Versão Inglês

Ano:  1948  Vol. 16   Ed. 1  - Janeiro - Abril - ()

Seção: Várias

Páginas: 51 a 54

 

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SÔBRE A SOUVIRONTERAPIA E APLICAÇÕES CORRELATAS

Autor(es): Dr. OROZIMBO CORRÊA NETTO

2.º parte

Poços de Caldas.

Continuando a parte final dêste trabalho, que trata de considerações gerais sôbre a Souvironterapia para dar apenas uma idea geral do conjunto do importante capítulo da terapêutica das otites médias, eu desejo salientar que a terapêutica da surdez é um problema de diagnóstico, dependendo do perfeito conhecimento de sua causa.

Somente depois de estabelecido o diagnóstico é que é possível a indicação da Souvironterapia. Quando eu me referi ás vaporisações, como meio de diagnóstico, quiz mostrar que muitas vezes o catarro do ouvido pode existir antes do doente apresentar-se surdo e mesmo antes da audiometria acusar qualquer anormalidade auditiva.

Nestas condições, podemos compará-las com as radiografias em casos de sinusite. Todos sabem que os resultados radiológicos numa grande percentagem em casos de sinusite são positivos, muito antes dos doentes de sinusite acusarem qualquer sintoma dessa afecção em seus portadores. Ao praticarmos a vaporisação da trompa de Eustachio nos casos de catarro crônico ouve-se um ruido característico de estertor húmido, que os autores alemães, na sua língua de extraordinária precisão, denominam Rasselgeräusche. Muitas vezes êsse ruído não é bem distinto no início da vaporisação, mas a medida que os gazes sulfurosos vão penetrando no ouvido médio, de um modo contínuo e com maior pressão, verifica-se perfeitamente a existência ou não do catarro crônico.

Para o diagnóstico das perfurações do tímpano, nada é comparável ás vaporisações sulfurosas, porque quando diminutas nem sempre a otoscopia as descobre.

A obstrução catarral por muco denso, impedindo o escoamento normal por obstáculo mecânico, mostra o valor das vaporisações sulfurosas que fazem a drenagem e o arejamento nos processos catarraes crônicos do ouvido médio e trompa de Eustachio, podendo haver concomitantemente infecção bacteriana persistente em indivíduos alérgicos, ou não alérgicos. Não há muito tempo, apareceu no gabinete otológico de nossas Termas, um moço residente em S. Paulo, dizendo que não vinha tratar-se de surdez, mas queixava-se de uma rebelde otite externa, que vinha zombando de todos os tratamentos que tentara, e só lhe faltava o emprêgo da água sulpurosa. Depois do exame por mim feito, concluí que era acertado o diagnóstico de otite externa. Como a princípio êle só me pediu que aplicasse as lavagens do conduto auditivo externo com água sulfurosa nascente, não houve melhora alguma. Eu propuz então que êle me permitisse fazer com fim diagnóstico uma vaporisação da trompa de Eustachio do lado afetado. Qual não foi a minha surpreza e também dêle quando verificamos nitidamente a existência de um catarro crônico do ouvido. Com muita relutância de sua parte consegui, entretanto, praticar conjuntamente uma série de vaporisações sulfurosas no ouvido médio através da trompa até o desaparecimento do estado catarral, que trouxe em resultado a cura completa da sua rebelde otite externa.

Êste caso provou que a otite externa era secundária e proveniente do fóco catarral do ouvido médio, e assim estava explicada a rebeldia aos vários tratamentos a que êle submeteu a sua otite externa quando residia em S. Paulo, porque era necessário tratar também o ouvido médio. Para explicar êsse caso clínico eu direi que, sendo incompleto o anel timpanico, a membrana do tímpano na sua parte superior continua-se diretamente com a camada cutaneo-periostica do conduto auditivo e esta, camada é extremamente delgada. É a esta porção não enquadrada do timpano que se dá o nome de membrana flacida, ou de Shrapnell. É a parte menos resistente, a sua parte superior, onde se interrompe o anel osseo. É onde se produzem os descolamentos nas duchas fortes de ar, etc.

O catarro passa da caixa para o conduto e vice-versa, mesmo que não exista uma perfuração apreciável da membrana.

A regra fundamental é tratar radicalmente, não nos contentando com uma cura aparente das localisações das lesões, evitando-se as reincidencias, que em caso contrario são muito frequentes, e eliminando a fonte de contágio.

A otoscopia por meio do especulo de Siegle permite certificar a existencia de um timpano deprimido. Em resumo direi que o cabo do martelo move-se com o timpano, para dentro, e se desvia da sua posição inclinada para tomar uma posição horizontal de modo a parecer encurtado na sua perspectiva. A apofise curta projeta-se para fóra formando pregas posteriores que se dirigem para a membrana de Shrapnell e também para a Pars tensa e que não devem ser confundidas com o limite normal posterior do timpano. A membrana de Shrapnell é deprimida. O triangulo luminoso modifica-se na sua forma e na sua posição vindo cada vez mais para a periferia. Para, diagnosticar é preciso verificar assim a depressão do timpano, guardando os sinais principais, isto é, um cabo do martelo horizontal e encurtando, uma apophyse curta bastante proeminente com a membrana de Shrapnel1 deprimida., verificação das pregas posteriores e um triangulo luminoso afastado da sua posição normal. Com êstes dados o médico pode afirmar a existencia de um timpano deprimido.

É muito importante verificar a depressão do timpano, porque se o timpano se apresentar normal, não deprimido, isso, indica que a afeção não é do ouvido médio e portanto, deve-se ter certa reserva na indicação da Souvironterapia, que é benefica para as doenças do aparelho de condução. Nas doenças do aparelho de percepção ela é absolutamente inutil. Esta diferença todo o médico clinico devia saber como verificar.

Com o exame pela voz pode-se verificar, conhecendo-se que as doenças do aparelho de condução permitem ouvir bem os sons agudos, e mal os graves. Nas doenças do aparelho de percepção as palavras agudas são mal ouvidas, e mais ou menos bem as graves.

Na classificação da surdez devemos saber que todos os casos podem diferenciar-se em dois grandes grupos, isto é, 1.° surdez hereditária, e 2º surdez adquirida. Na prática observa-se que é menor o numero de casos de surdez hereditaria, e muito maior o numero de casos de surdez adquirida.

As hereditarias não teem indicação absolutamente para o tratamento pela Souvironterapia. Esta só se aplica para os casos de surdez adquirida e assim mesmo somente nos de tipo de condução, provenientes de afeções do ouvido médio.

As hereditarias do tipo familiar não são hoje consideradas come hereditarias no rigor do termo, e toda a tendencia é hoje para considerar como adquirida toda surdez do tipo familiar.

Estabelecido o diagnostico da especie de surdez adquirida, proveniente do ouvido medio, tipo de condução, está justificado o tratamento indicado pela Souvironterapia.

Quando verificamos que a surdez é de origem luética, o tratamento pela Souvironterapia em geral não é indicado, porque esta é quasi sempre do tipo de percepção, e deve-se tratar com a medicação especifica de preferencia pelo bismuto, nunca o arsenico.

As aplicações das vaporisações sulfurosas são praticadas unia por dia, de duração de 2 minutos em cada ouvido, até completar a 1.° série de 25 dias. Verifica-se o resultado obtido para aconselhar-se uma nova série de 25 aplicações alguns meses depois, até obter-se a cura.

Um dos ensinamentos que a minha longa pratica em Poços de Caldas me demonstrou é que os autores que recomendam que sejam feitas as aplicações com muito pouca pressão, isto é, suavemente, não estão com a razão. Eu penso que as aplicações para darem resultado devem ser feitas durante os dois minutos em cada ouvido com bastante pressão, com certa força continuamente a ponto de serem suportadas pelo paciente, no maximo, que puder ser tolerado de força.

Nunca eu faço anestesia para o cateterismo, porque penso que somente aqueles que não possuem uma grande pratica é que recorrem á necessidade de prévia anestesia. É claro que sempre as primeiras aplicações são mais dificeis de executar, mas depois das três primeiras, quasi sempre torna-se indolor o cateterismo feito com sonda metalica e não ha, portanto, necessidade de prejudicar o resultado a obter com uma, anestesia com todas as suas desvantagens e perda de tempo num serviço especialisado, sempre muito concorrido durante as estações, como é o nosso em Poços de Caldas. Recomendo sempre aos meus clientes que não façam uso de medicamentos analgesicos, quinino, salicylatos, iodo, insulina etc. substancias toxicas para o nervo auditivo, e nem façam uso dos banhos sulfurosos em temperatura superior á 36°c e meio, e de mais de 10 minutos de duração. Terminando a 2.ª parte dêste meu trabalho sobre a Souvironterapia, espéro ter proporcionado aos colegas não otologistas uma idéa geral sobre este capitulo importante da terapeutica das oties medias, que não sendo tratadas a tempo, podem levar os pacientes a uma surdez incuravel, o maior dos males humanos, essa prisão do silencio, onde eles maldizem a sua triste sorte até o fim da vida.

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