Ano: 2003 Vol. 69 Ed. 5 - Setembro - Outubro - (13º)
Seção: Artigo Original
Páginas: 672 a 677
Correlação entre limiares de reconhecimento de sentenças no silêncio e limiares tonais
Correlation between sentences recognition thresholds in quiet and tonal thresholds
Autor(es):
Fabiana Soncini1,
Maristela J. Costa2,
Tania M. Tochetto de Oliveira3,
Luis Felipe D. Lopes4
Palavras-chave: audiologia, audição, percepção auditiva, testes de discriminação da fala, audiometria de tom puro
Keywords: audiology, hearing, auditory perception, speech discrimination tests, audiometry-pure tone
Resumo:
Introdução: Testes de reconhecimento de sentenças no silêncio ainda são pouco utilizados na rotina clínica audiológica e até mesmo em pesquisas. Por isso, muitas vezes, ao realizar esta avaliação, o clínico não possui parâmetros para interpretar ou classificar os resultados. Objetivo: Assim, este estudo teve por objetivo investigar a correlação entre o limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) e a média dos limiares tonais nas freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz. Métodos: Foram examinadas 200 orelhas de indivíduos normo-ouvintes, 50 homens e 50 mulheres (média 34,61 anos). Inicialmente, realizou-se anamnese, meatoscopia, audiometria tonal liminar e pesquisa do limiar de reconhecimento de fala e do índice percentual de reconhecimento de fala. Posteriormente, utilizando o teste Listas de Sentenças em Português, realizou-se a pesquisa dos LRSS. Resultados: O LRSS médio obtido nas 200 orelhas examinadas foi 6,15 dBNA e a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz foi de 8,55 dBNA. A análise estatística evidenciou correlação significante entre as variáveis em estudo. Conclusões: A média dos limiares tonais nas freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz pode ser usada como referência para a análise dos resultados obtidos na pesquisa do LRSS. Além disso, pode-se esperar que os valores dos LRSS sejam melhores que os valores obtidos a partir das médias dos limiares tonais, pois as sentenças fornecem pistas acústicas e lingüísticas com significado.
Abstract:
Introduction: Tests of sentences recognition in quiet still are neither very used in the clinical audiological routine and nor in researches. That's why, many times, when this evaluation is accomplished, the clinicians doesn't possess parameters to interpret or classify the results. Aim: Thus, the aim of this study was to investigate the correlation between the sentences recognition threshold in quiet (SRTs) and the average of the tonal thresholds in the frequencies of 0,5, 1 and 2 kHz. Methods: 200 ears of normal-hearing individuals, 50 men and 50 women (average 34,61 years) were examined. First, an anamnesis, meatuscopy, pure tone audiometry, speech recognition threshold and speech recognition percent index were done. After that, by using the Portuguese Sentences Lists Test, the research of sentences recognition threshold in quiet (SRTs) took place. Results: The medium SRTs obtained in the 200 examined ears was 6,15 dBHL and the average of the tonal thresholds for the frequencies 0,5, 1 and 2 kHz was 8,55 dBHL. The statistical analysis revealed significant correlation between the variables studied. Conclusions: The average of the tonal thresholds in the frequencies of 0,5, 1 and 2 kHz can be used as reference for the analysis of the results obtained in the research of SRTs. Besides, it can be expected that the values of SRTs are better than the values obtained with the average of the tonal thresholds, because the sentences supply acoustic and linguistic tracks with meaning.
INTRODUÇÃO
A compreensão da fala possibilita ao homem comunicar-se com o outro de forma eficiente, sendo fundamental para a sua integração social. Talvez por esta ser uma habilidade tão importante para o indivíduo é que uma das queixas mais comuns na rotina clínica seja, justamente, a dificuldade de compreensão da fala.
Sendo assim, a habilidade para compreender a fala deve ser considerada o aspecto mais importante a ser mensurado na função auditiva humana, pois permite avaliar a função comunicativa receptiva, fornecendo dados de como o sujeito funciona em situações de escuta diária, por meio de informações objetivas, facilmente quantificáveis.
Na prática clínica audiológica, são aplicados testes de reconhecimento de fala com diferentes tipos de estímulos (sílabas, listas de palavras com e sem sentido, monossilábicas, dissilábicas, entre outros). Dentre esses, a apresentação de palavras no silêncio tem sido a situação de testagem mais utilizada.
No entanto, deve-se ter a preocupação em medir a capacidade de discriminação da fala em situações mais próximas as reais, utilizando testes de reconhecimento de fala com sentenças, pois estas são os estímulos verbais que melhor simulam a realidade de comunicação diária1.
Por esta razão, testes que utilizam sentenças para avaliar o reconhecimento de fala, tanto no silêncio como na presença de ruído competitivo2-5, têm sido desenvolvidos nas últimas décadas. No Brasil, o teste desenvolvido por Costa6 foi o primeiro a utilizar sentenças em português brasileiro para esta finalidade.
Mesmo diante de tantas opções de instrumentos de avaliação e da importância dos seus achados para um diagnóstico clínico mais preciso devido à inexistência de parâmetros para interpretar ou classificar os resultados obtidos, os testes de reconhecimento de sentenças no silêncio ainda são pouco utilizados em situações clínicas e até mesmo em pesquisas científicas. Daí a relevância de buscar parâmetros de normalidade para este tipo de avaliação.
Baseado nestas considerações, este estudo teve por objetivo investigar se existe correlação entre o limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) e a média dos limiares tonais nas freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz.
MATERIAL E MÉTODO
Este estudo foi realizado no Ambulatório de Audiologia do Serviço de Atendimento Fonoaudiológico (SAF) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no ano letivo de 2002, após ter recebido parecer favorável da Comissão de Ética em Pesquisa (CEP) do Gabinete de Projetos do CCS - UFSM (protocolo do CEP nº 050/02 - GAP 12654).
Os voluntários somente foram avaliados depois de terem recebido informações sobre os objetivos, justificativa e metodologia do estudo proposto e após assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
As medidas desta pesquisa foram obtidas em cabine tratada acusticamente, utilizando um audiômetro digital de dois canais, marca Fonix, modelo FA-12, tipo I e fones auriculares tipo TDH-39P, marca Telephonics. As sentenças foram apresentadas utilizando-se um Compact Disc Player Digital Toshiba - 4149, acoplado ao audiômetro acima descrito.
O critério de inclusão utilizado nesta pesquisa, para constituir o grupo de estudo, foi a presença de limiares de audibilidade inferiores a 25 dB NA nas freqüências de 250 a 8000 Hz7.
Assim, para a realização deste estudo, foram examinadas 200 orelhas de indivíduos adultos normo-ouvintes, 50 do sexo feminino e 50 do sexo masculino, com idades entre 18 e 63 anos (idade média de 34,61 anos).
Os procedimentos realizados foram: anamnese, meatoscopia, audiometria tonal liminar (ATL) por via aérea nas freqüências de 250 à 8000 Hz e por via óssea nas freqüências de 500 à 4000 Hz; pesquisa do limiar de reconhecimento de fala (LRF), com palavras dissilábicas; e pesquisa do índice percentual de reconhecimento de fala (IPRF), com palavras monossilábicas. Na pesquisa do LRF e do IPRF, as listas de palavras foram apresentadas a viva-voz.
Posteriormente, foi realizada a pesquisa dos Limiares de Reconhecimento de Sentenças no Silêncio (LRSS), através da aplicação do teste Listas de Sentenças em Português (LSP), desenvolvido por Costa6. Esse material apresenta-se gravado em CD e contém listas de sentenças em português e um ruído com espectro de fala, gravados em canais independentes, permitindo a apresentação das sentenças tanto no silêncio quanto no ruído.
Antes do início da testagem de cada sujeito, a saída do canal do CD onde estão gravadas as sentenças foi calibrada através do VU-meter do Audiômetro. O tom de 1000 Hz presente no canal do CD em que estão gravadas as sentenças foi colocado no nível zero.
As sentenças foram apresentadas de forma monoaural, através de fones auriculares, permitindo avaliar as orelhas separadamente. Em anexo, são apresentadas as listas de sentenças utilizadas para a realização desta pesquisa (Anexo I).ANEXO I. Listas de Sentenças Utilizadas na Pesquisa
Lista 1A
1. Não posso perder o ônibus.
2. Vamos tomar um cafezinho.
3. Preciso ir ao médico.
4. A porta da frente está aberta.
5. A comida tinha muito sal.
6. Cheguei atrasado para a reunião.
7. Vamos conversar lá na sala.
8. Depois, liga para mim.
9. Esqueci de pagar a conta.
10. Os preços subiram ontem.
11. O jantar está na mesa.
12. As crianças estão brincando.
13. Choveu muito nesse fim-de-semana.
14. Estou morrendo de saudade.
15. Olhe bem ao atravessar a rua.
16. Preciso pensar com calma.
17. Guardei o livro na primeira gaveta.
18. Hoje é meu dia de sorte.
19. O sol está muito quente.
20. Sua mãe acabou de sair de carro.
21. Ela vai viajar nas férias.
22. Não quero perder o avião.
23. Eu não conheci sua filha.
24. Ela precisa esperar na fila.
25. O banco fechou sua conta.
Lista 1B
1. O avião já está atrasado.
2. O preço da roupa não subiu.
3. O jantar da sua mãe estava bom.
4. Esqueci de ir ao banco.
5. Ganhei um carro azul lindo.
6. Ela não está com muita pressa.
7. Avisei seu filho agora.
8. Tem que esperar na fila.
9. Elas foram almoçar mais tarde.
10. Não pude chegar na hora.
Lista 2B
1. Acabei de passar um cafezinho.
2. A bolsa está dentro do carro.
3. Hoje não é meu dia de folga.
4. Encontrei seu irmão na rua.
5. Elas viajaram de avião.
6. Seu trabalho estará pronto amanhã.
7. Ainda não está na hora.
8. Parece que agora vai chover.
9. Esqueci de comprar os pães.
10. Ouvi uma música linda.
É importante salientar aqui, que foi observado, no primeiro trabalho realizado com fones auriculares8, a existência de uma diferença de 7 dB entre o volume de gravação dos dois sinais apresentados no CD (fala e ruído). Posteriormente, foi realizada uma análise espectrográfica computadorizada do material gravado no CD, a qual demonstrou que as sentenças estão gravadas em uma intensidade média de 7 dB abaixo da intensidade do ruído. Por esta razão, a autora do teste9 refere que, nas avaliações com fones auriculares, é necessário que seja realizada a subtração de 7 dB dos valores de fala observados no dial do equipamento. Tal critério foi adotado nesta pesquisa.
As sentenças foram apresentadas na seguinte ordem:
a) apresentação das sentenças de 1 a 10 da lista 1A, na orelha esquerda, para familiarização do indivíduo com o teste;
b) apresentação da lista 1B, na orelha esquerda;
c) apresentação da lista 2B, na orelha direita;
O procedimento utilizado para a obtenção das medidas do LRSS foi a "estratégia seqüencial, adaptativa ou ascendente-descendente"10, a qual permite determinar o nível necessário para o indivíduo identificar corretamente cerca de 50% das sentenças apresentadas.
Assim, seguindo essa estratégia, a aplicação do teste consistiu em apresentar o estímulo de fala em uma determinada intensidade. Quando a resposta foi correta, diminuiu-se a intensidade de apresentação do estímulo seguinte. Quando a resposta foi incorreta, aumentou-se a intensidade de apresentação do estímulo seguinte. Uma resposta só foi considerada correta, quando o indivíduo repetiu, sem nenhum erro ou omissão, toda a sentença apresentada.
Devido às características técnicas do equipamento disponível para a realização desta pesquisa, foram utilizados intervalos de apresentação das sentenças de 5 dB e 2,5 dB, respectivamente. O estímulo foi apresentado em intervalos de 5 dB até a primeira mudança no padrão de resposta e, a partir daí, os intervalos de apresentação das sentenças foram de 2,5 dB entre si até o final da lista.
Para pesquisar o LRSS, a primeira sentença de cada lista foi apresentada com intensidade de 10 dB acima do valor encontrado na pesquisa do LRF para dissílabos, de acordo com o dial do equipamento. Foi observado, em pesquisas preliminares que utilizaram esse mesmo material8,11, que esta intensidade é suficiente para a obtenção de resposta correta na primeira sentença apresentada a indivíduos com audição normal, garantindo a motivação do paciente para a realização do teste.
Os níveis de apresentação de cada sentença foram anotados durante o teste. A média desses valores foi calculada a partir do nível de apresentação em que ocorreu a primeira mudança no tipo de resposta, até o nível de apresentação da última sentença da lista. Então, para a obtenção dos Limiares de Reconhecimento de Sentenças no Silêncio (LRSS) foi subtraído 7 dB dos valores médios de apresentação da fala, registrados no equipamento, conforme descrito anteriormente.
Método Estatístico
Para investigar o nível de correlação entre os resultados obtidos na pesquisa do LRSS e a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz, foi aplicado o Coeficiente de Correlação de Pearson.
O nível de rejeição para a hipótese de nulidade foi fixado em um valor menor ou igual a 0,01 (1%). Os resultados estatisticamente significantes foram assinalados com um asterisco (*).
Para realizar o estudo estatístico da diferença entre as médias obtidas para o LRSS e para a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz, aplicou-se a fórmula Intervalo de Confiança para a Diferença de Duas Médias, utilizando a = 1%.
A partir da aplicação desta fórmula, foram obtidos os valores do limite inferior e do limite superior para a diferença entre as médias das variáveis estudadas.
RESULTADOS
A seguir, são apresentados os resultados obtidos a partir das avaliações realizadas nas 200 orelhas examinadas neste estudo.
A análise estatística não evidenciou diferença significante quanto ao sexo. Portanto, esta variável foi desconsiderada.
Na Tabela 1, está exposto o resultado da análise de correlação entre o limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) e a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz, obtida a partir da aplicação do Coeficiente de Correlação de Pearson. A análise estatística revelou que existe correlação forte e significante (p < 0,01) entre as variáveis em estudo.
A Tabela 2 apresenta os resultados obtidos a partir da aplicação da fórmula Intervalo de Confiança para a Diferença de Duas Médias, utilizada para o estudo da diferença dos valores médios encontrados para as variáveis analisadas.
Observa-se que a diferença entre a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz e a média do LRSS foi de 2,40 dB NA e o valor da amplitude da diferença foi de 1,13 dB NA. Assim, obteve-se um limite inferior de 1,27 dB NA e um limite superior de 3,53 dB NA, para a diferença entre as variáveis.
A Figura 1 mostra a variação do resultado do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) em relação à média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz, em termos percentuais. Observa-se que em 77,5% (n = 155) das orelhas examinadas, o resultado do LRSS foi melhor que o da média dos limiares tonais, isto é, a intensidade necessária para obter o LRSS foi menor que a média dos limiares de tom puro.Tabela 1. Correlação entre o limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) e a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz.
* Existe correlação estatisticamente significante (p < 0,01).
Tabela 2. Resultados da análise estatística referente à diferença entre as médias obtidas para o LRSS e para a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz.
Figura 1. Variação do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) em relação à média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz.
DISCUSSÃO
Utilizando o teste Listas de Sentenças em Português (LSP), verificou-se que o LRSS médio obtido nas 200 orelhas examinadas foi 6,15 dB NA e a média dos limiares tonais para as freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz foi de 8,55 dB NA (Tabela 1). Foi evidenciada a existência de correlação forte e significante entre as variáveis em estudo, pela análise estatística realizada.
Os achados deste estudo concordam com os obtidos por outros pesquisadores que também realizaram uma análise comparativa do valor médio dos LRSS obtidos, com a média dos limiares tonais de 0,5, 1 e 2 kHz, e afirmaram que essas duas variáveis da avaliação audiológica estão intimamente relacionadas. Plomp12 referiu que a média dos limiares de 0,5, 1 e 2 kHz se aproxima do valor obtido para o limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio e que o único parâmetro que influencia o LRSS é o limiar de audibilidade. Smoorenburg13 ressaltou o fato de que a média de 0,5, 1 e 2 kHz, teria boa relação com a previsão do LRSS.
A forte relação entre os limiares auditivos para tons puros e o limiar de reconhecimento de fala tem sido demonstrada repetidamente ao longo dos anos14-16. A média dos limiares tonais nas freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz tem sido usada como valor de referência para a interpretação dos resultados da pesquisa do limiar de reconhecimento de fala (LRF), quando palavras são usadas como estímulo, sendo uma das avaliações mais realizadas rotineiramente pelos audiologistas.
Como já foi referido anteriormente, a pesquisa do limiar de reconhecimento de fala com sentenças ainda é pouco utilizada e não há valores de referência e padronização para os resultados obtidos. No entanto, os resultados obtidos neste estudo, bem como aqueles encontrados na literatura especializada compulsada, mostram que a média dos limiares tonais de 0,5, 1 e 2 kHz pode ser usada como valor de referência para a análise e interpretação dos resultados obtidos na pesquisa do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS).
Analisando os resultados individuais, constatou-se que o LRSS foi melhor do que a média dos limiares de tom puro nas freqüências 0,5, 1 e 2 kHz, em 77,5 % (n = 155) das orelhas examinadas (Figura 1), ou seja, a intensidade necessária para obter o LRSS, expressa em dB NA, foi inferior a média das freqüências tonais avaliadas. O mesmo foi verificado quando comparou-se os valores médios encontrados para as variáveis em estudo, conforme apresentado na Tabela 1. Este achado concorda com os de Duquesnoy17, o qual constatou em seu estudo que o LRSS geralmente é melhor do que aquele obtido na média dos limiares de tom puro nas freqüências 0,5, 1 e 2 kHz.
Acredita-se que este melhor resultado do LRSS, quando comparado com o resultado da média dos limiares de 0,5, 1 e 2 kHz possa ser justificado pelo fato das sentenças fornecerem pistas acústicas e lingüísticas, além de serem estímulos sonoros com significado, ao contrário do estímulo de tom puro. Isso facilitaria a percepção do estímulo. Schochat1 relatou que a habilidade para ouvir a fala envolve redundâncias intrínsecas e extrínsecas. Em sujeitos com audição periférica e central normais, as redundâncias intrínsecas dizem respeito às diversas vias e tratos auditivos disponíveis no sistema nervoso auditivo central. As redundâncias extrínsecas referem-se às pistas acústicas, sintáticas, semânticas, morfológicas e lexicais da fala que, embora nem sempre necessárias, têm grande valia quando a mensagem está sendo expressa. Isso ocorre no caso de testes que utilizam sentenças como estímulo de fala. Também Cooper e Cutts18 e Festen e Plomp19 afirmaram que o contexto das sentenças fornece pistas que beneficiam a inteligibilidade da fala.
A partir da análise estatística realizada para o estudo da diferença dos valores médios obtidos para as variáveis investigadas (Tabela 2) verificou-se que, em média, o LRSS foi 2,40 dB NA melhor que a média dos limiares tonais na freqüências de 0,5, 1 e 2 kHz, com uma variabilidade de 1,13 dB NA para mais ou para menos.
No entanto, salienta-se que esses valores foram obtidos para um grupo de estudo constituído por sujeitos normo-ouvintes, quando utilizou-se para pesquisa do LRSS o teste Listas de Sentenças em Português, desenvolvido por Costa6, não tendo sido encontrado na literatura compulsada estudos que tenham realizado este tipo de análise, utilizando este mesmo material de teste.
Sugere-se então, a continuidade deste estudo, a fim de que seja avaliada uma amostra significativa da população, para obter a padronização do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) com o teste Listas de Sentenças em Português. Também salienta-se a necessidade da realização desta análise com grupos de sujeitos com diferentes configurações audiométricas.
CONCLUSÕES
Ao término desta pesquisa, a análise crítica dos resultados obtidos para o grupo estudado permitiu concluir que, em indivíduos normo-ouvintes:
existe correlação entre a média dos limiares tonais de 0,5, 1 e 2 kHz e o valor do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS).
na maioria dos pacientes (77,5%) os valores do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS) são, em média, 2,40 dB NA melhores que os valores da média dos limiares tonais de 0,5, 1 e 2 kHz.
a média dos limiares tonais de 0,5, 1 e 2 kHz pode ser usada como referência para a análise e interpretação dos resultados do limiar de reconhecimento de sentenças no silêncio (LRSS), quando se utiliza o teste Listas de Sentenças em Português, desenvolvido por Costa6, e os mesmos padrões de calibração e procedimentos apresentados nesta pesquisa.
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1 Fonoaudióloga Clínica, Especialização em Fonoaudiologia (Audiologia) pela UFSM e Mestranda em Distúrbios da Comunicação Humana pela UFSM.
2 Fonoaudióloga Clínica, Doutora em Ciências dos Distúrbios da Comunicação Humana -
Campo Fonoaudiológico - pela UNIFESP/SP e Fonoaudióloga do Centro de Educação da UFSM.
3 Fonoaudióloga Clínica, Doutora em Ciências dos Distúrbios da Comunicação Humana pela UNIFESP/SP e
Professora Adjunto do Deptºde Otorrino-Fonoaudiologia da UFSM.
4 Matemático, Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) / SC e Professor Adjunto do Departamento de Estatística da UFSM.
Instituição: Universidade Federal de Santa Maria / UFSM.
Endereço para Correspondência: Fabiana Soncini - Av. Nossa Senhora Medianeira, 1286/103 Santa Maria/RS 97060-002. - Tel (0xx55) 223.9681 / 99776748 - E-mail: fabianasoncini@terra.com.br
Trabalho apresentado sob forma de tema livre no 18º Encontro Internacional de Audiologia, realizado de 11 a 13 de abril de 2003 em Curitiba/PR.
Artigo recebido em 04 de junho de 2003. Artigo aceito em 17 de julho de 2003.