Versão Inglês

Ano:  1945  Vol. 13   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Associações Científicas

Páginas: 222 a 239

 

ASSOCIAÇÕES CIENTÍFICAS

Autor(es): -

SOCIEDADE DE OTO-RINO-LARINGOLOGIA DO RIO DE JANEIRO

Ata da 59.ª Sessão Ordinária

Aos doze dias de Maio de mil novecentos e quarenta e quatro reuniu-se em sessão ordinária a Sociedade de Oto-Rino-Laringologia do Rio de Janeiro, sob a presidência do Dr. Walter Muller dos Reis e secretariada pelo Dr. Flavio Aprigliano.

Aberta a sessão é lida a ata da sessão anterior, sendo aprovada. Nada havendo a tratar no espediente, passa-se a ordem do dia, com os seguintes trabalhos:

Tuberculose da Lingua - Dr. Getulio Silva.

O A. apresenta cinco observações sôbre casos de tuberculose da língua, diagnosticados no Serviço Nacional do Cancer. Chama atenção para a dificuldade do diagnóstico da tuberculose da língua, pois os doentes quase sempre vêm à consulta, dizendo que não sofrem do pulmão. Tece comentários sôbre a sintomatologia e o aspecto clínico das lesões, para se poder fazer o diagnóstico diferencial entre a tuberculose, o cancer e as lesões sifilíticas da língua, que tambem não são raras.

Chama a atenção tambem para o exame clínico de rotina e as provas de laboratorio, que irão ser de grande valor para o diagnóstico e prognóstico.

Comentários:

DR. MAURO PENNA: - Comprimenta o Dr. Getulio Silva pela interessante comunicação que acaba de fazer, comenta sôbre a raridade de observações de tuberculose primitiva da lingua, sendo dever do especialista saber diferenciar os casos de tuberculose como complicação de processo pulmonar. Cita caso de uma doente com ulcera no faringe, na qual os exames de rotina nada revelaram para o lado do pulmão, entretanto a biopsia da lesão revelou a presença de bacilos de Koch.

SR. PRESIDENTE: Felicita o Dr. Getulio Silva pela interessante comunicação que apresentou.

DR. GETULIO SILVA: Agradece os comentários feitos pelo Dr. Mauro Penna e as palavras elogiosas do Sr. Presidente.

CASOS CLÍNICOS

1º) Papilomatose do laringe - Dr. Galdino A. Lima da Silva.

Comentários:

DR. ARISTIDES MONTEIRO: Cita caso de uma moça com papilomatose recidivante do laringe, na qual procedia-se a retirada dos papilomas mais ou menos de 2 em 2 meses. Comenta as observações do Dr. Galdino, que com a cirurgia e o repouso conseguiu a cura da papilomatose nos casos apresentados.

SR. PRESIDENTE: Agradece ao Dr. Galdino pelo interessante caso clínico apresentado.

2.º) Comoção labiríntica por faísca elétrica -
Dr. Danilo Gonçalves

A doente, J. C. L., de 37 anos de idade, procurou o Serviço do Hosp. S. Francisco de Assis, dizendo ter sido atingida por um ráio, do que sobreveiu comprometimento do ouvido.

Em 31 de dezembro do ano passado, estando a paciente em atividades domésticas, foi abalada por um ráio. Perdeu os sentidos pelo espaço de 1/2 hora e, ao recuperá-los, estava tonta. Tudo lhe parecia rodar, não podendo informar para que lado. Foi então transportada para o leito, onde permaneceu náuseosa e mesmo chegando a vomitar, pelo periodo de uns 3 ou 4 dias. Não sofria dos ouvidos até aquéla data, somente, quando usava quinina por estar impaludada, surgiam zumbidos, porém, desapareciam ao suspender aquéla droga. Do dia do incidente para cá, não mais se libertou dos zumbidos no ouvido D. Tres dias após o trauma, o OD começou a purgar. As vertigens que nos primeiros dias, acompanhadas de vomitos, não lhe permitindo sair do leito, têm diminuido, todavia, não sendo ainda capaz de andar só, pois quando menos espera fica tonta e cairá se não for amparada. O sentido da quéda não é determinado. Decorriam dois meses quando veiu à consulta.

EXAME: Inspecção - A paciente parece normal. A marcha se faz bem. Otoscopia: OD - perfuração sêca, com um diametro de 4mm. atingindo ambos quadrantes posteriores até o umbigo. OE-léve retração. Audiometria: OD - surdez tipo percepção e léve abaixamento para os tons graves. OE-léve abaixamento para ambos os tons. Prova rotatória: hipoexcitabilidade labiríntica. P. calórica: OE - nistágmo horizontal á D.

TRATAMENTO: Instituímos a terapêutica comum: sedativos, vit. B1, etc. A paciente nos procurou em abril, disse ter melhorado, podendo andar só; continuam os zumbidos em grau mais léve. A surdez é a mesma; a perfuração timpanica diminuiu e continúa sêca.

POR QUE "COMOÇÃO LABIRÍNTICA"? 1.º - comprometimento brusco do ouvido interno. 2.º - surdez labiríntica, 3." - vertígem acompanhada de vomitos, o que difére da cerebral: 4.º - zumbidos, 5.º - deficit das funções vestibulares. E, como nesses casos, a evolução não diferiu: a) a vertigem foi desaparecendo aos poucos; b) zumbidos regredindo, c) surdez a mesma.

Comentários:

DR. MAURO PENNA: Comprimenta Dr. Danilo pela exposição do seu caso clínico e cita observação de uma comoção labiríntica por desnível de uns 7 metros numa "Montanha Russa".

DR. FERREIRA DE SOUZA: Cita 2 observações de comoção labiríntica por tiro no ouvido, sem entretanto haver lesão do labirinto.

SR. PRESIDENTE: Felicita o Dr. Danilo Gonçalves pelo caso clínico apresentado.

3.º) Difteria nasal e corpo estranho - Dr. Duarte Moreira

A presença de bacilos diftéricos no exsudato nasal colhido antes da retirada de alguns corpos estranhos, levou Keen a afirmar sua existência em cem por cento dos casos.

Talvez tenha razão. Mas, como comprová-lo se diante destes casos a ninguem ocorre colher material para exame? Por que pensar em difteria se a simples retirada do corpo estranho resolve de imediato a questão? Tambem nós não fugiríamos à regra e somente ao acaso devemos a oportunidade de uma tal verificação.

Trabalhávamos no Centro de Saúde n.º 8 do Distrito Federal e a secção de Epidemiologia frequentemente nos mandava doentes de difteria ali em tratamento. Três dentre êles, mereceram um registro especial.

1.º) Alcira B., brasileira, branca, com 4 anos de idade e residente à Rua Francisco Vale n.º 17, procura o Centro de Saúde em 10 de Dezembro de 1938, sendo atendida pelo Epidemiologista. Colhido material de nariz e garganta e resultando o exame bacteriológica positivo para difteria, recebe 10.000 u.a. de sôro. Em 4 de Janeiro de 1939 o primeiro exame para libertação resulta ainda positivo, em material colhido na garganta. Como novos exames sejam positivos, óra no nariz, óra na garganta, faz-se em 9 de Março seguinte o "test" de virulência que resulta negativo e a doentinha tem alta.

No dia 29 do mesmo mês é trazida, pela primeira vez, ao nosso Serviço de Oto-rino-laringologia. Informa a progenitora que desde Outubro sente-máu cheiro no nariz da menina, o qual não se modificou com a aplicação do soro. Examinando-a, encontramos na fossa nasal esquerda envolto em exsudato purulento fétido um corpo estranho que, logo retirado, verificamos ser um botão de ôsso com 1 cm. de diâmetro. Algumas instilações de óleo gomenolado e a paciente ficou inteiramente livre da fetidez nasal. Extinto o exsudato, não se fez novo exame de laboratório.

2.º) Walter A., brasileiro, branco, com 2 anos de idade, reside à Rua Fernão Cardim n.º 17 casa V. Examinado no Serviço de Otorino-laringologia de um Hospital desta Capital, recebe 10.000 u.a. de sôro anti-diftérico por ter sido positivo o exame direto do exsudato nasal.

Encaminhado ao Centro de Saúde, procede o Serviço de Epidemiologia em 26 de Maio de 1939 a novo exame, bacteriológico, que resulta positivo para bacilos de Loeffler no exsudato nasal. Já com a experiência do caso anterior, o colega epidemiologista manda em 2 de Junho a criança ao nosso Serviço e localizamos na fossa nasal direita um corpo estranho, pedaço de papel, que logo é retirado.

Os exame, de libertação feitos em 8 e 13 de Julho, resultam negativos.

3.º) Amasilis M. A., brasileira, branca, com 4 anos de idade, residente à Estrada Velha da Pavuna n.º, 1.122, procura em 25 de Setembro de 1939 o Centro de Saúde, por indicação do Serviço de Otorino-laringologia de outro Hospital. Embora trazendo positivo para difteria um exame direto de exsudato nasal, o Epidemiologista em vez de lhe injetar o sôro específico, manda-nos a criança para imediato exame.

Pessoa da família informa que há seis meses sai da narina direita pús e sangue, sempre com muito mau cheiro. A rinoscopia anterior o diagnóstico prontamente se faz e da fossa nasal direita se retira um corpo estranho, pedaço de papel muito dobrado e fétido. Desaparece o exsudato e a mucosa logo adquire aspecto normal, mas os exames continuam positivos por algum tempo. Não se aplica sôro.

Nos três casos, o primeiro diagnóstico não foi de corpo estranho. Em todos o exame do exsudato foi positivo para bacilos de Loeffler, continuando positivo após o sôro no primeiro caso e mesmo depois de retirado o corpo estranho no terceiro. Os dois últimos simulavam de tal forma difteria, que foram encaminhados ao Centro de Saúde pelos próprios rinologistas.

Tratando-se evidentemente de corpos estranhos do nariz e não de difteria, confirmariam estes casos a asserção de Keen? Como explicar a presença dos bacilos diftéricos no exsudato nasal?

Não estamos em condições, com três casos apenas, de solucionar a questão. Todavia, diante da negatividade do "test" de virulência e da persistência dos exames positivos após o sôro e a retirada do corpo estranho, acreditamos com Terracol, que tudo corra por conta dos germes de que eram eventualmente portadores. Se coincidência ou não a presença de bacilos de Loeffler nos corpos estranhos do nariz, só um estudo clínico e bacteriológico de numerosos doentes o poderá firmar. Nós é que não ousaríamos pedir aos Colegas um simples exame direto dêsse exsudato nasal, quando muito mais facil é tomar do gancho ou da pinça, retirar o corpo estranho e não pensar mais no caso.

Ata da 60.ª Sessão Ordinária.

Aos dois dias do mês de Junho de mil novecentos e quarenta e quatro, reuniu-se em sessão ordinária a Sociedade de OtoRino-Laringologia do Rio de Janeiro, presidida pelo Dr. Walter Muller dos Reis, e secretariada pelo Dr. Flavio Aprigliano.

Aberta a sessão é lida a ata da sessão anterior, sendo a mesma aprovada. No expediente, é apresentada uma proposta para socio correspondente do Dr. Alarico Quinõnes Cabral, assistente da clínica O. R. L. de Assunção, Paraguai.

Passando a ordem do dia é dada a palavra ao Dm. David Adler, que apresenta sua conferencia sôbre:

"Impressões de viagem à America do Norte"

Descreve-nos o Dr. David Adler em uma interessante palestra sua viagem à America do Norte, desde as dificuldades para a entrada naquele país, sua permanência em Nova York, o modo atual de vida do povo em vista das alterações surgidas com o estado de guerra. Descreve-nos tambem sua visita aos hospitais militares onde há a recuperação dos feridos de guerra, notando que a cirurgia plástica ainda não constitue uma especialidade a parte, como deveria ser. Finalizando, dá-nos uma idéia dos novos processos usados na reparação dos tecidos, na imobilização das fraturas e no tratamento das queimaduras.

O SR. PRESIDENTE, agradece ao Dr. David Adler por nos ter apresentado tão interessante e agradavel palestra.

CASOS CLÍNICOS.

l.º) Cisto infectado do seio maxilar - Dr. Aristides Monteiro

Apresenta o caso de um doente queixando-se de tensão ao nivel do seio maxilar; não havia passado de resfriado, exame rinoscópico negativo. Diagnóstico clínico de cisto do maxilar, confirmado pela punção do seio, que deu saída a regular quantidade de liquido citrino. O doente aliviado não voltou ao consultório.

Dois anos mais tarde, apareceu novamente, e com a mesma sintomatologia, pedindo nova punção, recusando-se a ser operado. O ano passado veio pela terceira vez à consulta, e desta vez com dores violentas ao nível da fossa canina e abundante secreção pela narina, sem as características do líquido citrino. Pela rinoscopia, observamos através do meato medio, a mucosa do seio herniada e de aspecto esverdeado. Anestesia pela néo-tuto-adrenalina; retiramos essa mucosa com um polipotomo, dando saída a grande quantidade de pús, o que muito aliviou o paciente 3 meses após, novo resfriado; voltaram as dores e a secreção; desta vez o doente resolveu operar-se, libertando-se do que o afligia.

Abertura do seio maxilar pela técnica de Caldwell-Luc: a mucosa apresentava um aspecto enovelado. Enviada para exame antomo-patológico, verificou-se tratar de parede cística com processo inflamatório.

Acredita-se hoje que os cistos têm sua origem nos germes dentários de Mallassez; esse doente tinha porem a dentadura perfeita.

2.º) Complicação eventual no post-operatório de uma operação de desvio do septo e de uma sinusite maxilo-etmoidal - Dr. Rubens M. Cabral

C. G. D. Matrícula nº 96.772, Idade 18 anos, Côr branca, Sexo masculino, Lavrador, Solteiro, Brasileiro, Natural de Paracamby (E. do Rio) onde reside.

Vem à consulta porque lhe doe a cabeça e o globo ocular esquerdo. Sente dificuldades respiratórias principalmente à esquerda. História do doente: - Das doenças da infância teve sarampo, coqueluche, catapora, cachumba. Paludismo há 2 anos do qual ficou bom (sic.) tendo se tratado no Posto da Malária em Paracamby. Pais vivos e sadios. Colaterais sem importância.

EXAME:

Orofaringoscopia: - Amigdalectomizado. Dentes bem tratados.

Rinoscopia anterior: Após retração pela neotutocaina-adrenalina, verificamos a presença de crista do septo nasal à esquerda. Vegetações adenoides.

Otoscopia: - Retração timpânica em ambos os ouvidos.

Diagnóstico: - Crista do septo nasal à esquerda. Vegetações adenoides.

Tratamento: - Ressecção sub-mucosa de Killian, curetagem das vegetações adenoides; operações a que se submeteu no dia 2-XII-943.

Sequência operatória:

Quinta feira - 3-XII-943 - Pela manhã, quando pasamos pela enfermaria, estava o doente, recostado em seu leito sem se queixar de cousa alguma. Pulso e temperatura dentro da normalidade.

Pela parte da tarde, febre alta, o termômetro acusando 40º, 5 C. segundo nos informou a enfermeira pelo telefone. Prescrevemos um antitérmico e aguardamos os acontecimentos. No entanto mentalmente, faziamos uma porção de hipóteses: - Poderíamos atribuir esta temperatura à absorção sanguínea na ferida operatória? ... Mas nêste caso a elevação da temperatura seria mínima, e o paciente apresentava 40", 5... O Dr. Milton de Carvalho, a quem fizemos ciente do ocorrido, sugeriu que poderiamos estar diante de uma intolerância pela gaze iodoformada, o que, já tem sido observado; e que não descuidássemos "no sentido de perquirir um sindromo intestinal, ou uma pielite, por exemplo..." até que o clínico pudesse melhor elucidar o caso.

Mas intolerancia que se manifesta assim de modo inesperado decorridas mais de 24 horas da operação...

Infecção da ferida - por material cirúrgico contaminado? por deficiência na antissepsia do campo operatorio tão extenso no caso presente pela adição da ferida no cávum pela ablação das adenoides? ... Foi o que mais nos assombrou e o que nos pareceu mais possivel naquele momento. Aguardamos assim o dia imediato para a retirada do tamponamento e verificação de perto do estado da ferida operatória.

Sexta-feira 4-XII-943 - Fomos encontrar o paciente pela manhã ainda sub-febril, abatido, com certo estado de depressão física e psíquica. Retiramos o tamponamento e para surpreza nossa a ferida nada apresentava de anormal. Um pequeno filete de sangue do corneto inferior de um lado e nada mais.

Com o clínico, Dr. Pires de Castro, prescrevemos uma injeção de Hexamina na veia. Coaguleno. O exame clínico nada revelou de anormal nos diversos aparelhos.

Passou bem o dia.

Sábado 5-XII-943. - Pela manhã ia passando bem. A tarde recebemos um telefonema do Hosp. São Francisco de Assis dizendo que o doente estava novamente com muita febre; fomos imediatamente para lá encontrando então o paciente de novo com muita febre, 40º, 5 C., vômitos repetidos, de inicio alimentares, depois biliosos, mal estar, cefaléia, calafrio.

Como o que mais prontamente nos acudiu à memória foi a hipótese que já haviamos feito anteriormente, e o receio de que a infecção de que falamos pudesse se propagar às meninges, muito nos alarmavam os sintomas, que pareciam estar conspirando contra nossa imaginação, - Febre alta, Cefaléa, Vômitos?! ... Mas,... curioso, por mais que insistíssemos nada de encontrarmos rigidez de nuca, sinal de Kerrig ou o de Brudzinski...

Comunicamo-nos com o Assistente chefe da 6.º Enfermaria, Dr. Milton de Carvalho, que sugeriu déssemos um purgativo e insistiu para que colhesse mos sangue para exame ao microscópio.

Administramos uma limonada purgativa que o estômago do paciente regeitou imediatamente. Prescrevemos para aplicar no momento uma empola de óleo canforado, e uma de cardiazol quinino no momento e outra à noite.

Colhemos duas lâmina de sangue, mas como o laboratório do Hospital estivesse fechado àquela hora, levamos as mesmas ao nosso amigo particular Dr. Murilo Prado, biologista da Aeronáutica que teve a gentileza de examiná-las.

Não podíamos imaginar a surpresa que nos esperava, nem quanto tinha sido acertada esta medida.

A resposta do Dr. Murilo não tardou, trata-se de Impaludismo, foi encontrado o Plasmodium falciparum. Creamos alma nova, o diagnóstico estava feito; Paludismo - forma terçã maligna.

O paciente foi transferido no dia imediato para a Enfermaria de Doenças Tropicais onde se tratou.

O. S. 22 anos, pardo, do sexo masculino, solteiro, brasileiro, Natural de Mimoso (E. E. Santo) Residente à Faz. Independência, Mimoso.

Não tendo passado pelo ambulatório internou-se diretamente na 6.ª Enfermaria, em 4-3-944, por apresentar forte cefaléia há cerca de um mês.

História do paciente: - Sarampo, coqueluche, catapora, cachumba. Há um ano teve febre, tremores de frio. Tratou-se no posto da Malária em Mimoso. Pais vivos e sadios; possui oito irmãos vivos e sadios. Colaterais sem importancia.

Orofaringoscopia - S. S.

Rinoscopia anterior - Secreção branco amarelada descendo do meato médio. Otoscopia - S. S.

Radiografia dos seios da face - Opacificação dos seios maxilar e etmoide do lado direito.

Diagnóstico - Sinosite Maxilo-etmoidal direita.

Operado em 13-3-944 - Operação de Caldwell-Luc modif. e Etmoidectomia transmaxilar.

Cinco dias após a operação, 18-3-944, começou a apresentar calafrio, febre intensa, 40º, vômitos, suóres frios.

Ao exame local nada encontramos que chamasse nossa atenção. Medicação inespecífica.

O exame clínico feito pelo Dr. Pires de Castro nada revelou para o lado dos diversos aparelhos.

Em 20-3-944, exame de sangue, para pesquisa de hematosoário, feito pelo Dr. Pais Brazil no Lab. do Hospital São Francisco, revelou a presença do Plasmódium Vivax.

Êstes dois casos que acabamos de relatar nos levou a consultar alguns autores sôbre o assunto, assim é que vimos no magnífico "Tratado de Clínica das Doenças Infectuosas e Parasitárias" de Eugênio Coutinho à Pag. 250, Edição de 1939, quando trata da evolução do Paludismo:

"Podem os indivíduos - principalmente as crianças - infectados por qualquer espécie de plasmódio, não mostrar por muito tempo os sintômas da doença (malária latente), que só aparecem por ocasião das recaidas, provocadas pela ação do calôr ou do frio intensos, de intervenção cirúrgica, parto, hemorragia, uso de adrenalina, estricnina, etc. "

Na Patologia Interna de Dieulafoy, Edição 16.a (1920) Vol. IV, pag. 368.

"Diagnóstico e Evolução do Paludismo".

"Abandonada a sí mesma a febre intermitente pode se curar em tratamento após a duração de algumas semanas; mas, tratada ou não, é raro que uma primeira manifestação de intoxicação palustre não seja seguida de uma série de recidivas sobrevindo dentro de algumas semanas, de vários meses, de vários anos de distância, ora sem causa nova apreciável, ora por ocasião de um resfriamento, de uma fadiga, de um traumatismo (Verneuil), ou após uma doença aguda. Esta volta do impaludismo depois de urna perturbação de causa externa ou interna é muito importante de se conhecer".

À página 384 e segs. trata do Paludismo larvado e alude às formas nevrálgicas.

O Prof. Moreira da Fonseca em seu livro "Formas Nervosas do Imapludismo", 2.ª Ed. (1935) à pags. 106.

"Forma nevrálgica: - Geralmente, as nevralgias de carater intermitente e curáveis pela quinina são atribuídas ao impaludismo, constituindo o apanágio de suas formas larvadas.

Essas nevralgias palústres, ora não são acompanhadas ele acessos febris, ora se apresentam como complicação de febres intermitentes.

São mais frequentes para o lado do quinto pár, ou trigêmeo, sobretudo em seus ramos supra e infra orbitários ; vindo em seguida, segundo Laveran, as nevralgias do ocipital, dos intercostais e do ciático".

No primeiro volume do "Precís de Parasitologie" de Brumpt,. Ed. de 1936. págs. 455 e segs.

"Paludismo crônico - Um indivíduo impaludado e não tratado parece curado após uma espécie de hábito que se produz em algumas semanas, em alguns meses, em alguns anos conforme o caso. Às vezes mesmo os indivíduos afirmam nunca ter tido a febre; no entanto, pelo exame dêstes indivíduos, encontram-se um baço enorme e um fígado geralmente hipertrofiados. A coloração terrosa e o aspecto anemiado são em geral típicos. Estes indivíduos são paludados crônicos, que possuem o germe palustre em estado latente e que podem ser tomados brutalmente por um acesso pernicioso, sobrevindo após um excesso qualquer ou de um esforço fisiológicamente anormal.

Estas formas não se encontram serão nas zonas endêmica endêmicas onde indivíduos são reinfestados pelos Anopheles. Elas não se encontram nos paludados que permanecem em regiões em que o paludismo desapareceu".

"Paludismo larvado - Os paludados são sujeitos a nevralgias intermitentes, a nevralgias intercostais e a diversas manifestações nervosas dolorosas que aparecem com uma certa periodicidade; estas manifestações palustres são totalmente curadas pelo tratamento quinínico. Devemos assinalar entretanto que a cura de uma nevralgia periódica pela quinina não permite absolutamente afirmar sua natureza palustre".

Quando trata das Recaídas à págs. 461 diz:

"Recaídas puderam ser provocadas acidentalmente e com fim diagnóstico ou terapêutico , inoculando tuberculina, adrenalina, cloreto de cálcio intravenoso, gonacrina, vacina antitífica, leite ou soro de cavalo. Diversos agentes físicos podem produzir os mesmos resultados, tais como duchas quentes e frias, massagem do baço, raios ultra-violetas, estes últimos pelo menos no paludismo aviário. "

Comentários:

DR. MAURA PENNA: Felicita o autor pelos casos apresentados e tece comentários sôbre a surpresa que o impaludismo pode apresentar. Cita um caso de cefalalgia intensa, tratado como sinusite ex-vacuo apesar de radiografia negativa, e que pelos exames complementares verificou-se tratar de impaludismo.

DR. DUARTE MOREIRA - Cita caso de um impaludismo evoluicio com otite média aguda.

SR. PRESIDENTE - Felicita Dr. Rubens M. Cabral pelo interes - cante caso apresentado.

ATA DA 61.a SESSÃO ORDINARIA.

Aos seis dias do mês de Julho de mil novecentos e quarenta e quatro, reuniu-se em sessão ordinária a Sociedade Oto-Rino-Laringologia do Rio de Janeiro, presidida pelo Dr. Walter Muller dos Reis, e secretariada pelo Dr. Flavio Aprigliano.

Aberta a sessão é lida a ata anterior, sendo aprovada. No expediente é aprovada por unanimidade a proposta para socio correspondente do Dr. Alarico Quinõnes Cabral.

Em nome da Sociedade o Dr. Aristides Monteiro sauda o novo socio. Com a palavra a seguir o Dr. Alarico Q. Cabral que, pronuncia à seguinte oração:

Señor Presidente,

Doctor Aristides Monteiro,

Señores:

Grande honra constituye para mi que la Sociedad O. R. L. de Rio de Janeiro me reciba hoy en su seno, para ser nombrado miembro de ella como socio Correspondiente. Convencido estoy de que esta alta distinctión es inmerecida para mi, gero acepto con la seguridad de ser depositario de lo que ela me confiere en nombre de la Sociedad O. R. L. del Paraguay de la que soy miembro, sirviendo de esta manera como un eslabón mas en la unión, al mismo tiempo que estrechar aun mas los vinculos deambas sociedades que desde largo tiempo mantinen y seguirán manteniendo en forma indestructible.

Seré portador de este mensaje de buena y sincera amistad que el Brasil, noble nación de América brinda a un pueblo hermano por intermedio de uno de sus hijos, esta no es la primeira ni tampoco sera la ultima de las manifestaciones que este gran pueblo ofrece, tendria varias que citar y podria, peso, bastame recordar que este pais teniendo bien presente de que la unión de los pueblos se hace gracias al intercambio de sus jovenes ha creado la División de Cooperación Intelectual como dependencia de Itamaraty, cuya labor infatigable reconocemos y agradecemos los extranjeros que nos encontramos en misión de estudios. Estas becas que hacemos uso ya fueron ofrecidas por ella y asi hemos llegado y seguirán Ilegando, desde los mas apartados lugares de la América toda, para que bajo un techo común y teniendo los mismos derechos que los nacionales aprendamos en las aulas y en los centros hospitalarios, donde siempre se nos brindó con la máxima amplitud de espiritu, sin mesquindad ninguna todo cuanto atesora la ciencias médicas en las diversas instituciones de enseñanza por la que cursamos.

Cabeme agradecer las elogiosas palabras del Dr. Aristides Monteiro, mi distinguido maestro dei Hospital San Francisco de Assis durante los catorce meses de mi estadia en esta ciudad.

Al riterar mis agradecimientos por tan honrosa distinción, hago votos por que la Soc. O. R. L. de Rio de Janeiro, entidad que marca rumbos en la especialidad en el pais y bastamente conocida, no solo en los centros cientificos de dentro de sus propios limites, sino tambien en los de allende las fronteras, continue su marcha ascendente con la vista dirigida en todo instante hacia horizontes mejores en la seguridad de que, como miembro que soy de ella desde el dia de hoy, haré de que su nombre se mantenga en el sitial honroso que siempre le cupo.

Lipoma do saco lacrimal - Dr. Fernando Linhares

OBSERVAÇÃO N.º 18

FICHA N.º 22.669.

J. C. 32 anos, casada, portuguesa.

HISTORIA: Doente há 19 anos. Teve um flemão da órbita há 13 anos em Portugal.
Fez anteriormente, inúmeras sondagens e tratamentos.

EXAME: A compressão do ângulo interno de olho, lado direito, secreção muco purulenta. Canaliculo inferior estreitado. Lado esquerdo epifora simples.

RINOSCOPIA - Normal.

DENTES: Em bom estado.

DIAGNÓSTICO: Dacriocistite muco purulenta lado direito, epifora lado esquerdo.

INTERVENÇÃO: Dacriocisto-rinostomia Dupuys Dutemps Bourguet. (Aparelhagem de D. Vale) Anestesia local, e de base (DILAUDID).

Ao incisarmos o saco encontramos um tumor pediculado mole medindo 1,50 cm. de comprimento, 0,4 de largura, enchendo toda cavidade do saco lacrimal semelhante a um papiloma ou polipo. Retirado por meio de uma alça polipotomo quase sem sangue, tocamos o ponte de insersão com ácido crômico. Anastomose do saco à pituitaria. Havendo dificuldade em suturar o retalho posterior saco-mucos, fizemos apenas a sutura anterior. Sutura da pele. Retirada pontos 5 dias após. Drenagem bôa.

Enviado o material para o Dr. Jonio Salles da Secção de Anatomia Patológica do Instituto Oswaldo Cruz, que nos deu o seguinte resultado: O exame microscopico revela a existência de um tumor constituido de células adiposas reunidas em lóbulos circunscritos por tenues formações em conjuntivas".

Diagnóstico: Lipoma - (Dr. Jonio Salles) .

LIPOMA: Tumor formado por elementos análogos ao tecido célula gorduroso. O aspecto macro e microscópicos destes tumores apenas se diferencia da gordura normal, geralmente isentes de cápsula, porém com o acúmulo anormal da gordura só é diferenciado desta, pelo maior tamanho dos lóbulos e vascularização mais pronunciada. Consistência costuma ser igual ao tecido gorduroso, porém mais duro quando cruzados por tabiques conjunctivos (fibrolipoma). - (Bastos Ansard.)

No nosso caso a paciente sofria de obstrução há 16 anos havendo feito inúmeras sondagens e tratamentos intempestivos comprovados por formação de abcesso.

Sôbre a origem do tumor ocorreu-nos duas hipóteses ligadas a tratamento previo.

a) - irritação provocada pelas inúmeras sondagens.

b) - formação de hernia gordurosa penetrando no saco após abcesso.

A patologia e anatomo patologia do aparelho lacrimal com exceção das modificações produzidas pelas infecções microbianas, pouca atenção tem chamado aos especialistas.

Na literatura especializada apenas encontramos obstrução do aparelho lacrimal por culturas de Actinomyces (Hagedon, Faza Kas) Arch. Oftl. 23 abril 1940.

Mac Kenzie citando uma lesão tuberculosa do aparelho lacrimal chama atenção para o fato da pouca predileção dos tumores em geral para o aparelho lacrimal, explica devido a constante passagem de lagrima pelo epitelio ciliado, opinião esta também aceita por Seifert. (Les Anales 1939 n.º 6.)

Monteiro descreve um lipoma da cavidade nazal mostrando a raridade destes tumores nesta região (Rev. Bras. ORL. VIII, N.º 1, 1940).

Sendo um tumor benigno produzia perturbações apenas devida a sua situação anatômica, sem a gravidade do caso analogo publicado por Vinson e Pembleton de obstrução bronquial par lipoma (Arch. Vo. 35 n.º 6).

COMENTÁRIOS: Dr. Aristides Monteiro - Agradece a citação que fez do seu nome no trabalho, comenta a raridade do seu caso, que foi descoberto sómente pelo exame anatomo-patológico de rotina que se fez no H. S. Francisco de Assis.



Microfotografia do tumor mostrando as células adiposas reunidas em lobulos envolvidos por formações conjunctivas: LIPOMA (Dr. Jonio Salles) - Microf. J. Pinto.



Sr. Presidente - Felicita o Dr. Fernando Linhares pela interessante comunicação apresentada.

Dr. Fernando Linhares - Agradece os comentários do Dr. Aristides Monteiro e as palavras do Sr. Presidente.

CASOS CLÍNICOS

1.º) POLIPO DE KILLIAN - Dr. Flavio Aprigliano

O polipo de Killian não é coisa rara dentro da especialidade, porém, não constitue observação de todo dia, razão pela qual resolvemos trazer êste caso clínico à Sociedade.

R. A., 29 anos, pardo. brasileiro, natural do Distrito Federal, procurou o ambulatório de O. R. L. do Hospital S. Francisco de Assis, queixando-se de obstrução nasal, principalmente da narina esquerda, que está sempre "entupida".
Raramente tem dores de cabeça, e não tem secreção no nariz.

EXAME: Orofaringoscopia: Dentes em bom estado, amigdalas pequenas pediculadas, sem sinal de inflamação. Otoscopia: Nada de anormal. Rinoscopia anterior: F. D. nada de anormal. F. E.: mucosa de coloração normal, esporão do septo, alto e posterior, impedindo a visão do meato médio na sua parte posterior, na porção anterior do meato, e corneto, nada ha que notar. Rente ao assoalho nasal, na, parte posterior há uma tumoração de aspecto polipoide. Rinoscopia Posterior: - Notamos um polipo de regular tamanho, obstruindo totalmente a coana esquerda.

Radiografia dos seios da face: Zona de opacidade no seio maxilar esquerdo, parecendo ser imagem de polipo.

O doente foi internado em 15-5-44 para os exames de retina, e foi operado no dia seguinte. Operação de Caldwell-Luc. Encontrarmos um polipo cístico, ocupando todo o assoalho do seio, e com um prolongamento pela parede interna até as proximidades da fosseta de Fiol. Nas demais paredes do seio o aspecto da mucosa era normal. Ao tentarmos retirar esse polipo, que era sessil, perfurou, dando vasão a um líquido amarelo-citrino. Havia integridade do recesso alveolar. Curetamos o seio e fizemos contra-abertura nasal. Com uma pinça de Brunnings, retirarmos o polipo coanal, pela narina. No dia 22-5-44, o doente teve alta definitiva não sentindo mais nada e respirando perfeitamente bem das duas narinas.

Foi Killian quem primeiro descreveu o polipo coanal como tendo sua origem no seio maxilar, daí a denominação até hoje usada. Para Caboche, o polipo antrocoanal se caracterisa : por ser unico, unilateral e se unir por um longo pediculo que parte do meato médio, quase sempre de aspecto normal. É no dizer de Terracol, a projeção retro nasal, trans-ostial de uma polipose sinusal. Indicam pois, geralmente uma sinusite latente, as mais das vezes do tipo hiperplastico. A origem sinusal destes polipos é pois fora de duvida.

Laurens dá como mais frequente a inserção do polipo, no recesso alveolar do seio, (como no nosso caso). Citeli, descreveo polipo coanal como sendo uma hernia da mucosa dos seios maxilar ou esfenoidal, chamando-o de prolapso da mucosa do seio. A imigração do polipo para o nariz, é feita pelo ostio principal ou acessório do seio maxilar. Quanto a tendência dos mesmos à se desenvolverem para a coana, varias são as explicações: ação da gravidade, ostio muito posterior, etc. . Estamos com Halphen, quando considera ser muito frequente um desvio do septo impedindo a evolução anterior do polipo, e orientando-o para o cavum, como parece ter sido o nosso caso. O controle radiográfico mostrará um seio com sua transparência alterada e frequentemente pela punção diameatica iremos obter saida a um liquido citrino. Como terapêutica a maioria dos autores aconselha, para que haja cura radical, se combinar à extração do polipo, curetagem do seio maxilar.

COMENTARIOS:

SR. PRESIDENTE: Cita um caso que teve a oportunidade de observar no serviço do Prof. Segura de Buenos Aires, de um polipo de Killian gigante, tendo sido extraido pelo nariz com um gancho comum. Termina agradecendo ao Dr. Flavio Aprigliano pela apresentação do seu caso clínico.

DR. DUARTE MOREIRA: - Cita 2 observações de sua clínica, extraindo também o polipo e praticando a curetagem do, maxilar, Num caso, no qual fez a extração do polipo pelo nariz, 2 anos depois, vindo o paciente à consulta, verificou que o polipo havia recidivado. Nova extração, o doente recusou a operação.

2.º) CORPO EXTRANHO DA LINGUA - Br. Walter Muller dos Reis

M. L. O. 28 anos. Branco. Solteiro. Masculino. Maritimo. Ficha 3559, do Serviço de O. R. L. do Hospital Nossa Senhora do Socorro. Procurou o serviço em 24 de Maio de 1942, dizendo ter sofrido queda a quinze dias, e batido com o maxilar inferior no chão. Nessa ocasião mordeu a língua. Tinha um incisivo central cariado e diz ter o mesmo penetrado na língua e se quebrado, ficando o fragmento retido. Agora sente a língua como que aumentada de volume e acredita que o fragmento de dente ainda esteja nela introduzido. Não sente dor e não o incomoda muito. Nega sofrer de epilepsia e que tal tenha acontecido durante um ataque.

Ao exame objetivo, constatamos pequeno desvio do septo para a esquerda. Nada para o lado dos ouvidos. Dentes cariados, faltando são no terço anterior da lingua, mais proxima ao bordo que a linha os incisivos laterais e o incisivo central direito. Incisivo central esquerdo cariado e reduzido a pequeno fragmento. Amigdalas pequenas encastoadas sem reação inflamatória. Percebe-se pequena incimediana, quase cicatrizada. Apalpação nota-se a meia espessura da orgão um nodulo do tamanho de caroço de feijão dos maiores. A língua não está infiltrada nem aumentada de volume. Não ha dor à palpação e o doente pode move-la livremente. Tentamos sondar com um pequeno estilete de prata, não o conseguindo por se achar o pertuito quase fechado. Mais do que a dúvida da existência ou não de fragmento dentário na espessura do orgão, levou-nos o desejo de documentar, a solicitar radiografia da porção livre da lingua, tanto, mais que pouco custava fazê-la naquela época. Sugerimos ao radiologista colocar chapas das usadas para radiografia dentária. A radiografia feita pelo Dr. Franklin Véras mostrou, como poderão ver, fragmento de dente na espessura da língua (metade esquerda, terço anterior).

Nada mais havia a fazer que pequena incisão e retirada do fragmento. Isso entretanto não desejava o enfermo, pois não mais se apresentou ao serviço, voltando quase tres meses após, para informar que havia conseguido deslocar e extrair o fragmento dentário, usando para tal um espinho de larangeira.

Ao exame, a incisão perfeitamente cicatrizada. Pela palpação, ausência de qualquer endurecimento do orgão e ausência do nodulo que existira no lugar do fragmento dentário.

Muito pouco poderiamos encontrar de interessante nesse despretencioso caso clínico. Apenas o não ser de todo dia a observação de corpo extranho encravado na lingua. Por outro lado, a tolerancia do orgão para com o corpo e sua relativa imunidade aos germes habituais de supuração que aí por força existiam em estado saprofitário. Este fato mostra como as feridas do orgão se reparam bem e explica a raridade relativa do abcesso da língua. As manobras de extração procedidas pelo doente, atestam bem êste fato, pois é de se calcular a falta de assepsia com que foram conduzidas. O emprego do espinho de larangeira continua ser de regra por parte do doente ignorante, para tais manobras. Não é de mais acentuar o prejuízo de tal crença, de que esse espinho é esteril. Em dois dos casos de blastomicose que observamos em nosso serviço, os doentes confessaram que eram dados a prática de usar espinhos de larangeiras para palitar os dentes.

COMENTÁRIOS:

DR. DUARTE MOREIRA - Comenta o interessante caso clínico, pela raridade que representa.

3.º) AFONIA PSÍQUICA - Dr. Duarte Moreira.

A impressão causada por um choque emotivo pôde determinar em certas pessôas, especialmente do sexo feminino, distúrbios funcionais laríngeos que se traduzem pela afonia. Ela aparece repentinamente e se manifesta por uma voz sem timbre, que nos casos graves pôde chegar até o mutismo completo. A impossibilidade de falar em vóz alta não impede que o paciente use a vóz cochichada e ao mesmo tempo que as funções fonéticas reflexas, tais como a tosse, o riso e o choro, conservem o seu som habitual. A afonia, que se instala bruscamente, pôde durar alguns instantes ou alguns dias, vários meses ou anos, mas tambem pôde desaparecer de um momento para outro sob a ação de uma influência qualquer e por um processo mais ou menos psicoterápico. Mais difíceis de vencer são as afonias de guerra, desencadeadas pelas emoções que experimentam, os jovens soldados, sob o fogo dos canhões e as explosões dos modernos engenhos bélicos.

Ao exame laringoscópico verifica-se que as cordas se movem normalmente à respiração, mas não conseguem em muitos casos se aproximar mutuamente à fonação. Esta imagem glótica é muito variavel, de um dia a outro e de um a outro momento no mesmo exame, o que faz excluir a possibilidade de uma lesão orgânica, mas tambem pensar na falta de vontade para emitir os sons. É bem verdade que, assinala Canuyt, nada é sistemático nesse tipo de afonia; os distúrbios se verificam ao nivel do laringe, mas as causas determinantes são do domínio psíquico.

Decorre daí a conduta terapêutica do laringologista, que sem negar a importância do sintoma vocal se esforçará por conquistar a confiança do paciente, condicionando a recuperação da vóz à sua força de vontade.

Auxiliará porém a psicoterapia geral com outros recursos de ordem local, tais como a faradização e a massagem vibratória do laringe, a embrocação com soluções anestésicas ou não, a anestesia e preensão da epiglote aconselhada por Szeker ou a introdução no laringe da bola de Muck.

A re-educação com os exercícios vocais de Killian e a leitura com os ensurdecedores de Lombard, igualmente podem ser usadas como bons auxiliares.

Da eficiência da psicoterapia associada a um simples método local, como seja o da pressão sôbre a cartilagem tireoide, dá nos prova o seguinte caso:

Bibiana S. A., brasileira, parda, com 20 anos, solteira, industriaria, procurou nosso Serviço de Oto-rino-laringologia no Centro de Saúde n.º 8 do Distrito Federal, em 17 de Fevereiro de 1938.

Pela progenitora, que a acompanhava, fômos informados de que às 21 horas do dia 7 do mesmo mês houvera uma desinteligência entre a paciente e o noivo, daí resultando uma tentativa de suicídio por êste; pessôas da casa antecipando os fatos, avisaram abruptamente à moça que o noivo se enforcára. Bibiana recebendo tal notícia, ficou, de súbito afônica.

Chamada a Assistência e consultados mais tarde dois Médicos, não obteve qualquer melhora.

Ao se apresentar à consulta estava inteiramente afônica, podendo apenas cochichar. A tosse entretanto se conservava sonora e não muito ruidosa. O exame dos ouvidos, do nariz e da faringe, nada revelou de anormal. A laringoscopia, cordas vocais de aspeto normal o com movimentos íntegros.

O diagnóstico não podia ser outro: afonia psíquica, afonia emotiva ou afonia histérica dos clássicos.

E na mesma ocasião, convencida de que se ia curar, tomamos o laringe entre o polegar e o indicador da mão direita, dizendo-lhe iríamos "colocar no lugar um ossinho que se deslocara". Ordenamos a seguir que contasse em voz alta de 1 a 10, o que foi feito da primeira vez com vóz cochichada e depois com vóz mais clara, até que após alguns minutos o fazia com vóz inteiramente normal.

Leu, conversou e se foi embora com a vóz clara e natural, que desaparecera havia dez dias e que voltava assim facil e rapidamente, por simples sugestão.

COMENTÁRIOS:

Dr. Flavio Aprigliano - Cita um caso observado no Serviço de O. R. L. do Hospital S. Francisco de Assis e curado pela psicoterapia.

Dr. Aristides Monteiro - Cita um caso que observou há mais eu menos 20 anos no serviço de O. R. L. do Prof. João Marinho na Santa Casa e que curou com a terapeutica de "colocar o laringe no lugar".

Dr. Muller dos Reis - Cita um caso de disfonia histérica em uma moça, na qual fez uma operação no laringe e ficou curada 15 dias após, a paciente voltou ao ambulatorio novamente afônica nova "operação" e cura permanente. Felicita o Dr. Duarte Moreira, pelo interessante caso apresentado e nada mais havendo a tratar deu por encerrada a sessão.

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