeiro tipo e 2 do segundo. Os primeiros são de miíases situados exclusivamente nos alveolos de dentes reduzidos a raizes. Os segundos - um do A. e o outro do dr. Berenguer - são de localisação do berne na concha e no meato inferiores. O A. observou grande numero de casos de miíases, mas, durante mais de 12 anos, nunca viu um só caso com a localisação em que estes se apresentaram. Isto e a falta de referencia a casos semelhantes na literatura, tanto geral como especial, forçaram o A. a comunicar essas observações. E' aproveitada a oportunidade para se demonstrar que o termo certo é miíases e não miase, como comumente se diz no Rio e em São Paulo. Discussão:
Dr. Mattos Barreto: Cita 2 casos de berne que teve ensejo de observar nas fossas nasais: o 1.°, numa creancinha, localizado na fossa mirtiforme, para cuja extração usou a tecnica de Ruttin isto é, instilação por meio de seringa de Pravaz, de algumas gotas de petroleo (na falta deste empregou a benzina) no pertuito onde se encontrada a larva, e depois com facilidade extraiu-a com a pinça nasal. O 2.° caso, localisado no sulco naso-geniano, já abcedado, que foi tratado como abcesso comum. Pela anamnése, constatou que a ferida tinha se originado dentro do nariz e estendendo-se secudariamente ao sulco naso-geniano.
Dr. Paulo de Faria: Acha que as localisações de berne nas fossas nasais deve ser classificada de raras. Um caso de sua observação curou-se com lavagens de agua cloroformada.
Dr. Fabio Belfort: Pensa que se deveria cuidar melhor da identificação das larvas nos casos de miíases.
Dr. Schmidt Sarmento: Lembra que ha muita confusão entre a miíase pelo berne e a mais comum, a bicheira. Quanto a primeira veriedade, a sua localisação na fossa nasal, reputa muito rara, por quanto, nunca teve ocasião de observar em sua clinica.
Dr. Mangabeira Albernaz (encerrando a discussão): Pela discussão de seu trabalho, viu confirmar a raridade dos casos que apresentou. Julga que a tecnica de Ruttin não resolve todos os casos, não se podendo muitas vezes prescindir da incisao,
DR. MANGABEIRA ALBERNAZ (Campinas) - "Um caso de difteria do labio com cêrca de 3 anos de duração".
Resumo: Trata-se de um caso de difteria do labio inferior, que se manifestou ha cêrca de 3 anos, após um traumatismo. Deste resulta uma ulcera crustosa, irregular. O doente sofreu por isso, um tratamento especifico antiluéitco. No fim de um ano, continuando no mesmo estado, resolve o medico mandar fazer um exame bacteriologico da secreção da ulcera, revelando este a presença do bacilo difterico. 0 doente nunca teve anginas, nem mesmo simples dores de garganta. Em vista do exame, recebe 45 mil unidades de sôro, mas a lesão não cicatrisa. Varios trata.mentos são experimentados: violête de genciana, tripaflavina, raios ultra violeta, efluvio diatermico, electro coagulação superficial, etc. No fim de cérca de 3 anos, repetes eo exame microbiologico da secreção e encontra-se ainda o bacilo difterico. Resolve-se então lançar mão de grandes dóses de sôro, recebendo o paciente 2o8 'mil unidades, e, simultaneamente, pequena dóse de 914 diluida em Calfenil. Após o uso desta grande dóse de sôro, novos exames provam a ausencia de bacilos de difteria. O caso é muito raro, não tendo o A. podido encontrar na literatura, nenhuma referencia a casos semelhantes.
DR. PAULO DE FARIA (S. Paulo) - "Otites agudas ex. terna e média. Sinusite maxilar aguda. Detalhes de terapeutica".
Resumo: O A. faz referencia ao sinal que denomina "expiratorio ou pneumo-sinal", no decurso da punção do antro maxilar, o qual muito concorrerá para se evitar as complicações - edemas e emfisemas - tão observados após ás punções desse antro. Esse sinal consiste no ruido que sáe pelo trocater no momento em que o doente, fechando a boca e comprimindo as narinas sobre o mesmo, faz um movimento de expiração. Quando o trocater faz falso trajéto, não se percebe ruido algum e nesse caso não se deve insuflar o ar ou praticar lavagem de especie alguma.
Aconselha os pediatras a praticarem a ducha de Politzer nas creanças que se queixam de dôr nos ouvidos, principalmente nas primeiras 12 horas. Esse procedimento evitará a progressão da inflamação timpanica e todo seu cortejo de complicações.
Trata da aplicação da cocaina e adrenalina na furunculóse do ouvido externo e na angina flegmonósa aguda, como elemento auxiliar de cura. A anestesía suprime a dôr que abate o organismo e a reação deste será maior.
Discute em seguida sobre a vantagem de se manter sempre alcalinisados os fócos de supuração, onde a acidez concórre para agravar o mal.
Termina pedindo aos. colegas, se têm conhecimento de indicações identicas feitas por outros autores.
Discussão:
Dr. Roberto Oliva: Propõe que se denomine de "sinal Paulo de Faria" ao pseumo-sinal citado pelo autor.
Dr. Mario Ottqui le Rezende: Não teria coragem de aconselhar as duchas de Politzer nas afecções agudas do ouvido, nas creanças. Só a experiencia do autor poderá- afirmar o valor curativo da sua pratica.
Dr. Schmidt Sarmento: Apezar de reconhecer o valor do "sinal Paulo de Faria", acha que a velha puncção não é de máu uso, quando feita com os devidos cuidados. Vê no trabalho apresentado uma contribuição á propedeutica de seio maxilar. Quanto as duchas de Politzer, têm certo temêr, pois poderá levar outros germens para o ouvido medio.
Dr. Paulo Faria - (encerrando a discussão): O perigo das duchas está afastado, pois já tratou de inumeros casos, a pedido de pediatras, e nunca observou acidentes. Quanto a tecnica, aproveita o momento em que a creança chora, para praticar a ducha.
DR. SCHMIDT SARMENTO (S. Paulo) - "Anginas monociticas e agranulociticas". (Este trabalho está publicado na integra em outra secção desta revista).
Discussão:
Dr. Paulo de Faria: Pergunta se nas anginas agranulociticas notou calefrios repetidos. Em um caso de Seiffert, acompanhado de calefrios e curva septica, a ligadura da jugular foi corôada de exito completo.
Dr. Mangabeira Albernaz: O trabalho do Dr. Sarmento apareceu em ocasião oportuna. Os pediatras procuram atualmente firmar o diagnostico das anginas monociticas. Acha que os conhecimentos ainda são imperfeitos e felicita o Dr. Sarmento por ter focalisado a questão de maneira precisa.
Dr. Marcos Lindenberg: Faz considerações sobre a questão da taxa monocitica nas diferentes fases da angina, frisando que se deve encarar nos exames, não só a taxa percentual desses elementos figurados, mas tambem em algarismos absolutos. Acha que os pediatras fazem diagnosticos muito apressados, tratando-se, como se sabe de molestia do aparelho hematopoiético, e portanto, podendo dar quadros hematologicos de relações estreitas.
Dr. Schmidt Sarmento (encerrando a discussão): Antes de responder aos colegas, traz ao conhecimento da casa, como prometera, o resultado final de seu caso de operação plastica do palato móle apresentado anteriormente. A operação falhou, com recidiva quasi completa. Nunca segunda sessão emprego a diatermo-coagulação.
Ao Dr. Paulo de Faria, diz que calefrios geralmente acompanham o quadro morbido dessas afecções. Não ha sinal algum que faça pensar em sepsis, nem a febre, nem o exame hematologico. Acha audacia ligar a jugular para curar "por assim dizer o incognito". Lembra a dificuldade de se obter contagens globais de sangue mais repetidos, devido ao fátor finananceiro. E' de conviniencia a remoção de tais doentes para hospitais, onde se póssa proceder aos exames que forem necessarios.
Antes de terminar a sessão, o Dr. Mario Ottoni de Rezende passa a lêr o relatorio de sua autoria, sobre o têma "Valor da Oto-rino-laringologia na Higiene Escolar", relatorio esse que é aprovado pela casa. H. C.
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