Versão Inglês

Ano:  1970  Vol. 36   Ed. 2  - Maio - Agosto - (11º)

Seção: -

Páginas: 125 a 131

 

Anatomia da Fóssula da Janela do Vestíbulo

Autor(es): Neivo Luiz Zorzetto*

Os progressos da moderna Otologia mostraram a necessidade de conhecer em detalhes a anatomia do aparelho estato-acústico. Os trabalhos sôbre a parede labiríntica da orelha média, mostram a preocupação dos autôres em registrar as diferenças que ocorrem com as estruturas que limitam a fóssula da janela do vestíbulo ou "nicho do estribo". Tal preocupação gira em tôrno do estreitamento da fóssula provocado pelo promontório da cóclea, pela proeminência do canal do facial e pelo semicanal do músculo tensor do tímpano 1. Este estreitamento da fóssula da janela vestibular é uma das dificuldades da cirurgia da otoesclerosel 1, 3. 0 tamanho da fóssula da janela do vestíbulo está condicionado à situação das estruturas que a limitam como as saliências maiores ou menores do nervo facial na sua terceira porção3 ou as variações que pode apresentar o mesmo no seu curso, 4, 6, 8, 10. A deiscência da parede óssea do canal do nervo facial, 2, 3, 5, 7, 8, 9,14 quando exagerada provoca a protusão do nervo que se desloca sôbre a fóssula ocasionando seu estreitamento, assim como a presença do pontículo do promontório, implica também no estreitamento da fóssula vestibular 13. Estes fatôres podem alterar os aspectos da anatomia da parede labiríntica da cavidade do tímpano e dificultar a cirurgia.

Material e Método

Estudamos 135 ossos temporais de indivíduos adultos, de 21 a 86 anos de ambos os sexos pertencentes à coleção de ossos temporais do Departamento de Morfologia da Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas do Botucatu, São Paulo. As peças foram preparadas sob microscópio estereoscópico, utilizanldo-se um motor com broca odontológica. Todo o material era fixado em solução de formol a 10%, de modo que as preparações foram feitas em peças úmidas. As mensurações, foram feitas utilizando-se ocular micrométrica com retículo de 1 cm dividido em milímetros e décimos de milímetro.

Tomamos como ponto de referências para a medida da largura média da fóssula o meio da proeminência do canal do facial e a parte mais alta do promontório voltada para a mesma, de modo que a linha de medida passava aproximadamente pela cabeça do estribo. O estribo de todos os casos estava movel não sendo portanto, portadores de focos de otoesclerose fenéstrica.

Resultados

O estudo revelou uma apreciável variedade na largura da fóssula vestibular conforme mostra a tabela I.

TABELA I

Medidas das Fóssulas examinadas


No material examinado foram encontradas fóssulas que mediam desde 1,2 mm até 2,5 mm de largura, passando por todos os valôres intermediários a estas duas medidas.

Assim os resultados foram reunidos em três grupos:

Fóssulas de largura mínima (Fig. 1 - A, B, C, e D).

Foram registradas 15 (11,11%) que apresentavam de 1,2 mm a 1,5 mm de largura sendo estas medidas as menores encontradas no material examinado. Notamos que nessas fóssulas o estreitamento era uniforme tanto no pólo posterior como no têrço médio onde foi efetuada a medida, enquanto que o pólo anterior era sensivelmente mais largo.



FIG. 1 (A, B, C e D) Fotografia e desenho da parede labiríntica da caixa do tímpano, mostrando fóssulas da janela do vestíbulo de largura mínima. (1) Estribo na fóssula da janela do vestíbulo. (2) Canal Facial. (3) Processo cocleariforme. (4) Promontório. (5) Fóssula da janela da cóelea. (6) Eminência piramidal.



O mais alto grau de estreitamento da fóssula da janela do vestíbulo foi encontrada em 4 peças uma das quais medindo 1,2 mm de largura e as três outras 1,3 mm. Nestes, a fóssula mais se parecia a uma fenda localizada entre o canal do facial e o promontório (Fig. 1 -A, B e C). A fóssula cuja largura era de 1,2 mm sòmente permitia um espaço diminuto para os ramos do estribo não sendo possível a retirada dêste ossículo íntegro, pois a base (platina) não passava na fóssula devido seu exagerado estreitamento. Neste caso o estreitamento era devido aos seguintes fatores: o canal do facial inteiramente aberto libertando o nervo que se expandia até junto ao estribo; o promontório muito elevado com sua face voltada para a fóssula mais plena do que curva; a eminência piramidal situada mais inferior e posteriormente do que em geral ocorre.

Fóssulas de largura média (Fig. 2 -A, B, C, e D). - Neste grupo enquadramos 83 fóssulas (61,48%) cuja largura variava entre 1,6 mm a 2 mm. Estas, embora mais freqüentes, apresentam certas variações no que diz respeito aos pólos anterior e posterior. Nossas observações mostraram que na maioria dos casos o pólo anterior da fóssula vestibular é o ponto em que ela possui largura máxima (Fig. n.º 2-A e B) contudo, em 18 destas peças este pólo se apresentava mais estreito do que o têrço médio e era produzido pelo processo cocleariforme do semicanal do músculo tensor do tímpano que se projetava sóbre a fóssula de modo a torná-la mais estreita. (Fig. 2-C e D.) O pólo posterior é sempre mais estreito do que o têrço médio quando o pontículo do promontório está presente (Fig. 2 - B, C e D). Em 76 casos êste pólo era mais estreito e em todos o pontículo existia. O pólo posterior da fóssula é sempre estreitado pelo pontículo do promontório e êste estreitamento pode ser mais acentuado, dependendo da forma e da posição do pontículo em relação à fóssula e da posição e dimensão da eminência piramidal.



FIG. 2 (A, B, C e D) Fotografia e desenho da parede labiríntica da caixa do tímpano, mostrando fóssulas da janela do vestíbulo de largura média. (1) Estribo, na fóssula da janela do vestíbulo. (2) Canal facial. (3) Processo cocleariforme. (4) Promontório. (5) Fóssula da janela da cóclea. (6) Eminência piramidal.



Fóssulas de largura máxima (Fig. 3 -A, B, C, D e F). - Em 35 casos (27,41 % ) verificamos que a largura da fóssula no seu têrço médio variava de 2,1 mm a 2,5 mm sendo esta a largura máxima encontrada.

O fato destas peças se apresentarem mais largas do que as do grupo precedente, é devido, segundo nossas observações, a dois fatôres; a) o promontório, nestes casos, é mais baixo e, sua face voltada para a fóssula mais curvilínea (Figs. 10, 12 e 13); o canal facial apresenta-se com um trajeto de curvatura visivelmente mais pronunciada do que os demais (Fig. 3 - B, C e E).


FIG. 3 (A, B, C, D e E) Fotografia e desenho da parede labiríntica da caixa de tímpano, mostrando fóssulas da janela do vestíbulo de largura máxima. (1) Estribo na fóssula da janela do vestíbulo. (2) Canal facial. (3) Processo cocleariforme. (4) Promontório. (5) Fóssula da janela da cóclea. (6) Eminência piramidal.



O pólo anterior destas fóssulas era também mais largo do que o dio, porém, em alguma o processo cocleariforme projetava-se sobre estreitando-a (Fig. 3 - C).

O pólo posterior como já foi descrito tem seu estreitamento condicionado pela presença do pontículo do promontório e êste fato vem se confirmar em 10 preparações nas quais o pontículo ou não existia ou era formado por um delgado e curto processo ósseo promontorial e uma dobra mucosa, estas foram as fóssulas que apresentaram a largura máxima sendo o pólo posterior tão largo quanto o têrço médio.

Discussão

Os resultados mostram que a fóssula da janela do vestíbulo pode apresentar diferentes graus de estreitamento, apresentando-se com a forma desde uma fenda de 1,2 mm situada entre o canal do facial e o promontório até a de uma apreciável abertura de 2,5 mm.

O maior estreitamento verificado na fóssula vestibular impedia que se retirasse o estribo íntegro como se observa em alguns animais 11,12 sendo os fatôres que concorrem para êsse fenômeno, a saliência pronunciada do canal do facial na sua terceira porção3 e a face do promontório voltada para a fóssula, mais reta do que curva. O estreitamento causado pelo canal do facial, acontece mais facilmente quando o nervo está exposto, devido a ausência da parede óssea 1, 2, 3, 5, 7, 8, 9, 10, 14 do canal, ou pelas variaçães que este nervo pode apresentar 4, 6, 8 ,10.

Êsse estreitamento exagerado ocorre em 11,11% dos casos estudados cuja largura do terço médio da fóssula variava de 1,2 mm a 1,5 mm.

As fóssulas que apresentavam largura compreendida entre 1,6 mm a 2 mm representam um grau médio de estreitamento e isto ocorreu em 61,48%, do material que examinamos.

A fóssula vestibular não apresenta a mesma largura em tôda sua extensão, pois, via de regra seu pólo anterior é mais largo. Contudo, em algumas preparações êste pólo se apresentava, mais estreito do que o têrço médio, e isto era devido a projeção do processo cocleariforme do semicanal do músculo tensor do tímpano. O mesmo acontece em relação ao pólo posterior da mesma que normalmente é a parte mais estreita sendo provocada pela presença do pontículo do promontório que segundo nossa publicação anterior ocorre em 70,45% dos casos sob a forma cilíndrica e laminart3. O pontículo do promontório pode ter tal situação ao ponto de reduzir a abertura do pólo posterior 0,5 mm enquanto o têrço médio apresenta largura maior do que 2 mm.

As fóssulas de largura máxima, de 2,1 mm a 2,5 mm representam 27,41% dos casos, sendo que nestas a largura exagerada se deve ao trajeto arciforme do canal do facial na sua 3.ª porção e também no promontório mais baixo do que a regra.

Nestas peças o pontículo faltou em 10 casos de modo que o pólo posterior não apresentava diferença de largura com o têrço médio e o pólo anterior era sempre mais largo do que o meio, salvo nos poucos casos em que ele era bastante pronunciado.

Informações sôbre os graus de estreitamento da fóssula assim como os fatôres que concorrem para alterar seu aspecto têm grande valor de ordem prática, por isso devem ser conhecidas as freqüentes variações encontradas na parede labiríntica da orelha média a fim de que sejam tomados os cuidados necessários como já frizaram alguns autôres 3, 4, 7, 9, 10.

Os casos de estreitamento máximo da fóssula, embora em menor número, constituem um problema para os que trabalham neste campo da cirurgia, pois o espaço entre o promontório e a 3.ª porção do canal do facial torna muito difícil o acesso à janela do vestíbulo.

Resumo

Examinando 135 ossos temporais de indivíduos adultos, o autor analisou os graus de estreitamento da fóssula da janela do vestíbulo medindo a distância da abertura do estreito externo da fóssula.

Tomou como pontos de referência a parte mais alta da proeminência do canal facial voltada para à fóssula de um lado, e, o promontório do outro lado, passando aproximadamente pela cabeça do estribo. Verificou que a fóssula vestibular pode variar de 1,2 mm a 2,5 mm de largura sendo mais freqüentes as fóssulas cuja largura variava de 1,6 mm a 2,0 mm.

Os fatôres que concorrem para provocar o estreitamento da fóssula são: o trajeto retilíneo do canal facial e a ausência da parede do mesmo provocando a protusão do nervo sôbre a fóssula; a face do promontório mais reta do que curva; a presença do pontículo do promontório estreitando o pólo posterior da fóssula e a projeção do processo cocleariforme do semicanal do músculo tensor do tímpano estreitando o pólo anterior da mesma.

Nas fóssulas que apresentavam largura máxima o promontório era mais baixo e o canal facial possuía um trajeto arciforme na sua terceira porção.

Summary

The author studied the narrowness degrees of the fossula of the vestibular fenestra examining 135 temporal bones of adult people. Were made measures of the outer strait opening distance of the vestibular fenestra fossula. The reference points of those measures were the highest part of the facial canal proeminence turned to the fosula of the vestibular fenestra in one side and the promontory on the other, passing approximately on the stapes' head.


He found that the fossula oâ the vestibular fenestra wide may vary from 1,2 mm to 2,5 mm, but the most frequent were those varying from 1,6 mm to 2,0 mm wide.

The main factors that cause the fossula narrowness are:

a) the rectilinear way of the horizontal segment of the facial canal and the absence of its wall, causing the nerve protusion over the fossula of the vestibular fenestra (stapes niche);

b) the promontory's, face more rectilinear than curvilinear;

c) the presence of the ponticulus promontory narrowing the posterior pole of the fossula, and d) the projection of the cochleariform process of the semicanal of the tensor tympani muscle, narrowing its anterior pole. In the widest fossulae, the promontory was lower and the facial canal had a more arcuate way in its third part.

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* Professor Regente de Anatomia Humana, Chefe do Departamento de Morfologia da Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu - São Paulo.

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