Ano: 2012 Vol. 78 Ed. 4 - Julho - Agosto - (27º)
Seção: Relato de Caso
Páginas: 136 a 136
Tumor miofibroblástico inflamatório de osso temporal
Inflammatory myofibroblastic tumor of the temporal bone
Autor(es): Gustavo Latorre Samencatti1; Felipe Costa Neiva2; José Ricardo Gurgel Testa3
Palavras-chave: granuloma de células plasmáticas, neoplasias da base do crânio, orelha média, osso temporal, sobrevida.
Keywords: ear middle, granuloma plasma cell, temporal bone.
INTRODUÇÃO
O tumor miofibroblástico inflamatório (TMI) é uma proliferação pseudoneoplásica benigna, de etiologia desconhecida, que acomete, principalmente, trato gastrointestinal, fígado e pulmão. Poucos casos são relatados na literatura sobre sua ocorrência em osso temporal, sendo este o segundo com invasão encefálica.
APRESENTAÇÃO DO CASO
Este estudo relata uma paciente do sexo feminino, 59 anos, que apresentava queixa de vertigem e surdez súbita esquerda havia 1 mês. Ao exame físico, apresentava membrana timpânica íntegra e hiperemiada.
Foi solicitada audiometria, que evidenciou perda auditiva mista grave à esquerda. Na tomografia (TC) do osso temporal esquerdo, observou-se um material com densidade de partes moles que ocupava a região epitimpânica e do antro mastoídeo, com preservação da cadeia ossicular e esporão de Chausse; porém, com erosão do canal semicircular lateral (Figura 1A).
Figura 1. A: Tomografia computadorizada de ossos temporais evidenciando lesão que erodia o canal semicircular lateral; B: Aspecto do tumor no intraoperatório; C: Ressonância magnética (RM) de crânio T1 pós-contraste mostrando a invasão do tumor no lobo temporal esquerdo; D: RM de crânio em T2, na qual observa-se grande edema cerebral.
Optou-se pela realização de timpanomastoidectomia à esquerda, na qual foi observada tumoração em antro mastoídeo de aspecto granulomatoso e infiltrativo, sendo realizada biópsia excisional da lesão (Figura 1B). Não foram constatados sinais de extensão da lesão pelo tégmem mastoídeo para região intracraniana. No estudo anatomopatológico, chegou-se ao diagnóstico de TMI.
Após 3 meses da timpanomastoidectomia, a paciente apresentou intensa cefaleia com episódio convulsivo. Solicitou-se ressonância magnética (RM) de crânio, que constatou lesão junto à meninge da fossa média, hipercaptante ao gadolíneo, que invadia lobo temporal esquerdo, causando grande edema cerebral adjacente (Figura 1C-D). Realizado tratamento conservador com deflazacort por tempo indeterminado, com controle do crescimento tumoral e redução do edema cerebral até o momento.
DISCUSSÃO
TMI é uma lesão pseudossarcomatosa distinta de etiologia desconhecida1, que ocorre em tecidos moles e vísceras, mais incidente na criança e no adulto jovem2. O TMI de osso temporal é de difícil diagnóstico, pois possui variedade de diagnósticos diferenciais, como otite externa maligna, osteomielite bacteriana necrotizante, osteomielite fúngica, colesteatoma, doenças granulomatosas, outras neoplasias primárias e metástases. A TC e RM são de fundamental importância na delimitação da lesão, pela sua capacidade de destruição do osso temporal e invasão intracraniana3,4.
Williamsom et al.5 publicaram, em 2003, revisão de 10 casos de TMI de osso temporal. Realizaram, em nove casos, a remoção cirúrgica total e, em um caso, subtotal. Administrou-se corticoterapia a dois casos, um por tumor residual e outro por envolvimento meníngeo. No caso com tumor residual, optou-se, também, pela radioterapia5.
Santaolalla-Montoya et al.6 publicaram, em 2008, caso de um homem de 75 anos de idade com TMI em osso temporal, com invasão de base de crânio e acometimento dos pares cranianos VI, X, XI e XII. Submetido à timpanomastoidectomia, paciente evoluiu com erosão de dura-máter e invasão de fossa craniana posterior, vindo a óbito posteriormente.
Não há consenso sobre o melhor tratamento do TMI do osso temporal; porém, tem-se optado pela remoção cirúrgica do tumor sempre que possível, reservando a corticoterapia e radioterapia para os casos inoperáveis. A opção pelo uso dos corticoides no controle do edema cerebral e da sintomatologia tem-se mostrado efetiva a curto prazo; porém, não impede a progressão a doença. O uso da radioterapia é controverso, pois além dos efeitos colaterais e do prognóstico reservado destes pacientes, não se provou incremento da sobrevida5.
Observa-se aumento do número de casos desse tumor no osso temporal nos últimos 10 anos, e sua etiologia ainda permanece incerta5. O relato deste caso se justifica pela sua raridade, sendo o segundo relato de invasão intracraniana e o primeiro com sobrevida de mais de 1 ano da paciente com a doença.
COMENTÁRIOS FINAIS
Resumindo, o TMI de osso temporal é raro e representa uma entidade clínico-patológica distinta. Apesar da benignidade, geralmente tem característica destrutiva, com envolvimento de orelha média e interna, podendo levar à erosão óssea do tégmem mastoídeo e consequente invasão intracraniana.
REFERÊNCIAS
1. Ereño C, López JI, Grande J, Santaolalla F, Bilbao FJ. Inflammatory myofibroblastic tumor of the larynx. J Laryngol Otol. 2001;115(10):856-8.
2. Corsi A, Ciofalo A, Leonardi M, Zambetti G, Bosman C. Recurrent inflammatory myofibroblastic tumor of the glottis mimicking malignancy. Am J Otolarynlol. 1997;18(2):121-6.
3. Patel PC, Pellitteri PK, Vrabec DP, Szymanski M. Tumefactive fibroinflammatory lesion of the head and neck originating in the infratemporal fossa. Am J Otolaryngol. 1998;19(3):216-9.
4. Gasparotti R, Zanetti D, Bolzoni A, Gamba P, Morassi ML, Ungari M. Inflammatory myofibroblastic tumor of the temporal bone. AJNR Am J Neuroradiol. 2003;24(10):2092-6.
5. Williamson RA, Paueksakon P, Coker NJ. Inflammatory pseudotumor of the temporal bone. Otol Neurotol. 2003;24(5):818-22.
6. Santaolalla-Montoya F, Ereño C, Zabala A, Carrasco A, Martínez-Ibargüen A, Sánchez-Fernández JM. Inflammatory myofibroblastic tumor of the temporal bone: a histologically nonmalignant lesion with fatal outcome. Skull Base. 2008;18(5):339-43.
1. Especializando em ORL.
2. Médico Otorrinolaringologista (pós-graduando (mestrando) do Departamento de Otorrinolaringologia e Cabeça e Pescoço da UNIFESP).
3. Doutor em Ciências pela UNIFESP (Professor Adjunto do Departamento de Otorrinolaringologia e Cabeça e Pescoço pela UNIFESP).
UNIFESP.
Endereço para correspondência:
Gustavo Latorre Samencatti
Rua Agostinho Rodrigues Filho, 350, apto 171B. Vila Clementino
São Paulo - SP. CEP: 04026-040
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 14 de junho de 2011. cod. 8301.
Artigo aceito em 25 de setembro de 2011.