INFORME SOBRE LOGOAUDIOMETRIA (1)
Autor(es): ARMANDO PAIVA DE LACERDA
(1) Apresentado ao Departamento de Otorrinolaringologia, da Associação Paulista de Medícina, na reunião de 17-9-1953.
A perda auditiva para afala pode ser medida em decibeis mesmo modo que a perda relativa a tons puros audiometricos.
Os antigos processos utilizados para se avaliar a perda auditiva em relação a fala (voz alta, normal e segredada), tomando por base para as medições distancias preestabelecidas, não permitiam que se obtivessem resultados seguros e perfeitos. Tais provas qualitativas da audição, recorrendo à voz e aos sons instrumentos, sem contrôle da intensidade; foram, pouco a pouco, cedendo lugar aos testes audiometricos utilizando tons puros com frequência de valor determinado, permitindo medir a acuidade auditiva por meio da escala de decibeis, o que trouxe indiscutiveis vantagens à pratica otológica. Com o desenvolvimento assumido pela audiometria ficou demonstrado, porém, que se o audiometro tonal pode ser considerado um excelente instrumento para indicar o limiar da audição relação a tons puros, nem sempre permite determinar a capacidade para a fala, quando se recorre a conversão da perda tonal em perda percentual da palavra. Se a audiometria tonal indica a perda auditiva no campo de frequências, servindo a interpretações diagnosticas e prognosticas, uma impressão mais perfeita sobre a perda em relação à fala só pôde ser fornecida, recorrendo-se a ela própria na medida da audição.
É que o ouvido humano destina-se principalmente a receber e a transmitir à interpretação cortical os sons da fala. Se admitirmos ser o som o excitante biologico ou adequado da função auditiva, demos considerar a voz humana mais do que isso - o próprio excitante fisiológico do orgão sensorial auditivo, consoante os trabalhos originais de Zund-Burguet.
Os estudos relativos a audiometria utilizando a fala desenvolveram-se bastante nos últimos tempos. Tornou-se possivel, meio de sistemas eletrônicos, a apresentação da voz à pessoa ouvinte, em diferentes niveis de intensidade, isto é, passando a ser controlada pela escala de decibeis, como sucede em relação às provas audiometricas utilizando tons puros. Mas não se chegou a um tal resultado sem que se procedesse, preliminarmente, a estudos e pesquisas visando a estabelecer os padrões fonéticos necessario confecção dos testes, a que se denominou "P. B. tests", ou sejam as provas auditivas recorrendo a determinada técnica e a listas de fonemas, préviamente balanceados ou selecionados.
Todo e qualquer problema do campo audiológico, assume sempre caráter de complexidade, por ser a audiologia por si mesma uma ciência assás complexa.
As dificuldades aumentam, porém, quando se trata de medir a intensidade dos sons vocalicos e não mais a dos tons puros, simples ou elementares, como nos testes audiometricos habituais. Os sons laringêos, diferentes destes, são sons de complexidade tonal providos de hormonicos, o que tona mais complicada sua percepção. Os fonemas compreendem um som fundamental com seus harmonicos próprios e outros superpostos devido ao reforço dos primeiros pela ressonância das cavidades buco-faringéas. Cada série de fonemas possue sua audibilidade própria, entre os limites inferior e superior da fala e em determinada intensidade, sendo a audibilidade uma das propriedades do som, do mesmo modo que a intensidade, a altura, o timbre e a duração.
A fala é uma mistura de sons representados por frequências variaveis e transitórias, contribuindo assim para a complexidade do fenomeno sensorial auditivo, que envolve atividade cortical discriminativa e interpretativa de tais sons. A analise espectrografica das vogais, ditongos e consoantes, ou seja da estrutura acustica da palavra falada, revela-nos campos extremamente variaveis de frequéncias.
0 aparelho fonador humano produz varias centenas de sons diferentes, mas levando-se em consideração as frequências e a qualidade dos mesmos, as possibilidades de variação são ainda mais numerosas. (Saltzman)
A fala humana vem a ser, portanto, um conjunto de elementos sonoros ou fonemas, cuja relação com a linguagem, como sistemas de sons, lhes vem conferindo crescente importancia no campo da fonética experimental. De fato, os fonemas tornaram-se os principais fenomerios da linguagem - "os elementos constitutivos da linguagem", como os define Trubetzkoy.
"Os antigos conhecimentos fonéticos sobre os movimentos das cordas vocais, do véu do paladar, da língua, dos labios, etc., bem como os efeitos de ressonância nas cavidades buco-faringéas, constituíram por muito tempo a demonstração das possibilidades oferecidas pelas estruturas anátomo-fisiológicas no fenomeno da fala. Apesar de significativos resultados obtidos neste terreno; na solução de problema fonológicos ou clínicos, mostram-se, todavia, insuficientes para resolverem outras questões da propria fonética. (Goldstein).
A nova teoria linguistica (Saussure, Trubetzkoy, jakobson) passou a considerar os sons vocalicos como o resultado da colaboração de todo o organismo, dentro do princípio pavloviano da unidade funcional organica, sob a direção cerebral. De acordo com a nova teoria, nem toda a inervação dos "musculos da fala como nem todos os sons, palavras e frases que integram a linguagem, fornecem suficiente base de conhecimentos para a compreensão do assunto. Somente determinados feno, menos motores e sensoriais, consoante as tendencias e aptidões individuais, aparecem em nosso vocabulario.
Daí se haver procurado determinar as unidades fonéticas minimas que adquirem grande importancia na representação de objetos; ações e impressões ambientes. Tais unidades são os fonemas. Diferentes combinações de sons produzem os fonemas simples e os complexos. Variações do material fonético, de pronuncia, sintaxe, bem como gramaticais são outros tantos fatores que intervêm na expressão da linguagem humana.
"Todas as línguas têm em comum alguns fonemas que correspondem às reações gerais dos seres humanos. Cada língua, porém, possui seu próprio sistema de fonemas, definindo o respectivo padrão fonético. (Bloomfield).
Depreende-se de tudo isso a necessidade da utilização de fonemas devidamente balanceados ou selecionados, na determinação das características fonético-ácusticas de cada idioma, para os fins da moderna audiometria recorrendo a fala.
As primeiras tentativas para a determinação da perda auditiva em relação à fala foram levadas a efeito por Fletcher e colaboradores, na Bell Telephone Laboratories, quando procuravam, aperfeiçoar as sistemas de transmissão e reprodução da palavra nos aparelhos telefônicos, fonográficos e radiofonicos.
Por meio de testes coletivos foro-audiometricos, Fletcher e Fowler (1926), com a colaboração da Federação Americana de Duros de Ouvido submeteram a exame 4 mil escolares, constatando que 14,4% dos alunos apresentavam deficit auditivo. Tomando por base esta cifra, os autores calcularam que cerca de 3 milhões das crianças das escolas norte-americanas deviam ser portadoras de deficiencia auditiva. Experiencias posteriores, no mesmo sentido, foram realizadas por Macfarlan com a colaboração do Instituto Eletrotecnico da Universidade de Pensilvania e por outros pesquisadores, entre os quais Remorino, na Argentina, por meio da adaptação dos testes originais ao idioma castelhano.
Porém, os primeiros experimentadores a utilizarem listas de silabas e palavras nessas medidas foram Fletcher e Steinberg (1929), lançando assim as bases da moderna logoaudiometria. Tais pesquisas dos Laboratorios Bell foram confirmadas e desenvolvidas por trabalhos posteriores, que surgiram no decurso e após a última guerra mundial, originando-se deste modo os primeiros testes utilizando listas foneticamente balanceadas (P. B. tests).
A partir de então, os metodos de pesquisa e o aparelhamento utilizados nestas provas têm sido incessantemente aperfeiçoados. As pesquisas conduzidas por Hudgins e colaboradores no Laboratório de Psicoacustica da Universidade de Harvard e publicadas em 1947 pela revista "The Laryrigoscope", abriram novas perspectivas a tais investigações do campo audiologico, podendo mesmo servir como norma ao estabelecimento de testes em outros idiomas, pela sua adaptação à respectiva fonética. A analise da fala levada a efeito por esses experimentadores despertou maior interesse audiologico, por dela haverem resultado testes estandardizados, que ampliaram o campo de aplicação das provas lógoaudiométricas.
A contribuição de Walsh, Silverman e Davis, no Instituto Central de Surdez, de St. Louis, foi igualmente preciosa para esclarecer os principios essenciais da audiometria, da fala além de permitir maior aplicação clinica de seus resultados. Walsh e Silverman verificaram modificações sensíveis do aspecto da curva de articulação de acordo com o tipo da afecção auditiva. Aqueles autores e posteriormente Davis introduziram e desenvolveram o conceito do "índice de utilidade social" para a audição, em substituição ao do limiar de 50% de palavras captadas. O indice seria a percentagem de articulação correspondente a media dos niveis relativos às três intensidades dá fala.
O criterio adotado adotado pela equipe dá Universidade de Harvard, como essencial a seleção de palavras ou frases a serem utilizadas nos testes, foi o relativo a familiaridade, dissimilaridade fonética, coleção normal de fonemas e homogeneidade quanto à audibilidade basica. Foram assim obtidas listas de palavras ou frases foneticamente balanceadas com as características da lingua inglesa na variedade falada dos Estados Unidos, compreendendo as primeiras, palavras dissilábicas de igual acentuação, dissilábicas não selecionadas e monossilábicas (P. B. lists). Especialmente os testes de palavras de duas silabas acentuadas (selected,spondees), pela sua homogeneidade e maior inteligilibilidade, tornaram-se desde, logo os preferidos por serem mais eficientes na medida da audição pela fala.
Os estudos relativos a moderna logoaudiometria baseiam-se no conceito da função de articulação, segundo-os trabalhos originais de Fletcher e Steinberg com os testes de monossílabos. A função de articulação é expressa numa curva representando a relação entre a percentagem de unidades da fala ouvidas corretamente ou percentagem de discriminação correta e a intensidade da fala em decibeis, medida no ouvido do individuo submetido-ao teste: "De um certo modo, a função de articulação corresponde, no teste a fala, à curva audiometrica tonal. É um grafico que revela como uma pessôa ouve a fala utilizada no teste". (Carhart)
Fig. 1 - Curva de articulação normal (Davis)
Dispondo de material fonético selecionado e homogêneo, os experimentadores modernos passaram a aplicá-lo, submetendo aos testes de captação individuos de audição normal, a fim de se poder estabelecer os valores normais ou limiares como ponto de comparação para as provas em, individuos hipoacusicos. Chegaram assim à confecção da curva de articulação ou de captação normal. O limiar de captação ou inteligilibilidade, o principal a ser determinado nos exames clinicos, pode ser obtido no momento exato em que, o paciente for capaz de repetir corretamente 50% dos fonemas que lhe tenham sido apresentados. Este ponto representa, o, valor arbitrariamente denominado de limiar da audição para a fala. (Hudgins). Comparando-se este valor ao limiar médio de um grupo de ouvintes tendo audição normal, a diferença em decibeis entre os dois limiares indica a perda auditiva para a fala. Em outras palavras, a perda auditiva para a fala será obtida pelo numero de decibeis acima do limiar normal de inteligilibilidade, necessário à captação de 50% das palavras utilizadas.
A curva de articulação normal, que vemos na fig. 1, resulta dos testes de captação efetuados com listas de palavras fonéticamente balanceadas, N Instituto Central de St. Louis. Neste grafico, as ordenadas representam a percentagem de articulação ou de palavras repetidas corretamente e as abcissas a intensidade da fala em decibeis. 0 limiar de recepção da fala (50% de captação) pode ser lido no ponto de interseção da linha horizontal (perda auditiva para a fala) com a curva de articulação normal, ao nivel de 33 dbs.
A curva de articulação origina-se em 19 dbs., no limiar de perceptibi1idade, ou seja onde o individuo submetido ao teste começa a distinguir algumas palavras mais faceis. Depois a curva sobe continuamente até alcançar a maxima inteligilibilidade em 70 dbs., permanecendo assim um campo de 50 dbs. entre as palavras menos audiveis e as mais faceis de serem ouvidas. Três niveis de intensidade correspondentes à voz fraca, normal e alta se acham tambem previstos no gráfico.
Fig. 2 - Curvas da perda auditiva de dois indivíduos hipoacusicos, A e B, comparadas a função de articulação normal (Hudgins).
Na curva de articulação normal, a inteligilibilidade (percentagem de palavras corretamente ouvidas) eleva-se proporcionalmente com a intensidade da fala até alcançar os 100% de captação.
O fato da perda auditiva para a fala poder ser prevista tambem no audiograma torna esta medida menos usada na clinica do que a chamada "discrimination loss", que se vê neste grafico. A, perda discriminativa vem a ser a medida da percentagem de palavras que o paciente não consegue repetir corretamente, apesar da maior intensidade empregada.
A perda auditiva para a fala, isto é, a diferença em decibeis entre o limar de inteligibilidade de um determinado indivíduo e. o limiar normal de inteligibilidade, pode ser melhor apreciada no grafico seguinte (fig. 2), onde a linha horizontal, que atravessa o meio do campo, correspondente ao nível de 50% de itens corretamente repetidos,, equivale a uma escala de perda auditiva. Vemos, neste grafico, a perda de dois pacientes hipoacusicos em relação à curva de articulação extraída de um grupo de ouvintes tendo audição normal. Como se observa, o paciente A apresenta uma perda de 14 decibeis e o paciente B de 55 decibeis, ou melhor o paciente A precisa de 14 dbs. e o B de 55 dbs. acima do limiar normal, para que possam ouvir a mesma percentagem de fonemas utilizados na prova.
Fig. 3 - Curvas de articulação relativas a três tipos de palavras (Hudgins)
Ainda de acordo com as pesquisas de Hudgins e colaboradores, na Universidade de Harvard, a fig. 3 nos revela três tipos de curvas de captação correspondentes a três especies de palavras da língua inglesa: as dissilábicas de igual acentuação e selecionadas (selected spondees), as dissilábicas não selecionadas. (unselected dissyllables) e as monossilábicas foneticamente balanceadas (monosyllables PBlists). O aspecto das curvas indica a maior ou menor uniformidade dos tres tipos de palavras. Quanto mais ascendente a curva até os 100%, maior o grau de homogeneidade do material fonetico. Assim, a curva das "selected spondees" oferece uma media de elevação de l0% por decibel sobre o campo de 20 a 80% de captação. A curva das monossilábicas eleva-se 4% por decibel sabre o mesmo campo, permanecendo a curva das dissilábicas não selecionadâs.entre as duas anteriores.
As curvas de articulação tambem podem sofrer modificações, quando se utiliza o mesmo material fonetico, mas recorrendo-se a locutores diferentes, sendo mais suscetiveis a tais variações as curvas de palavras monossilábicas e menos influenciadas as curvas das dissilábicas com a mesma acentuação, pela maior uniformidade que oferecem.
Fig. 4 - Curvas de articulação comparativas de cásos de hipoacusia de condução, mista e de percepção (Walsh e Silverman).
Como já vimos, grande importancia deve ser concedida ao aspecto da curva de captação e ao nivel maximo de discriminação alcançado, devendo o número de palavras, corretamente ouvidas ser proporcional ao aumento da intensidade, isto é, partindo-se dos 50% de captação, este aumento deverá manter a curva ascendente até os 100%. Em certos tipos de hipoacusia, todavia, a ascenção se verifica somente até um certo nivel (60 a 80%), observando-se, então, tendência da curva a se tornar horizontal, não obstante a maior intensidade empregada, como nos mostra a fig. 4. 0 nível de captação não sendo proporcional ao aumento da intensidade da fala indica, em tais casos, comprometimento da função coclear. Segundo Walsh e Silverman, os altos níveis alcançados nas provas de inteligibilidade indicam um bom funcionamento coclear e, portanto, um prognostido favoravel nos casos de fenestração. Isto é o que se verifica com a curva A, de paciente portador de hipoacusia de condução, não se tornando tão favorável o prognóstico no caso da curva B, de hipoacusia mista, sendo contraindicada a intervenção cirúrgica no caso do paciente C, cuja função coclear deficiente não permite que o nivel, de captação se eleve além de 60%, apesar da maior intensidade empregada.
A importância da logoaudiometria decorre das suas várias aplicaçõës na prática, a saber:
a) - por fornecer novos elementos ao clinico quanto ao diagnostico e prognostico das perdas auditivas, ao mesmo tempo que contribuindo para melhor aplicação da terapeutica medica ou cirurgica, sobretudo na seleção de casos de fenestração e aferição de resultados pós-operatórios;
b) - pela sua aplicação aos problemas educacionais com a determinação do grau de audição dos escolares e levantamento do censo audiometrico dos mesmos;
c) - por se incluir entre as medidas de proteção à audição das crianças, como principal recurso para a despistagem das perdas auditivas incipientes nelas observadas;
d) - pela sua aplicação à protese auditiva eletrônica" na indicação de aparelhos bem como avaliação do rendimento acústico obtido com a adaptação dos mesmos em indivíduos hipoacusicos;
e) - por,favorecer o estudo e a determinação de fatos novos relativos a audição normal ou deficiente.
Para se dar inicio a um plano de pesquisas visando à aplicação, na pratica, da logoaudiometria em função do nosso idioma tornam-se indispensáveis instalações acústicas apropriadas, inclusive camara à prova de som, bem como equipamento adequado, oscilógrafo, espectrógrafo de som, decibelometro, alto falante de grande fidelidade, etc. A participação de pessoal técnico, que se dedique a um trabalho de equipe, deve prever como fundamental á colaboração do foneticista e do fisico ou engenheiro acustico com o audiologista.
A correlação entre os vários tipos de provas de captação sendo muito estreita, qualquer delas poderá servir aos objetivos da aplicação clínica. Em todas, o procedimento correto para medida da acuidade auditiva consiste no emprego da escala de decibeis, ou melhor de sistemas de atenuação do som eletrificamente controlados e calibrados em decibeis. Tais sistemas eletrônicos permitem a apresentação da voz ao ouvinte, ou diretamente, por meio de microfone e de alto-falante de grande fidelidade, ou indiretamente, por meio do teste gravado, no qual a calibração tonal é incluida como parte da gravação. Neste caso, os sons vocalicos diminuem gradativamente de intensidade com a rotação do disco, constituindo o método preferido em quase todas as experiências realizadas.
A escolha do material fonético a ser utilizado nas provas de captação, pesquisando-se os fonemas mais usados em nosso idioma, deverá constituir nossa primeira preocupação, adotando-se nesse sentido um dos critérios científicos antes mencionados. Ao que nos parece, devemos dar preferencia ao criterio adotado pela equipe da Universidade de Harvard com as modificações introduzidas pelos trabalhos do Instituto Central de Surdez de St. Louis quanto ao contrôle fonetico e ao conceito de familiaridade dos vocabulos utilizados, orientação essa, aliás, seguida pelos pesquisadores argentinos (Tato e colaboradores), ao determinarem as características fonéticas do idioma castelhano, na variedade rioplatense.
O ensaio lagoaudiometrico realizado, entre nós, por Ermiro Lima obedeceu a critério semelhante, na escolha de 10 listas de 25 palavras dissilábicas, ou sejam 250 dissílabos; entre graves e agudos, que foram gravados nos estudios da Radio Nacional do Rio de janeiro, tendo sido as provas efetuadas em três indivíduos jovens de audição normal, extraindo-se a curva média de captação. (fig. 5).
Fig. 5 - Curva media de captação (E. Lima)
Como estudo preliminar à logoaudiometria em nosso idioma, apresentado ao lI Congresso Latino-Americano realizado em São Paulo, em 1951, constitui o mesmo excelente contribuição ao assunto, se bem que o autor, criticando seu próprio trabalho quanto às falhas e dificuldades encontradas, reconheça que os testes de captação não foram efetuados em camara à prova de som, tendo sido utilizada uma sala do Hospital com ruído atenuado.
A esses primeiros ensaios de Ermiro Lima seguiram-se as pesquisas de Geraldo de Sá, contidas em publicação mais recente, da Revista Brasileira de-Medicina, tendo este autor procedido a analise fonetica da lingua portuguesa falada no Brasil, sob o ponto de vista qualitativo e quantitativo; para sua aplicação a logoaudiometria. 0 autor organizou listas de palavras foneticamente balanceadas a que denominou, F .B listas, (em substituição às P B lists da lingua inglesa), compreendendo, listas de monossilabos e de palavras iambicas, ou sejam dissilabos agudos, que o autor considera o material mais indicado para os testes de limiar em nossa lingua. Diz ele ter verificado diariamente o valor dos testes com F B listas, portanto em nosso idioma, no Departamento de Otorrinolaringologia, da Washigton University, em St. Louis, procurando dotas a audiologia nacional deste inestimável auxilio diagnóstico.
No que concerne às palavras "espondeas", as preferidas nos testes em língua inglesa, afirma o autor que "tal tipo de dissílabo; de identica acentuação em ambas as silabas, é virtualmente desconhecido nos idiomas português e castelhano", partilhando assim da opinião, de Tato, quanto a este último.
Aconselha ainda Geraldo de Sá que se recorra, paia os testes em nosso idioma ao mapa da "Indice de Adequaciedade Social", já estabelecido para a lingua inglesa (S.A.I.) por Walsh, Silverman e Davis com listas apresentadas ao ouvinte em três niveis de intensidade da fala, sendo as medias obtidas no mapa equivalentes aos indices. Este seria utilizado, a titulo précario, até que estudos fossem feitos para o estabelecimento do nosso próprio mapa (I.A.S.), dizendo o autor não dispôr de material humano e de tempo para tal verificação. Inclue ainda, no trabalho a ser realizado, o estabelecimento das curvas normais de captação e das perdas de discriminação em três níveis, a verificação do limiar de adequaciedade social e a do limite de, surdez condutiva. Dispondo-se; de listas de palavras foneticamerite alanceadas como as apresentadas pelo autor, tais verificações se tornariam, em sua opinião; matéria de pura observação clinica é estatística.
Eis o material, de estudo que nos foi possível reunir e trazer ao conhecimento dos colegas, neste informe sobre logoaudiometria.
Não seria de esperar, numa exposição limitada como esta, de valor apenas informativo, uma análise mais completa da materia, descendo a minucias e abordando outros aspectos do problema logoaudio-metrétrico em nosso idioma.
0 que se impõe é o prosseguimento de tais estudos, a base dos conhecimentos existentes e da ex.periencia de trabalhos já realizados, quer no estrangeiro, quer entre nós, como os que foram mencionados neste informe, mas procurando-se determinar as caracteristicas fonetico-acusticas de nosso idioma, como essencial à pesquisa, em nosso proprio meio, para seu exato valor cientifico.
Com isso, teremos prestado um serviço à coletividade, pela aquisição de novos elementos de avaliação da capacidade auditiva em relação à fala, tanto em individuos adultos como em crianças, nas formas de hipoacusia como na despistagem das perdas incipientes destas ultimas, e ampliando-se, por conseguinte, o campo audiometrico de aplicação clínica e educacional com os resultados que serão certamente obtidos com tais experimentos.
BIBLIOGRAFIA
BUNCH, C. C. - Clinical Audiometry - Mosly Comp. - St. Louis, 1943 - V.S.A.
CANFIELD" N. - Audiology - C. Thomas - Illinois, 1949 - U.S.A.
CARHART, R. - Basic Pr inciples, of Speech Audiometry - Acta Oto-Laryngologica XL - 62-71 - 1951.
CARHART, R. - Instruments and materials for Speech Audiometry - Acta Oto-Laryngologica XL - 313-23 - 1951-52.
FLETCHER, H. - Speech and Hearing - V. Nostrand Co. - N. York, 1929.
GOLDSTEIN, K. - Language and Language Disturbances - Grune & Stratton - N. York, 1948.
HIRSH, I. - Psychophysics of Hearing - Acta Oto-Laryngologica XL - 273-82 - 1951-52.
HUDGINS, C. V., HAWKINS, J. E., KARLIN, J. E., STEVENS, S. S. - The Pevelopment of Recorded Auditory Tests for Measuring Hearing-Loss for Speech - The Laryngoscope,- January, 1947.
HUGHSON, W. and WESTLAKE, H. - Manual for Program Outline for Rehabilitation of Aural Casualties, etc. - American Academy of Ophtalmology and Otolaryngology - January, 1944,
LIMA, E. - Ensaio Logoaudiometrico - II Congresso Latino-Americano de Otorrinolaringologia - São Paulo, 1951.
PALVA, T. - Finish Speech Audiometry - Acta Oto-laryngologica - Suplementum CI-1952.
REMORINO, A. G. - Audíometria en Ia edad escolar.- Cordoba - R. A. - 1943.
SÁ, GERALDO DE - Análise fonética da lingua portuguesa falada no Brasil Revista Brasileira de Medicina - Rio de Janeiro, julho 1952.
SALTZMAN, M. - Clinical Audiology - Grune & Stratton - N. York, 1949.
TATO, J. M. - Lecciones de Audiometria - EI Ateneo - Buenos Aires, 1949.
ZUND-BURGUET, A. - Principes d'Anacousie = A. Máloine - Paris, 1913.
NOTA
Ao final dos debates, que se seguiram à apresentação do Informe sobre Logoaudiometria na reunião de 17-9-953 do Departamento de Otorrinolaringologia, da Associação Paulista de Medicina, foi designada uma comissão constituida pelos Drs. Armando Paiva de Lacerda, José de Rezende Barbosa e Mauro Candido de Souza Dias, para proceder aos estudos necessários à elaboração de um plano de pesquisa logoaudiorrietrica, em São Paulo, contando, desde logo, com a colaboração do engenheiro acustico Dr, Paulo Taques Bitencourt, assistente do Instituto Eletrotécnico, da Escola Politecnica, e tambem presente àquela reunião, a convite do aludido Departamento.