Versão Inglês

Ano:  1953  Vol. 21   Ed. 1  - Janeiro - Fevereiro - ()

Seção: -

Páginas: 9 a 24

 

O TEMPO FUNCIONAL DAS OTOPLASTIAS (*)

Autor(es): DR. J. REBELO NETO

(Sobre o autor - Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de S. Paulo - Brasil)

O tema da reconstrução do pavilhão auricular, nos casos de agenesia congênita, está tão intimamente vinculado à reconstrução do conduto auditivo externo, visando o restabelecimento da função auditiva, que não podemos conceber a possibilidade de se querer resolver o difícil problema da reconstrução do pavilhão, deixando de lado a do conduto.

Mais opinamos que a solução do último deve preceder à do primeiro.

São muito comuns a associação das microtias a outros defeitos, quer vizinhos, como a paralisia facial, quer distantes. Propositadamente, porém, encararemos aqui tão somente as malformações cantonadas ao aparelho auditivo.

Os defeitos apresentam-se no exterior, se caracterizando pelos vícios de conformação do pavilhão auricular úbliteração ou não do conduto auditivo externo, importando na interposição de uma camada mais ou menos espessa de tecidos entre a superfície e o ouvido médio e pelos defeitos internos, abrangendo os elementos da cápsula labiríntica. Podem ser unilaterais ou bilaterais, casos em que a gravidade das alterações estruturais é desigual.

Encarando a necessidade de resolver cada caso de per si, a primeira pergunta que acode ao espírito é indagar qual o momento em que se deve intervir.

Qual a oportunidade preferencial para iniciar a fase cirúrgica?

Ela varia de acôrdo com o tipo da malformação. Podemos distinguir os seguintes tipos principais: 1) Malformação um ou bilateral, afetando o pavilhão, sem comprometimento do conduto; 2) Malformação unilateral do pavilhão, com obliteração do conduto; 3) Malformação bilateral do pavilhão, com obliteração do conduto, dos dois lados.

Vamos estudar separadamente cada item:

1) Malformação uni ou bilateral afetando o pavilhão, sem comprometimento do conduto auditivo externo.

Mais comuns do que as alterações de posição do pavilhão, são as suas diminuições de tamanho, causadas por condensações cartilaginosas, plicaturas, torções, encartuchamentos, etc.

Nos defeitos leves, possíveis de corrigir sem recorrer a enxêrtos, exigindo apenas manobras cirúrgicas muito discretas e simples, podemos operar a partir de um ano de idade (Obs. n.º 10).

Incidindo, porém na plástica de aumento, requerendo anexações de pele, de armadura esquelética, preferimos operar mais tarde, quando o pavilhão já assume dimensões mais avantajadas, se aproximando do tamanho definitivo, quer dizer, aos 8 ou 10 anos, só abreviando esse prazo caso se manifestem sinais patentes de complexos de inferioridade.

A última palavra será dada ao atingir o indivíduo a idade adulta, quando o estudo antropométrico da face apontar a existência de uma disproporção manifesta de dimensões, cuja correção cirúrgica deverá ser aconselhada então.

2) Malformação unilateral do pavilhão, com obliteração do conduto auditivo externo.

O problema aqui é muito mais sério. Possuindo um órgão gravemente deficitário de um lado e outro são, qualquer ameaça à integridade deste, assume um caráter catastrófico, diante da eminência da destruição completa da função auditiva, o que significa - a surdo-mudez.

Tratar de pesquisar a existência de um aparelho afetado, embora rudimentar, envidar esforços para aproveitá-lo ou exaltar o seu papel funcional, segundo entendemos é o papel obrigatório do cirurgião plástico.

Transformar esse aparelho rudimentar, sepultado sob uma ganga de tecido ósseo e forrado ainda por uma sobrecarga de tecidos moles, num órgão auxiliar do outro lado, que está são, deve constituir a nossa preocupação desde o primeiro exame.

Ter sempre em mente que a desobstrução deverá ser precoce, afim de permitir à onda sonora estimular desde cedo um componente congenitamente fraco, deficitário, tonificando-o aos poucos, tornando-o lenta mas seguramente cada vez mais robusto, disciplinado, colocando-o paulatinamente não como auxiliar mas como órgão eficiente, capaz de assumir sozinho a função auditiva, no caso de surgir uma afecção que venha a destruir o lado primitivamente são.

Após tatearmos um pouco, acreditamos que a idade entre 12 e 18 meses seja a melhor época para abordar a desobstrução cirúrgica. Entretanto, a data deverá ser fixa definitivamente no momento em que, pelas radiografias seriadas, for possível ter-se a impressão de que o desenvolvimento dos órgãos auditivos esteja concluído. Comparando boas radiografias tiradas em idades mais baixas com as de um ano ou mais, não se pode deixar de concordar que temos em mãos guias muito mais seguros, permitindo identificar melhor os complexos elementos dos ouvidos médio e interno.

Alem disso a intervenção cirúrgica nos parece dispor de pontos de reparo mais bem delineados e um órgão mais sólido e volumoso.

Exigir provas acumétricas equivale a adiar a intervenção para idade mais avançada, perdendo anos e anos de estímulo sonoro, traindo assim e diminuindo em valôr a finalidade do tratamento. Por isso as dispensamos, pela impossibilidade em obte-las naquela época.

ANESTESIA

Nas criancinhas, para obter silêncio completo durante tôdo o tempo da operação, aplicamos "per os" o seconal, na dose de um centigramo por quilo de peso e o scophedal na dose de dois décimos de centímetro cúbico.

Nas crianças maiores, utilisamos o tio-nembutal por via muscular. Fazer inalar oxigênio se houver cianose, mesmo ligeira. Infiltração local de novocaina a 1% adicionada à solução milesimal de adrenalina (1x10).

Nos adultos, ou a anestesia local ou a geral.

TÉCNICA CIRÚRGICA

Embora reconhecendo as vantagens da fenestração, até agora não tivemos oportunidade de executa-la, nos limitando a antrotomia, seguida imediatamente da confecção do conduto auditivo externo.

A incisão deve ser norteada pela projeção do antro. Entretanto, sendo possível, convem dispo-la contando com a melhoria de forma do pavilhão, desfazendo uma plicatura ou realizando qualquer outra ma obra, à título de base para o futuro trabalho de recomposição plástica do pavilhão.

Ao mesmo tempo procurar descobrir resíduos cartilaginosos, preciosos para a recomposição do conduto, como veremos em pouco. A antrotomía prossegue, consoante a técnica banal, não apresentando feição particular.

Apenas temos o cuidado de alargar ligeiramente as paredes do funil ósseo e alisar as suas paredes.

A confecção do neoconduto constitue um problema que a prática nos mostrou ser difícil. As vezes o conduto permanece aberto, após epitelização com enxêrto fino de pele autogena (tipo Thiersch), principalmente quando a cavidade cavada no osso é de grandes proporções. Nas crianças, entretanto, há tendência para o apagamento gradual do conduto e sua expulsão pela onda invasora de tecido fibroso, visto não haver um obstáculo que a ela se oponha.

Depois de observar o resultado tardio de várias condutoplastias, chegamos à conclusão de que o processo preferencial é obstar a coalescência das paredes, copiando o que a natureza faz: dar ao conduto paredes rijas, recorrendo à cartilagem.

Quasi sempre é possível obter esse material em quantidade suficiente no próprio local. Fazemos com ela um anel, dando-lhe forma e uma certa firmeza por meio de alguns pontos de catgut atraumático 4:0.

O anel é destinado a garantir a abertura permanente do canal auditivo.

Sem êle, ha tendência incoercível para a sua obliteração. Essa obliteração equivale à nulidade do resultado em vista.

Tem o comprimento de 8 a 15 mm, variando de caso à caso, indo do fundo ósseo até ao nível da pele.

O anel é forrado completamente por um fragmento muito fino, mas uno, de tegumento cutâneo (enxêrto de Thiersch) mantido e imobilisado contra o fundo e contra as paredes cartilaginosas por meio de pequenas esferas de gase xeroformada.

O enxêrto nessas condições, nutre-se por embebição logo após a sua aplicação, encontrando material nutritivo para uma pegada fácil e rápida. Ao primeiro curativo, oito a dez dias depois, encontra-se o conduto de paredes firmes, totalmente forrado por uma camada epitelial a elas sólidamente presa, assim se mantendo de modo permanente (Obs. n.º5).

Em indivíduos de idade mais avançada, a conduta é a mesma, variando apenas no que diz respeito às provas auditivas que serão muito mais completas, no sentido de chegar-se a um diagnóstico relativo ao grau e tipo da hipoacusia.

No adulto, operado sob anestesia local, o enfermo acusa melhoria da acuidade auditiva desde o ato operatório.

3) Malformação bilateral do pavilhão, com obliteração do conduto dos dois lados.

A microtia bilateral não operada equivale praticamente à surdo-mudez, dada a fraqueza do estímulo sonoro. Os indivíduos nessas condições ouvem muito pouco, o que se pode comprovar de imediato, vendando-lhes os olhos.

São, entretanto, hábeis leitores labiais, dando a um examinador menos avisado, falsa impressão oposta.

A interpretação radiológica é mais delicada. Entretanto, há casos bem claros onde, embora seja patente a condição disgenética, pode-se identificar o conduto auditivo externo, grau de pneumatização da mastóide, trompa, canais semicirculares, etc. comprovação que nos encoraja a abordar o tratamento cirúrgico desobstrutivo. O critério de idade e conduta operatória são idênticos ao da microtia unilateral.

A intervenção pode ser feita simultaneamente nos dois lados, sem inconvenientes, aproveitando-se uma única zona doadora de material cutâneo para forrar os dois canais cartilaginosos.

Passemos às nossas observações.

OBSERVAÇÕES

Documentamos o presente trabalho com a observação de 15 doentes, selecionados exclusivamente pelo critério da coexistência da obliteração total do conduto auditivo, associado à orelha micrótica, pondo de lado um grande número de casos em que o defeito se cartonava ao pavilhão, com o conduto auditivo externo integro.

Para comodidade da leitura reduzimos as observações ao estritamente necessário, resumindo deliberadamente os dados de menor importância.

1) A. J., sexo masculino, branco, brasileiro, 6 meses de idade. Pavilhão reduzido de volume no sentido transverso, sem conduto, lado esquerdo.

Mãe sadia, 6 prenhezes, havendo uma curetagem antes da gravidez do paciente. Pai, teve um irmão com pé torto. Ex. radiográfico: inicio de pneuumatização da mastóide na região periantral. Não lia vestígio de conduto auditivo externo. Presença de cápsula labiríntica. Vestíbulo e conduto auditivo interno.

Operado em novembro de 1947, com 6 meses de idade. Anestesia de base pela associação seconal (um centigramo por quilo de peso) e scophedal. Infiltração local novocaino-adreualínica (10ccxlcc). Incisão endoaural, aproveitando-se o descolamento para alargar a concha. Descoberta do esqueleto, osteotomia da parede cranial. O antro é atingido. A cavidade, após a toilete, é forrada com - enxêrto de Thiersch retirado da nadega mantido fixo com pequenas pelotas de gaze xeroformada. Cicatrização per primara.

Ex. em maio de 1952: "Conduto auditivo externo esquerdo quase Mulo, fechado por tecido cutâneo, pouco além da concha. Não há audição aérea". (Dr. Caio de Andrade).

2) B. F., sexo masculino, branco, brasileiro, 25 dias. Pavilhão direito reduzido a um cordão, sem perfuração do conduto. Apêndice auricular à esquerda. Primeiro filho do casal, cujos antecedentes genéticos nada apresentam.

Ex. radiográfico: Boa pneutnatização do temporal. Núcleo labiríntico normal, presente, esboço de conduto auditivo interno. Mastóide de tipo esclero-diploético, pneumatização irradiando do antro. Operado em abril de 45, com 22 meses. Incisão retro-auricular, osteotomia da parede cranial, descoberta do antro. Proteção da área cruenta e confecção do novo conduto com retalhos cutâneos da vizinhança. Ex.em fev. de 1948: presença de conduto do lado operado. O exame audiométrico revela (Dr. Rezende Barbosa): "Foi quasi impossível mesmo do lado são, talvez devido à idade do paciente. Entretanto, tanto ao exame pelos diapasões quanto ao audiométrico, verifica-se a existência de restos de audição em O. D., principalmente para o lado dos sons agudos. O exame de transmissão óssea é bem positivo, indicando com evidência a vitalidade do ouvido interno direito. Audibilidade à voz conversada 50 a 55% do lado direito. Hipoacusia de condução com déficit a 55%".

3) C. L. M., sexo feminino, branca, bras., 2 meses. Pavilhão da O. D. reduzida a um burlete, sem conduto. Mãe sadia. Pai, portador de fistula congênita do dorso do nariz. Ex. radiográfico: Início de pneumatização da mastóide a partir da região antral, normal em relação à idade. Núcleo labiríntico invisível. Tem-se a impressão de que não há conduto auditivo interno.

Operada em agosto de 46, com 3 meses: incisão retro-auricular, perfuração da parede cranial, sendo atingido o antro. A cobertura da parte cruenta é feita com pele vizinha, após amplo descolamento.

Revisão em março de 50: conduto permeável. Não é possível obter-se curva audiométrica devido à idade.

4) C. D. sexo masc., branco, bras., 36 dias, Pavilhão da orelha direita de proporções diminutas, encartuchado, voltado para baixo, com imperfuração do conduto. Mãe sadía, prenhez única. Pai tem uma sobrinha com fissura bilateral do lábio. E.x. radiográfico: mastóide apresentando à direita e à esquerda esboço de pneumatização, normal para a idade. Ex. um ano mais tarde: Falta de desenvolvimento celular da mastóide. Região periantral de tipo esclero-diploético. Nem conduto, nem esboço de cápsula labiríntica.

Operado em abril de 46, com 16 meses. Trepanação da parede craniana, não tendo sido encontrado conduto. Poucas células mastoideias. Os resíduos do pavilhão são abertos e fixos em boa posição. Reoperado em maio de 47, com 19 meses. A incisão recai sobre a cicatriz da operação anterior. Nova exploração óssea. Não encontramos nem conduto nem antro. O novo conduto é atapetado com enxêrto de Thiersch retirado da coxa direita.

5) L. M. L. A., sexo fem., branca, bras., 14 meses. Orelha direita reduzida a pequenas saliências, sem conduto. Mãe sadia, primeira prenhez. Pai, portador de orelha micrótica à esquerda. Operada aos 15 meses, em fevereiro de 51. Os resíduos do pavilhão foram completamente destacados do seu leito, conservando-se presos por um pedículo superior e outro inferior, sendo levados para traz e suturados às margens de uma incisão curvilínea, à guisa de helix. Com os fragmentos de cartilagem, subjacentes foi feito um pequeno cilindro com 11 mm de comprimento, mantendo-se essa forma por meio de alguns pontos com catgut. Fixação do cilindro ao sítio do conduto, por meio de pontos de catgut. As paredes internas são revestidas de enxêrto de Thiersch retirado do flanco esquerdo. A parte cruenta restante foi protegida por enxerto intermediário de pele. Pegada integral dos enxertos, inclusive o que forrava o cilindro cartilaginoso. O ex. 16 meses depois mostra um bom conduto, de paredes bem armadas, sem a mínima tendência à coalescência (fig. 1). Chamamos a atenção para essa técnica, cujo resultado satisfatório contrasta com o resultado da confecção de néo-condutos forrados exclusivamente por fragmentos de pele, cuja tendência ao colapso é, por vezes, incoercível.

6) L. A., sexo masculino, branco, bras., 14 anos. Pavilhões reduzidos à pequenas saliências, sem condutos dos dois lados (figs. 2 e 3). Segundo filho do casal, sem antecedentes genéticos. Ex. radiográfico: em O. D. a mastóide é de tipo pneumatizado com malhas finas e O. E. com pneumatização escassa, quasi inexistente, ligeiramente esclero-diploética. A esquerda não se vê com nitidez o meato auditivo externo. Em ambos há esboço nítido de cápsula labiríntica. Audiograma antes da operação: hipoacusia bilateral de tipo condução, sendo que à direita a perda em relação à voz conversada atinge a 75% e à esquerda, 70% (fig. 4).

Operado em julho de 49, com anestesia geral: antrotomia dos dois lados, sendo a parte cruenta recoberta com enxêrto de Thiersch. Ex. em junho de 52 mostra os dois condutos amplamente abertos (figs. 5 e 6), de paredes muito bem epitelizadas. O ex. audiométrico traduz evidente melhoria da condução aérea, atingindo a perda 60% à direita e 55% à esquerda, à voz conversada (fig. 7).


Fig. 1 - Paciente L. M. L. A . Microtia com agenesia do conduto (Obs. n.° 5). Resultado 18 meses depois da condutoplastia, empregando cartilagem local para as paredes e enxêrto de Thiersch para o fórro.


7) M. P., sexo masc., branco, bras., 38 anos. Ausência total de qualquer vestígio de pavilhão à direita, com atrofia do esterno-cleido-mastoideo e paralisia facial congênita do mesmo lado. Primeiro filho do casal, tendo mais um irmão, sadio, sem antecedentes genéticos. Exame radiográfico : Mastóide hipo-desenvolvida à esquerda, com esboço de pneumatização da região periantral. Há conduto auditivo externo. O. D.: mastóide apneumática, não se observando conduto ósseo.

Exame audiométrico mostra hipoacusia de condução bilateral, com déficit à voz conversada atingindo 20% à esquerda e 60% à direita.

Tratamento cirúrgico iniciado em janeiro de 51, visando a confecção de um novo pavilhão. 0 tratamento do conduto ainda não foi abordado.

8) O. G. sexo masc., branco, bras., 20 dias. Restos de pavilhão em S, sena conduto, à direita (fig. 8). Pais sadios, seis antecedentes genéticos, possuindo três filhos normais, sendo o paciente o segundo. Ex. radiográfico feito com 20 dias: mastóide hipodesenvolvida à esquerda, com esboço de pneumatização da região periantral. Há conduto auditivo externo. O. D.: mastóide apneumática, não se observando conduto ósseo. Operado em março de 45, com 27 meses. Incisão atrás dos resíduos do pavilhão, descoberta da parede craniana e trepanação. Encontramos somente algumas células, sendo uma de maior porte, mas sem vestígios de membrana, ossículos ou conduto. Fechamento completo em dois planos. Em março de 47 é reoperado, encontrando-se o antro. Forro de toda a cavidade com Thiersch.

 

Figs. 2 e 3 - Paciente L.A. (Obs. n.º 6). Microtia bilateral, com agenesia dos condutos.


Ex. em maio de 52: o conduto mantem-se amplamente aberto (fig. 10). O ex. audiométrico mostra condução normal à esquerda e uma redução que não ultrapassa de 25% do lado direito, em relação à audibilidade da voz conversada (fig. 11).

9) P.R., sexo masc., branco, bras., 1 dia. A direita: pavilhão reduzido a uma pequena saliência circular, como se fôra um botão. A esquerda, só se identifica o lóbulo, acima do qual há uma espécie de carena, com uma verrucosidade central, sem conduto. Paralisia facial direita. Filho único. Sobrinha materna portadora de fístula congênita do tireo-glosso. Do lado paterno: irmã com assimetria facial unilateral congênita e um sobrinho com malformação unilateral do pavilhão auricular. Ex, radiogrãfico: O. D existe conduto auditivo externo e pneumatização escassa da mastóide, a partir da região periantral. O. E. não se observa presença de conduto auditivo externo ósseo mas sim pneumatização de malhas finas à partir da região antral. A esquerda observa-se núcleo labiríntico. Operado em setembro de 43, aos dois anos. Não é encontrada célula antral. Cruzamento de dois retalhos vizinhos para forrar o conduto. Reoperado em janeiro de 49, com 8 anos. O.D.: mastóide reduzida a uma verrucosidade com 5 mm de diâmetro, achando apenas uma célula maior, trabeculada. Afunilamento da cavidade óssea . O.E.: encontramos ossículos e antro, mas nenhum vestígio de conduto. Epitelização dos neo-condutos com enxêrto de Thiersch. Audiograma em junho de 52: hipoacusia de condução bilateral, mais acentuada à esquerda, com perda de audibilidade à voz conversada de mais ou menos 60% à direita e mais ou menos 65% do outro lado.


Fig. 4 - Audiograma obtido em maio de 1949, traduzindo hipoacusia bilateral de tipo condução. (Obs. n.º 6).


10) P. F., sexo masc. branco, bras., 21 dias. Pavilhão esquerdo reduzido de volume, sem conduto auditivo. Primeiro filho do casal, havendo mais três gestações, sendo a última interrompida voluntariamente. Pais sadios, sem antecedentes genéticos. Ex. radiogr. mostra ausência de conduto auditivo externo ósseo, presença duvidosa do núcleo labiríntico. Não há pneumatização.

Aos dois meses, em janeiro de 1945, corrigimos parcialmente a malformação do pavilhão, dando-lhe aparência similar à do lado são.

Com a idade de 7 anos o ex. da função auditiva, feito pelo Dr. Rezende Barbosa, diz: "Acumetria pelos diapasões e audiometria, mostram a existência de hipoacusia esquerda, tipo condução e de 50 decibels de intensidade em media. Pela prova rotatória verificou-se a vitalidade do labirinto posterior dos dois lados, tendo obtido respostas nistagmicas, reações corporais e reações vertiginosas em ambas as direções". Ex. radiografia existência da cápsula labiríntica (vestíbulo e cóclea dos dois lados) ; existência do conduto auditivo externo ósseo dos dois lados; ambas as mastóides de tipo diploético, sendo que à esquerda possui pneumatização da região peri-antral o que indica, com alguma certeza, a existência do ouvido médio.

 

Figs. 5 e 6 - Aspeto atual, antes de ser iniciada a plástica dos pavilhões. Condutos amplamente permeáveis. (Obs. n.º 6).


Estabelecida, assim, a indicação da operação plástica destinada a restabelecer a permeabilidade do conduto auditivo externo esquerdo, executamos a operação em fevereiro de 42. Incisão crucial na altura da projeção do orifício externo do coduto auditivo. Descolamento dos retalhos, mantendo-se seu afastamento por meio da tração com fios. Não identificamos membrana nem ossículos. Perfuração do golfo da jugular. Sendo impossível continuar a exploração óssea, retiramos enxerto epidérmico da face externa da coxa esquerda, atapetando completamente toda a zona cruenta. Pequeno retoque na extremidade superior do pavilhão.

O audiograma, estabelecido em junho de 1952, mostra curvas sensivelmente similares à primitiva

11) P.N.M., sexo feminino, branca, bras., 1 ano. Pavilhão do lado direito achatado e estreitado, sem orifício externo do conduto. Pequeno apêndice auricular do lado oposto. Pais sadios, sem antecedentes genéticos de interesse. É o produto da segunda gestação, sendo o da primeira, normal.

Ex. radiogr.: ausência de conduto auditivo externo ósseo; presença duvidosa do núcleo labiríntico. Não ha pneumatização das mastóides.

Operada em julho de 49, aos 4 meses de idade. Incisão anterior, descolamento dos tecidos moles, exposição do esqueleto. Trepanação óssea. Não encontramos vestígios de antro. Apesar disso efetuamos o atapetamento do novo conduto com enxêrto de Thiersch, retirado da côxa direita. Em dezembro de 49: embora um pouco estreitado, o conduto mantem-se bem permeável.

12) R..J. V., sexo masc., branco, bras., 9 dias. Aplasia dos dois pavilhões, reduzidos a pequenas saliências em forma de S, sem orifício externo do conduto auditivo. Pais sadios. Mais tarde teve dois irmãos, também sadios.

Ex. radiogr: Nos dois lados a mastóide é de aparência normal, cápsula labiríntica presente. Conduto auditivo externo obliterado dos dois lados.


Fig. 7 - Curvas do exame audiometrico, mostrando melhoria da condução aérea. (Obs. n.° 6).


Em junho de 44, aos 8 anos, foi feita a primeira operação: incisão retroauricular, exposição do esqueleto, abertura do antro, funilização das paredes ósseas. Fôrro com tecidos da vizinhança. Na mesma ocasião é operado o lado oposto, pela mesma técnica. Em abril de 45 foi feito um tubo cutâneo na região infra-clavicular dos dois lados, como inicio da recomposição do pavilhão, somente agora continuado, pela ausência do paciente.

O audiograma, em maio de 52 mostra Hipoacusia do tipo condução com perda de audibilidade da voz conversada em mais ou menos 60% à direita e 65% à esquerda.

13) R. M. R., sexo feminino, branca, bras., 3 meses. Pavilhão da orelha esquerda de dimensões um pouco menores do que a do lado oposto. No local do orifício externo do conduto auditivo há uma pequena depressão, que termina em dedo de luva, mas o conduto é imperfurado. Ex. radiografia: boa pneumatização da região peri-antral, sugerindo a existência de contendo normal da caixa.

Operada com um ano, em novembro de 51. Técnica similar aos demais, não tendo sido encontrado o antro. Epitelização do conduto com enxêrto de Thiersch. O exame funcional, feito pelo dr. Rezende Barbosa, quatro meses depois, revela: "Boa audibilidade pelo O.E., lado operado. Audição conservada para tôdos os diapasões e freqüências do audiometro. Entretanto, à intensidades bem mais altas do que do lado são, Tem-se a impressão de boa recuperação funcional, pelo menos no momento presente. O grau exato é, ainda, de difícil determinação".


Fig. 8 - Paciente O. G. (Obs. n.º 8). Microtia unilateral, com imperfuração do conduto auditivo.


14) R .E., sexo feminino, branca, bras., 5 meses. Pavilhão da orelha direita formando um cartucho voltado para baixo, conduto imperfurado. Hemi-atrofia facial dêsse lado. Pais sadios, filha única. Ex. radiogr. não se observa conduto auditivo externo à direita. Ambas as mastóides com esboço de pneumatização, à partir do antro. Aspeto normal para a idade. Cápsula labiríntica presente dos dois lados. Operada em fevereiro de 1949, aos 6 meses de idade. Incisão anterior, contornando o lóbulo. Exposição do esqueleto, trepanação da parede cranial. Não encontramos células mastoideanas nem antro. Exposição da meninge. Retirada de enxêrto cutâneo do flanco esquerdo, com o dermátomo. Atapetamento de tôda a parte cruenta. No exterior os detritos do pavilhão são colocados em posição anatômica, visando a futura recomposição do pavilhão. Cicatrização "per primam". Exame em junho de 52: os restos do pavilhão continuam em excelente posição. Apagamento parcial do conduto. Audiograma em junho de 52: "interpretação duvidosa devido à idade da paciente, revelando diminuição na percepção aérea à direita de 60% e à esquerda de 10%".


Fig. 9 - Audiograma obtido aos 27 meses de idade, nas vesperas da intervenção. (Obs. n.º 8).



Fig. 10 - Resultado da antrotomia e epitelização parietal com enxerto de Thiersch. (Obs, n.º 8)


15) Y. F., sexo feminino, branca, japoneza, 5 meses. Pavilhão da O. D. reduzido a um fino burlete, em forma de S, com apenas 2 cent. de altura, com imperfuração do conduto. A ficha genética doas pais nada mostra de interessante. O da prole, sim: a mãe teve 9 gestações sendo duas do sexo masculino, normais, uma terceira falecida de meningocele e aplasia da orelha direita, depois um aborto espontâneo de quatro meses, uma filha normal, novo abôrto espontâneo, o setimo nati-morto à termo com vasta meningocele, o oitavo novo abôrto e o último que é a nossa paciente. Ex. radiografia ausência de pneumatização da região periantral. Meato auditivo externo aparentemente obliterado. Lado esquerdo, estrutura normal para a idade. Operada aos 5 meses, em outubro de 1945. Incisão anterior, indo até ao esqueleto. Identificação da mastóide. Trepanação óssea, não sendo encontrados nem antro, nem ossículos. Os restos do pavilhão são aproveitados para dar conformação normal ao lóbulo. Fechamento em dois planos.


Fig. 11 - Audiograma executado 7 anos depois da intervenção. Condução normal à esquerda e redução que não ultrapassa de 25 % do lado direito. (voz conversada). (Obs. n.° 8).


SUMÁRIO

Em resumo, de 1936 até hoje operamos 15 casos, sendo 11 do sexo masculino e 4 do feminino.

As formas unilaterais foram as mais comuns (11 ) em relação às bilaterais (4).

Os operados uma única vez o foram nas seguintes idades: 3 meses, dois; e um com 4, 5, 6, 12, 15 e 18 meses, 8, 14 e 38 anos. Quatro foram operados duas vezes: 1) aos 6 e 19 meses, não encontrando o antro em nenhuma; 2) 27 meses e 4 anos, identificando melhor o antro na segunda intervenção; 3) 2 e 8 anos, encontrando o antro só de um lado; 4) 2 meses e 6 anos, sendo a primeira somente um retoque no pavilhão.

Em geral, uma boa radiografia em baixa idade é difícil de obter, oferecendo dados muito menos valiosos do que radiografias tiradas em idades mais avançadas.

O exame audiométrico é um ótimo teste, mas só pode ser pedido em idades mais altas, variando de paciente para paciente. Não é factível na idade em que nos propuzemos fazer a desobstrução do conduto.

Nas crianças o tipo de anestesia foi o de base, pela associação seconal-scophedal-oxigênio (V. obs. n.° 1). Para os adultos, a local ou geral.

O tipo de intervenção foi norteado pela obtenção de uma comunicação permanente entre o antro e o exterior, aproveitando-se a oportunidade para dispor o que resta do pavilhão em posição anatômica, visando o seu aproveitamento para a futura otoplastia.

O fôrro do neoconduto foi tentado com enxêrto livre de pele, fino, tipo Thiersch ou com retalhos pediculados de vizinhança. Entretanto, a confecção preliminar de um tubo cartilaginoso, por sua vez forrado com Thiersch foi o que nos deu resultados mais duradouros.

Quanto ao resultado funcional, é difícil e incompleta a sua apreciação, pois nove pacientes ou ainda são muito pequenos, não podendo fornecer testes, ou não compareceram ao exame posterior. Em quatro, o resultado foi nulo. Mas, nos dois restantes (Obs. 6 e 8) houve melhora manifesta da hipoacusia.

Reconhecemos que o estudo do problema é difícil, nos forçando a tornar decisões sob uma base apreciativa, quase teórica. Mesmo considerando um caso feliz, como, por exemplo urna curva audiométrica quase igual dos dois lados - o são e o operado, com a idade de um ano, como atribuir com absoluta certeza o sucesso à precocidade da operação?

O sucesso não seria o mesmo, caso operássemos com a idade de 5, 10 ou 15 anos?

A experiência de um caso não se presta à generalizações, dada a diferença às vêzes clinicamente imponderável entre casos aparentemente similares.

Em última análise, somente uma estatística vultosa e um período mais dilatado de observação, poderia quebrar a rigidez desse conceito.

CONCLUSÕES

As vantagens da condutoplastia precoce, são:

1) Facilitar a ação estimulante da onda sonora, pela eliminação da massa de tecidos interposta entre o ouvido médio e o exterior.

2) Oferecer, desde cedo a possibilidade de melhorar a audição.

3) Tem valôr estético porque atende à uma disposição anatômica normal.

4) O conduto é o apoio principal da prótese, quer a prótese estética, do pavilhão, no caso do paciente preferir o seu uso, quer a prótese funcional ou ortofônica. Em geral, a prótese do pavilhão só é abordada em idades mais avançadas. Mas a ortofônica pode ser aplicada muito mais precocemente concorrendo para a recuperação funcional e social do paciente, desde a idade escolar.

5) Uma vez construído um novo e bom conduto auditivo externo, tornam-se mais simples as manobras cirúrgicas de fenestração, o que é importante, tratando-se de crianças de tenra idade.

6) Assim, é conveniente considerar a condutoplastia como primeiro tempo da otoplastia, cujo caráter funcional a coloca no pé de uma operação de necessidade.

"Desejamos agradecer ao Dr. José Eugenio de Rezende Barbosa a sua inestimável cooperação no estabelecimento das indicações cirúrgicas, pela interpretação das radiografias e leitura dos audiogramas, auxiliando a maior parte das intervenções cirúrgicas."

(*) Comunicação enviada ao VI Congresso Latino-Americano de Cirurgia Plástica, em julho de 1952 (Assunción).

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