Versão Inglês

Ano:  1942  Vol. 10   Ed. 2  - Março - Abril - ()

Seção: Notas Clínicas

Páginas: 273 a 276

 

POLIPO ANTRO-COANAL OU DE KILLIAN

Autor(es): DR. E. VELLOSO VIANNA (*)

Apresentamos dois casos de polipos de Killian, sendo um em criança e o outro em adulto. Assim o fazemos pois já era nossa intenção escrever sobre o primeiro caso quando por feliz coincidencia nos aparece o segundo. Julgamos pois que a nossa observação fica deste modo bem mais interessante. Nele mencionamos ausencia de auxiliar no ato cirurgico, substituido por afastador de nossa autoria, e pedimos aos caros colegas que nos lerem, aguardar para dentro em breve e nesta mesma revista a apresentação de um conjunto de afastadores automaticos para diversas intervenções no dominio de nossa especialidade. Este artigo deverá ser bastante documentado não só na parte fotografica como na de experimentação pratica. Até o presente momento já possuo mais de uma dezena de casos, esperando somente mais alguns para comprovação absoluta.

OBSERVAÇOES CLINICAS

Observação n.° 1 - Registro clinico particular n.° 2158. Data 20-10-41.

NOME: José R. da S. - IDADE: 14 anos - COR: branca - NATURALIDADE: brasileira - ESTADO CIVIL: solteiro - PROFISSÃO: Lavrador - RESIDENCIA: Goiatuba, Estado de Goiás.

INDAGAÇOES GERAIS - ANAMNESE - Ha mais ou menos treis anos que após uma gripe sentiu forte mau cheiro no nariz e com o tratamento que fez julgava-se completamente curado, quando de um mês a esta data o mesmo voltou acompanhado de forte corrimento. Sente tambem no mesmo lado (direito) dor localisada na super-cilio e a respiração nasal completamente nula. Passado venereo e morbido sem interesse para o caso.

EXAME CLINICO - Pela rinoscopia anterior notamos um grande polípo de cór esbranquiçada obstruindo toda a luz do meato inferior, de consistencia mole e não sangrando pelo toque com o estilete rombo. Na rinoscopia posterior vemos toda a canna direita obstruida pelo polípo. Dôr a pressão na fossa canina direita. Pela diafanoscopia sombra bem acentuada no seio maxilar direito.

EXAMES COMPLEMENTARES - Pedimos exame radiologico dos seios da face, que revelou "obscurecimento completo do seio maxilar direito e da zona nasal do mesmo lado". Assinado Dr. Vergilio Mineiro. (fig. 1).
Recebido pela Redação em 9-2.1942.

DIAGNOSTICO - Sinusite maxilar e polipose nasal do lado direito. Polípos antro-coanaes ou polípos de Killian.

TRATAMENTO E EVOLUÇÃO - Tratamento cirurgico foi o que fizemos. Pela manhã injetamos 5 cc. de Glucalbet e ás 3 horas da tarde fizemos a operação de Caldwell-Luc. Antes porem de fazermos a contra abertura nasal retiramos o polípo por via nasal. Este veio em dois pedaços, sendo um retirado com a pinça de Brunings e o outro expelido pelo paciente ao fazermos nova pegada. Ao fazermos a abertura anterior do seio, encontramos o mesmo cheio de polípos, secreção muco-purulenta com forte mau cheiro e mucosa completamente espessada. Não nos foi possivel descobrir a inserção do polípo que passava para o nariz. A anestesia foi tronco-regional pela Scurocaina (solução C) 6 cc. e cocaina-adrenalinisada no meato. O ato operatorio correu sem acidentes. Operador: Dr. E. Velloso Vianna. Auxiliar: não houve, pois usei o afastador automatico de minha autoria. Post-operatorio: otimo e com 12 dias demos alta ao paciente, completamente curado. Na fotografia 2 apreciarão o polípo nasal bi-partido e os polípos retirados do seio maxiliar.

Observação n.º 2. Registro Clinico Particular n.° 1.000. Data 19-IX-39.

NOME: Adolfo G. - IDADE: 33 anos - COR: branca - NATURALIDADE: brasileira - ESTADO CIVIL: casado - PROFISSÃO: lavrador -RESIDENCIA: Municipio de Morrinhos, no Estado de Goiás.

INDAGAÇOES GERAIS - ANAMNESE - Ha mais ou menos 11 anos que vem sofrendo do nariz e de dois mezes a esta data peorou bastante, pois apareceu um caroço (sic) no lado esquerdo do nariz que o tem impedido de respirar por este lado. Tem mau cheiro no nariz. Passado morbido sem interesse.

EXAME CLINICO - Pela rinoscopia anterior notamos polipos de coloração esbranquiçada enchendo completamente toda a fossa nasal do lado esquerdo e pela posterior notamos que o polipo apenas apontava na coana. Pelo toque tinha consistencia mole e sangrava facilmente. Diafanoscopia revelava completa transparencia de todos os. seios. Lado direito não tinha anormalidade alguma.

DIAGNOSTICO - Polipos nasaes do lado esquerdo.



Fig. 1



Fig. 2



Fig. 3



TRATAMENTO E EVOLUÇÃO - As 15 horas do mesmo dia fizemos a retirada dos polipos com o serra-nó e com a pinça de Luc. Eram varios polipos inseridos no meato medio. Anestesia local com cocaina adrenalinisada. Operador: Dr. E. Velloso Vianna. Ato operatorio: correu sem acidentes. Alta com cinco dias.

1941 - DEZEMBRO, 2.

Volta queixando-se que de treis mezes para cá tem sentido, novamente o nariz entupir do lado esquerdo, e tem sentido dores de cabeça localisadas principalmente no supercilio. Quando engole sente mau cheiro, que não é percebido pelas pessoas que o cercam. Nos procurou novamente afim de que verificassemos se era o incomodo antigo que tinha voltado.

EXAME CLINICO - Na fossa nasal esquerda e na parte mais posterior, saindo do meato medio um polipo de coloração esbranquiçada e brilhante, que se dirige para o coana. Pela rinoscopia posterior, notamos saindo da coana esquerda um polipo do tamanho de um ovo de pombo, fazendo saliencia no cavum. Dór a pressão na fossa canina esquerda. Diafanoscopia revela sombra no seio maxilar esquerdo. Pedimos então uma radiografia dos seios da face que revelou "Obscurecimento do seio maxilar esquerdo", assinado: Dr. Moysés de Freitas. (Figura 3).
DIAGNOSTICO - Polípo antro coanal e sinusite maxilar (esquerda).

TRATAMENTO E EVOLUÇÃO - Dia 3 - Pela manhã 5 ec. de Glucalbet e ás 14 horas deste mesmo dia sob anestesia tronco regional, a mesma usada no caso anterior, fizemos a operação de Caldwell-Luc para o seio maxilar esquerdo. Feita a abertura da parede da fossa notamos a mucosa edemaciada e no recesso alevolar a implantação do polipo. Curetamos o seio e retiramos toda a mucosa doente. Como no caso anterior antes de fazermos a contra-abertura nasal, retiramos o polipo pela boca fazendo a pegada com a pinça de Luc. O ato operatorio correu sem acidentes. Operador: Dr. E. Velloso Vianna. Auxiliar: não houve pela mesma razão do caso anterior. Sequençia operatoria otima e após 12 dias demos alta ao nosso doente.

COMENTARIOS

Escrevendo este artigo temos em mira, cumprindo um dever que é o de divulgar mais dois casos desta entidade morbida, aumentar a casuistica nacional, quasi sempre pobre por comodismo de nós medicos que silenciamos o mais das vezes as nossas observações e os nossos trabalhos.

Felizmente de tempo a esta data vemos que o interesse pelas ciencias cresce assustadoramente, e dentro de nossa especialidade tivemos o ensejo de presenciar o brilhantismo do IV Congresso Brasileiro de Oftalmologia do Rio de janeiro que reuniu uma quantidade enorme de especialistas e o numero de comunicações foram tantas que poz até certo ponto em dificuldade a comissão executiva com respeito ao tempo concedido a cada congressista. De outro lado, vemos que mesmo longe dos grandes centros já encontramos especialistas que trabalham pelo engrandecimento da medicina nacional, trazendo a sua contribuição, que nem sempre é tão documentada por falta, as vezes, que foge ao poder de sua vontade, corno soe acontecer com este modesto trabalho. Nós medicos do interior para realizarmos algum trabalho precisamos de muito tempo e de dispormos de grande biblioteca particular, que fica sobremodo dispendiosa. Isto sem falarmos nos meios auxiliares que tem de ser todos'remunerados ou pelo doente ou por nós proprios. Assim sendo, peço aos caros colegas relevarem as faltas que este modesto artigo contem, motivadas as vezes pelas razões acima expostas.

Em magnifico trabalho publicado na REVISTA BRASILEIRA DE OTO-RINO-LARINGOLOGIA, janeiro de 1940, os caros colegas Homero Cordeiro e Mauro Candido de Souza Dias, citam que apenas treis trabalhos sobre este assunto existiam no país. Estes são: 1." - o de Rubem Amarante, com um caso em creança de 16 anos; 2." - o trabalho magistral de P. Mangabeira Albernaz, com 4 casos, tambem em creanças de 12 e 13 anos; 3." - o de Capistrano Pereira, com 2 casos em meninos. Alem destes, existem mais o de Homero Cordeiro e Mauro Dias, com treis casos, o de Mario Terra, com um caso em creança e, finalmente, o nosso, com um caso em creança e um em adulto. Ao todo são 12 em creanças e um em adulto.

Sobre a denominação dos mesmos, deixarei de fazer qualquer comentario. Quanto ao diagnostico é mais ou menos facil, pois o polipo é unico unilateral e tem um pediculo que se insinua no meato medio. Deste modo, somente errará quem fizer diagnosticos apressados e sem o necessario cuidado. Faltas deste genero são mais ou menos imperdoáveis principalmente tratando-se de especialistas. A razão do nosso segundo caso ser preciso de nova intervenção não foi em absoluto por desleixo de nossa parte e sim porque o doente apresentava nesta ocasião polipos varios e ao mesmo tempo completa transparencia dos seios da face. Outro fato que vem em favor de que o segundo polipo tenha etiologia diferente é o espaço de tempo que durou para recidivar se por acaso possa.se dizer que foi recidiva. Como sabemos, os polipos antro-coanaes uma vez retirados só a parte nasal recidivam em pouco tempo.

Como meios auxiliares dispomos da diafanoscopia que embora seja as vezes falha foi positiva nos nossos dois casos e nos demais que os colegas o pesquizaram. Como sabemos, casos em que exista liquido no seio pode o mesmo, aumentando a refringencia tornar mais transparente o seio doente que o normal. A radiografia simples, que na opinião de varios autores é tambem falha em todos os casos que me referi foi positiva. Pode-se usar também a radiografia com meios de contraste.

A patogenia é mais ou menos controversa e ao nosso modo de pensar as diversas teorias não fazem mais do que se completarem, pois concluimos que em casos semelhantes a mucosa do seio está com um processo inflamatorio hiperplasico (teoria de Hirsch) que tende por sua vez a sair do seio, que o aumento do tamanho do ostio natural ou acessorio contribui tambem muito (teoria de Matsui) e que a ação mecanica de assoar, escarrar ou espirrar gosa de papel preponderante (teoria de Ino Kubo).

Quanto a localisação do polipo no interior do seio, somente em um caso nos foi possivel verificar que era ao nivel do recesso alveolar. No outro caso não pudemos descobrir a localisação do pediculo. A respeito do tratamento somos partidarios de que se deve intervir no seio e retirar o polipo pois no caso contrario, tiraríamos apenas o efeito deixando a causa.

Nos nossos casos, assim fizemos, isto é, operamos o seio e retiramos depois os polipos, um deles pela boca e o outro pelo nariz um pedaço e o restante foi expelido via bucal pelo paciente. Não notamos dificuldade alguma neste proceder. Temos tido noticias dos doentes e ambos passam até hoje sem nada mais terem.




(*) Chefe da Clinica Oftalmica e Oto-rino-laringologica do Hospital Municipal de Uberlandia - Minas
Recebido pela Redação em 9-2-1942.

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