Versão Inglês

Ano:  1949  Vol. 17   Ed. 5  - Setembro - Dezembro - ()

Seção: -

Páginas: 179 a 188

 

Dr. J. J. da Nova

Autor(es): -

* 27 de Março de 1869
+ 25 de Maio de 1949



Com o falecimento de J. J. da Nova perde a Medicina brasileira um de seus grandes vultos. Pioneiro e um dos Mestres da Otorrinolaringologia em S. Paulo, o ilustre morto dedicou, também, bôa parte de sua vida à organização e orientação de Institutos de benemerencia social tais como o Instituto Pasteur e a Policlinica de S. Paulo. Seus amigos e colegas, desolados pelo passamento do ilustre varão, antigo dedicado e estimado chefe, reuniram-se solenemente para homenagear e reverenciar a sua memoria.

Na sede da Policlinica de São Paulo realizou-se uma sessão solene em homenagem à memoria do dr. J. J. da Nova, promovida por aquele instituto em conjunto com a Sociedade de Medicina e Cirurgia, secção de Otorrinolaringologia da Associação Paulista de Medicina e Instituto Pasteur.

A reunião foi presidida pelo dr. José Ayres Netto, diretor clinico da Policlinica, sentando-se à mesa os srs. Dr. Rafael da Nova; dr. João Alves Meia; presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia; dr. Hugo Ribeiro de Almeida, presidente da secção de Otorinolaringologia da Associação Paulista de Medicina; dr. João Pereira Pinto, diretor do Instituto Pasteur; Dr. Sinesio Rangel Pestana e professor Antonio de Paula Santos.

Pelo dr. James Ferraz Alvim, diretor da Policlinica, foram lidos telegramas, cartas e oficios dos srs. Francisco de Paula Amarante; Artur Antunes Maciel, presidente da Caixa Economica Federal; José Maria Whitaker, diretor do Bane, Comercial; Horacio Lafer; Alvaro Guimarães, diretor da Escola Paulista de Medicina; Afonso Ferreira; Gabriel Porto, Guedes de Mello ; Walter Soares; Fulvio Giannini e dos medicos de Campinas.

PALAVRAS DO DR. AYRES NETTO

Abrindo a sessão, proferiu o Dr. Ayres Netto as seguintes palavras:

"Meus senhores - A Policlinica de São Paulo convocou esta sessão de merecida e justa homenagem ao seu saudoso presidente que alimentava por esta Casa entranhado afeto e à qual, vinha prestando, desde longos anos, relevantes cuidados. Para dar maior significação ao ato convidou para vele tomar parte, lamentando conosco tamanha perda, a Sociedade de Medicina e Cirurgia, onde o dr. J. J. da Nova ocupara, com destacado brilho, uma das cadeiras de membro honorario; o Instituto Pasteur, do qual foi dos mais entusiastas fundadores; a secção de otorinolaringologia da Associação Paulista de Medicina onde o pranteado medico se, destacava como eximio especialista.

Solicitou que falassem neste momento, exaltando as suas qualidades de carater e de espírito, o professor A. de Paula Santos, seu mais antigo discipulo e o Dr. Hugo Ribeiro de Almeida, seu sucessor na Clinica da Policlinica. O nome e figura de J. J. da Nova jamais será olvidado pela Policlinica; nos seus ultimos dias, sentindo-se gravemente doente deliberou, de moto-proprio, passar a chefia de seu serviço ao dr. Hugo Ribeiro de Almeida. Foi uma cena tocante que a todo os presentes comoveu profundamente.

Passado algum tempo, mostrou firme empenho em deixar a presidencia da instituição que tanto amava. Seria a sua despedida. A isso se opuseram tenazmente os seus companheiros de diretoria e assim, nessa qualidade, logrou assinar a escritura do terreno doado pela Prefeitura para a instalação do novo predio, desde muito, em cogitações. Infelizmente não quis o destino impiedoso que assistisse ao lançamento da pedra fundamental da nova sede e o inicio da sua construção.

O seu honrado nome ficará, para sempre, respeitado e lembrado com verdadeiro carinho.

ORAÇÃO DO PROFESSOR PAULA SANTOS

A seguir, o professor Paula Santos pronunciou a oração abaixo, revivendo a figura do ilustre medico desaparecido, dr. J. J. da Nova:

"A Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo e a Policlínica de São Paulo mandaram-me dizer as suas palavras de saudade ao grande morto, cuja memoria hoje reverenciamos. São obvias as razões da escolha: fala o discipulo mais velho e mais antigo do grande e querido mestre, impulsionado pelos sentimentos de gratidão e amizade impereciveis.

Sob o influxo destes imperativos é que imploramos a complacencia do auditorio, para que nos perdoe a pobreza e carencia da roupagem, como enfeites das idéias que brotam espontaneas de um coração magoado e confrangido pela grande perda. Foi neste mesmo recinto que, há mais de três lustros, fizemos o elogio biografico do velho da Nova, que reingressava ao convívio da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, como socio honorario, ao lado de Diogo de Faria.

Tivemos, então, oportunidade de rememorar com entusiasmo os feitos de um grande medico e perfeito cidadão, mostrando quão honrado se sentia este gremio em colocá-lo ao lado de seus respeitaveis e distinguidos vultos.

Lembramos, nessa ocasião, sua figura de escol, frisando sua preponderancia no seio da classe, destacando a contribuição inestimavel que dava aos empreendimentos em que colaborava, sempre acobertado na modestia, apanagio de sua pessoa. Destacamos sua contribuição, no começo do seculo, para que se fundasse, de parceria com os abnegados desembargadores Valle, Bittencourt Rodrigues, Cockrane e Arnaldo Vieira de Carvalho, o Instituto Pasteur de S. Paulo, realçando a benemerencia do empreendimento e a devoção à causa publica revelada pelos seus fundadores.

Depois disso o dr. Nova prosseguiu no mourejar diuturno da clinica afanosa, em que os devotamentos, dedicações e sacrificios se encobrem no anonimato consequente aos esquecimentos e ingratidões, compensados uma ou outra vez por alguma satisfação ou alegria de fôro intimo, balsamo valioso e inestimavel para o que exercem a arte com amor, com ética e consciencia apostolares. Foi desse retraimento que conseguimos retirá-lo, em 1919 ou 20, para a chefia da Clinica Oto-Rino-Laringologica da Policlinica de São Paulo. Neste passo, para tocar sua sensibilidade e demove-lo da recusa, muitos valeram os argumentos delicados, suasorios e amistosos daquele espírito angelical e puro, de Bueno de Miranda. Contar o que foram os vinte anos de dedicação de J. J. da Nova à benemerita Policlinica, seria uma superfectação para os que me ouvem, e, principalmente, para os que acompanharam suas atividades, nos diversos misteres que aqui exerceu.

Deve-lhe esta instituição o melhor de seus esforços morais e intelectuais; aqui formou escola, para seu seio trouxe valores novos e apreciaveis, como Paulo de Faria, Homero Cordeiro, Jayme de Campos e Nestor Granja, e formou alunos como Horacio de Paula Santos, Raphael da Nova e Hugo Ribeiro de Almeida. Fomos seu assistente durante treze anos, e só Deus sabe o quanto nos aproximamos em alma e espírito e o quanto lhe devemos de ensinamentos da arte e, sobretudo, de exemplos morais, fazendo-nos classificá-lo como chefe e mestre insigne, amigo indefectivel, querido e respeitado, exemplar e disciplinador, intransigente e inflexivel no cumprimento do dever, sem discrepar da cortesia, da afabilidade e da suavidade no trato ameno.

E, porque de tal arte se impôs, ei-lo alçado a diretor-tesoureiro e diretor-presidente da Policlinica de São Paulo, dando-lhe o que de melhor possuia, em esforços e inteligencia, e obtendo da Municipalidade, de particulares e dos poderes publico, auxilio, que - ao cabo - permitiram fazer da Policlinica - então eu volvida em tremenda e grave crise financeira - este belo florão que tanto honra a cultura e o espírito de caridade paulistas. Isto que hoje aqui se ostenta, façamos curial justiça, deve-se, sobretudo, a J.J. da Nova e a esse outro abnegado que todos nós queremos e respeitamos, esse admiravel Aires Netto, que nos-há de perdoar a irreverencia de haver tocado em assunto que considera defeso.

O que vos quero dizer hoje, com a maior emoção e com a melhor homenagem ao egregio morto, são certos sentimentos particulares que fizeram nossa aproximação, como reminicencias da infancia, quando ainda menino conheci-o, em fins do seculo passado, medico assistente de meu saudoso pai, do seu consultorio da rua 15 de Novembro, ao lado de Alberto Seabra, ensaiando os passos no campo da otorino, recem-chegado do Velho Mundo, pioneiro aqui de uma especialidade em que sempre se impôs, durante meio seculo, seguindo-lhe e acompanhando as evoluções, respeitado e querido por todos os clientes e companheiros. Mas é que, mesmo encoberto pela modestia, nem assim podia disfarçar a solidissima estruturação de seu saber, alicerçada em profunda formação humanistica e dobrada de um carater inquebrantavel tudo isso somado com os primores de educação de berço, como se sabia ministrar naqueles tempos de que hoje, melancolicamente, já sentimos saudades...

Esses os predicados que, na pratica, proporcionaram-lhe os graus de profissional de ética inatacavel e de cidadão impoluto e prestativo, patriota e consciente de reputação ilibada e inatacavel. E todas estas qualidades se manifestavam simplesmente sem alarde, encantadoras, naquela alma simples em que a sensibilidade e os sentimentos eram flores de primorosa educação, pundonor e recato. De porte distinto e ieratico, simpatico e circunspecto desde moço, precocemente encanecido, de olhar doce e falas mansas, sem expansões exuberantes, infenso a intimidade, indiscretas, só podia ser entendido, compreendido e amado pelos poucos que merecessem sua confiança esquiva. Homem da familia, arredio ao convivio e contacto das massas - amigo de poucos e bons amigos, sem arroubos de expansibilidade, preceptor de seus filhos - aos quais soube criar e educar primorosamente, somente almejava o convivio do lar e a tranquilidade de alma, para dedicar-se à pratica de estudos e deleitos espirituais, como só sabem fazer os bem matriculados na velhice. Mas esse homem bom, justo e perfeito, expoente dos atributos humanos que compõem aquele tipo de equilibrio que os gregos chamavam de ataraxia, esse misto de inteligencia e bondade, essa flor de sensibilidade amoravel que só entendia a vida naquele ambiente de movimentos e atitudes ritmados de beleza e simplicidade, esse querido amigo viu um dia seus propositos truncados pela brutalidade do destino.

Desde então, sobreviveu a si mesmo : o espírito revoltado e o corpo forte ainda suportaram a terribilidade do golpe...

Porque tivera tido uma mocidade sã e maravilhosamente produtiva não houve o de que penitenciar-se na velhice e, na hora do amargor, amparado pela candura e piedade da santa companheira de sua vida e pela dedicação da prole ilustre que o acompanhava na magua dolorosa, engolfou-se nas leituras e meditações e morreu como um justo, respeitado e apontado por todos como um exemplo do seu oficio e um expoente da sua classe".

DISCURSO DO DR. HUGO RIBEIRO DE ALMEIDA

Falando em nome da secção de Otorinolaringologia da Associação Paulista de Medicina, proferiu o dr. Hugo Ribeiro de Almeida o seguinte discurso:

"A secção de Otorinolaringologia da Associação Paulista de Medicina, aceitando o convite da Policlinica de São Paulo para realizar uma sessão conjunta com a Sociedade de Medicina e Cirurgia em homenagem ao dr. Joaquim José da Nova, fez interromper os seus trabalhos de hoje à noite, para testemunhar e pesar de todos seus socios, pelo infausto passamento.

Na qualidade de presidente desta secção cabia-me dizer o sentimento dos companheiros de especialidade de São Paulo e a emoção que a dolorosa noticia despertou em toda a classe. Tendo, porém, trabalhado durante 14 anos, nesta casa, sob sua direção, sentir-me-ia muito mais à vontade dizendo alguma coisa de sua pessoa.

Poucos homens podem envelhecer. Quando o corpo, usado pelos anos da maturidade, vai perdendo o brilho da força; quando a pele, os musculos e os ossos já cansados inclinam o homem para a terra, o seu espírito torna-se estranhamente visivel e presente.

Poucos homens podem envelhecer porque a côr da alma de uma pessoa é sentido de sua vida toda. E nossa pobre humanidade, nascida sob o signo do mal, na sua dramatica caminhada na luz dos dias que lhe são dados, chega à borda da eternidade como tragicos desafios à misericordia divina.

Jesus Cristo, interpondo-se entre a adultera e a massa que a queria apedrejar, abaixou-se e com o dedo começou a escrever na areia. Um a um, algozes e juizes, se retiraram começando pelos mais velhos.

O homem, habitualmente vivendo no erro consciente, que o prostitue, ao envelhecer a afina sobe-lhe à face, corrupta e inconfessavel.

O dr. Nova pôde envelhecer. Sempre o conheci velho. Velho e puro. Foi uma vida clara a cristalizar um carater longos anos afora. Sobre ele seu espírito sem manchas vivia. Sua presença nesta casa das horas de serviço, sempre tornou nosso ambiente mais claro. Ele era a grande riqueza desta instituição, hoje aflitamente debruçada sobre o seu desaparecimento.

Varios caminhos seguem os fortes na trilha penosa da virtude. Mesmo dentro do cristianismo, encontrarmos formulas diversas de ascese. E entre todos os povos, livros sagrados ensinam aos seus filhos privilegiados, a sabedoria de subir aos céus.

A grandeza de vida do dr. Nova - o tipo ele vida que levou - foi buscada na cultura grego-romana. Eu o filiaria ao mais nobre dos filosofos classicos, à Marco Aurelio. É inegavel a influencia que sobre ele teve a cultura germanica, talvez mais particularmente, Goethe. No entanto encontro entre os grandes estoicos da antiguidade o segredo de sua vida. Há certas passagens dos "Pensamentos para si mesmo", de Marco Aurelio que parecem retratar o Dr. Nova no primeiro livro ele atribui ter recebido de seu pai: "a mansidão, e a inquebrantavel adesão às decisões, maduramente refletidas; a indiferença pela vã gloria que nos dá o que os homens chamam de honrarias; o amor ao trabalho e a perseverança; ouvir os que podem trazer algum conselho util à comunidade; inexoravelmente, dar a cada um segundo o seu merito; a arte de saber quando se deve ser intransigente e quando se deve ceder".

Eu poderia citar outras passagens, mas registrarei apenas o seu elogio: "a gravidade sem afetação; a solicitude atenta para com os amigos; a paciencia para com os ignorantes e para com aqueles que decidem sem refletir; a arte de se acomodar com toda a especie de pessoa, de tal maneira obre seu comercio lera mais agradavel que qualquer adulação".

A seriedade dos filosofo,, estoicos influiu grandemente sobre toda a cristandade medieval. Abelardo, o teologo, tomava como norma de vida os escritos dos estoicos, particularmente do grande Imperador-filosofo. Com Santo Tomás o aristotelismo preparou, dentro do conceito de exatidão, o desabrochar da ciencia na renascença e na idade moderna. Veio após o cepticismo, com os artistas dos ultimos seculos - introduzindo no mundo uma formula filosofica pouco fecunda que leva o homem à desintegração.

Aqui no Brasil, o nosso magnifica imperador Pedro II, formado no mais puro estoicismo, fez surgir no seu tempo uma elite, moldada nos seus austeros principios pessoais. Os gestos e a vida dos homens daquele tempo, como os conhecemos dos faustos da época é, ao meu ver, a pagina mais linda da nossa historia. Depois, o mundo evoluiu parta nova formula filosofica, já conhecida dos gregos - o cinismo. Atitude extremamente perigosa que permite os maiores arrojos de heroismo e as piores depravações. Visemos dias confusos e agitados, com grandiosidades e horrores se entreparando a todo momento.

A figura do Dr. Nova nos emergia do imperio, retratando viva, os grandes Homens, daquele periodo. Solitario dentre de um tempo que o não podia compreender, sua sensibilidade, afinada pelo bom gosto classico, muito sofreu nos ultimos tempos de sua existencia. A sua inconformidade com os homens e com a vida, tinha raizes na sua cultura germanica. Eu a traduziria com frase de Goethe: "Não ha esperança senão para um ser acanhado. Jamais ele abandona o homem de cerebro estreito que se prende ás pequenas coisas, que com uma mão ávida não cessa de escavar o em busca de um tesouro, e quando encontra um verme se satisfaz".

Estoico nos males que lhe atingiram o físico, manteve-se de pé na desolação. Não busco vãs esperanças em vermes da terra. Sempre tirou todas as forças de si mesmo. Generosamente, como um grande senhor viveu para distribuir. Deus, que o criou, e o assistiu formar, com esforço, tão bela figura, deve tê-lo neste momento em seu seio inefavel".


ORAÇÃO DO DR. JOÃO PEREIRA PINTO

Por ultimo falou em nome do Instituto Pasteur, o dr. Foto Pereira Pintai, cujo. oração foi a seguinte:

"Foi em 1903 que o dr. J.J. da Nova, pelas sua excelças virtudes humanitarias e científicas, integrou a pleiade de homens notaveis e benemeritos, da qual fizeram parte os srs. doutores Ignacio da Gama Cochrane, Bitencourt Rodrigues, Alberto Seabra, desembargador José Maria do Valle, conde Francisco Matarazzo, senhor Guilherme de Andrade Villares, doutores Vitor Freire, Clemente Vuono Netto, Arnaldo Vieira de Carvalho, Diogo de Faria, Mathias Valadão, Roberto Hotinger, Sergio Meira e Ulysses Paranhos, para a criação do Instituto Pasteur de São Paulo. Nasceu a Instituição e foi constituida a sua personalidade juridica, elaborados os seus regimentos e estatutos sob carater de Fundação Científica e Humanitária.

Enorme foi a luta desses abnegados fundadores e na qual sempre tornou parte ativa o dr. J. J. da Nova, no desempenho de sua ardua função de Secretario, pugnando meticulosamente tanto no setor científico e financeiro, como dedicando-se devotadamente para o crescimento da entidade. Vencidas as múltiplas dificuldades de inicio, o Instituto Pasteur tomou vulto, sob a sabia e proficua orientação de seu Conselho Diretor, do qual fazia parte integrante o dr. Nova e cujo Conselho adotou por divisa o seguinte lema "Virtude et labore vincuntur omnia". De fato, o Instituto prosseguindo em sua nobre e genrosa carreira, conquistou enormes simpatias, correspondendo sempre ao apoio generoso que lhe não foram regateados, acentuando dia a dia os benefícios já prestados com a realisação do, programa consignado em seus estatutos, a principio, considerado como simples aspiração. Prestigio e apoio não lhe faltaram quer dos poderes publicos, quer de todas as classes sociais, para a sua manutenção, por todos reconhecido de imprescindivel necessidade.

Verificada a enorme expansão do emprendimento e as necessidades cada vez mais crescentes da coletividade, fez-se indispensavel a aquisição no estrangeiro de um profissional de notoria competencia para assumir a direção técnica do Instituto, a qual recaiu na pessoa do eminente professor Antonio Cariai.

Decorrido algum tempo de trabalho sob a supervisão do referido professor, pode o instituto concorrer com diversos produtos de uso veterinario na memoravel Exposição Estadual, realizada a 12 de Outubro de 1907. Figuraram entre eles : as vacinas contra a tuberculose bovina, contra o carbunculo sintomatico ou peste de manqueira e contra o carbunculo hematico; bem assim os soros: anti-carbunculoso e anti-tetanico, alem da tuberculina de Koch, a maleina e o virus contagioso para destruição dos ratos e de camondongos. Reconhecida a eficacia de tais produtos, foi o Instituto Pasteur de São Paulo distinguido com uma Medalha de Ouro. Era nessa ocasião Presidente do Estado o exmo. sr. Dr. Jorge Tibiriçá, que reconhecendo os grandes meritos da Fundação, não deixava de conceder-lhe a necessaria subvenção. Auxilios e donativos eram recebidos das Camaras Municipais do interior do Estado, que os consignavam em seus orçamentos.

Destinando-se o Instituto à profilaxia da raiva, manteve sempre sob rigorosa: fiscalização todas as atividades inerentes a essa finalidade, demonstrando pelos seus relatorios anuais o numero de consultas e de pessoas tratadas, com designação de suas respectivas nacionalidades, procedencias, sexos e idades, sede, grau das mordeduras, tempo decorrido entre o acidente e o inicio do tratamento, categoria dos animais mordedores, distribuição das pessoas, segundo as categorias e sede das mordeduras, bem assim, circunstanciada noticia sobre o numero de animais vacinados contra a raiva, dos autopsiados e submetidos às necessarias provas do diagnostico, sua procedencia e resulta dos exames neles praticados.

Verificado o numero cada vez mais crescente de pessoas mordidas por animais raivosos ou suspeitos, verificado principalmente na Capital, a Camara Municipal resolveu chamar a si o serviço de aprensão e extinção de cães vagabundos, o qual é mantido até hoje. Assim é, que desde a fundação do Instituto, isto é de Novembro de 1903, a fins de 1904 achavam-se em tratamento 467 pessoas; em 1905 - 451; 1906 - 281; 1907 - 309; 1908 - 616; 1909 - 627; 1919 - 400, e assim por diante, com pequenas oscilações, o numero de acidentados crescendo enormemente, até que em 1916 quando o Instituto passou para o Estado, seu numero já se elevava a 910 pessoas. Cumpre-me dizer que apesar do numero avultado de inoculações feitas, não se deu caso algum de supuração, o que denota o cuidado e o criterio com que eram preparadas os materiais destinados à vacinação.

Efetivamente essa semente lançada sob a inspiração de Deus, do seio da coletividade de São Paulo, cresceu e frutificou, prestando desde o seu nascimento até o presente, relevantes serviços à humanidade, como posso afirmar pelo computo de 8.057 pessoas tratadas no ano de 1948, e, pelo fornecimento de vacina, anti-rábicas ao Paraguai, Estado de Goiás e norte do Paraná, por acertada determinação do sr. governador do Estado.

Eis aí, meus senhores, em sintese arrojada, a grande obra que ainda o dr. J. J. da Nova como procurador da Fundação, assinou a escritura de doação ao Estado, aos 21 de Março de 1916, transferindo-lhe toda posse, jus, dominio, direito e ações, sem onus ou obrigações de especie alguma, sob a unica clausula de ser conservado o titulo de Instituto Pasteur, ora existente.

Finalizando, aqui estou, na qualidade de atual diretor do Instituto para homenagear, respeitosamente, a memoria do dr. J. J. da Nova, em meu nome e em nome daquela Instituição, em reconhecido preito de gratidão pelos beneficios que prestou à coletividade, como um dos benemeritos fundadores do Instituto Pasteur de São Paulo".

A Revista Brasileira de Oto-Rino-Laringologia consigna aquí, ao eminente Mestre da Otorrinolaringologia Paulista, sua respeitosa e sentida homenagem.

São Paulo, Dezembro de 1949.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial