Versão Inglês

Ano:  2013  Vol. 79   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - (13º)

Seção: Artigo Original

Páginas: 727 a 733

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Inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 & perda auditiva neurossensorial súbita

Phosphodiesterase Type 5 Inhibitors and sudden sensorineural hearing loss

Autor(es): Monique Antunes de Souza Chelminski Barreto1; Fayez Bahmad Jr2

DOI: 10.5935/1808-8694.20130133

Palavras-chave: inibidores de fosfodiesterase; perda auditiva súbita; zumbido.

Keywords: phosphodiesterase inhibitors; sudden hearing loss; tinnitus.

Resumo:
O uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 como sildenafil, vardenafil e tadalafil tem aumentado atualmente e alguns destes pacientes vêm apresentando perda auditiva neurossensorial súbita.
OBJETIVO: Apresentar dois casos de pacientes que apresentaram surdez súbita em uso eventual do medicamento e revisar estudos sobre o uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 e surdez súbita.
MÉTODO: Estudo analítico de dois casos e revisão sobre o tema no banco de dados da Pubmed/ MedLine e Bireme utilizando as palavras-chave inibidores da fosfodiesterase e surdez súbita e seus correlatos na língua inglesa.
RESULTADOS: Os pacientes analisados são jovens, sem comorbidades, em uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 e após terapia combinada para o tratamento da surdez súbita, apenas um deles obteve melhora auditiva. Nove estudos científicos foram encontrados. Estudos pré-clínicos e clínicos, transversais e prospectivos foram revisados.
CONCLUSÃO: O aumento da ocorrência na prática clínica e relatos científicos na literatura sugerem que o uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 seja encarado como fator de risco para surdez súbita. Novos estudos com amostras maiores e grupo controle são necessários para investigar esta associação.

Abstract:
Phosphodiesterase type 5 Inhibitors, such as sildenafil, vardenafil and tadalafil have been increasingly used today and some of the users have developed sudden sensorineural hearing loss.
OBJECTIVE: To present two patients with sudden deafness developed after an occasional use of the drug and review studies on the use of phosphodiesterase type 5 inhibitors and sudden hearing loss.
METHOD: Analytical study of two cases and review of the subject matter in the Pubmed/Medline and Bireme databases using the keywords: phosphodiesterase type 5 inhibitors and sudden deafness and its correlates in the English language.
RESULTS: The patients analyzed are young without additional disorders, using phosphodiesterase type 5 inhibitors, and after combination treatment for sudden hearing loss only one had hearing improvement. We found nine scientific studies and reviewed preclinical studies, clinical trials, prospective and cross-sectional investigations.
CONCLUSION: Increased occurrence in clinical practice and scientific reports in the literature suggest that the phosphodiesterase type 5 inhibitors are considered a risk factor for sudden deafness. Further studies with larger samples and control groups are needed for better assessing this association.

INTRODUÇÃO

Ototóxicos podem causar alterações nas funções do equilíbrio e da audição, modificando a função coclear e vestibular. As drogas mais comuns apontadas como ototóxicas são principalmente os antibióticos aminoglicosídeos; agentes antineoplásicos, principalmente à base de platina (cisplatina e carboplatina), bem como alguns diuréticos de alça furosemida, salicilatos e quinina1.

Em 2007, no primeiro relato de caso associando o uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 (IPDE-5) a perda auditiva, os autores atribuíram esta enfermidade a um provável efeito ototóxico da droga utilizada (sildenafil) e salientaram que há uma extensa lista de drogas ototóxicas como os aminoglicosídeos, antibióticos, entre outras medicações, e que este foi o primeiro caso correlacionando o uso de sildenafil e perda auditiva neurossensorial súbita2.

Os inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 (IPDE-5) como sildenafil, vardenafil e tadalafil são fármacos usados no tratamento da disfunção erétil, mas sildenafil também é indicado para hipertensão pulmonar. Os efeitos adversos comuns incluem dor de cabeça, rubor facial, congestão nasal, dispepsia e náuseas. Recentemente, os IPDE-5 têm sido associados a efeitos adversos de visão, e há evidências emergentes indicando que o uso de tal droga pode ser responsável também por alterações auditivas, inclusive aumentando o risco de perda auditiva súbita3.

As preocupações recentes sobre esta classe de medicamentos e o aparecimento de casos de perda auditiva neurossensorial súbita (PANSS) resultaram em uma exigência do FDA (Food and Drug Administation) - agência norte-americana que regula produtos alimentícios e farmacêuticos - para uma a rotulagem mais rigorosa. Baseados nestes relatos, pesquisadores reforçaram a necessidade de investigar a relação potencial entre perda auditiva neurossensorial súbita e uso desta classe de drogas4.

Tais medicamentos são conhecidos comercialmente como: citrato de sildenafil (Viagra® e Revatio®, Pfizer), vardenafil (Levitra®, distribuído pela Bayer Pharmaceuticals, Schering-Plough e GlaxoSmithKline), e tadalafil (Cialis®, da Eli Lilly). Sildenafil foi o primeiro IPDE-5 licenciado para disfunção erétil e tem sido amplamente prescrito desde que foi aprovado nos Estados Unidos da América pelo FDA5. Embora utilizado de forma intermitente, o sildenafil, às vezes deve ser tomado continuamente em doses elevadas. Para o tratamento da disfunção erétil, a dose recomendada de citrato de sildenafil é de 25 a 100 mg por dia6.

A surdez súbita se caracteriza como uma surdez neurossensorial de aparecimento abrupto e sem causa conhecida. Pode ocorrer comprometimento da orelha interna e/ou vias auditivas centrais, de intensidade e frequências variáveis, podendo variar de leve sensação de ouvido obstruído a perda total da audição, sendo acompanhada de zumbido em aproximadamente 80% dos casos7-9. Quanto ao zumbido, este pode variar de intensidade e ocorre em 70% dos casos, podendo ceder ou persistir mais que a perda auditiva10.

A sensação de diminuição da audição pode variar de discreta a muito intensa, e pode apresentar recuperação espontânea em 25% ou mais dos casos. O comportamento evolutivo da surdez súbita é bastante inconsistente, com curas espontâneas, totais ou parciais, podendo deixar sequelas auditivas irreversíveis7.

Em estudo histopatológico do osso temporal, após episódio de surdez súbita idiopática, evidenciou-se grande perda de neurônios cocleares, sendo que o órgão de Corti e células ciliadas externas estavam ausentes na maior parte do giro basal da cóclea, justificando, naquele caso, a perda auditiva em frequências agudas11.

Recentemente, surgiram evidências apontando para o fato de que inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 possam ser responsáveis por perdas auditivas neurossensoriais súbitas2,3,6.

Tendo em vista a atualidade do tema proposto e ausência de publicações em língua portuguesa, surgiu o interesse em realizar o presente estudo com o objetivo de apresentar dois casos de pacientes portadores de perda auditiva neurossensorial súbita em uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 e revisar estudos sobre esta correlação.


MÉTODO

Foi realizado o estudo analítico de dois casos de pacientes jovens, sem comorbidades, em uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 e que apresentaram perda auditiva neurossensorial súbita, sem melhora auditiva após terapia combinada (corticoterapia por via oral- CVO e por via intratimpânica- CIT), em relação à audição e ao zumbido. Os pacientes assinaram o Termo de Consentimento Lívre e Esclarecido (TCLE) e a Pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Brasília (UnB), com número de Protocolo 132/12.

A estratégia de busca empregada na revisão bibliográfica foi guiada utilizando os descritores indexados no DecS (Descritores em Ciências da Saúde) em português e no MeSH (Medical Subject Headings) em inglês: surdez súbita e inibidores da fosfodiesterase e seus correlatos na língua inglesa: sudden deafness e phosphodiesterase inhibitors. Para tanto, foram utilizados os bancos de dados da Bireme e Pubmed/MedLine, sendo analisados todos os artigos publicados em revistas indexadas, incluindo estudos pré-clínicos e clínicos, transversais e prospectivos.

Foram consideradas, neste estudo, as publicações produzidas a partir de 1998 a junho de 2013, perfazendo um total de 15 anos, sendo que a última busca manual realizada nas bases eletrônicas de dados ocorreu em junho de 2013.


RESULTADOS

Em relação aos dois casos apresentados, o Paciente 1, com 37 anos, buscou atendimento médico assim que iniciaram os sintomas de hipoacusia e vertigem leve, sendo submetido imediatamente ao tratamento com uso de terapia combinada para surdez súbita, ou seja, corticoterapia por via oral (CVO - Prednisolona, 1 mg/kg/dia por 10 dias e redução de 10 mg a cada dois dias) associada à corticoterapia via intratimpânica com três aplicações em dias alternados (CIT - Metilprednisolona 0,7 ml de uma solução de 40 mg/ml, Solumedrol®) e não apresentou intercorrências durante o tratamento.

Na primeira Audiometria Tonal Limiar, apresentou limiares auditivos ausentes na orelha esquerda. Realizou, ainda, exames laboratoriais e de ressonância magnética. Nas avaliações auditivas realizadas por meio das Emissões Otoacústicas Evocadas por Produto de Distorção e Potenciais Evocados Auditivos, apresentou resultados compatíveis com a perda auditiva neurossensorial profunda, ou seja, ausência de respostas. Não houve melhora mesmo após a terapia combinada (CVO + CTI) em exames audiométricos realizados a partir de um mês após a terapia.

O Paciente 2, de 43 anos, apresentou como sintomas iniciais a hipoacusia, zumbido e vertigem grave. Foram realizados exames laboratoriais e ressonância magnética, bem como avaliação auditiva composta pela Audiometria Tonal Limiar, Teste de Emissões Otoacústicas Evocadas e Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico, e apresentou melhora dos limiares auditivos.

Em relação ao zumbido, utilizamos a Escala Visual Analógica (EVA) para incômodo e intensidade como forma de avaliação subjetiva do sintoma zumbido e houve melhora na pontuação (Tabela 1), no Paciente 1, sendo classificada de intensa para moderada após a terapia combinada, e no Paciente 2, de moderada para leve após a terapia. Já no Inventário do Handicap do Zumbido (THI), observa-se que o Paciente 1 obteve mudança de categoria de catastrófico para grave e o Paciente 2 obteve melhora na pontuação, passando do grau grave para o grau leve (Tabela 2).






Foram encontrados nove artigos. A primeira publicação correlacionando o uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 e surdez súbita é de 2007 (Quadro 1).




DISCUSSÃO

Os efeitos dos inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 na cóclea permanecem ainda incertos devido à necessidade de mais pesquisas com grupos maiores e grupo controle, bem como há a necessidade que os otorrinolaringologistas insiram em sua anamnese a possibilidade do uso desta classe de medicamentos em sujeitos com este tipo de perda auditiva, já que têm surgido algumas evidências indicando que estes medicamentos podem ser responsáveis por perdas auditivas neurossensoriais súbitas.

Salienta-se, ainda, que é de fundamental importância avaliar o mecanismo de ação desta classe de medicamentos, para explicar a possível associação causal entre o uso desta e as perdas auditivas neurossensoriais, que mesmo após o uso de terapia combinada (corticoterapia por via oral e via intratimpânica), têm sido irreversíveis.

Baseados nos resultados obtidos, observa-se que, nos dois casos descritos, a perda auditiva neurossensorial súbita foi unilateral, acompanhada de zumbido e vertigem. No Paciente 1, houve perda auditiva em todas as frequências testadas e, no Paciente 2, a perda auditiva foi maior nas frequências altas. Tais achados são concordantes com a literatura, como descrito em estudo histopatológico do osso temporal, após episódio de surdez súbita idiopática que evidenciou grande perda de neurônios cocleares, principalmente no giro basal da cóclea, justificando a perda auditiva em frequências altas11.

Sendo o zumbido uma queixa comum, talvez a mais frequentemente associada à surdez súbita7-9, ficou demonstrado que os pacientes descritos no estudo, apresentaram tal sintoma. Importante salientar que, ainda que não tenha havido melhora nos limiares auditivos do Paciente 1 após a terapia combinada, foi observada melhora em relação à intensidade e ao incômodo provocado pelo zumbido (Tabela 1 e Tabela 2), o que reforça a hipótese de que o zumbido pode ceder ou persistir mais que a perda auditiva10.

O Paciente 2 apresentou uma mudança significativa nos limiares auditivos, tendo em vista que sua perda auditiva de grau grave, após a terapia combinada, mudou para o grau leve, assim como o mesmo ocorreu com o zumbido, que era grave e passou a ser leve (Tabela 1 e Tabela 2). Tais resultados, observados no Paciente 2, provavelmente foram decorrente da melhora auditiva, da estabilização emocional, bem como da habituação ao zumbido.

Tendo em vista o fato de que, na história clínica dos pacientes não foram descritas comorbidades e, ainda que a surdez súbita possa ser de causa idiopática, foi possível levantar a hipótese de que o uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 possa ter contribuído para tal ocorrência e estudos recentes têm demonstrado tal correlação2,4,5,14.

É preocupante o fato de que homens jovens, 37 e 43 anos, sem comorbidades, em uso de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 tenham apresentado este tipo de perda auditiva, reforçando a possível ototoxicidade desta classe de medicamentos e, em alguns casos, a irreversibilidade da perda auditiva.

Em relação aos estudos encontrados sobre o tema, o primeiro relato de caso do uso de sildenafil e surdez súbita na literatura mundial foi publicado em 2007, por pesquisadores da Índia. Conforme os autores, o sildenafil é um tratamento oral eficaz para a síndrome da disfunção erétil e tem sido amplamente utilizado, tendo em vista a disponibilidade relativamente fácil da medicação, inclusive sendo adquirida pela Internet. Porém, os autores ressaltaram que muitos pacientes não estão cientes dos efeitos nocivos do sildenafil e utilizam o medicamento sem supervisão médica. O caso descrito é de um paciente do sexo masculino de 44 anos de idade, que apresentou perda auditiva neurossensorial profunda bilateral, ocorrida após a ingestão de sildenafil 50 mg/dia, durante 15 dias. O paciente relatou que após 15 dias da ingestão do medicamento, percebeu perda auditiva na orelha direita e após dois dias deste sintoma inicial, o mesmo ocorreu na orelha esquerda. O paciente foi medicado com predinisolona 1mg/Kg/dia por um mês e os dados auditivos foram documentados por meio da Audiometria Tonal Limiar, Teste de Emissões Otoacústicas Evocadas por Produto de Distorção e Potenciais Evocados Auditivos de Tronco Encefálico (PEATE)2.

Em 2007 ainda, após este relato de caso, o FDA anunciou 113 relatos de perda auditiva em pacientes que faziam uso de inibidores da PDE-5, sendo que 84 destes casos foram excluídos da série de casos por diversas razões. Os 29 relatórios restantes fizeram uma forte associação entre o uso dos inibidores da PDE-5 (sildenafil, vardenafil, tadalafil) e perda auditiva neurossensorial. Além da perda auditiva, foram relatados ainda zumbido e tontura. Diante disto, o FDA exigiu que os fabricantes destes medicamentos alertassem os consumidores sobre esta possibilidade: de uma perda auditiva neurossensorial súbita5.

O primeiro estudo experimental foi realizado na Coreia do Sul, em 2008, em que os autores examinaram a audição de cobaias em que foram administradas altas doses de sildenafil por 105 dias e os ratos foram avaliados no dia inicial (0), no quinto dia (5), no décimo quinto dia (15), no vigésimo quinto dia (25), no trigésimo quinto dia (35) e no centésimo quinto dia (105). Para avaliar a audição, os autores utilizaram a pesquisa dos Potenciais Evocados Auditivos de Tronco Encefálico (PEATE), as respostas auditivas de média latência, bem como o teste de Emissões Otoacústicas Evocadas. Os autores relataram que, em altas doses, o sildenafil causou mudanças nos potenciais evocados auditivos, pois aumentou o tempo de latência dos potenciais de curta latência. O mesmo tipo de resultado ocorreu nos potenciais de média latência. As emissões otoacústicas diferiram entre os grupos de alta dose de sildenafil e o grupo controle com o tratamento a longo prazo. Os autores afirmaram que estes resultados indicaram uma diminuição no número de células ciliadas externas do órgão de Corti e que a provável causa disto é o efeito tóxico devido ao excesso de óxido nítrico nos órgãos auditivos como a cóclea e o nervo auditivo. Baseados nestes resultados, os autores demonstraram que a administração de altas doses de sildenafil, a longo prazo, pode contribuir para a ocorrência de perda auditiva neurossensorial6.

Em 2009, foram relatados mais dois casos bem como foi realizada uma revisão dos dados pós-comercialização do FDA, por meio de uma análise retrospectiva e encontraram os seguintes resultados: de 25 pacientes analisados, 15 pacientes (88%) tiveram perda auditiva dentro de 24 horas após a ingestão de um inibidor de PDE-5. Oito pacientes (32%) relataram vertigem associada à perda de audição. Em 96% dos casos relatados, a perda auditiva foi unilateral. A resolução completa da audição foi observada em cinco pacientes (20%), enquanto que outros três pacientes (12%) tiveram pelo menos melhora parcial. Portanto, dos 15 pacientes com perda auditiva inicial, apenas oito pacientes (32%) relataram melhora em comparação com a queixa inicial. Os autores concluíram que, embora os dados não tenham sido conclusivos, parece haver uma ligação potencial entre o uso de inibidor PDE-5 e perda auditiva neurossensorial súbita. Assim, os autores reforçaram que os médicos otorrinolaringologistas devem incluir em sua anamnese e possíveis causas de surdez neurossensorial súbita, o uso de algum dos inibidores PDE-5. Embora não haja atualmente nenhuma evidência direta de um mecanismo deste efeito colateral, os autores postularam que ela está relacionada com os efeitos prolongados do monofosfato de guanosina cíclico (GMPc) dentro da cóclea4.

Em 2009, também foi realizado o primeiro estudo observacional prospectivo em humanos. Dezoito pacientes que estavam usando um inibidor da PDE-5 para disfunção erétil foram estudados. Foi realizada Audiometria Tonal Limiar em todos os pacientes nas frequências de 250 a 16.000 Hz antes e depois de 1, 5 e 72 horas de 10 mg de ingestão de vardenafil. Quatro pacientes demonstraram um aumento estatisticamente significativo no limiar auditivo em uma das orelhas, compatível com os critérios de ototoxicidade dentro de 72 horas de ingestão da droga. Além disso, todos os pacientes mostraram uma diminuição significativa do limiar unilateral em 10.000 Hz. No entanto, com a interrupção do medicamento, houve melhora nos limiares auditivos e todas as perdas auditivas desapareceram12.

Em um estudo com base epidemiológica, realizado em 2010, o pesquisador realizou uma comparação entre indivíduos com e sem perda auditiva e que faziam uso dos inibidores de PDE-5. O autor ressalta que este foi o primeiro estudo epidemiológico que avaliou a associação entre o uso de inibidores PDE-5 e a perda auditiva neurossensorial. A coorte era composta por 11.525 homens, com 40 anos ou mais e escolhidos a partir do levantamento Medical Expenditure Panel Survey entre 2003 e 2006. Durante um período de dois anos, os participantes forneceram dados em cinco entrevistas sobre suas informações demográficas, saúde, posturas saudáveis e prescrição de medicamentos. Eles também não relataram nenhuma dificuldade auditiva nem o uso de aparelhos auditivos. Os resultados mostraram que a incidência de perda auditiva foi de 17,9% - um percentual que aumentou com a idade. Aproximadamente 2% dos pacientes tinham tomado algum tipo de droga da classe dos inibidores de PDE-5, sendo que 80,3% deles utilizaram sildenafil (Viagra).

Os resultados mostraram que a perda auditiva foi duas vezes mais comum entre aqueles que fizeram uso de inibidores PDE-5 (3,0% versus 1,4%). Nenhuma relação significativa com a perda auditiva foi vista com tadalafil ou vardenafil. Porém, o autor atribuiu tal resultado ao fato de que o uso limitado de tadalafil e vardenafil pelos participantes pode ter limitado encontrar uma possível associação com a deficiência auditiva. O autor ressaltou, ainda, que a relação entre o uso de IPDE-5 e a perda de audição pode ser resultado de uma tendência das drogas que promovem o congestionamento do tecido erétil nasal, elevando a pressão no ouvido médio, bem como refere que o IPDE-5 funciona pelo bloqueio da degradação do GMPc e sua acumulação induz a expressão gênica por meio dos fatores de transcrição das proteínas de fosforilação por quinases específicas, os quais têm sido associados com lesões das células ciliadas da cóclea. Finalmente, o autor ressalta que a natureza irreversível da perda auditiva e o seu impacto na qualidade de vida reforçam a necessidade de mais pesquisas sobre o papel etiológico da utilização de medicamentos IPDE-5 e que, devido ao estudo ser do tipo transversal, este fornece apenas uma visão limitada sobre a relação do uso de IPDE-5 e perda auditiva, sendo, portanto, necessária uma investigação adicional13.

Em 2010, também foi descrito o caso de um paciente que desenvolveu perda auditiva neurossensorial súbita unilateral, possivelmente relacionada ao uso de vardenafil para a disfunção erétil. Descrevem seu estudo de caso como sendo de um paciente de 57 anos que chegou ao pronto-socorro com perda auditiva de leve a moderada na orelha direita, na faixa de 500 a 3.000 Hz, confirmada na Audiometria Tonal Limiar e que ocorreu após a ingestão de vardenafil.

Os autores descrevem que tal paciente foi hospitalizado dois dias mais tarde para a administração de dexametasona por via intravenosa, seguida de prednisona oral e que ocorreu uma melhora na audição no quarto dia de internação, tendo alta três dias depois, continuando a prednisona em nível ambulatorial. A audiometria realizada 10 dias após o tratamento com corticosteroides, confirmou que a audição na faixa de 500-3.000 Hz estava dentro dos limites de normalidade. Os autores consideraram que houve uma possível associação da perda auditiva neurossensorial súbita associada com o consumo de vardenafil. Os autores realizaram, ainda, uma análise dos casos de deficiência auditiva relacionadas com inibidores da PDE-5 nos Estados Unidos com o banco de dados do Sistema de Notificação de Eventos Adversos do FDA, para comparar as características do seu paciente com aqueles de outros casos de eventos adversos relatados e, com base na relação temporal da perda auditiva neurossensorial súbita e o uso de vardenafil deste paciente, eles propuseram que o vardenafil é uma provável causa de perda de audição. Conforme os autores, este caso forneceu novas evidências de que o consumo de inibidor da PDE-5 deve ser considerado como uma possível causa em pacientes com perda auditiva neurossensorial súbita3.

Foi realizado estudo em 2011 com o intuito de rever e analisar a literatura atual sobre a correlação entre o uso de inibidores da PDE-5 e perda auditiva e propor possíveis mecanismos fisiológicos, bem como investigar a comunicação global deste efeito colateral. Os autores salientaram que o uso de sildenafil e demais inibidores da PDE-5 tem crescido rapidamente desde seu lançamento em 1998 e um crescente corpo de evidências indica uma morbidade significativa associada com o perfil de efeitos colaterais dessa classe de medicamentos com perda auditiva.

Para tal estudo, agências de farmacovigilância na América do Norte, Europa e Austrália foram contatadas e foram solicitados relatórios de perdas auditivas associadas ao uso dos inibidores da PDE-5. Posteriormente, os relatórios foram examinados para excluir aqueles onde existiam outras possíveis causas para justificar as perdas auditivas. Os autores encontraram 47 casos de perda auditiva neurossensorial com uma associação temporal com a ingestão de inibidores da PDE-5, baseados na literatura e nos dados obtidos das agências de farmacovigilância. Os pacientes tinham média de idade de 56,6 anos. Oitenta e oito por cento das perdas auditivas relatadas eram unilateral com uma distribuição uniforme esquerda/direita. A perda auditiva ocorreu dentro de 24 horas após a ingestão do inibidor PDE-5 em 66,7% (n = 18) dos casos, sendo que o uso de sildenafil representou mais de 50% dos casos. Diante destes resultados, os autores concluíram que há evidências crescentes de que os inibidores da PDE-5 podem induzir uma perda auditiva neurossensorial. E, diante destes resultados, é preciso haver mais consciência desse efeito colateral incapacitante entre os profissionais de saúde responsáveis pela prescrição deste medicamento. Os autores ressaltam ainda que, com a expiração das patentes de sildenafil entre 2011-2013, os medicamentos genéricos estarão mais acessíveis e poderá ocorrer um aumento significativo na utilização destas drogas, bem como um aumento no número de casos de perda auditiva neurossensorial14.

Na Turquia, em 2012, pesquisadores analisaram os efeitos histopatológicos do uso de sildenafil a longo prazo sobre a cóclea em um modelo animal. Para tanto, os autores estudaram ratos adultos machos Wistar albinos. O grupo controle foi alimentado com dieta padrão de laboratório. No grupo de estudo, foi aplicado sildenafil por via oral, 1,5 mg/kg uma vez por dia durante 45 dias. Cada osso temporal foi dissecado e as cócleas foram removidas em bloco. Os ratos do estudo foram divididos em dois grupos experimentais: Grupo 1 (n = 10) foi o grupo controle, em que não foi aplicada qualquer medicação, e o Grupo 2 (n = 10) foi o grupo de sildenafil. Foi utilizado 50 mg de sildenafil (Viagra comprimidos, da Pfizer) que foram moídas em pó fino e dissolvido em 0,9% de NaCl. A dose de citrato de sildenafil administrada neste estudo foi 1,5 mg/kg, sendo que esta dose é compatível com doses normalmente utilizada em seres humanos. A terapia com sildenafil foi aplicada por via oral por meio de uma sonda orogástrica, uma vez por dia durante 45 dias, até 12 horas antes da cirurgia. Para avaliar a audição, foi realizado o Teste de Emissões Otoacústicas Evocadas Transientes (EOAET).

Os autores observaram que a hematoxilina e eosina não mostrou diferença entre os grupos. Em relação à análise imuno-histoquímica, a caspase 3 imunorreatividade foi observada no grupo de sildenafil. No grupo controle, a caspase 3 imunorreatividade não foi observada. Desta forma, os autores concluíram que a caspase-3 imunorreatividade no grupo sildenafil foi fortemente associada com um aumento nos eventos apoptóticos na cóclea e que o uso a longo prazo de sildenafil pode causar deficiência auditiva através do aumento da apoptose15.

Em 2013, foi realizado o primeiro estudo observacional prospectivo com o uso de tadalafil nas funções auditivas, utilizando para tanto uma avaliação auditiva objetiva. Foi um estudo do tipo observacional prospectivo em um hospital terciário. Vinte e cinco pacientes que não haviam feito uso de tadalafil e com disfunção erétil ou hipertensão arterial pulmonar realizaram Audiometria Tonal Limiar e Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (PEATE) antes da terapia medicamentosa, e 3 e 30 dias após a terapia medicamentosa. Os autores constataram que 15 pacientes faziam uso da medicação tadalafil 10 mg para a disfunção erétil, e outros 10 pacientes faziam uso de 20 mg uma vez por dia de tadalafil para hipertensão arterial pulmonar. Não houve diferença estatisticamente significante no limiar auditivo no início e no follow-up (p > 0,05). No entanto, três pacientes em uso de tadalafil 20 mg mostraram aumento significativo no limiar auditivo nas frequências mais altas. Não houve incidência de perda auditiva neurossensorial súbita no grupo de estudo.

Os autores afirmaram que este foi o primeiro estudo prospectivo e observacional que avaliou o efeito do tadalafil nas funções auditivas com provas objetivas. Embora não tendo encontrado resultado estatisticamente significativo para confirmar ou refutar a associação entre o tadalafil e deficiência auditiva, o aumento do limiar em frequências mais altas depois do uso de tadalafil sustenta os resultados de estudos anteriores e aponta para uma possível relação entre os dois. Finalmente, os autores sugerem que sejam realizados novos estudos similares com amostras maiores para conhecer a associação exata de inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 sobre as funções auditivas16.


CONCLUSÃO

O aumento da ocorrência de surdez súbita em pacientes em uso de IPDE-5 e relatos científicos na literatura sugerem que o uso dos inibidores da fosfodiesterase do tipo 5 seja encarado como fator de risco para surdez súbita, suscitando a necessidade de mais estudos sobre a possível ototoxicidade desta classe de medicamentos.


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1. Mestrado em Ciências da Saúde pela FCS-UnB Especialista em Audiologia pela UFPE Especialista em Psicopedagogia pela UFRJ (Audiologista da Fundação Hospitalar do Distrito Federal - GDF Doutoranda em Ciências da Saúde pela Faculdade de Ciências da Saúde da UnB)
2. Doutorado em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da UnB (Professor do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Ciências da Saúde da UnB)

Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade de Brasília

Endereço para correspondência:
Fayez Bahmad Jr
SMHN, QD 02, Bloco C, Ed. Dr. Crispim, Sala 515. Asa Norte
Brasília - DF. Brasil. CEP: 70710-149
Tel: +55 (61) 3328-6009
E-mail: fayez@unb.br

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) do BJORL em 5 de agosto de 2013. cod. 11047.
Artigo aceito em 22 de setembro de 2013.

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