Versão Inglês

Ano:  1943  Vol. 11   Ed. 2  - Março - Abril - ()

Seção: Associações Científicas

Páginas: 187 a 207

 

ASSOCIAÇÕES CIENTÍFICAS

Autor(es): -

SECÇÃO DE OTO-RINO-LARINGOLOGIA E CIRURGIA PLÁSTICA DA ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA

Reunião de 17 de Julho de 1942

Presidida pelo dr. Paulo Sais e secretariada pelos drs. Antonio P. Corrêa e Mauro C. de Sousa, realizou-se no dia 17 de julho de 1942, uma reunião ordinária da Secção de Oto-rino-laringologia e Cirurgia Plástica da Associação Paulista de Medicina.

Expediente:

Aberta a sessão pelo sr. presidente, foi lida e aprovada a ata da última reunião. O dr. António P. Corrêa, traçou algumas considerações em torno do seu comentário ao trabalho apresentado pelo dr. Frederico Müller na última reunião (Maio), concluindo pela existência do lupus vulgar no Brasil, sendo entretanto, muito raro.

O sr. presidente, comunicou à Casa, a realização, no próximo mês de outubro, do 2.°Congresso de Oto-Rino-Laringologia do Brasil, a realizar-se em São Salvador na Bahia. Embora a Secção não tenha ainda recebido nenhum convite especial, o sr. presidente declarou esperar que todos os oto-rino-laringologistas de São Paulo, contribuam para o brilho deste certame, adiantando ainda que a mesma designará uma comissão para fazê-la representar no referido congresso.

Pedindo a palavra, o dr. Francisco Hartung propoz que a comissão a ser formada, seja composta não só de membros da Secção, mas que tenha um carater mais geral, isto é, que seja a representante da Associação Paulista de Medicina, pois nesse caso, haveria uma credencial muito maior. O sr. presidente, respondeu que oportunamente se determinará a respeito, pois até o presente momento, nem a Secção de Oto-rino-laringologia, nem a Associação Paulista de Medicina, receberam convites oficiais.

Dr. Rezende Barboza: A Casa deve se congratular com o dr. Mazza pelos seus estudos. Há muito que acompanhamos com interesse essas pesquisas do A., e cremos que o valor principal do seu trabalho, reside no fato de que o mesmo procura resolver uma falha, se assim podemos dizer, na semiologia otológica, representada pelo registro gráfico dos resultados dos exames pelos diapasões. A notação corriqueira adotada pela maioria dos otologistas, peca por falta de nitidez, de leitura nem sempre fácil e não proporciona um estudo comparativo fiel e rápido entre exames executados em épocas diferentes. Assim, pensamos que nêste ponto reside o valor principal do trabalho do Dr. Mazza, que o diagrama proposto permite anotar de uma maneira científica e elegante, os valores obtidos com o exame pelos diapasões.

É muito complexo o trabalho do dr. Mazza, mas achamos que o mesmo merece e deve ser comentado sob dois pontos de vista diferentes: em primeiro lugar devemos considerar a representação audiográfica em si, e, depois, o valor da transformação dos resultados pelos diapasões em unidades absolutas de sensação, em decibel.

A notação audiográfica proposta pelo A., isto é a representação em um diagrama, calculado de uma maneira toda especial, das diferentes unidades de tempo de audibilidade dos dispasões, levando-se também em consideração as constantes de amortecimento de cada diapasão de acôrdo com os dados fornecidos por Prince Fowler, parece-nos ótima, pois a sua leitura nos fornece, instantaneamente o estado atual da capacidade auditiva dos pacientes, e proporciona também, uma fiel comparação com exames anteriores, feitos com a mesma técnica ou notação. Entretanto, achamos que o dr. Mazza deve evitar de representar no mesmo diagrama as linhas e números que indicam a perda de audição de uma ficha audiométrica comum, no caso, o audiograma usado com o audiómetro Western Eletric G A. A impressão que temos, pela leitura da ficha audiográfica do dr. Mazza, é que o resultado de ambos os exames, pelos diapasões e pelo audiómetro, serão sempre absolutamente idênticos independentemente do grau de surdez do indivíduo, sendo que a linha que representa a curva das intensidades máximas, que corresponderia à surdez total pelos diapasões, coincide com a curva de valor idêntico no audiograma pelo audiómetro. Ora, tal fato, parece não concordar com a realidade. Com os diapasões raramente conseguimos e praticamente não podemos manter intensidades tão altas como acontece com o audiómetro. A própria construção dos diapasões, impõe uma limitação nos exames, principalmente em relação aos diapasões de tonalidade mais aguda que apresentam amortecimento rapidíssimo.

De outro lado, ma construção do diagrama lançou mão mais de um cálculo aritmético, calculando-se em segundos de audibilidade, apesar dos valores obtidos serem multiplicados pela constante de amortecimento para cada diapasão, enquanto a escala de perda de audição, para a representação do exame audiometrico implica num prévio cálculo geométrico. Mas, nessa parte, devemos confessar, reside um valor inestimável do dr. Mazza, em procurar coadunar, *cientificamente, em uma representação gráfica, esses dois elementos. De um modo prático, eles coincidem.

Quanto à parte de valor da transformação do resultado dos exames pelos diapasões em decibels, a mesma não deve ser discutida nem quanto às suas vantagens nem quanto às suas possibilidades, pois é um fato estabelecido e do conhecimento do A., pois o dr.. Mazza também leu a obra de Fletcher, em que esse cientista resolveu e esgotou o assunto, transformando em decibels, os valores obtidos nos exames pelo vóz, acúmetro, relógio, moedas e diapasões.

Finalizando, com toda a sinceridade, achamos que a representação gráfica proposta pelo dr. Mazza é viável e prática, apesar das limitações inerentes aos próprios diapasões mas, também pensamos que os dados devem vir anotados isoladamente, sem coincidir com um audiograma usado pelo audiômetro, pois não devemos, para os fins que desejamos, comparar valores de dois métodos, porque ambos os tipos de exame são valiosos, ambos não se subsistem mas se completam, e sim procurar registrar, como o faz o gráfico do dr. Mazza de um modo prático e seguro, os resultados dos nossos exames.

Dr. Paulo Sãs: Felicito o dr. Mazza e agradeço em nome da mesa a apresentação do seu trabalho. É muito louvável a sua atitude, procurando facilitar o exame audiométrico para a maioria dos especialistas que não possuem o audiômetro. Com isso, o dr. Mazza mostra o seu amor à audiometria, já pela função do cargo que exerce no qual muitas vezes tem que entrar em pesquisas mais rigorosas. Assim, eu o estimulo, para que continue os seus estudos no sentido de fornecer uma maneira mais prática, para conseguir resultados de audiometria, para aqueles que. não possuem o audiômetro.

Dr. Antônio P. Corrêa: Desejo apenas dizer que, se no gráfico do dr. Mazza se deixa de considerar os valores em decibeis, conforme deseja o dr, Rezende Barboza, no fundo a sua representação teria que se limitar somente à diferencial dos tempos de audição em segundos. Seria um gráfico de Roux, aperfeiçoado com a constante de amortecimento.

Dr. Angelo Mazza: Agradeço as referências do dr. Vicente de Azevedo, e peço desculpas pela "rudeza" do termo por mim empregado, como êle o afirmou. Ao dr. Rezende Barboza, agradeço as suas palavras estimulantes. Quanto ao que êle diz, que o audiômetro fala em linguagem logarítmica, enquanto meu gráfico fala em linguagem aritmética, tenho a dizer, que me base-ei na autoridade de Fletcher. Este autor, diz que a expressão:


Perda de audição + 10 log. I'/I0 = ? (t° - t )


é significativa, para qualquer som, seja puro, musical, voz e diapasão. Este fato nos obriga a admitir que ambos os gráficos sejam superponíveis.

Para terminar, devo dizer que este meu trabalho, talvez não tenha grande valor prático, más ele continue mais uma pequena pedra com a qual eu quiz contribuir para melhorar os métodos de exame em otologia.

OTITES EM LACTENTES (*) - Dr. Francisco Hartung

O A. fez um apanhado da literatura referente à patologia do ouvido médio do lactente. Demonstra quanto é falho e obscuro êste capítulo, devido às dificuldades oriundas nas condições próprias do ouvido do lactente, e pobreza dos recursos semiológicos. Por esse motivo, julga razoável a atitude de alguns otoiatras franceses e americanos, que se batem por estabelecer como norma em certos casos, uma paracentese propedêutica, mesmo quando os sinais otológicos e otoscópicos, sejam totalmente negativos. Alguns dêles são ainda mais radicais, porquanto propõem uma antrotomia exploradora, quando os distúrbios gastro-intestinais, não cedem à terapêutica e à dietética e quando não haja outro foco provável para sintomas de toxicose, que então apareçam e agravem o estado do doente, proporcionando situações desesperadoras. Para documentar a realidade da situação, transcreve uma estatística inglesa recente, atribuída a Leathart, que demonstra pelos seus números, que a mortalidade geral infantil na Inglaterra, poderia ser reduzida à metade se todos os casos de mastoidite fossem diagnosticados e operados em vida, e não na mesa de autópsia, como acontece, sendo a causa mortis atribuída à broncopneumonia, pneumonia lobar, gastro-enterites e bronquite aguda. Conclue o A. pela necessidade de maior divulgação dêstes fatos e de separar a patologia do ouvido do lactente do campo da pediatria e da otologia, para transformar-se em uma especialidade autónoma, como aconteceu com a esofago-broncoscopia.


COMENTÁRIOS:


Dr. Francisco Prudente de Aquino: Há algum tempo atrás, apresentei aqui um trabalho no mesmo sentido e também na Secção de Pediatria. Nesta última secção, me causou espécie, o ambiente hostil que encontrei por parte dos colegas pediatras, muitos dos quais ilustres profissionais, que tiveram relutáncia em admitir que pudesse existir uma gastroenterite, ou uma toxicose, devido a uma otite lactante. Daí se pode concluir a dificuldade que tem o oto-rino-laringologista em praticar a paracentese, já não falando em antrotomia, como quer o dr. Hartung. Muitas vezes para se propor a paracentese, há necessidade de um verdadeiro conselho de família.

Entre os meus 52 casos há alguns que apresentam aspectos interessantes. Em um deles, a criança veio a São Paulo desenganada pelos médicos da localidade onde morava. Fizemos a paracentese, e, em 4 ou 5 dias depois, a criança estava completamente boa. Mais tarde tive notícias de quê por várias vezes a criança tinha tido posteriormente o mesmo surto; entretanto o seu pai apenas a levava ao médico especialista em uma cidade vizinha, pedia que ele fizesse a paracentese, o que era o bastante para a criança voltar logo depois ao normal. Isto já por 4 ou 5 vezes conforme notícias que tivemos. Em um outro caso, a criança se apresentou em toxicose. Foi feita a paracentese, mas logo depois a criança peorou entrando em convulsões. Fui verificar e notei que os tímpanos estavam fechados e novamente bastou abrí-los, para que o quadro mórbido desaparecesse por completo.

Quanto aos dados de autópsia realizados na Inglaterra, que o dr. Hartung citou, acho que deveriam sofrer um reparo. De fato, é necessário saber-se o que os autores ingleses chamam de mastoidite, pois não resta dúvida que aqueles números são por demais elevados. Principalmente considerando-se as amplas comunicações anatômicas existentes entre cavum, trompa, caixa do tímpano e antro, talvez que, por ocasião das autópsias, o achado fosse mais um produto da estase cadavérica ou mesmo secreção que se tivesse depositado no antro. Não devemos esquecer também que a mastóide da criança, ainda não completou a sua ossificação.

Quanto ao mais, cumprimento o dr. Hartung, e peço que continue na jornada que começou, mesmo porque os seus primeiros frutos já estão surgindo como se pode perceber, pelo maior interesse que os colegas pediatras estão ultimamente dando ao assunto.

Dr. Rubens Brito: O dr. Hartung fez sugestões interessantes, e creio que ele fez muito bem em fazer um trabalho de tal monta sôbre um assunto de tão grande interesse prático para os oto-rino-laringologistas. Quero apenas chamar a atenção para um ponto que me parece importante. Sendo a paracentese uma cousa inócua, que não faz mal nenhum à criança, em todos os casos de dúvida, eu não vacilo em abrir o tímpano, tendo conseguido, assim, às vezes, resultados tão surpreendentes quão brilhantes.

No mais felicito o dr. Hartung pelo seu trabalho.

Dr. Paulo Sais: Agradeço e felicito ao dr. Hartung o interessante estudo apresentado, fruto de já alguns anos de trabalho árduo. Também sou da mesma opinião do dr. Aquino, no que se refere aos pediatras não darem grande atenção às afecções do ouvido, em sua relações com os distúrbios gastro-intestinais das crianças. Isto eu atribuo até certo ponto à influência da escola alemã, que é seguida por quasi a totalidade dos nossas colegas pediatras. Os ingleses, americanos e franceses, é que se batem pela paracentése Além disso, os pediatras se orientam pelos seus casos de clínica particular e ambulatórios, que quasi sempre são casos de otite aguda, enquanto o casos de otite lactente que causam aqueles distúrbios, são casos mais frequentes em hospital.

Peço ao dr. Hartung que leve este seu trabalho ao Congresso de São Salvador, pois ele honrará a oto-rino-laringologia paulista naquele certame.

Dr. Hartung: Ao dr. Aquino, devo dizer, que também tenho tido ocasião de observar a descrença dos pediatras nesta questão. Quanto à questão das autópsias, creio que as que aqui citei, são bem controladas, até mesmo com exames histológicos. Agradeço ainda a contribuição do dr. Brito e de modo particular ao dr. Sais.

Reunião de 17 de Agosto de 1942


Presidida pelo dr. Paulo Sais e secretariada pelos drs. António P. Corrêa e Mauro C. de Sousa, realizou-se, no dia 17 de agosto de 1942, uma reunião ordinária da Secção de Oto-rino-laringologia e Cirurgia Plástica da Associação Paulista de Medicina.

Expediente :

Aberta a sessão pelo snr. presidente, este, após avisar que a ata da última reunião não seria lida por não estar corrigida, declarou que a próxima sessão será realizada a 18 de setembro em virtude da Secção de Neurologia ter pedido a data ordinária por receber no próximo mês a visita do prof. Aloísio de Castro.

Em seguida o 1.° Secretário passou a ler uma carta da diretoria que diz respeito às atas das reuniões. - "Pelo sistema adotado, todos os resumos são submetidos à revisão dos próprios autores. Conviria pois que os resumos fornecidos pelos autores representassem o trabalho em miniatura, não se limitando à simples enumeração de assuntos focalizados. Durante o ano de 1941 houve 252 trabalhos dos quais os resumos e comentários taquigrafados foram publicados. Com a crescente difusão da Revista tornam-se mais frequentes as transcrições de trechos em outros periódicos."

O secretário acusa ainda o recebimento de um telegrama de Plínio M. Barreto e Snra., agradecendo a presença, no entêrro do seu filho, do representante desta Secção.

E ainda, um convite para fazer-se representar no II Congresso Brasileiro de Oto-rino-laringologia que se realizará de 11 a 15 de outubro de 1942.


ORDEM DO DIA

"CIRURGIA DA OZENA NA CRIANÇA". APRESENTAÇÃO DE UM CASO. - Dr. Ernesto Moreira.

OBSERVAÇÃO: - 10 anos e meio, branca, brasileira, Vila Adolfo, Rio Preto.

Procurou a Clínica O.R.L. do Hospital Esperança em 19 de junho de 42. Queixa-se de supuração abundante, por ambas as narinas, há 5 anos, aproximadamente. Tratamento contínuo e variado com diversos médicos e especialistas, mas, sem resultado. Ultimamente, segundo afirma a progenitora e a própria paciente que é viva e inteligente, as cefaléias frontais são intensas e constantes. Mau cheiro nasal e eliminação de crostas esverdeadas por ambas as narinas.

EXAME. NARIS E SEIOS DA FACE: - platirrinía discreta. Voz nasalada. Atrofia nasal bilateral, acentuada no andar inferior, e já bem avançada no andar médio. Pequenos polipos no meato médio direito. Secreção crostosa no andar médio das fossas nasais e purulenta abundante nos assoalhos.

RADIOGRAFIA DOS SEIOS DA FACE: - Opacidade total do seio maxilar direito, espessamento da mucosa de revestimento do seio maxilar esquerdo. Atrofia nasal e condensação óssea das paredes laterais do nariz.

BOCA, FARINGE, LARINGE: - Dentes regulares, amígdalas com sinais de inflamação crónica. Parede posterior da faringe integra sem secreção ou atrofia.

EXAMES COMPLEMENTARES: - R. de Wassermann no sangue, negativa.

TRATAMENTO E EVOLUÇÃO: - Foi tentado, inicialmente, o tratamento conservador com Xarope de Gibert, aplicação diária de ondas curtas nos seios da face. Este tratamento foi executado, religiosamente durante vinte dias seguidos e o resultado resumiu-se em melhora das cefaléias e dos seios da face. Foi então proposta e executada a operação de Lautenschleger-Moreira por mim, auxiliado pelo dr. Rezende Barbosa sob anestesia local, com prévia preparação com Nembutal, uma hora antes, e uma ampola de sedol quinze minutos antes da intervenção. O ato operatório decorreu normalmente atendendo a idade da paciente que se portou admiravelmente bem. O post-operatório está se processando com toda a regularidade.

Apresentado o caso e as radiografias correspondentes, o autor tece comentarios em tôrno dos dois tipos de rinite atrófica simples e genuina, diferenciando-as entre si. Em seguida, diz que escreveu a vários colegas, indagando sôbre o tratamento a seguir. Entre várias respostas interessantes, cita a de um colega que preconiza injeções de bismuto para o tratamento da ozena. "Se esse colega tivesse as noções que dei, diz o autor, talvez soubesse que os casos que curou não eram genuínos e sim, simples.


COMENTÁRIOS:


Dr. Paulo Sais: - O dr. Moreira continua no seu afã de desbravador da ozena E, agora se encaminhou na cirurgia da criança. Nós vemos que a maior dificuldade tem sido a compreensão da criança em suportar uma operação relativamente grande: o colega, usando entorpecentes, contornou esta dificuldade. Um único comentário que desejo fazer, e é em relação a esta cirurgia, em pacientes com menos de 12 anos. E que, em virtude dos germens dentários ainda estarem no maxilar superior, uma cirurgia aí pode acarretar pela destruição uma falha nos dentes para o resto da vida. Portanto, acho que se devia esperar mais.

Dr. Moreira: - Os germens dentários estão incluidos inteiramente no próprio osso maxilar e não têm uma relação direta, a não ser em casos de anomalias, com a própria mucosa do antro. Só sendo muito desastroso é que sé poderá atingi-los. Porém, esta menina do meu caso já estava com os dentes permanentes.

SOBRE DOIS CASOS DE ÓSTEOMIELITE DO SEIO FRONTAL E DO OSSO MALAR TRATADOS PELO BACTERIÓFAGO
(Apresentação dos doentes) - Dr. Sílvio Marone.

O A. inicia o trabalho, justificando a sua apresentação, em vista da terapêutica, que em seus pacientes empregou: o bacteriófago.

Começa definindo, segundo Kreuger e Schribner esse elemento e dá o conceito de cultura secundária; apresenta as suas propriedades terapêuticas estabelecidas por D'Herelle. Derivam desses conhecimentos os princípios da técnica de aplicação do bacteriófago que são bastante simples e cujos resultados são rápidos. Diz ainda que o bacteriófago é inteiramente inócuo nos casos em que não se observa a lise dos germes infectantes. Além disso, estabelece-se nesses casos uma ação de imunização local pela absorção do caldo que entra na composição desse agente terapêutico.

Em sua análise da literatura nacional e estrangeira não encontrou, a não ser rápidas referências sôbre a ação dêsse elemento na osteomielite, principalmente no terreno da oto-rino-laringologia. Segundo seu modo de ver, tal se deve: 1.°) ao relativo pequeno número de casos dessa moléstia naquele setor; 2.°) pelo descaso ou desconhecimento das propriedades trapêuticas do bacteriófago - Por isso apela para os colegas no sentido de se ensaiar sempre essa poderosa arma, que, quando não elimina rápida e completamente, como se pode ver em suas observações, a infecção, pelo menos é muito benéfica pela imunidade local que produz.

Passa a seguir a apresentar as suas observações: - Na 1ª, pelo adiantado do processo localizado no seio frontal D. e em parte do E. foi antes feita a ressecção da parte necrosada (processo de Moulonguet). Na 2.ª, caso raro de osteomielite localizada exclusivamente no corpo do osso malar. E foi aplicado somente o bacteriófago.

O bacteiófago empregado foi gentilmente preparado e cedido pelo Prof. Macedo Leme.

Resumo da primeira observação:

Desde dezembro de 1939, cefaléia generalizada, mais intensa ao nivel do seio frontal D, que se intensifica às treze horas e se atenuava às quinze horas e não cedia com banhos de luz e inalações. Apirético. Grande saída de pus do lado D. do nariz. Em Nov. de 1940, foi diagnosticado polipose nasal D. praticando-se a extirpação de quatro polipos. Extraiu, a pedido do medico, todos os dentes da arcada superior. Cefaléia e purgação nasal D. persistentes. Apirético. Tomou até essa data quarenta tubos de Stopton, Septazine e Rubiazol. Em Maio de 41 amanheceu com ambas as pálpebras superiores completamente cerradas; intensamente hiperemiadas e dôr nos angulos supero-internos das órbitas. Em 25 de julho de 41 procurou-nos com a sintomatologia assinalada e dôr à pressão ao nivel dos seios frontal e maxilar Ds., tumefação da pálpebra superior D semelhante a flegmão. Radiografia: "Pansinusite D. Opacidade do seio frontal E. Seios maxilar e etmoidal Es. de transparência normal". Entretanto escapou-nos a nós e ao radiologista um processo de ósteo-mielite de tábua externa do seio frontal D. A 30 de julho abrimos o seio maxilar D. cuja mucosa se apresentou com degeneração poliposa. Abertura dos etmóides anteriores Ds., cuja mucosa apresentava a mesma degeneração. Ampliação do canal naso-frontal D. sem curetar o frontal. No post-opertório curativos comuns, Stomosina antipiógena, com desaparecimento completo da cefaléia. A 12 de setembro, voltou, apresentando tumefação da pálpebra superior e que não cedia com tratamento antifeccioso geral. Tratava-se de flegmão duro, circunscrito nessa pálpebra, determinando ptose e sensação de peso. A punção somente saída de sangue. Pensou-se em neoplasia e goma luética. R. W. e R. Kahn negativas. Contudo tomou Neosalvarsan 0,30 sem melhoras, vindo, ao contrário, até a passar mal. A 15 de Outubro abriu-se por si o suposto flegmão dando saída a pus amarelo cremoso. Apesar-dos curativos diários não param de minar pus. Nova radiografia: "Contôrnos dos seios frontais são imprecisos e há uma reação de osteite do seio frontal D., com destruição dos contornos súpero-internos da órbita desse lado. Sinais radiológicos de pan-sinusite à D., com osteite e ósteomielite da táboa externa do seio frontal. A 20 de Outubro, operado pelo dr. Matos Barreto e auxiliado por nós. Operação, de Moulonguet. Ressecção de toda a taboa externa do seio frontal D. e parte da do frontal E. Ressecção do septo inter-sinusal. A taboa interna do seio frontal D. apresentava fócos superficiais de ósteo-mielite, que foram eliminados, dando-se visão à dura que se apresentava com caracteres nítidos de paquimeningite, o que agravava o quadro.

O interessante desta observação reside no post-operatório, pois durante os três dias seguintes houve cefaléia intensa, seguindo-se estado de inconsciência e agitação. Temperatura alta. Vacinoterapia e imunotransfusão diária. No quarto dia, depois de operado fizemos a primeira aplicação do bacteriófago local por meio de sonda frontal com acentuada melhora e queda da curva térmica, melhoras que se estenderam até o quinto dia. No sexto dia nova exacerbação da febre, tonturas e dôres na nuca. Do sétimo dia em diante a febre caiu por crise as melhoras se acentuaram. A 31 de outubro, depois da sétima aplicação do bacteriófago, teve alta do hospital. Atualmente, (Agosto de 42), depois de onze meses está passando perfeitamente bem, tendo engordado oito quilos. A cura clínica pode ser verificada pelas radiografias, e pelo paciente que se acha presente.

Se no primeiro paciente fez antes terapêutica cirúrgica para depois se aplicar o bacteriófago, que conduziu acentuadamente a evolução para a cura, já no segundo paciente a terapêutica foi exclusivamente o bacteriófago. Chama o A. ainda a atenção para a localização rara da afecção, localização essa que não foi encontrada tal como encontrou em nenhum dos tratados especializados nacionais ou estrangeiros.

Resumo da segunda observação:

A 4 de fev. de 1942, dôr ao nível do osso malar. E, cujas partes moles suprpajacentes se edemaciaram exageradarnente, edema que atingiu, onze dia depois, a pálpebra inferior, a face até as proximidades do olho. E, do tamanho de uma laranja baía das grandes. A 7 do mesmo mês a dor se acentuou, com latejamento e febre à noite. A 13 de fev. procurou um hospital da capital onde lhe disseram tratar-se de abcesso, tendo sido incisado no reborbo inferior do malar E. Houve saída de pus fétido, atingindo mais ou menos tres litros; não refere saída de sequestro. Melhoras acentuadas. Um mês após, intumescimento da pálpebra inferior E. do tamanho de um ovo de galinha, doloroso e sem prejuízo da visão E. Radiografado verificaram tratar-se de sinusite maxilar. Punção maxilar negativa. Aberto o flegmão palpebral, nas proximidades do ângulo externo com saída de pus fétido semelhante ao do osso malar. Apesar-dos curativos diários o pus continuava a mina. Depois de 26 curativos e de continua purgação, foi operado de sinusite maxilar E., mas a purgação persistia. Nova radiografia é verificou-se tratar-se de osteomielite do osso malar. Foi indicada ressecção desse osso a que o paciente não se submeteu, procurando-nos. Procurou-nos a 22 de abril de 1942, apresentando fístula ao nível do rebordo inferior do osso malar e com saída de pus cremoso, sem sequestro, tumefações mamilonares ao nível da pálpebra inferior. R. Wassermann: negativa. Radiografia: "Opacidade do seio maxilar e processo destrutivo do osso malar E por ósteo-mielite". Colhemos o material e enviamos ao dr. Macedo Leme, ao mesmo tempo que procedíamos à fotografia. No dia 34 de abril fizemos através da fístula a primeira aplicação do bacteriófago que se repetiu nos dias 2 de maio, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 11. No dia 7 depois da 6.ª aplicação de bacteriófago notamos saída de pequeno sequestro de 0,5 cmt. de comprimento e o pus perdia seu aspecto cremoso para se tornar cada vez mais fluido e de menor quantidade. No dia 9, depois de 8.ª aplicação o pus era quasi nulo e de aspecto aquoso. No dia 12, depois da 9.ª aplicação, não houve mais saída de pus, mantendo-se assim até hoje (agosto de 1942). Procedemos a fotografias e radiografias durante a tratamento e depois da cura que a confirmam. O doente, que está presente, está passando perfeitamente bem, tendo engordado nove quilos.

O presidente pediu que os comentários sobre este trabalho, fossem feitos após a apresentação de um caso semelhante, pelo dr. Rezende Barboza, que se segue:


OSTEOMIELITE FRONTAL (*) - Operação de Fürstenberg. - Drs. Carlos Gama e J. E. Rezende Barboza.

Os AA. apresentam um caso de osteomielite do osso frontal de tipo invasor, operado pela técnica de Fürstenberg há 8 meses e que se encontra, ainda, em observação, mas que, em tudo, leva a crer, que o paciente já se encontra clinicamente curado, com ferida operatória cicatrizada; estado geral florescente e as radiografias já demonstraram a neoformação óssea ao nível da zona de ressecção, osso esse regenerado, provavelmente, à custa da própria meninge.

Os AA. passam à leitura de detalhada observação em que descreveram a evolução de um processo de pansinusite bilateral em que foi feito esvaziamento de todos os seios pelas técnicas rotineiras, inclusive, em uma última etapa, o esvasiamento frontoetmoidal, bilateral, pela técnica de Lothrop-Sebileau, sendo que dois meses após esta última intervenção surgiram sinais de retenção aguda, dos seios frontais e comprometimento do osso frontal, na linha mediana, por um processo osteomielítico.

Em seguida descrevem a técnica operatória, segundo Fürstenberg, com ressecção larga das duas táboas, em pleno osso são, a dois centímetros de distância do fóco osteomielítico, com
emprêgo da serra circular, evitando contaminação das meninges. Chamam a atenção para a conduta seguida de electro-coagulação meticulosa de todos os canais da diploe. O post-operatório foi lento, sendo que durante os primeiros 20 dias foram executadas imuno e normo-transfusões, bem corno o uso de sulfatiazol por via oral. Os curativos constavam de lavagens com soluções de Dakin e aplicação de sulfanilamida em pó ao nível das incisões. A ferida cicatrizou-se com máu resultado plástico, aguardando-se, após observação mais prolongada da cura, uma possível intervenção plástica reparadora.

Os AA. apresentam um estudo radiográfico completo do caso, bem como a peça operatória que pertence atualmente ao Museu de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O paciente compareceu para ser observado pelos colegas.


COMENTÁRIOS:


Dr. Enio D'Aló Salerno. - Como contribuição ao trabalho do dr. Marone, quero referir um caso de fístula frontal, na qual a ausência do septo sinusal não foi notada, e que fechou depois do tratamento. Meses depois a doente voltou e fui obrigado a intervir novamente. Desta vez a doente não apareceu mais, o que faz pensar em uma cura, pelo menos relativa.

Tenho ainda um outro caso de sinusite com inflamação do osso malar, tratado exclusivamente por métodos cirúrgicos. O paciente, só mais tarde, fez algumas injeções de bismuto tendo-se realizado então a cicatrização.

Como contribuição ao trabalho do dr. Rezende Barboza, relato um caso de osteo-mielite em que a tábua interna tinha desaparecido por completo, o que foi percebido somente no ato cirúrgico. Encontrou-se uma meninge exposta em larga extensão com granulação muito grande. O pós-operatório foi acompanhado de um tratamento com sulfanilamida em microcristais. Tanto o pré como o pós-operatório foram chocantes, porque não se apresentou febre e nenhum outro sintoma. O pós-operatório foi rápido e com ausência de qualquer sintoma que dissesse que a meninge estivesse exposta em grande extensão.

Dr. Macedo Leme. - Quero referir-me aos 3 casos, apresentados, salientando que o bacteriófago só age quando posto em contato íntimo com o fóco de infecção. Assim, num dos casos do dr. Marone, diz o A.: "em que havia uma fístula, o bacteriófago foi aplicado com ótimos resultados." Dêsse modo, desde que seja possível seu emprego, deve-se faze-lo pois evita a mutilação e o sofrimento do doente, no caso de uma operação. O uso do bacteriófago não tem a menor contraindicação e tem dado os melhores resultados tambem no tratamento das sinusites. Seria interessante aplicar o bacteriófago em maior número de casos, afim de confirmar as suas propriedades terapêuticas. Estou certo de que podemos esperar do seu emprêgo em favor do doente e da Medicina.

Dr. Gabriel Porto. - O problema da osteomielite, é um dos mais importantes da Oto-rino-laringologia. Quero crer que o espirito de divergências de escolas e de tratamentos depende dos vários tipos. Devido a uma certa incompreensão e mesmo dificuldades que temos de reconhecer estes diversos tipos é que se determina uma certa confusão entre as escolas, a conservadora e a cirúrgica. Os casos são variáveis e todos os recursos de que temos lançado mão, com eficiência parcial ou completa, são todos muito interessantes e não podemos esquece-lôs. Parece interessante a contribuição do bacteriófago nestes casos.

Na clínica Mayo, admite-se a divisão da osteomielite em 3 tipos: osteomielite fulminante, séptica, na qual a morte se dá em 24 a 48 horas, parecendo não haver cura; osteomielite difusa, do crânio, que é muito grave e que evolue geralmente em dois meses; e por fim o tipo de osteomielite circunscrito, que é o mais benigno e que alguns chamam de osteite. Este é o tipo da sinusite frontal fistulizada, não apresentando nada de grave e é geralmente de bons resultados cirúrgicos, pois basta abrir o abcesso e tratar do seio frontal. Entre os tipos desta classificação tão esquemática, é claro que deve haver tipos intermediários.

Estou acompanhando um paciente, ha 7 anos, cuja doença, teve uma evolução lenta e acidentada. O paciente teve uma osteomielite e um processo septicémico por estafilococos. Com o tratamento caminhou para a cura. Depois, em períodos de 6 em 6 meses, mais ou menos, o indivíduo aparecia com um abscesso no couro cabeludo, o qual era curado normalmente. Agora, depois dos 7 anos da primeira manifestação da osteomielite difusa, foi internado na clínica com coisa mais grave, apresentando temperatura elevada. Foi internado, embora não tivesse uma coleção supurada na região frontal, mas não demorou muito que se constituísse um abscesso. Tudo melhorou e parecia que se ia resolver, quando teve um acesso convulsivo e perda do conhecimento. No dia seguinte, porém estava bom. Depois, resolvi fazer uma intervenção tipo Fürstenberg, mas não completa. Retirei uma grande extensão da táboa do frontal, interna e externamente. Depois de uns 15 dias surgiram sinais nítidos de abscesso encefálico. No post-operatório, que ia decorrendo satisfatoriamente, surgiu uma colossal hérnia do cérebro, do tamanho de uma laranja, manifestando-se durante este período uma meningite concomitante e purulenta. Depois de 2 meses, consultei o dr. Carlos Gama a respeito, o qual opinou por uma ressecção da hérnia, após a qual ficou na dura, uma perfuração do tamanho de uma moeda de 400 réis das grandes. Depois, tivemos um recidiva da hérnia, e assim o caso acomodou-se sendo que a ósteo-mielite já há uns 3 meses está curada. Espero que este doente se restabeleça e terei a oportunidade de trazê-lo aquí. O caso é curioso pela evolução lenta da ósteomielite.

Um outro doente, observado nesta mesma ocasião, teve uma ósteomielite que se extendeu bastante, até a região occipital, tendo sofrido grande ressecção cirúrgica.

Esta contribuição serve para demonstrar que este problema da ósteo-mielite é um problema essencialmente clínico. Um médico bastante experimentado pode decidir qual a atitude que deve seguir em cada caso.

Dr. J. Matos Barreto. - Em relação ao caso do dr. Marone, cuja parte cirúrgica nos coube, eu desejo comentar sôbre o emprego do bacteriófago, acentuando, todavia, que na citação de casos e estatísticas é preciso considerar, como acaba de dizer o dr. Porto, os tipos intermediários, quando não sejam unicamente de uma osteíte com fistulização e comprometimento dos tecidos moles. O caso em apreço, porém, era de ósteomielite, tão extensa, que nos obrigou a fazer a extirpação ele quasi toda a parede lateral do nariz, a espinha naso-frontal e as paredes anterior e posterior dos dois frontais: o processo de Moulonguet ainda ampliado. Fomos felizes, assim, quando nos lembramos da oportunidade de aproveitar, em bom tempo, os estudos e a solicitude do dr. Macedo Leme, a quem nos cabe ainda uma vez agradecer.

Tenho empregado o bacteriófago em outros casos de pansinusite complicada, notando que o tratamento post-operatório é muito encurtado. Também em casos de simples tratamento conservador, os resultados são muito bons. Ocorre-me citar o caso de uma octagenária, com bronquite e impossibilidade quasi de levantar a cabeça do travesseiro. Devo dizer que neste caso, empreguei também a Tiazamida, ulteriormente. Com essa mesma preparação de bacteriófago, fornecida pelo dr. Macedo Leme, obtive o resultado desejado no caso de um menino de uns sete anos cuja sinusite, com osteite do malar, por muito tempo ignorada, vinha comprometendo o seu estado geral. A criança por febril e não se queixar de dores, era submetida a toda a sorte de pesquisas e tentativas de tratamento clínico, menos os da especialidade.

E apenas com estas referências que eu desejava contribuir aos comentários dos dois brilhantes trabalhos hoje apresentados. Pretendo, posteriormente; reunindo um maior numero de casos, apresenta-los, como comprovantes da influência do bacteriófago na reativação benéfica da defesa dos tecidos, mesmo em processos não francamente supurativos.

Dr. Jorge Hirschmann. - Achando-me, atualmente, às voltas com um destes casos, quero relaciona-lo a esta divergência existente entre a ampla cirurgia e o tratamento conservador. O caso é mais ou menos semelhante a um dos que foram apresentados pelo dr. Marone. Há uns 4 meses, o paciente foi operado de sinusite maxilar. No post-operatório tudo correu mais ou menos normalmente. Vinte dias após a cirurgia, apareceu um pequeno edema infra-orbitário, que se foi extendendo. A radiografia, não revelou nenhuma lesão óssea. O edema continuou, e 20 dias após foi tirada nova radiografia percebendo-se então que havia uma lesão óssea no maxilar superior. Nesta ocasião o dr. Macedo Leme nos cedeu o bacteriófago. O doente, com outros tratamentos também melhorou bastante; indo então para a sua residência. Uma semana depois, o edema apareceu novamente e começou a aumentar. O processo veio quasi a furo, sendo feita então uma incisão infra-orbitaria e desde então, tenho aplicado o bacteriófago quasi que diariamente. O estado do doente tem melhorado sensivelmente, mas embora já não tenha mais febre, a supuração continua não cedendo, infelizmente, até agora. O doente tem um edema do dorso do nariz que está, entretanto, cedendo relativamente. Nada de definitivo se pode dizer ainda, porque o processo ainda está em evolução, sendo que foi obtida uma cultura positiva para o estafilococo dourado.

Um fato interessante, referido pelo dr. Marone, é o seguinte: No 2.° caso por ele apresentado, foi empregado o bacteriófago. Pois bem, 6 dias depois foi eliminado um sequestro. Ora, se este não fosse eliminado, a supuração não cessaria completamente, e a intervenção deveria ser feita, embora não de modo amplo. E o que penso do meu caso tambêm. Talvez seja melhor fazer uma abertura mais ampla para eliminar o sequestro, se é que há sequestro.

Dr. Macedo Leme. - O bacteriófago anti-estáfilo, age somente nos processos infecciosos, que têm por agente etiológico o estafilococos e, mesmo assim, não resolve todos os casos. Proponho entretanto, que seja experimentado todas as vezes que houver oportunidade para tal, prosseguindo, se os resultados obtidos forem satisfatórios. Em caso contrário, lançar mão dos outros processos indicados. Levando-se em conta a sua alta especificidade, é inútil persistir nos casos em que o agente etiológico não seja homólogo, assim como nos casos de sequestro, pois o bacteriófago não poderá fazê-lo desaparecer tornando-se indispensável a sua retirada cirúrgica. Entretanto, mesmo que o germe não seja lisado, não é uma terapêutica inútil, pois sendo o caldo simples uma substância quimiotáxica positiva, atrai os leucócitos para o foco e aumenta a imunidade local à custa das proteinas dos germes que são lisados durante o seu preparo, fatores que vão contribuir indiretamente para a cura do processo infeccioso.

Nada mais havendo a tratar, o sr. presidente agradeceu aos autores dos trabalhos apresentados a sua colaboração e deu por encerrada a reunião:

SOCIEDADE DE OTO-RINO-LARINGOLOGIA DO RIO DE JANEIRO

Ata da 45.ª Sessão Ordinária


Aos dois dias de Outubro de mil novecentos e quarenta e dois, reuniu-se em sessão ordinária a Sociedade de Oto-rino-laringologia do Rio de Janeiro, sob a presidencia do Dr. Aristides Monteiro tendo como secretário o Dr. Getulio Silva - Ao expediente falou o Dr. Müller dos Reis, que pergunta à Casa sobre a realização do 2.° Congresso Brasileiro de Oto-rino. O Snr. Presidente diz que está seguramente informando que este será adiado, não tendo porém ainda recebido até este momento qualquer informe oficial.

ORDEM DO DIA

1.°) HEMANGIOENDOTELIOMA DO OUVIDO MÉDIO
Dr. Aristides Monteiro.

Os endoteliomas são tumores que em geral se originam do endotélio vascular, tomando a designação de hemangioendotelioma quando a sua origem tem raizes do endotélio vascular sanguíneo e linfangioendotelioma quando é oriundo do endotélio vascular linfático.

C. P. parda, de 29 anos, solteira, procurou a clinica de O. R. L. do Dr. Paulo Brandão, no Hospital S. Francisco de Assis em fevereiro de 1929, queixando-se "dum tumor do ouvido que sangrava com facilidade e não a deixava ouvir a cerca de um ano". Via-se à entrada do conduto auditivo externo uma massa esbranquiçada, de superfície irregular, sangrando ao toque do estilete. Com cautela verificamos que o seu pedículo era profundo, não aderia às paredes do conduto, ausência de secreção. Fizemos a acumetria que demonstrou uma surdez de transmissão. Uma biopsia feita em 28-3-929 mostrou tratar-se de um mixofibroma (Dr. O. Pena). A doente recusou submeter-se à operação. Oito anos depois, em 1937, voltou novamente a paciente queixando-se das mesmas perturbações e disposta a se operar. Pedimos uma radiografia da mastóide, que mostrou na posição de Stenvers o seguinte: "rochedo esquerdo, área de osteolise na zona pétrea que fica para dentro do labirinto, seguindo o eixo da pirâmide: A referida área interessa também o bordo superior. Verica-se também a presença de algumas áreas de rarefação na região mastoidiana, cuja transparência está comprometida. Foram feitas também radiografias do rochedo e mastóide direita que se apresentam radiologicamente normais". (Dr. Vitor Rosa, 5-7-937). Fizemos uma radical do ouvido médio, que se encontrava completamente cheio da massa tumoral poupando em parte a mastóide, somente emitindo pequeno prolongamento para o antro e algumas células peri-antrais. A extração da massa tumoral deu lugar a abundante hemorragia, a custo sustida somente depois de completa exerese do tumor. Não fizemos plástica alguma. Em um mês e meio alta curada com epidermização relativa da caixa. A doente não voltou à clínica conforme pedíramos. A biopsia deste tumor foi porém diferente da primeira; examinando com vagar encontramos elementos que nos levaram a diagnosticar um hemangioendotelioma. Dois anos após em 1939, novamente, somos procurado pela paciente que nos contou passara bem cerca de seis meses, depois recomeçaram as hemorragias pelo ouvido, quando ela o tocava por causa de pruridos que sentia; piorara tambem da audição, estando completamente surda, e o que mais ainda a aborrecia, era que há dois meses a cara "ficara torta". De fato, verificava-se uma paralisia facial e uma surdez mixta completa (Audiômetro Western Eletric 6,B). Examinamos a paciente e verificamos que o tumor se reproduzira, ocupando o mesmo lugar e tendo o mesmo aspecto anterior, no conduto auditivo externo. Propuzemos nova radiografia e operação, recusou tudo, morreria com "aquilo". Há um ano procurou-nos no Hospital, na mesma quanto a lesão e disposta a não se operar mais.

A natureza do tumor mostra que este se origina do sistema celular do endotélio vascular, dos espaços subdurais e das cavidades serosas. Sua origem seria a mesma da linhagem das células da cavidade celônica, donde procedem, e que se formam cedo pela fenda que existe nas duas camadas do mesoderma. As células do nosso tumor seriam oriundas das células mesenquimatosas, em estreita relação com o tecido conjuntivo.

Estudando em seguida os tipos histológicos veremos que são quatro a saber: os perivasculares, o adenóide, o angioendotelioma e o endotelioma difuso. São tumores sólidos, circunscritos e nas serosas encontram-se como nódulos opalescentes. No osso, diz EWING (Neoplastic Diseases. Fth. ed. Saunders. 1940), o endotelioma tende a retomar o lugar do tecido pre-existente com pequeno ou grande aumento da forma do osso mas com numerosas perfurações na sua estrutura textural; isto se verificou no nosso caso, onde se observa no rochedo e mastóide, várias zonas de osteolise circunscritas. Sua multiplicidade é uma das características do tumor e nota-se tal fato nos diferentes pontos que ele localiza no rochedo do nosso doente (veja radiofoto anexo).

A penetração do tumor tambem se faz por contiguidade, GRASSER cit. por MANASSE, (Path. Anat. p. mensch. Ohres. Bergmann. 1917. Wiesbaden) viu três casos deste tumor, sendo dois fatais; um deles, tinha um nódulo secundário no conduto



Fig. 1



Radiografia do rochedo (Stenvers).
Nota-se uma área de osteolise na zona petrea que fica para dentro do labirinto, seguindo o eixo da pirâmide. A referida área interessa também o seu bordo superior.



Fig. 2



Pequeno aumento. Numerosos vasos néoformados, estroma conjuntivo com celulas endoteliais.



Fig. 3



Grande aumento. Verifica-se a presença de células endoteliais esferóides
ou fusiformes. O citoplasma é claro, no núcleo nota-se a cromatina pulverulenta regularmente disposta.

auditivo interno, lesando o acústico. Aponta ainda aquele autor o perigo de erosão da carótida pelo tumor, ocorrência rara ruas nem por isso impossível.

Em 1934 (O Hospital. 9.779) publicamos com MAGARINOS TORRES um caso de endotelioma da dura mater dando metastases nos gânglios linfáticos cervicais, toráxicos, pleura e miocárdio. O tumor perfurou a calote craniana, produzindo largas depressões nos lobos parietais de ambos os hemisférios, sem se estender para a substância nervosa. É interesante notar que apesar disto não havia paralisia motora nem alterações da palavra. O ouvido nesse caso ficou indene à invasão da massa tumoral.

A estrutura celular destas formações tumorais é típica, e no nosso caso as células apresentavam-se poliédricas, do tipo pavimentoso, raramente cilíndrico. Num ou noutro lugar viam-se algumas fusiformes, outras esferóides. O citoplasma é claro, relativamente pequeno, o núcleo apresenta-se com cromatina pulverulenta regularmente distribuída sem formar grumos, com um nucléolo típico. Fibrilas endoteliais sofrem degeneração hialina, de permeio com grande número de vasos sanguíneos neoformados.

O diagnóstico diferencial é feito com o epitelioma e não se presta a confusão.

A etiologia é no geral a mesma dos tumores vasculares: o trauma e a inflamação crônica. No nosso caso havia uma passado de dores do ouvido quando criança, possível otite média purulenta crônica. Quem sabe se esta causa não foi a predisponente.

Em regra estes tumores não dão metastases, apesar do caso de CLEMINSON (Zbl. Hals. 7.873.1925) que relata a observação dum endotelioma do ouvido médio e externo com metastase para o peritônio, e do nosso e de Magarinos Torres citado linhas acima.

Queremos ressaltar dois fatos essenciais: um, a transformação do tumor que se explica ou por não ter a primeira biopsia pegado o estroma propriamente dito, ou porque se deu evolução subsequente para outra classe tumoral. Outro, digno de nota, é a natureza benigna do blastoma. Tumor acompanhado durante treze anos que recedivou e pelas destruições que fez podemos tomá-lo clinicamente como maligno (paralisia facial e nevrite do acústico), e histologicamente como benigno. Não fôra a organização do serviço de anatomia patológica que temos, e não séria possível o acompanhamento durante treze anos do mesmo caso com ensinamentos tão valiosos.

Na bibliografia que consultamos, vimos o caso de SEIFFERT (Z. Hals. usw. Heilk 35:348.1934) que tem muito de comum com o nosso caso. O autor alemão examinou uma doente com uma cicatriz operatória no sulco retroaricular; do conduto auditivo emergia uma granulação que facilmente sangrava. Tinha sido operada de radical por outro especialista em 1928, de um "tumor que sangrava bastante". O exame histológico feito nessa ocasião deu o seguinte resultado: tecido neoformado infiltrado com grande desenvolvimento de vasos. Em 1933, cinco anos depois, Seiffert examina-a e verifica a reprodução do tumor. Nova intervenção radical, massa tumoral enchendo a cavidade operatória; com o tecido que sangrava abundantemente viam-se de permeio massas colesteatomatosas. Seio lateral com parede espessada e granulado. Uma outra biopsia mostrou então que se tratava dum endotelioma do ouvido médio. Complica-se o caso, quatro semanas depois temperatura 40.°, sensibilidade e dor no ângulo do maxilar. Mais uns dias e meningite. Trombrose-do seio. Morte. A autopsia mostrou restos do tumor na região do foram em jugular e abaixo da trompa nota-se um abscesso; a meningite, foi a causa mortis. Seiffert pensa como nós, e o mesmo nos sucedeu, que a primeira biopsia não tenha interessado a massa tumoral em cheio, daí o resultado negativo. Diz que muitos tumores rotulados de angiosarcomas, alveolosarcomas e outros, nada são que verdadeiros endoteliomas.

SCHALL, (Surgery of the Ear. S. Kopetzky. T. Nelson ed. New York, 1938) escrevendo o capitulo de cirurgia dos tumores do temporal faz referências e publica duas fotografias, uma de hemangioma do ouvido médio, que se extendia ao conduto e células retrofaciais, não havendo reprodução dois anos depois; a outra, é de um hemangiona endotelioma do ouvido médio e mastóide. Foi feita na paciente uma timpanomastoidectomia e irradiação, fechamento da incisão retroauricular, oito anos depois nenhum sinal de reprodução. O autor americano recomenda aplicação imediata de radium na cavidade, a menos que a dura ou o seio lateral estejam expostos. Agulhas de radium de 10 mg. cada uma protegidas por 1 cm. de gase, numa dosagem de 1.000 mg. horas. Esta dosagem não causa nem lesões cerebrais, nem necrose ósseas.

Estes tumores são de crescimento lento, FRASER (Zbl. Hals. 13.262.1929) menciona um do temporal, que durou dezessete anos; o nosso caso é típico bem como o de Seiffert, porém acreditamos que se reproduzam com facilidade uma vez operados. No caso deste último autor o processo inflamatório que se instalou secundariamente, concorreu para o desenlace fatal do caso, e a contaminação do tecido são fez-se através dos numerosos vasos sanguíneos do tumor.


COMENTARIOS


O PROF. ERMIRO LIMA comenta o caso, destacando a raridade deste tumor no ouvido médio e fato digno de menção, de se observar o seu desenvolvimento durante treze anos conforme assevera o autor, baseado num perfeito serviço de anatomia patológica como tem a clínica do Prof. Marinho, e que é do seu conhecimento. Pergunta, porque o autor não fez a prévia ligadura da carótida externa, afim de evitar a hemorragia abundante que se processou no ato cirúrgico. Termina felicitando o Dr. Aristides pelos ensinamentos que trouxe à Casa com o seu caso.

O DR. ARISTTIDES MONTEIRO agradece o interesse com que a Casa e o Prof. Ermiro ouviram e comentaram sua comunicação. O tumor é de fato raro e a observação longa do seu caso só foi possível devido como acentuou o Prof. Ermiro Lima, à organização que há na clínica onde trabalhe. Lá todo tumor, processo inflamatório em dúvida, ou caso operado vai para biopsia, daí podermos acompanhar os casos dez, vinte anos se quizermos, pois desde 1923 os temos fichados em arquivo de lâminas. Não fez a ligadura da carótida porque já observou em mais de um caso publicado (Linfangioma do cavum) que tal procedimento não deu o resultado esperado. A hemorragia neste caso anteriormente publicado, foi assustadora e não fosse o tamponamento imediato não sabe o que ocorreria. A circulação de retorno restabelece-se mais rápido do que se pensa, não produzindo a ligadura da carótida o que era de se esperar.


2.°) USO LOCAL DA SULFANILAMIDA EM OTORINO-LARINGOLOGIA - Prof. Dr. Ermiro Lima.

O A. faz considerações sobre o emprego moderno e local da sulfanilamida. Esse emprego vem sendo feito nos ferimentos, como recurso profilatico, e tambem nos processos supurativos, como recurso terapêutico.

Como recurso terapêutico, o emprego local da sulfanilamida, nos processos inflamatórios no domínio da Oto-rino-laringologia vem tendo largo uso. O A. faz considerações sobre o modo de ação dá sulfanilamida, e apresenta algumas observações da especialidade,nas quais obteve bons resultados com o método: 5 de afecções inflamatórias dos seios da face; 5 de mastoidite; 5 de amigdalectomias seguidas do emprego local do mesmo agente medicamentoso.


COMENTARIOS:


O DR. RAMON PRIETO (DE ASSÚNCION) tece comentários sobre o emprego da sulfamida em O. R. L. dizendo que a viu empregar na clínica do Prof. Marinho, no Hosp. S. Francisco de Assis no tratamento das sinusites maxilares e nas mastoidites. Fala das vantagens do emprego do medicamento por via para-enteral e chama a atenção para os casos de intoxicação.

O DR. PAULO BRANDÃO comenta a comunicação dizendo que nas operações de maxilar e etimoide é tão conservador no tratamento post-operatório, que as vezes nem lava o maxilar operado, sempre satisfeito com essa norma de conduta. Usa o sulfamida por via para-enteral, com excelentes resultados, nas otites médias agudas, com temperatura elevada e estado geral toxi-infeccioso grave. Tem várias observações, em crianças principalmente, onde o tratamento combinado da droga e cirurgia deu resultados brilhantes, e outros casos onde mais de uma paracentese não foi necessária por efeito tão somente da terapêutica sulfamídica.

O DR. ERMIRO LIMA esclarece aos seus comentadores que se referiu principalmente ao uso do medicamento no emprego local. Que nos seus casos tem-se dado por satisfeito, fazendo hoje larga aplicação do método; vem trazer à casa os seus primeiros observados. Quanto a toxidez do medicamento, por isto mesmo que a sua absorção é bem menor do que quando empregado por via para-enteral, - ela é mínima. Si não lhe falha a memória trinta por cento do efeito medicamentoso da droga é absorvido, daí não lhe causar receio o emprego desta terapêutica. Agradece aos seus colegas a honra que lhe deram em comentar o seu trabalho.




(*) Trabalho publicado na Revista Brasileira de O. R. L. - X, pag. 573 Set.-Out. 1942.
(*) O trabalho foi publicado na íntegra. Veja Rev. Ass. Paul. Med., Vol. XX, Julho de 1942, pág. 373.

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