Versão Inglês

Ano:  1942  Vol. 10   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - ()

Seção: -

Páginas: 627 a 633

 

MUCOCÉLE DO SEIO MAXILAR

Autor(es): DR. J. E. DE PAULA ASSIS

Adjunto da clínica

CLINICA OTO-RINO-LARINGOLOGICA DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE S. PAULO (Serviço do Dr. Mario Ottoni de Rezende)

Entre as afecções dos seios da face, que se destacam pela sua raridade, enquadram-se os mucocéles. Mucocéle não é mais do que o acúmulo das secreções produzidas pela mucosa que reveste os diversos seios da face, as quais não podem ser expelidas pelo incessante movimento' dos cilios vibrateis, devido a uma oclusão dos canais que ligam os respectivos seios às fossas nasais; sendo que, no caso do seio maxilar, é o canal maxilar, em grande parte mucoso, de 6 a 8 milímetros aproximadamente (TESTUT e JACOB) que se abre na goteira do unciforme pelo ostium maxilaris. Assim, os mucocéles são encontrados em todos os seios para-nasais, produzindo, às vezes, pelo seu desenvolvimento excessivo, lesões graves, como sejam, no caso do seio esfenoidal. o comprometimento do nervo ótico.

A sua etiologia ainda se acha sobre o tapete das discussões. As mais diversas teorias vêm procurando arejar o assunto. BENOIT deixa entrever uma perturbação vaso-motora e secretória sob a dependência da excitação do simpático; a escola alemã, levando à frente nomes da responsabilidade de KILIAN, ALEXANDER e outros, defende a origem infecciosa ou inflamatória. As injúrias externas, ou por outra, as lesões traumáticas têm sido invocadas como a causa única da obliteração dos canais, (TANTURRI), predispondo também ao aumento da viscosidade das secreções. (IMPERATORI e BURMAN). LACK e ZANNI falam a favor de uma origem congênita e a escola francêsa, enfim, (GARREAU, BERTEAUX, MOURE, etc.) vê no mucocéle um cisto de retenção.

Si os mucocéles são afecções raras, como disse no princípio, o do seio maxilar é de todos o mais raro, assumindo mesmo um caracter excepcional, sendo até, segundo RUBINO, COLLET e SKILLERN, não admitido por muitos autores.

S. CITELLI nega a existência da hidropsia do antro ex-vácuo; acreditando, porém, que, quando lia oclusão do ostio maxilar só poderá se produzir um mucocéle e não uma hidropsia.
Esta afecção processa-se muito lentamente e pôde ser encontrada indiferentemente em ambos os sexos (ST. CLAIR THOMSON), embóra ESTEVAM DE REZENDE chame a atenção para a predominância do mucocéle do seio maxilar no sexo feminino. (O meu caso confirma a sugestão de Rezende).

Modernamente, ST. CLAIR THOMSON, baseando-se tia concepção da escola francêsa, acha provável que os mucocéles encontrem a sua origem no desenvolvimento de cistos na membrana mucosa, quer seja pela distenção cística de unia glândula, ou pela degeneração çística de um polipo. É possível que este cisto formado, rompa-se, e o líquido, tornando-se livre e enchendo a cavidade venha erosar a parede anterior do antro, tornando-a delgada e produzindo destarte um abaúlamento facial, no qual, pela pressão, se nota um estalido característico, conhecido pelo nome de sinal do pergaminho.

Sobre a raridade excepcional dos mucocéles do seio Maxilar não lia contestação. No ambulatório de O. R. L. da Sta. Casa de Misericórdia de S. Paulo, sob chefia do eminente especialista Dr. Mario Ottoni de Rezende, em seu novo fichário começado a 1-1-939, e já com mais de 20.000 doentes registrados, este é o primeiro caso. É muito dificil e de grande responsabilidade levantar-se uma estatística. Si nos louvarmos, entretanto, por aquela apresentada por OCTACI LIO LOPES, em seu bem documentado trabalho sobre o assunto em questão, veremos que o nosso caso enfileirar-se-ia sob o n.º 17, na literatura mundial, e sob o n.° 5 da literatura indígena.

De diagnóstico muito difícil, a maioria dos mucocéles maxilares têm sido diagnosticada no momento operatório (E. REZENDE, O. LOPES, P. ASSIS), havendo facil confusão com os tumores do antro, principalmente os cistos, e com as sinusites crônicas.

De marcha silenciosa, indolor, só apresenta sintomas definidos e precisos quando a sua exteriorisação se produz e, pela compressão exercida, veta lesar os orgãos de visinhança. Antes disto, cefaléas, dores irradiadas pela face, sensação de plenitude-, e, às vezes, ligeiro inchaço na região.

A radiografia não esclarece muito o diagnóstico, pois, nela, vamos notar apenas a opacidade difusa do seio maxilar, como si fosse urna sinusite, urna vez que o mucocéle não se tenha exteriorizado. ZANNI e ARCELIN emprestam grande valor ao apagamento dos contornos dos seios, sinal este orais facil de ser apreciado nos seios frontais. Pensa também que, no caso de mucocéle, a opacidade é relativa e não tão pronunciada couro nas sinusites, havendo manchas esparsas no seu interior. Tudo isto, porém, não me parece a mim, aclarar perfeitamente o diagnóstico.

HERRNHEISSER já assevera que, nos casos de mucocéle, os seios podem se apresentar, ou opacos, ou com a sua transparência aumentada, paradoxo este, que encontra explicação no adelgaçamento das paredes osseas erosadas o que é mais observado em relação aos seios frontais.

Uma questão importante, a meu vêr, é a delimitação do mucocéle. É ele ou não encapsulado? Os autores não se mostram de acôrdo sobre a existência de uma parede própria do mucocéle. ZANNI sugere a hipótese que nos mucocéles não supurados, ou mucocéles propriamente ditos, não há cápsula envolvente, a não ser a própria mucósa do seio; e, rios mucocéles supurados ou pioceles, a cápsula apresenta-se. Isto está de acôrdo com as observações de E. DE REZENDE quando diz "mas dos estudos feitos deduz-se que a membrana envolvente do mucocéle é a própria mucosa do seio";

e ainda com GUEDES DE MEIO FILHO quando declara:

"o relatório do anátomo-patologista confirma a opinião mais aceita de que a limitante do mucocéle é a própria mucosa do seio."

No meu modo de vêr, acho perfeitamente lógica a falta de membrana envolvente rios mucocéles, pois, simples acúmulos, simples armazenamentos de mucos nos seios para-nasais, só poderão ser limitados pela própria mucósa da cavidade, não podendo constituir tumores propriamente ditos, a não ser nos mucocéles secundários, onde o exame anátomo-patológico revela tratar-se de cistos.

É possível, segundo minha opinião, que, nos casos considerados como encapsulados, se trate de pseudo- cápsula, formada pela camada superficial do epitélio que se destaca, ou por um espessamento da substância mucósa que se acha na periferia da coleção de mucos.

O mucocéle apresenta-se de coloridos variados, claro, escuro, côr de chocolate, etc..

Depois destas ligeiras considerações passo a apresentar o caso de minha observação.
- Ficha 13.112 - Ambulatório de O.R.L. da Sta. Casa de Misericórdia de S. Paulo. (Serviço do Dr. Mario Ottoni de Rezende).

Apresentou-se à consulta no dia 28-4-941.

Há alguns anos apresenta ligeiro inchaço na região ela fossa canina direita. Tem crises de cefaléas, que se exacerbam no periodo dos resfriados. Normalmente não tem corrimento nasal abundante. Não sente máo cheiro. Sensação de plenitude na face, na cabeça toda, sensação esta que aumenta quando se abaixa. Submeteu-se a diversos tratamentos, e, não logrando melhoras, procurou a clínica.

Exibe a radiografia anexa (fig n.º 1). pela qual notamos opacidade do seio maxilar esquerdo.





Antecedentes pessoais e hereditários sem significação para o caso, excepto a ausência de traumatismo na região. Já fez Wassermann, que foi negativo.

Ao exame notamos, realmente, edema da hemi-face direita, que se manifestava ligeiramente dolorosa à pressão. A rinoscopia não revelou anormalidade apreciável. Em vista ela radiografia, apezar da pequena contribuição sintomática, pensei em sinusite crónica, talvez de forma hiperplásica.

Operação efetuada a 5-V-941. Anestesia local. Novocaina 1 % adrenalina. Técnica de Caldwell-Luc. Parede anterior do antro adelgaçada, sendo muito facil a trepanação. Aberto o sinus, encontrâmo-lo totalmente cheio de uma massa gelatinosa - verdadeira geleia - cinzenta esverdeada. Retirâmo-la inteiramente, ficando o seio completamente limpo. Procuramos respeitar a mucósa o mais possível. Contra abertura nasal ampla: Lavagem com sóro fisiológico. Período post-operatório normal.

O material foi enviado ao anátomo-patologista e tivemos o seguinte resultado:

Exame macroscópico: Massas de tecido de aspecto mucoso e gelatinoso de coloração acinzentada, apresentando aqui e ali áreas hiperêmicas de cor parda avermelhada. Tem forma irregular e consistência extremamente mole e gelatinosa. A maior tem as dimensões de unta amendoa.

Exame histo-patológico (Material em reserva em formol e parafina. Colorações hemat. eosina, hemat. ferrica - Van Gieson).

Córtes em parafina, em diferentes alturas do material enviado, mostram tratar-se quasi exclusivamente de massas de substância mucosa, disposta em espessas faixas. Entre as mesmas, veem-se pequenos acúmulos hemorrágicos e, em alguns pontos, pequenos fragmentos de epitélio cilíndrico descamado ou células epiteliais isoladas, ao lado de escássos elementos celulares inflamatórios (principalmente linfocitos).





Resultado: massas de substância mucósa tendo em suspensão acúmulos hemorrágicos, pequena quantidade de células epiteliais descamadas e elementos celulares inflamatórios.

S. Paulo, % de Maio de 1941.

a.) Dr. Moacir Amorim.

Era este o caso clínico que, pela sua extrema raridade, me pareceu aconselhável trazer ao vosso conhecimento. Si alguma conclusão prática dele podemos tirar para nosso proveito clínico, é que, a precocidade do áto cirúrgico evitando o desenvolvimento excessivo do mucocéle, vem previnir complicações de carater grave que podem advir, pela íntima visinhança que os seios mantêm com o cérebro.

SUMARIO

O A. apresenta um caso de mucocéle maxilar direito, em uma paciente de 29 anos de idade, fichada sob o n.º 13.112 no Ambulatório de O.R.L. da Sta Casa de Misericórdia de S. Paulo, Brasil (Serviço do Dr. Mario Ottoni Rezende), que operou pela técnica de Caldwell-Luc. Discute a etiologia da afecção, citando varias teorias sobre o assunto. Entra no mérito da radiografia, que não lhe parece muito esclarecedora do diagnóstico, sempre dificil pela escassez do quadro sintomático, uma vez que o mucocéle não se acha exteriorizado.

Aborda a questão da limitação do mucocéle, acreditando, com a maioria dos autores, que o mucocéle não é encapsulado, por ser um simples acúmulo de muco retido no seio. Pensa que nos mucocéle ditos encapsulados trate-se de uma pseudo cápsula, feita à custa da camada superficial do epitelio que se destaca ou de um espessamento da substância mucósa, que se acha na periferia da coleção. Frisa a raridade excepcional do mucocéle do seio maxilar. O seu caso, segundo uma estatística apresentada por Otacilio Lops (Catanduva, S. Paulo, Brasil), Sobre o assunto, enquadra-se como o, 17.º da literatura mundial e 5.º da literatura médica brasileira. Concluindo, acha que a precocidade do áto cirúrgico evitando o desenvolvimento excessivo do mucocéle, evita complicações graves, que podem advir pela intima visinhança dos seios com o cérebro.

SUMMARY

The author presents a case of a mucocele localized in lhe right side of the upper jaw in a patient of 29 years old, treated in the Ambulatory of O.R.L. of the Santa Casa de Misericordia of S. Paulo, Brazil, (Serviço do Dr. Mario Ottoni Rezende), under number 13.112, and where she was operated on by the Caldwell-Luc system.

The paper discusses the etiology of the affection giving several theories about the assumption. It shows also the little value of the X ray, because the mucocele is not present in it and the difficulty of the diagnosis for the few quantity of signs.

He believes with the majority of authors that the mucocele is not encapsulated because it is a mere accumulation of mucous into the sinus and those called encapsulated, the capsule is originated either by the detached superficial layer of the epithelium or by a peripheral condensation of the mucous substance. He emphasizes the extreme rarity of the mucocele of the maxillary sinus. His case according to statistics presented by Octacilio, Lopes (Catanduva, S. Paulo, Brazil) about the assumptions, is classified in the 17. th of the World literature and in the 5.th in the Brazilian medicai literature. In conclusion, the author believes that operating at the earliest opportunitq prevents the excessive development of the mucocele, avoids severe complications, that it may happen due to the Glose vicinity of the sinus to the Brain.

BIBLIOGRAFIA

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17) RUBINO- Dicionario delle Scienze Mediche.

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