Versão Inglês

Ano:  1953  Vol. 21   Ed. 4  - Julho - Agosto - ()

Seção: -

Páginas: 154 a 166

 

DR. FRANCISCO DE PAULA PINTO HARTUNG (1893-1953)

Autor(es): -

Foi com grande pezar, que os meios medicos e sociais desta Capital, receberam a triste noticia do falecimento de Francisco Hartung, ocorrido no dia 14 de julho ultimo.

Com a sua morte perde a Oto-rino-laringologia nacional um dos seus membros mais ilustres e que muito contribuiu para o seu progresso e desenvolvimento entre nós. Pois fazia Hartung parte da "velha guarda" que compreendia um grupo de especialistas que de 1922 em diante, entusiasmados com ensinamentos recebidos em Berlim e Viena, procuravam, difundí-los em nossos meios hospitalares e incentivando assim, a formação dessa pleiade de jovens especialistas, hoje mestres consumados, que levam a oto-rino-laringologia a todos os rincões do nosso Brasil.

Nasceu Francisco Hartung no dia 13 de janeiro de 1893 na cidade de Petropolis, filho de Afonso Fernando Hartung e Ana Matilde Pinto Hartung. Iniciou seus estudos primarios na sua cidade natal, e com 8 anos de idade, vindo para São Paulo, completou-os na Escola Modelo Caetano de Campos. Em seguida cursou o Ginasio do Estado, da Capital, onde se bacharelou com ótimas notas.

Medico por vocação, não pôde, no entretanto, matricular-se no curso medico, que na ocasião ainda não existia em São Paulo. Entrou então para a Escola Politécnica, apesar de engenheiro nada havia em sua personalidade. Dois anos após matriculou-se na Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, recem-fundada pelo saudoso Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho.

No 4.° ano medico, a convite do Prof. Henrique Lindenberg, foi nomeado interno da Cadeira de Oto-rino-laringologia. Após sua formatura, em 1919, foi nomeado 2.° assistente dessa Cadeira, e tambem assistente da clinica particular do Prof. Lindenberg. Sua tése de doutoramento: "Contribuição ao diagnostico clinico da Leishmanióse nasal" (1919), aprovada com grande distinção, teve larga repercussão científica, pelo real valor do trabalho.

Era Livre-docente de O.R.L. na Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. Exerceu o cargo de 2.º assistente até 1928, quando deixou expontaneamente após o falecimento do Prof. Lindenberg.

Em 1923, 1924, 1935 e 1936 fez proveitosos estudos da especialidade nos grandes centros europeus e americanos. Em 1939 foi convidado especialmente para participar da "Reunião da Sociedade Rioplatense de Otorrinolaringologia, levando como tése brasileira, excelente contribuição sobre a "Leishmaniose das mucosas", trabalho que completou sua tése de doutoramento.

IN MEMORIAN


Dr. Francisco de Paula Pinto Hartung

Relação dos trabalhos cientificos publicados.

(Nas "Revista Otolaringologica de São Paulo", "Revista Brasileira de Otorinolaringologia" "Boletim da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo", "Revista da Associação Paulista de Medicina de São Paulo" e em avulsos).

1.º - "These de Doutoramento" - 1919 - Contribuição ao diagnostico clinico de Leishunaniose nazal.
2.º - "Mastoidote e Nevrite Retrobulbar" - Seis resumos dos "Archives of Otolaryngology" - 1933- (R.O.S.P.) - Março e Abril.
3.º - "Otite Media Aguda e Paralisia do Facil" - Mastoidectomia - Cura da otite e da paralisia - 1933. (R.O.S.P,) - Julho e Agosto - Seis resumos identicos).
4.º - "Alergia Nasal" - 2 resumos identicos. (R.O.S.P. - Novembro e Dezembro de 1933).
5.º - "Dois Casos de Agranulocitose" - 13 resumos identicos. (R.O.S.P. - Setembro e Outubro de 1933).
6.º - "Profilaxia da Surdez em Idade Escolar" - Avulso. Dezembro de 1933.
7.º - "Sobre um Caso de Labirintite Purulenta". (B.S.M.S.P. - Março e Abril de 1930).
8.º - "Hemorragia Post-Amigdalectomia" - Trabalho apresentado para concorrer a uma vaga na Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, que lhe deu entrada. (B.S.M.S.P. - 1930)
9.º - "Corpo Estranho no Nariz" - 8 resumos identicos - (R.O.S.P, - Julho e Agosto de 1934).
10.º - "Temperatura Post-Mastoidectomia" . Prova de Queckenstedt - 10 resumos identicos, (R.O.S.P. - Setembro e Outubro de 1934)
11º - "Amigdalectomia na Tuberculose" - (R.O.S.P. - 9 resumos identicos - Maio e junho de 1935)
12.º - "Impressões da Otorinolaríngologia, na Europa e nos Estados Unidos" - Conferencia na Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo - (B.S.M.C.S.P. - Março de 1936).
13.º - "Entrevista Sobre o Mesmo Assunto" - (R.O.S.P. - Março de 1936).
14.º - "Meningismo? Paracentese e Cura" - (R.O.S.P. - Janeiro e Fevereiro de 1937 - Resumo de cinco dos citados artigos).
15.º - "Inflamações do Rochedo" . Observação de um caso. (R.O.S.P. - Maio e Junho de 1937) - Osteomeliete irradiante do frontal. - Tradução dos "Archives of Otolaringology". Resumos de 4 artigos.
16.º - "Abcesso Lateral do Pescoço" - (R.O.S.P. - Nov. e Dez. de 1937).
17.º - "Enfizema Cirurgico na Amigdalectomia" - (R.O.S.P. - Setembro e Outubro de 1938 - Resumo de cinco artigos).
18.º - "Hemorragia Cirurgica do Septo Nasal" - (R.O.S.P. - 1938).
19.º - "Laringites Cronicas" - (R.O.S.P. - Novembro e Dezembro de 1938 - Resumo de nove artigos).
20.º - Relatorio sobre a reunião da Sociedade Rio Platense, realizada em Buenos Aires em Abril de 1939, onde representou a Associação Paulista de Medicina e a Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo).
21.º - "Leishmaniose das Mucosas" - Tema oficial do Brasil - Publicado em Buenos Aires em Agosto de 1939.
22.º - "Osteomielite do Frontal, Septicemia Estafilococica" - Abertura do frontal e cura. (Annaes do 1.º Congresso Brasileiro de Otorinolaringologia, reunido no Rio de Janeiro, em Outubro de 1938).
23.º - "Nevrite Retrobulbar" - Operação de Luc Caldwell. Cura. (Mesma fonte que a precedente).
24.º - "Glomerulonefrite" - Amigdalectomia. R.B.O.R.I., 1938.
25.º - "Traumatismo Raro da Membrana Timpanica" - R.B.O.R.L., Julho e Agosto de 1939.
26.º - "Otites e Enterites Infantis" - R.B.O.L., Janeiro e Fevereiro de 1940.
27.º - "Anginas e Nefrites" - R.B.O.R.L., Maio e Junho de 1940. Impressões sobre o Primeiro Congresso Sul-Americano de Otorinolaringologia, em Buenos Aires, em Maio de 1940, ao qual compareceu.
28.º - "Otites e Dispepsia na Infancia" - R.B.O.R.L., Setembro e Outubro de 1940. Infecções do espaço parafaringeo. Tradução resumo ecomentario de um artigo dos Archives of Otolaryngology.
29.º - "À Margem de Uma Observação" - R.B.O.R.L., Novembro e Dezembro de 1940
30.º - "Curiosidades Clinicas" - R.B.O.L., 1940.
31.º - "Deduções de Significação Endocrinica Tiradas das Radiografias dos Seios e da Mastoide". - Tradução e comentario de um artigo de Leigllton Jonhson para a R.B.O.R.L., Maio e Junho de 1941.
32.º - "Significação e Variações do pH nas Secreções Nasais" - Tradução e comentario sobre um artigo de Noah Fabricant para a mesma revista. Julho e Agosto de 1941.
33.º - "Meningite Pneumococica" - Operação e sulfamidoterapia. Cura. R.B.O.R.L., Março e Abril de 1942.
34.º - "Otite Media e Suas Complicações no Diabetico". - Trabalho apresentado à Sociedade de Otorinolaringologia do Rio de Janeiro, em Dezembro de 1942. R,B.O.R.L., Março e Abril de 1943.

Traçar o perfil de Hartung, não é tarefa facil, porque ele apresentava uma personalidade toda especial, e só os seus amigos mais íntimos compreendiam e admiravam o seu espirito polimorfo, onde se misturavam, em perfeita harmonia, o especialista competente e estudioso, e o artista, emotivo e sentimental, sempre vibratil em tudo que se relacionava com a arte.

Como medico, era um entusiasta da sua profissão, da qual fazia um verdadeiro sacerdocio, dentro da mais rígida ética profissional. Extremamente dedicado aos seus pacientes e amigo sincero dos colegas, era Hartung grandemente estimado por todos. Procurava sempre dar um cunho pessoal aos assuntos que estudava e defendia sempre com calor nos certames científicos, os trabalhos apresentados. Nos temas mais palpitante da especialidade, Hartung tomou sempre parte ativa. Assim foi na neurite retro-bulbar focal ligada a inflamação da mastoide; no diagnóstico das petrosites; na leishmanióse das mucosas; da relação entre as anginas e as glomerulo-nefrites; e principalmente os têmas: a questão da amigdalectomia nos tuberculosos e as otites e dispepsias na infancia, - têmas de maior relevo na época, tiveram em Hartung o seu grande divulgador, que não se cançava de procurar convencer os clínicos, tisiologos, pediatras e neurologistas, dos resultados positivos de suas inumeras observações e, muitas vezes era obrigado a defender com ardor e eficiencia das criticas injustas e sem base. E para melhor se aquilatar da seriedade e proficíencia com que Hartung dedicava às otites e dispepsias na infancia, e ao mesmo tempo reverenciar sua memoria, julgamos oportuno transcrever o seu ultimo trabalho, encontrado entre seus papeis pela sua dignissima esposa. Intitula-se: Minha Luta. Ei-lo: "Não estou parodiando ou plagiando Hitler. De modo algum seria isto possível, pois considero o fuhrer, mesmo em memoria, um dos vultos mais abomináveis que a historia nos tenha apresentado. Foi êle quem instituiu o regime de corrupção e da inconciencia. Foi êle quem ensinou premiar um menino, quando êste denunciava o proprio pai, se êle se manifestava contra o nazismo. Mas, a minha luta é outra, nada tem que vêr com o famoso e lamentavel livro "Mein Kampf". A minha luta é outra, contra alguns colegas que duvidam da seriedade do problema da Otite Latente. Aliás o Mangabeira, com muita lealdade, na ultima vez que falei em sessão sôbre o assunto, contou o seguinte: "Recentemente em Campinas, fôra chamado por um colega, afim de fazer paracentéses do tímpano em uma criancinha em franca toxicóse. Ele porem, examinando a pequena doente, e não concordando com os meus pontos de vista, não queria fazê-las. O colega, porem insistiu, alegando que havia opiniões que aconselhavam urgentemente paracentése. Como a criancinha dava impressão de morrer em horas, Mangabeira resolveu leva-las a efeito, mesmo contra vontade. Faz a paracentése e a criança rapidamente reage e vem a sarar, não obstante o seu gravissimo estado." De qualquer modo, porém, a luta continua, porque muitos colegas há que não aceitam o verdadeiro sentido de minhas palavras, quando me bato pela paracentése em tais emergencias. Por causa desta resistencia, certa vêz veio ter às minhas mãos, um pedido de pediatra eminente a um colega otiátra, pedindo insistentemente que fizesse a paracentése com qualquer tímpano, tal importancia tambem dá êle à drenagem do tímpano, para aliviar qualquer derrame, fonte parenteral das perturbações dispépticas do lactante, e que ràpidamente conduz ao coma e à morte o pequenino doente. Por aí se vê a que ponto chegam as paixões. Não há duvida que tambem está errado abrir todos os tímpanos, pois é incontestavel que muitos casos há, principalmente quando a criança não é excessivamente tenra, nas quais fácil é afirmar que o ouvido de modo algum está comprometido em um quadro de desinteria parenteral. O problema é outro. É outra a questão. Ninguem discute o progresso de nossa especialidade ou duvida do especulo e luz refletida. Seria insultar a memoria de Politzer e Lindenberg. Seria renegar a minha mocidade naquele porão infecto mas saudoso da Santa Casa de Misericordia de São Paulo, onde aprendi a examinar o ouvido, e convenci-me que na criancinha o problema é diferente daquele do adulto. Quem disser o contrario, ou não é sincero ou não tem tarimba. Isso sim. Uma coisa é examinar ouvido de adulto e outra é o ouvido da criancinha, justamente nos casos nos quais temos que acertar mesmo errando. Acertar fazendo a paracentése numa criancinha, cujo exame não nos permite afirmar com precisão quais as condições do ouvido médio. Mas errar tecnicamente falando, quando não divisamos as aparencias do tímpano. Este aspecto de medicina filosofica, na realidade nem sempre é compreendido. De fato, quais os elementos semióticos que podemos nos apegar, para informar o pediatria sobre o verdadeiro estado do ouvido do pequeno doente em toxicóse? O sinal de Vachez? (O Getulio está na moda: Ora a lei... ) Ora o sinal de Vachez! Como pretender que uma criancinha demonstre irritação ou chóra quando se lhe comprime o tragus, se ela já por si está muito contrariada, com as evacuações uma atraz da outra, com vomitos e dores intestinais? Depois, o conduto na otoscopia, apresenta-se com descamação, com restos de líquidos dessecados, ainda da vida intra-uterina. E não é só. Conduto com luz insignificante, no qual não cabe o menor especulo, por menor que seja o seu diametro. Tímpano ainda muito infletido, dificultando mais a visão. Como esperar uma boa visibilidade do tímpano? Ainda mais. Como afirmar ao pediatra e à família, que o ouvido daquela criança não é o ponto de partida da toxicóse, que algumas horas mais poderá extinguir essa vida ainda em botão, e que espera de nós sinceridade, honestidade científica e atuação imediata?

É fato que se abrirão tímpanos sãos. Nem é possível fugir a esta eventualidade. Não nos interessa este erro. No calculo das probabilidades desse problema, esse erro é essencial em sua equação patologica. Mas não podemos fugir a esta equação, si quizermos descobrir os coeficientes terapeuticos do qual pretendemos lançar mão. Paracentéses brancas? Sim, mas quantas delas se farão nas punções raquidianas e abdominais ou mesmo nas laparatomías exploradoras?

Problema mais difícil, se se contornar este aspecto filosofico, é aquele das mães. Muito mais vezes, tias ou avós, principalmente quando se trata de um reizinho, primeiro filho. Isto sim, por vezes é difícil. A solução está em levar o pequeno para o consultorio ou para o hospital, para depois abrir os tímpanos. O Aquino indagou do assunto. Ele tem razão. As vezes é muito difícil este aspecto".

Por esse trabalho, mostra Hartung, até os, seus ultimos dias, o desejo de convencer os séticos e incredulos, da razão do seu ponto de vista, que alguns chamavam da "mania de Hartung",, mas que Mangabeira Albernaz qualificou de "mania justa e, util", e referendada pela quase totalidade dos seus colegas.

Trabalhou Hartung, toda sua vida, com afinco e entusiasmo no Serviço de Oto-rino-laringologia da Santa Casa de Misericordia de São Paulo, desde aquele acanhado porão até o suntuoso serviço instalado no Pavilhão Conde de Lara, ao lado de Lindenberg, Schmidt Sarmento, Mario Ottoni, Ernesto Moreira, Paulo Sáes, Roberto Oliva e Silvestre Passy (referindo-nos apenas aos mais antigos) onde contribuiu com seu esforço e produções científicas para o prestigio daquele tradicional serviço, hoje um dos melhores do nosso país.

Tinha Hartung pendores para o professorado, mas o destino desviou-o da carreira universitaria; mas, mesmo assim era um professor sem catedra, pois nestes ultimos anos, convidado péla Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, tomou parte em bancas examinadoras de concursos para livre-docencia, encargos esses que ele desempenhava com grande prazer, entusiasmo e sabedoria, proprios aos homens de ciencia.

Ao lado da Medicina, cultivava com carinho as letras, a arte, principalmente a musica, sendo um fervoroso admirador dos classicos, como Bach, Chopin, Mozart e sobretudo Beethoven. A ultima etapa da sua vida, foi, como bem disse um seu amigo, o encontro do medico, do literato e do musica. A sua obra sobre a "Surdez de Beethoven" e outra sobre "Chopin", definem com precisão esse entrelaçamento em sua gloriosa jornada.

Hartung adorava as viagens, e fazia-as sempre que podia. As primeiras ao estrangeiro, foram mais para estudos medicos. Adorava a França, como se fosse sua segunda patria. Ainda recentemente fez uma viagem à Europa, - a sua ultima, - mas dando-lhe um caráter estritamente artístico, indo até à Grecia, que visitava pela primeira vez, e onde teve a oportunidade de observar "in loco" a cultura grega, da qual foi sempre grande admirador.

Francisco Hartung não teve filhos. Mas em compensação, teve sempre ao seu lado uma esposa dedicadissima, verdadeira e fiel companheira em todas as etapas de sua vida e preciosa colaboradora das suas variadas atividades.

Medico-especialista de profunda intuição clinica, aos primeiro sintomas que sentiu, fez o diagnostico do enfarto do miocardio que o vitimou, cujo exito final aceitou com a maior conformidade cristã, recebendo o conforto espiritual dos sacramentos, que solicitou confiante na misericordia divina.

A "Revista Brasileira de Oto-rino-laringologia" da qual Francisco Hartung foi sempre um grande amigo e assíduo colaborador e onde publicou a maioria dos seus numerosos e valiosos trabalhos, - lastima profundamente a grande perda sofrida pela Oto-rinolaringologia brasileira, da qual êle era um dos seus mais lidimos representantes.

Ele partiu, mas sua personalidade ficará sempre em nossa memoria, como símbolo do amigo sincero e do medico culto e cheio de virtudes.

Apresentamos a D. Silvia Ferreira da Rosa Hartung, os nossos mais sentidos pezames.
H. C.

Ao descer o corpo à sepultura, falaram:

Dr. Oscar Monteiro de Barros, em nome de seus companheiros de turma.

Senhores:

Antes que a terra se feche para abrigar definitivamente os restos de Francisco de Paula Pinto Hartung, deixai que a voz de um seu colega de turma, de um amigo que o compreendeu e amou, se faça ouvir.

Foi Hartung espírito de escol, que soube aliar à cultura medica, o conhecimento profundo da arte e da literatura. Alma de poeta; cheia de bondade e dedicação, espargiu sobre seus doentes, parentes e amigos, as bençãos dos seus beneficios e o balsamo da sua amisade.

Auxiliar da cátedra de oto-rino-laríngologia, colaborou na formação de dezenas de turmas de medicos da nossa Faculdade. Seus sabios ensinamentos, de verdadeiro conhecedor de sua especialidade, são ainda hoje relembrados por quantos tiveram a ventura de lhe ouvir as interessantes aulas.

Filho e irmão exemplar, amigo de todas horas, dedicou sua vida fecunda ao exercício da medicina, ao convívio familiar, a um circulo seleto de amigos e a musica, seu predileto passatempo, que profundamente amava e conhecia.

Hartung foi homem feliz. Sempre se viu cercado de carinho e amisade e teve como premio de suas raras qualidades a doce companhia de uma esposa fiel e dedicada, que soube encher-lhe a vida de encanto e suavidade.

Seus colegas de turma vêm, consternados, partir-se mais elo de sua cadeia e, em nome deles, com a alma dolorida, pronuncio comovidamente o nosso adeus. Sua lembrança ficará gravada em nossos corações como a de um Bom e de um justo.

Dr. Mauro Candído de Souza Dias, em nome dos companheiros do Serviço de O.R.L. da Santa Casa de Misericordia de S. Paulo.

A Clinica de ORL da Sta,. Casa de S. Paulo, na ausencia do seu atual chefe Dr. Mario Ottoni de Rezende, e a Catedra de ORL da Escola Paulista de Medicina cumprem, através da palavra de um de seus assistentes, o doloroso dever de acompanhar a, sua ultima morada o nosso querido companheiro de lutas Francisco Hartung.

Discipulo dileto do grande Henrique Lindenberg, Hartung cresceu e desenvolveu seu espírito e sua cultura medica á sombra larga do Serviço de Oto-RinoLaringologia da Santa Casa à qual deu o seu melhor esforço e dedicação.

Sua atividade científica foi intensa e colocou-se sempre como soldado de primeira linha nas sucessivas conquistas da ciencia ,oto-rino-laringologica. Sua tese doutoramento versando sobre Leishmaniose americana, moléstia de transcendente importancia para o Brasil, constitui obra fundamental a ser compulsada por todos aqueles que se interessam por este capítulo da Patologia Tropical. Além disso dedicou-se com entusiasmo e honestidade ao estudo relativo a patologia do ouvido medio infantil sobretudo em suas relações com os disturbios gastro entericos. O destino não lhe concedeu filhos mas compensou-se Hartung fartamente restituindo às mães aflitas as centenas de crianças moribundas que lhe chegavam as mãos.

Exerceu a profissão com amor, dignidade e entusiasmo. Formará agora ao lado de Henrique Lindenberg, Ernesto Moreira, Schmidt Sarmento e Jaime Campos. E para eles elevarão os olhos os moços em busca de um guia seguro. Serviu Hartung a sua Patria como o seu melhor soldado, foi colega bom e amigo leal. A Clínica de Oto-Rino-Laringologia da Sta. Casa de São Paulo perde um membro ilustre.

Os seus companheiros e colegas da Clínica inclinam-se reverenciando à sua memoria e pedem à Deus justiça e paz para a sua alma.

Na reunião do Departamento de O.R.L. da Associação Paulista de Medicina, realizou-se em 17-7-53 uma reunião dedicada à memoria de Francisco Hartung, e em nome dos especialistas de São Paulo, usou da palavra o Prof. Mangabeira Albernaz, que pronunciou o seguinte discurso:

Difícil é traçar o perfil de Francisco Hartung, quando ainda sob a impressão acabrunhadora de seu inesperado desaparecimento. Ainda estamos, seus amigos e colegas, sob a ação do choque brutal, recebido por uma telefonada lacónica "O Hartung faleceu hoje pela manhã".

Pelo fato de ser um de seus amigos mais chegados, coube a mim a incumbência amarga de, em nome dos otorrinolaringologistas de São Paulo, fazer-lhe o elogio fúnebre. E é isso justamente que quase me inibe o cérebro de pensar, quando o coração ainda não se refez do golpe atroz, quando ainda não me sinto conformado com mais esta injustiça do destino. Hartung ainda tinha pela frente muito que fazer. E era do grupo seleto e reduzido dos semeadores da boa semente, daqueles que, como ha pouco dizia Mc Laughliu, formam a ala dos bons mestres - "O bom mestre é o que admite a existência de problemas reais dentro de sua própria experiência, e, por meio de conselhos, estímulo e exemplo, auxilia os discípulos a ultrapassarem aquele que lhes ministra o ensino".

Há um mês ou pouco mais, reunia-se nesta sala uma mesa redonda de especialistas sul-americanos sob a chefia do grande mestre Prof. Justo Alonso, afim de tratar da questão do câncer da laringe. Foi esta a última vez em que tive a ventura de ver Francisco. Hartung. Levantara-se e partira antes de terminada a reunião, e eu estranhara o fato, pois, de volta de sua viagem ao velho mundo, ainda não nos havíamos encontrado. Levei para Campinas a tristeza de não nos termos falado, mas, 48 horas depois, recebia uma carta sua - a última que ele me havia de dirigir, em que, desculpando-se, explicava as razões de ter saído sem procurar-me.

Nesta carta, uma frase denotava o seu espírito: "A turma veterana está mesmo se aposentando. A velha guarda, a que pertencemos, ainda deve, porém, mostrar vitalidade, e gostei muito quando você chegou". É que ele, apesar de sua fascinação pela arte, pelas viagens, pela literatura, não deixava de ser o otorrinolaringologista que movimentara tantas vezes nossas reuniões com estudos e idéias palpitantes e controvertidas.

Se passarmos em revista sua atividade científica, vemos como ele sabia tocar nos pontos nevrálgicos da especialidade. Isto, desde a tese de doutoramento, que tratava de um problema de magna importância: a leishmaniose do nariz.

Apaixonado pelos temas que atacava, tornava-se paladino do que merecia a devida atenção dos especialistas. Recordo, em linhas gerais, alguns destes temas a neurite retrobulbar focal, ligada a inflamação da mastoide; as anginas pseudo diftéricas por pneumococo; a alergia nasal (isso em 1933) ; a radiografia da mastoide (tambem em 1933) ; as petrites; as hemorragias nas operações de septo nasal; as laringites crônicas; as mastoidítes complicadas; a lesão do tímpano por picada de formiga; a síndrome de Gradenigo; a comoção labiríntica por explosivos, etc., etc. Mas os temas que ele lançou em nosso meio, e que tiveram grande repercussão, foram a questão da operação das amígdalas em relação com a tuberculose; a relação entre as amigdalites e anginas e as glomérulanefrites; as otites dos lactentes; as glórias e derrotas da operação do septo nasal; e as otites e enterites da primeira infância. Nestes temas, do maior relevo na época, ele não só foi pioneiro, mas se tornou verdadeiro apostolo. Quanta vez vi a crítica injusta querer ridicularizar o que chamavam a "mania do Hartung". Mas a "mania" era justa e útil.

De seus casos, um foi, permitam-me o adjetivo, espetacular. Chamaram-no, certa feita, para ver uma criança com glomérulonefrite aguda. O pequeno apresentava amígdalas muito doentes e irritadas, e achou Hartung que a operação se impunha, contra o que se rebelou o pediatra, apoiado logo pela família. O caso, porém, veio a agravar-se: vieram edemas, surgiram cilindros hemáticos, a pressão elevou-se, a uréia, sanguínea, apesar da dieta drástica, aproximou-se dos 0,50 gr. por mil. Hartung insistiu - e depois tornou sempre a insistir em operar no estado agudo, de acordo aliás com o parecer de Volhard - e, diante da gravidade do caso, o pediatra e a família foram forçados a acatar-lhe a opinião. Operada a criança, foi a pouco e pouco melhorando, e curou-se.

A criança tornou-se um rapaz, um homem, e este homem resolveu casar-se. Fez questão que o médico, a quem devia a vida, estivesse presente à cerimônia. Hartung alegou não estar bem de saúde, e, de certo por modéstia, esquivou-se de comparecer à solenidade. Mas o pai do rapaz não se conformou. E quando o amigo querido trocava de roupa para ir assistir ao casamento, um infarto do miocárdio veio a fulminá-lo.

Não era em Hartung apenas o otorrinolaringologista, o médico, a unica face desta alma privilegiada. Hartung era um artista na extensão da palavra. A vibração de seu espírito diante dos clássicos da música, particularmente Bach, Beethoven, Chopin, Mozart, era digna de nota. Ele saía deste mundo, enlevado, sublimado, ao ouvir as músicas dos grandes iluminados.

Vibrátil em todos os sentidos, era um admirador entusiástico dos grandes literatos, de Vitor Hugo a Renan (um de seus fracos era Renan), de Machado a Ruy, de Nabuco a Euclides. Este então deixava-o fora dos sentidos, como Rui. Recordo-me da longa carta que ele me dirigiu, quando João Mangabeira publicou seu maravilhoso livro "Rui, estadista da República".

Este entusiasmo, esta vibração pelas coisas da arte, era em Hartung uma das características mais notáveis. Quando fiz, nesta sociedade, vai para dez anos - dentro de dois dias completa-se o primeiro decenário de sua morte - o elogio do Prof. Eduardo Moraes, Hartung ouviu-o e, dias depois, me escrevia: "Que necrológio! Quanta ternura, gratidão e afeto. E que harmonia de conjunto na mera alocução! Você" nada me encomendou, mas quero lhe dar um abraço sincero".

A musica estava-lhe permanentemente na alma. O estudo da surdez de Beethoven e o sobre Chopin são de um artista, de um médico... mas principalmente de um músico. Aliás _ele sentia, ele ouvia a música em tudo. Quando lhe enviei um folheto com a oração de paraninfo da turma de 1945 da Escola Paulista de Medicina, ele me escreveu uma linda carta, que, conquanto pareça imodéstia incluir neste elogio, é uma prova do seu sentimento musical. Assim escreveu ele: "Crença, fé, espiritualidade, cristianismo, cultura num crescendo muito bem metrificado e ritmado. Talvez uma idéia de Ravel, no "Bolero", ou, mais fácil ainda, a protofonia do "Tanhäuser". O plano geral é parecido, embora diferente o material. No começo, em surdina e de longe, aboés e clarinetas para o francês, violino. baixinho, para o alemão. Ao mesmo tempo, a nota emotiva, que vem logo. O baiano fora da Bahia, no "pais do sul" desde Castro Alves até Afrânio Peixoto. Deixam se absorver e aclimatar, mas não esquecem o berço. Tambem eu sinto assim. Mas o berço esta lá na "Bahia, constelada de igrejas". Depois muito mais música. Mais instrumentos. Ravel com os de sôpro, em Wagner as cordas. O crescendo vai aumentando e a platéia, se empolgando, ao mesmo tempo em que "quantas vezes não é o médico o anjo da esperança?" desafiando os desenganos e desilusões, certo de que a ingratidão é parte inerente à sua vida e à sua clínica. Depois, mais musica ainda. Forte, polifônica, cordas e de sopro, firmes e uníssonos, arrebatando e deslumbrando. Ravel, no seu talento hipotecado à Espanha, no sensualismo quase tropical, bamboleado num misticismo mouro. E Wagner com as "lorelei" do Reno, cujas lendas encantadas Hitler, com os seus crimes, havia de profanar. Também, no Municipal, naquele dia, foi assim. Não estive lá, não estando em São Paulo, mas mesmo assim ouvi o eco dos aplausos. E entusiastas e merecidos, porque "sim, prometo-o cada dia. Não perdi meu ideal, antes sinto-o maior, incomensurável. Estou convosco". Tambem eu, hoje como em 1919".

"Ai está amigo Mangabeira, a minha impressão, que julguei você tivesse curiosidade de conhecer. Muito antes de julgá-la como pernóstica, se deve atender à minha sinceridade e temperamento, que não faltam no que disse".

Só quem não o tivesse conhecido tacharia de pernosticismo o que ele escreveu. Ele era um emotivo e um bom. Minhas palavras o haviam atingido em cheio. E não quero esquecer o patriota. Exaltado, jacobino, tinha certo complexo do nome Hartung, que, não se cansava de dizer, era de origem dinamarquesa. Em suas cartas assinava ora Chico, ora Pinto Hartung, grafando a palavra Pinto e, numa delas, explicando: "latinidade apenas em evidencia"; e noutra: "o grifo relembra que sou jeca".

Seu patriotismo exaltado surgia já no nome, já nos atos. Perguntou-me certa vez: "Canudos é longe da Bahia, da capital? Quero ir à Bahia, mas faço questão de ver Canudos". Retruquei-lhe: "Mas Canudos não existe mais. Os heróis do exército talaram tudo". Mas a idéia fixa era ver aquele lugar trágico, onde Euclides, com cinzel de fogo e malho de talento, esculpiu no bronze de "Os Sertões", o monumento imperecível da vergonha nacional.

Assim foi Francisco Hartung. Um sonhador bem humorado, um grande músico, um sentimental, um artista polimorfo, um médico. Mas que médico não é artista, e que médico pode ser médico se não tiver alma de artista?

Deixou-nos quando ainda muito nos podia dar. Assim é a vida. Já dissera Antônio Vieira, o incomparável Vieira:

"De Troia disse Ovídio: Jam seges est ubi Troia fuit. E o mesmo podemos dizer das planícies, vales e montes, de onde se levantavam às nuvens aqueles vastíssimos corpos de casas, muralhas e torres. De umas não se sabem os lugares onde estiveram, de outras se lavram, semeiam e plantam os mesmos lugares, sem mais vestígios de haverem sido, que os que encontram os arados, quando rompem a terra. Para que os homens compostos de carne e sangue se não queixam da brevidade da vida, pois também as pedras morrem: e para que ninguém se atreva a negar, que tudo quanto houve, passou, e tudo quanto é, passa".

Na Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, tambem foi prestada sentida homenagem ao Dr. Francisco Hartung, tendo falado em nome dos colegas, o Dr. Mauro Candido de Souza Dias, cujo discurso transcrevemos:
Sr. Presidente.

O desaparecimento de Francisco Hartung feriu profundamente a Oto-rinolaringologia nacional roubando-lhe um dos seus membros mais ilustres. A Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo perde um elemento destacado e prosterna-se reverenciando a sua memoria.

Traçar o perfil de Hartung e penetrar os aspectos mais marcantes de sua psicologia é tarefa difícil. Difícil porque ele fugia á bitola comum dos homens apresentando sua personalidade facetas originais e estranhas. Na realidade era Hartung um carater cujas reações escapavam ao previsivel no homem comum.

Se encararmos o medico vamos identificá-lo a Henrique Lindenberg. A disciplina ferroa, a determinação inflexivel no trabalho, o entusiasmo e amor a profissão do mestre. Emotivo e sentimental. Extraordinariamente ativo e profundamente dedicado ao estudo. Procurava dar aos assuntos que estudava um toque pessoal e este é um traço dominante de seu carater de medico. Erigia suas opiniões em alicerces firmes e as defendia vigorosamente nos certames científicos. As atas da APM estão repletas dos debates que travou muitas vezes com extremo calor. O destino desviou-a da carreira universitaria para onde o dirigiam os passos da mocidade. Nem por isso deixou Hartung de interessar-se pela pesquisa clinica e pelo estudo. Trabalhando no serviço de O.R.L. da Sta. Casa ao lado de Schmidt Sarmento, Mario Ottoni, Ernesto Moreira, Silvestre Passy e Paulo Saes contribuiu por seu esforço e produção cientificas para construir as tradições deste Serviço um ponto alto da O.R.L. patria. Penetrou e desfez problemas arduos da especialidade. Entre estes cabe ressaltar o complexo capitulo das otites latentes do rocem nascido e suas repercussões gerais no organismo da criança. Este problema cuja iniciativa devemos a Paulo Saes, e o proprio Hartung muitas vezes o proclamou, recebeu de suas mãos um impulso decisivo. E é por isso que hoje os pediatras nos enviam os seus doentes com ordem expressa de praticarmos a paracentese. O mundo inteiro conhece e admira a obra de Worms e Le Mée neste particular. E nós, sem temor de erro, podemos proclamar que se a nossa lingua fosse mais accessivel ao estrangeiro ombrear-se-ia Hartung aos dois ilustres franceses tal a importancia e a amplitude de seu trabalho. Só este capitulo bastaria para consagrar toda uma existencia. No intrincado problema da infecção focal amigdaliana foi um dos seus grandes entusiastas. Extremamente arrojado e firme nas situações difíceis tem em sua clinica um sem numero de casos que se podem considerar milagrosos. Interessou-se na O.R.L. por todos os seus aspectos mas facinava-m'o particularmente os temas difíceis e controversos aos quais imprimia sempre uma orientação nova e desconhecida. Possuiu vasta e selecionada clientela e trabalhou com desinteresse pelos seus doentes.

Ao lado da Medicina dedicou-se com o mesmo carinho as letras, a arte e principalmente a musica. Possuiu um estilo limpido e claro que se inspirava principalmente em Euclides. Filosofo por natureza e por erudição temperava os seus artigos medicos com conceitos gerais que lhe davam um sabor original.

Mas foi na musica que Hartung encontrou a expressão mais alta do seu sentimento de esteta. Neste ponto foi inexcedivel. Aqueles que tiveram a felicidade de frequentar a sua casa da R. Rafael de Barros e depois na Av. Brasil ficarão saudosos dos belos serões inspirados em autenticos concertos de Chopin, Mozart e sobretudo Beethoven. Era possuidor de uma fabulosa discoteca onde se poderia encontrar tudo o que a musica fina pudesse oferecer. Não sabia receber um amigo em seu lar sem lhe prescrutar o gosto musical mimoseando-o com uma peça de sua predileção. Assim decorreu a sua existencia embalada pela melhor musica. Assim morreu Hartung cantarolando no seu leito de morte, na sua ante vespera, trechos de Bach. Dedicava amor especial aos cães destacando-lhes a fidelidade. Talvez os desenganos da vida o fisessem compensar nessa fidelidade a que não obteve dos homens. A sua casa era cheia de musica forte e era de ver-se a sua vitrola enchendo os ares com a Pastoral e a Nona Sinfonia atraindo os cães que estiravam ao longo do tapete e ali permaneciam imoveis até o termino do concerto. Assim era o ambiente do seu lar.

Gostava imenso de viagens e as realizou todas as vezes que ponde. Receio formado em Viena onde frequentou os mestres em cursos memoraveis os quais transcreveu com capricho em alguns cadernos verdadeiras joias da especialidade. Mais tarde suas viagens tomaram carater cientifico cultural voltando a Europa sobretudo a França que afinava como sua segunda Patria. A ultima deu um carater estritamente artistico visitando pela primeira vez a Grecia onde se extasiou na contemplação e estudo da cultura grega. Desta viagem deixou alguns artigos à guisa de roteiro onde ao lado do estilo fino e escorreito se admira uma solida cultura classica.

A ultima etapa da vida de Hartung marca o encontro do medico, do literato e do musico. A sua obra sobre a Surdez de Beethoven e outra sobre Chopin definem com absoluta precisão toda a sua existencia. Completou-se a cupula do edificio maravilhoso. Talvez Hartung, na sua ancia de perfeição e beleza, não estivesse saciado. Mas o destino não o traiu. A vida deu-lhe, na sua relatividade, quase tudo que desejou. A medicina deu-lhe prestigio e oportunidade de servir e amar ao proximo, a Musica prazer e encantamento, o Lar paz e amor.

Reverenciemos a sua memoria e agradeçamos-lhe o que acrescentou de util e de belo as tradições desta Casa e da Medicina Patria.

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