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Ano:  2011  Vol. 77   Ed. 5  - Setembro - Outubro - (25º)

Seção: Relato de Caso

Páginas: 677 a 677

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Angiofibroma Nasofaríngeo Juvenil com extensão intradural

Juvenile Nasopharyngeal Angiofibroma with intradural extension

Autor(es): Henrique Faria Ramos1; Marystella Tomoe Takahashi2; Bernardo Faria Ramos3; Marcos de Queiroz Teles Gomes4; Luiz Ubirajara Sennes5

Palavras-chave: angiofibroma, neoplasias da base do crânio, neoplasias nasofaríngeas.

Keywords: angiofibroma, nasopharyngeal neoplasms, skull base neoplasms.

INTRODUÇÃO

O Angiofibroma Nasofaríngeo Juvenil (ANJ) é um tumor vascular benigno da base do crânio, acometendo quase que exclusivamente adolescentes do sexo masculino. É um tumor raro, compreendendo menos de 0,05% de todos os tumores de cabeça e pescoço. Embora histologicamente benigno, pode apresentar comportamento extremamente agressivo, com extensão para tecidos adjacentes e destruição óssea por compressão1. A progressão de tal extensão pode levar ao envolvimento intracraniano, que é relativamente frequente, ocorrendo entre 10% e 36% dos casos2. Entretanto, raramente ultrapassa a dura-máter3,4.


RELATO DO CASO

WLS, sexo masculino, 16 anos, goleiro de futebol, com história de episódios de epistaxe e obstrução nasal esquerda há 5 meses, e uma lesão nasofaríngea na telescopia nasal. Observaram-se sinais sugestivos de um ANJ Andrews/Fisch II5 na tomografia computadorizada (TC). Em agosto de 2006, foi submetido à embolização da artéria maxilar, faríngea ascendente e meníngea média, entretanto, havia discreta irrigação tumoral a partir de pequenos ramos cavernosos da artéria carótida interna. Após três dias, procedeu-se a ressecção endoscópica endonasal do tumor. Durante a cirurgia, o paciente apresentou bradicardia importante na manipulação da fossa pterigopalatina. Desta forma, o procedimento foi interrompido com aparente remoção completa do tumor.

Após 1 ano de seguimento, apresentou retorno dos sintomas, sendo visibilizada lesão nasofaríngea na telescopia nasal. TC e ressonância magnética (RM) demonstraram ANJ Andrews/Fisch IVb5 com extensão para fossa pterigopalatina, fossa pterigoide, seio esfenoidal, seio cavernoso e lobo temporal. O estudo angiográfico evidenciou grande componente vascular proveniente de ramos petrosos e cavernosos da artéria carótida interna (ACI), após a embolização dos ramos da artéria carótida externa.

Considerando os aspectos previamente expostos, em outubro de 2007 optamos por uma abordagem via craniotomia fronto-temporal-zigomática esquerda para ressecção, uma vez que o tumor pode ser desvascularizado da ACI em um primeiro momento. Sob visão microscópica, a dura-máter foi dissecada do assoalho da fossa média, que foi aberto com uma broca pneumática de alta velocidade, expondo a órbita, o forame redondo com o nervo maxilar (V2), o forame oval com nervo mandibular (V3) e o seio cavernoso. As conexões vasculares entre a ACI e o angiofibroma foram coaguladas com bipolar. Em seguida, observou-se o angiofibroma transgredindo a dura-máter e, após sua abertura, a massa tumoral apresentava contato íntimo com o lobo temporal, com plano de clivagem. Após a remoção da porção intradural, a falha dural pela qual o tumor se estendia foi fechada com um enxerto de fáscia temporal. As porções nasofaríngea, esfenoidal e infratemporal foram dissecadas digitalmente e removidas superiormente pela falha do assoalho da fossa média, que foi posteriormente reconstruída com a rotação do músculo temporal. A análise histopatológica do espécime intradural demonstrou íntima relação entre o ANJ e a dura-máter, com invasão desta (Figura 1).


Figura 1. A) TC axial demonstrando ANJ com envolvimento do seio esfenoidal e extensão intradural, irrigado por ramos da ACI. B) RM coronal: sequência ponderada em T1 com gadolínio mostrando extensão do ANJ para a fossa média, com íntimo contato com o lobo temporal. C) Visão microscópica da dissecção da ANJ do lobo temporal (LT) após a abertura da dura-máter da fossa média (DFM). Setas representam as bordas da dura-máter aberta. MT. Músculo temporal; O. órbita; DFA. Dura-máter da fossa anterior. D) Fotomicrografia do fragmento intradural do ANJ (esquerda), em contato íntimo com a dura-máter (direita) e áreas de invasão tecidual (hematoxilina e eosina; 100 X).



O paciente evoluiu com paralisia do nervo abducente esquerdo no pós-operatório, que persistiu por cerca de 1 mês. Após 1 ano de seguimento, não havia sinais de recorrência na telescopia nasal e RM ou déficit neurológico e o paciente retornou às suas atividades.


DISCUSSÃO

ANJ com erosão da base do crânio e extensão intracraniana cursa com aumento dos riscos operatórios, assim como da probabilidade de contribuições vasculares significantes da ACI, cuja embolização pré-operatória não é viável. Por tais motivos, está associado a maiores taxas de hemorragia de difícil controle, déficits neurológicos, ressecção subtotal e recorrência. A embolização pré-operatória prévia também está relacionada à recorrência, pois a diminuição de tumores com invasão profunda do esfenóide dificulta a completa excisão, com rápida revascularização do tumor residual no período pós-operatório imediato, principalmente por ramos da ACI6.

Partindo do pressuposto de que o mecanismo de destruição óssea pelo angiofibroma resulta de um padrão de crescimento compressivo em vez que infiltrativo1, observa-se que a extensão intracraniana é geralmente extradural3,4.

A penetração dural é um fenômeno raro, com poucos relatos na literatura. Na RM, os sinais sugestivos de lesão transdural são ausência de plano de clivagem entre o tumor e a dura-máter ou envolvimento circunferencial da ACI. No entanto, em alguns casos a RM é incapaz de distinguir a invasão como extra ou intradural. A presença de ramos colaterais de vasos parenquimatosos cerebrais irrigando o tumor na angiografia pode ser um sinal de penetração dural.

Jafek et al.2 foram os primeiros a relatar um caso ANJ com penetração dural, abordado por um acesso combinado otorrinolaringológico-neurocirúrgico. Lyons & Donald7 relataram um caso de tratamento cirúrgico bem sucedido de ANJ que penetrava a dura e a pia-máter do lobo temporal. Butugan et la.1 relataram três casos de transgressão dural e invasão do seio cavernoso (dois destes eram tumores recorrentes), demonstrando que a manipulação prévia predispõe a invasão da dura.

De acordo com Danesi et al.4 a possibilidade de extensão intradural não pode ser negada; entretanto, para prová-la, o cirurgião deve demonstrar histopatologicamente o tumor transgredindo a dura-máter ou, alternativamente, visibilizar o tumor intradural por uma abordagem neurocirúrgica inicial. Diante do exposto, o caso relatado preenche ambos os critérios para envolvimento intradural.


CONCLUSÃO

Embora a invasão intracraniana pelo ANJ seja relativamente comum, a extensão intradural é muito rara, ocorrendo principalmente em recorrências tumorais. Geralmente, o plano de clivagem entre o ANJ e o tecido cerebral é bem definido. A remoção total do tumor é possível com déficits neurológicos mínimos. No entanto, a reconstrução dural é necessária.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Butugan O, Sennes LU, de Almeida ER, Miniti A. Intracranial Juvenile Angiofibroma With Dural and Cavernous Sinus Invasion. Rev Bras Otorrinolaringol. 1995;61(5):400-12.

2. Jafek BW, Krekorian EA, Kirsch WM, Wood RP. Juvenile nasopharyngeal angiofibroma: management of intracranial extension. Head Neck Surg. 1979;2(2):119-28.

3. Sennes LU, Butugan O, Sanchez TG, Bento RF, Tsuji DH. Juvenile nasopharyngeal angiofibroma: the routes of invasion. Rhinology. 2003;41(4):235-40.

4. Danesi G, Panizza B, Mazzoni A, Calabrese V. Anterior approaches in juvenile nasopharyngeal angiofibromas with intracranial extension. Otola-ryngol Head Neck Surg. 2000;122(2):277-83.

5. Andrews JC, Fisch U, Valavanis A, Aeppli U, Makek MS. The surgical management of extensive nasopharyngeal angiofibromas with the infratemporal fossa approach. Laryngoscope. 1989;99(4):429-37.

6. McCombe A, Lund VJ, Howard DJ. Recurrence in juvenile angiofibroma. Rhinology. 1990;28(2):97-102.

7. Lyons BM, Donald PJ. Intracranial juvenile angiofibroma with intradural and cavernous sinus involvement. Skull Base Surg. 1992;2(2):87-91.










1. Médico Otorrinolaringologista, Pós-graduando da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
2. Médica Otorrinolaringologista, Pós-graduanda da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
3. Médico, Residente do 3o ano em Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
4. Médico Neurocirurgião, Médico Assistente da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
5. Livre-Docente, Professor Associado da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).

Endereço para correspondência:
Henrique Faria Ramos
Av. Dr. Eneas Carvalho de Aguiar, 255 6º andar
São Paulo - SP, Brazil. CEP: 05403-000
E-mail: henriquefariaramos@terra.com.br

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 15 de julho de 2010. cod. 7211
Artigo aceito em 1 de outubro de 2010.

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