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Ano:  2010  Vol. 76   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Artigo Original

Páginas: 280 a 286

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Inteligibilidade de fala com e sem ruído em indivíduos expostos à música eletrônica

Speech intelligibility with and without noise in individuals exposed to electronic music

Autor(es): Jéssica Kuchar1, Cássia Menin Cabrini Junqueira2

Palavras-chave: audiometria da fala, audição, ruído.

Keywords: audiometry, noise, speech.

Resumo:
A audiometria é o principal meio pelo qual se avalia a audição, pois é um teste universal e padronizado. Os testes de fala são de difícil padronização devido às variáveis envolvidas, sendo de grande importância a aplicação destes na presença de ruído competitivo. Objetivo: Caracterizar a inteligibilidade de fala no silêncio e na presença de ruído competitivo, em indivíduos expostos à música eletronicamente amplificada. Material e Método: Foi realizado com 20 estudantes universitários apresentando limiares auditivos normais. O índice de reconhecimento de fala (IPRF) foi realizado com quatorze horas de repouso acústico, logo após a exposição à música eletronicamente amplificada e novamente após repouso acústico, sendo obtido em três etapas: sem ruído competitivo, com a presença de ruído competitivo tipo Babble, em escuta monótica, na relação sinal-ruído de +5dB e com a relação sinal-ruído -5dB. Resultados: Houve maior prejuízo no IPRF logo após a exposição à música e com ruído competitivo, e conforme a relação sinal/ruído diminui, houve piora no desempenho dos indivíduos no teste. Conclusão: A inclusão do uso de ruído competitivo nos testes de fala na rotina audiológica é importante, pois representa a real desvantagem vivenciada pelos indivíduos na escuta cotidiana.

Abstract:
Audiometry is the main way with which hearing is evaluated, because it is a universal and standardized test. Speech tests are difficult to standardize due to the variables involved, their performance in the presence of competitive noise is of great importance. Aim: To characterize speech intelligibility in silence and in competitive noise from individuals exposed to electronically amplified music. Material and Method: It was performed with 20 university students who presented normal hearing thresholds. The speech recognition rate (SRR) was performed after fourteen hours of sound rest after the exposure to electronically amplified music and once again after sound rest, being studied in three stages: without competitive noise, in the presence of Babble-type competitive noise, in monotic listening, in signal/noise ratio of +5dB and with the signal/noise ratio of 5dB. Results: There was greater damage in the SRR after exposure to the music and with competitive noise, and as the signal/noise ratio decreases, the performance of individuals in the test also decreased. Conclusion: The inclusion of competitive noise in the speech tests in the audiological routine is important, because it represents the real disadvantage experienced by individuals in daily listening.

INTRODUÇÃO

Há algumas décadas, o ruído tem sido objeto de estudos no que diz respeito a programas de prevenção da perda auditiva nos trabalhadores, porém, sabemos que o ruído não ocorre exclusivamente nos locais de trabalho, mas está presente em todos os ambientes onde vivemos: casa, lazer, esporte, escola1.

O ouvido humano é sensível a uma variedade de atividades acústicas. O ruído, de modo geral, é mencionado por vários autores como causador de alterações fisiológicas e psicológicas sobre os indivíduos que a ele estão expostos1-4. Um dos efeitos auditivos causados no organismo é a interferência na comunicação oral produzida pelo mascaramento ocasionado pelo ruído de fundo de sons de fala, embora o seu principal efeito seja a perda de audição3.

Quando uma conversação acontece em lugares ruidosos, é necessária uma atenção dobrada no indivíduo que está transmitindo a mensagem, pois a habilidade em compreender a fala nesta situação é reduzida. Gama5 afirma que o reconhecimento de fala é acompanhado da combinação das pistas acústicas, linguísticas, semânticas e circunstanciais. Quando a escuta ocorre em condições favoráveis, as pistas estão presentes em excesso e algumas delas podem ser desprezadas5. Para que a transmissão da mensagem seja efetiva, existe uma redundância de pistas acústicas das quais o ouvinte se vale de acordo com a situação e o contexto da comunicação5.

Entretanto, na situação de escuta em ambiente ruidoso, ocorre a diminuição das pistas acústicas da mensagem, levando o ouvinte a utilizar outras pistas para compreensão da mesma. Assim sendo, é importante que a avaliação audiológica disponha de métodos para avaliar a real desvantagem do indivíduo em situações de escuta desfavorável, reproduzindo, dessa forma, a escuta cotidiana.

Para tanto, o presente estudo teve por finalidade caracterizar as possíveis consequências do ruído na inteligibilidade de fala em indivíduos expostos à música eletronicamente amplificada.


MATERIAL E MÉTODO

O presente estudo foi realizado em uma clínica de Fonoaudiologia de uma instituição de ensino superior localizada na região norte do Paraná, obtendo parecer favorável do Comitê de Ética e Pesquisa desta instituição sob número 241/2005.

Participaram deste estudo 20 estudantes universitários, apresentando limiares auditivos dentro dos padrões de normalidade, curvas timpanométricas do tipo A e reflexos acústicos entre 70 e 100dB, sendo 10 do sexo feminino e 10 do sexo masculino, com faixa etária entre 18 e 25 anos, sendo a média de 20,25 anos, os mesmos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

O material utilizado foi: um questionário fechado, otoscópio da marca HEINE, fone supra-aural TDH-39, vibrador ósseo B-71, audiômetro da marca Interacoustic, modelo AC 40, imitanciômetro da marca Interacoustic, modelo AZ 7, diskman, CD com gravação de lista de monossílabos e ruído babble. O audiômetro, fone e vibrador ósseo foram calibrados atendendo os padrões ANSI 53.6 - 1996/ISSO 389 - 1991/ISSO 8798/ANSI 53.43 - 1993.

Primeiramente, foi realizada a inspeção do meato acústico externo para garantir que as avaliações audiológicas fossem realizadas em condições favoráveis. A seguir, foi aplicado um questionário (Tabela 1), com o intuito de se obter informações a respeito da saúde auditiva dos indivíduos.




A avaliação audiológica iniciou-se pelas medidas de imitância acústica (complacência estática e dinâmica e os limiares do reflexo acústico contralateral e ipsilateral) e audiometria tonal limiar onde os limiares de via aérea foram pesquisados nas frequências de 250, 500, 1000, 2000, 3000, 4000, 6000, 8000Hz e os de via óssea nas frequências de 250, 500, 1000, 2000, 3000 e 4000Hz. O critério utilizado para a classificação das curvas audiométricas seguiu a recomendação BIAP nº02/1 bis (1996)6.

Em seguida, realizou-se a logoaudiometria: limiar de recepção de fala (SRT) e índice percentual de reconhecimento de fala (IPRF), sendo este obtido em três etapas: a primeira sem ruído competitivo, a segunda com a presença de ruído competitivo tipo babble, em escuta monótica, na relação sinal-ruído (S/R) de +5dB e a terceira também nestes critérios, porém com a relação S/R de -5dB, como proposto por Kumabe7.

Cabe ressaltar que o IPRF foi realizado em três momentos. O primeiro momento foi realizado antes da exposição dos indivíduos à música eletronicamente amplificada, com quatorze horas de repouso acústico, o segundo momento foi logo após a exposição e o terceiro momento foi novamente após quatorze horas de repouso acústico.

Os indivíduos foram expostos à música eletronicamente amplificada, com intensidade de 100dBNA em cabina acústica, por meio de um diskman acoplado a um audiômetro, num período de 30 minutos, sendo que a saída do som foi nos fones TDH-39, para maior confiabilidade do material.

Para a análise estatística dos instantes antes e após a exposição à música em cada uma das situações: sem presença de ruído competitivo, com ruído competitivo nas relações S/R de +5dB e de -5dB, foi utilizado o Teste do Sinal8 utilizando o pacote estatístico Statistica 7.1 (Statsoft).


RESULTADOS

Questionário

A Tabela 1 apresenta os principais dados advindos das respostas ao questionário aplicado aos indivíduos participantes da presente pesquisa.

Inspeção do Meato Acústico Externo

Os resultados obtidos por meio da inspeção do meato acústico externo demonstraram que os indivíduos pesquisados não apresentaram qualquer alteração que impedisse que as avaliações audiológicas fossem realizadas em condições favoráveis.

Medidas de Imitância Acústica

Em relação às medidas de imitância acústica, não foram encontradas quaisquer alterações. Todos os indivíduos apresentaram curva timpanométrica do tipo A bilateralmente e presença dos reflexos do músculo estapédio na aferência e eferência de ambas as orelhas, no modo contra e ipsilateral.

Limiares Tonais Auditivos

Todos os indivíduos avaliados apresentaram limiares auditivos dentro dos padrões de normalidade, menores que 20dBNA nas frequências de 250 a 8000Hz, segundo a recomendação BIAP6.

Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF)

As Tabelas 2, 3 e 4 demonstram o IPRF, realizados no silêncio e na presença de ruído competitivo em relações S/R de +5dB e de -5dB de todos os indivíduos da pesquisa antes e após a exposição à música eletronicamente amplificada a 100dB de intensidade, por meio dos fones TDH-39 em cabina acústica, respectivamente.








Na realização do IPRF antes da exposição, sem ruído competitivo, os indivíduos apresentaram a média de acertos de 100% antes da exposição e 99% após, enquanto na avaliação com ruído competitivo na relação S/R de +5dB os indivíduos apresentaram a média de 98% de acertos antes da exposição e 97% após.

Ao analisarmos a Tabela 4, novamente observamos que a inteligibilidade de fala é prejudicada na presença de ruído competitivo, considerando a diminuição da relação S/R, verificamos os valores obtidos em porcentagem para o reconhecimento de fala na relação S/R -5dB, isto é, o ruído mais intenso 5dB que o sinal de fala. As médias do IPRF nesta relação foram de 71% de acertos antes da exposição a 100dB de música eletronicamente amplificada e 65% após esta exposição. Pode-se perceber diferença entre os valores, ao compararmos o teste realizado na relação S/R -5dB com o mesmo realizado sem ruído competitivo e com a relação S/R de +5dB.

A Figura 1 apresenta a porcentagem dos indivíduos que tiveram alterações no IPRF, após a exposição à música sem presença de ruído competitivo.


Figura 1. Porcentagem de alterações no IPRF, ocorridas após a exposição à música sem presença de ruído competitivo.



O Teste do Sinal demonstrou, no IPRF sem presença de ruído competitivo antes e após a exposição à música eletronicamente amplificada, diferença estatisticamente significante apenas para a orelha direita (p=0,023), que foi a primeira orelha testada.

A Figura 2 indica a porcentagem dos indivíduos que tiveram alterações no IPRF realizado na presença de ruído competitivo na relação S/R de +5dB.


Figura 2. Porcentagem de alterações no IPRF, ocorridas após a exposição à música na relação S/R +5dB.



Na Figura 2, pode-se notar que 50% dos indivíduos apresentaram alguma alteração no IPRF realizado com presença de ruído competitivo na relação S/R de +5dB, sendo destes 25% com alteração unilateral e 25% com alteração bilateral. Observa-se também que 50% dos sujeitos não apresentaram qualquer alteração no IPRF após a exposição à música eletronicamente amplificada.

O Teste do Sinal no IPRF com presença de ruído competitivo na relação S/R de +5 antes e após a exposiçãoà música eletronicamente amplificada não demonstrou diferença estatisticamente significante para nenhuma das orelhas (p>0,05).

Na Figura 3, estão expostos os dados, em porcentagem, dos indivíduos que apresentaram alterações no IPRF realizado com presença de ruído competitivo na relação S/R -5dB. Nota-se que apenas 1 indivíduo (5%) não apresentou qualquer alteração na inteligibilidade de fala após a exposição à música eletronicamente amplificada narelação S/R -5dB, 4 indivíduos (20%) apresentaram alteração bilateral, ou seja, tiveram as duas orelhas piores após a exposição à música e 15 indivíduos (75%) apresentaram alteração em uma das orelhas. Percebe-se então, pelas médias totais bilaterais já mencionadas, que há realmente grande alteração nesta relação S/R.


Figura 3. Porcentagem de alterações no IPRF, ocorridas após a exposição à música na relação S/R -5dB.



O Teste do Sinal no IPRF com presença de ruído competitivo na relação S/R de -5 antes e após a exposição à música eletronicamente amplificada demonstrou diferença estatisticamente significante tanto para orelha direita (p=0,039) quanto para a orelha esquerda (p=0,006).

A Figura 4 aponta a ocorrência de alterações após a exposição à música eletronicamente amplificada, por sexo, sem presença de ruído competitivo, na presença de ruído competitivo na relação S/R +5dB e na relação S/R -5dB. A mesma demonstra ainda o total de alterações ocorridas para ambos os sexos em todas as condições de teste utilizadas.


Figura 4. Porcentagem de alterações no IPRF, ocorridas após a exposição à música na relação, por sexo, nas diferentes relações S/R utilizadas.



Para comparar os sexos, utilizou-se apenas o cálculo de média aritmética para os grupos e comparação entre elas. Sem a presença de ruído competitivo, o sexo feminino apresentou melhor desempenho do que o sexo masculino, pois 8 indivíduos (80%) não apresentaramqualquer alteração, diante de 6 indivíduos (60%) do sexo masculino. No sexo feminino, nesta condição de teste, foi encontrado 1 indivíduo com alteração unilateral e 1 com alteração bilateral, e no sexo masculino, 3 com alteração unilateral e 1 com alteração bilateral.

Na segunda condição do teste, ou seja, com ruído competitivo na relação S/R +5dB, o sexo masculino foi que teve o melhor desempenho, sendo 6 indivíduos (60%) sem nenhuma alteração na inteligibilidade de fala, perante 4 indivíduos (40%) do sexo feminino. Das alterações encontradas no sexo feminino, 4 indivíduos (40%) revelaram alteração bilateral e 2(20%) alteração unilateral e no sexo masculino, verificou-se 3 indivíduos (30%) com alteração em uma das orelhas e 1 indivíduo (10%) com alteração em ambas.

Por fim, na realização do teste com presença de ruído competitivo na relação S/R -5dB, o sexo feminino obteve pior desempenho novamente, com 100% de indivíduos com alteração após a exposição à música eletronicamente amplificada, sendo estas, 90% de alteração unilateral e 10% de alteração bilateral. No sexo masculino, pôde-se verificar 90% dos indivíduos com algum tipo de alteração, sendo 60% unilateral e 30% bilateral.

O IPRF foi realizado pela terceira vez com 14 horas de repouso acústico, a fim de confirmar o retorno dos limiares auditivos dos pacientes e, consequentemente, o seu IPRF.

Pode-se verificar que todos os indivíduos obtiveram IPRF de 100% em ambas as orelhas, na terceira avaliação, sem presença de ruído competitivo, confirmando a facilidade para a realização do teste no silêncio.

Na realização do mesmo na presença de ruído com relação S/R +5dB, pode-se perceber que apenas 2 indivíduos tiveram o IPRF menor do que na primeira aplicação do teste.

Finalmente na realização do IPRF na relação S/R -5dB, na terceira aplicação do teste, pode-se verificar 6 indivíduos com um decréscimo no teste, apresentando piora no reconhecimento de fala.


DISCUSSÃO

Segundo Hall (1999)9, para classificar a audição como normal, os indivíduos deveriam ser inspecionados audiológica e otologicamente, não apresentar antecedentes de patologias de orelha média ou exposição a medicações ototóxicas, ou exposição excessiva a ruído e nem a queixa de tinitus. Segundo o autor esses pré-requisitos rigorosos não seriam encontrados na maioria dos indivíduos com limiares auditivos < 20dB NA.

Todos os sujeitos participantes da presente pesquisa, após a exposição à música eletronicamente amplificada, apresentaram os limiares nas frequências de fala preservados e queda nas frequências agudas, pois pretendia-se com o estudo provocar nos indivíduos uma TTS ("Tem-porary Threshold Shift" - Mudança Temporária do Limiar), a fim de verificar os prejuízos na inteligibilidade de fala dos mesmos após a exposição à música eletronicamente amplificada. Este tipo de perda auditiva é caracterizado por uma redução da sensibilidade auditiva, afetando principalmente as altas frequências, de 2.000Hz a 6.000Hz2,3.

A Tabela 2 demonstra os valores obtidos no IPRF sem ruído competitivo, antes e após a exposição à música eletronicamente amplificada. Esta etapa obteve maior número de acertos nos três procedimentos realizados, sendo que todos os indivíduos pesquisados apresentaram o IPRF superior a 92%. Resultados semelhantes foram encontrados por Caporali e Silva10, em seus estudos, porém com ruído ("cocktail party") e população diferentes.

Fletcher (1953) citado por Schochat11 verificou a relação entre energia e inteligibilidade de fala, observando que as altas frequências contribuem com 60% de inteligibilidade e 5% de energia de fala, enquanto que nas frequências baixas a concentração de energia é maior e a inteligibilidade menor, sendo assim o que mais interfere no reconhecimento de fala são as altas frequências, o que revelou o presente estudo, pois a inteligibilidade de fala foi prejudicada mesmo sem haver rebaixamento das frequências baixas.

Com relação ao IPRF realizado na presença de ruído competitivo do tipo babble na relação S/R de + 5 dB (Tabela 3), pode-se notar uma piora nos resultados do mesmo, se comparados com a realização do teste sem ruído competitivo, antes e após a exposição à música eletronicamente amplificada. Apesar das alterações de inteligibilidade de fala encontradas não serem muito significativas, nota-se que houve mudança nestes dois critérios utilizados para verificar as possíveis alterações na inteligibilidade de fala dos sujeitos, tais como a presença de um ruído competidor e a exposição a níveis elevados de pressão sonora.

Vários autores têm apontado para a importância da relação S/R utilizada nos testes de fala, sendo que quanto maior esta relação, isto é, a fala em maior intensidade do que o ruído, melhor será a inteligibilidade de fala do indivíduo12-15. Na literatura há divergências entre os autores quanto às diferentes relações S/R a serem utilizadas nos testes de fala na presença de ruído competitivo. Por exemplo, Costa12 relata que a relação S/R ideal dependerá muito do material a ser utilizado, e que valores entre +5 e +12 seriam bem adequados para se trabalhar com monossílabos e mascaramento com sons de fala. Para Schochat e Pereira13, esta relação pode variar de -10 a +20dB. Costa, Iorio e Albernaz16, após realizarem uma pesquisa para padronização de um teste de fala com listas de sentenças na presença de ruído, com indivíduos normais, estimaram a relação S/R de -11dB para que os indivíduos reconhecessem 50% dos estímulos de fala.

Na literatura consultada, não foi encontrada nenhum estudo referente a testes de inteligibilidade de fala, comparando sexo feminino e masculino, da mesma forma que realizou-se neste estudo apenas comparações entre indivíduos jovens e idosos, indivíduos com perda auditiva e normais, comparando os diferentes tipos de PAIR, entre outros10,13,17.

No entanto, neste trabalho, pode-se notar que o sexo masculino apresentou melhor desempenho nos testes realizados na presença de ruído competitivo nas duas relações S/R utilizadas, enquanto o sexo feminino teve o melhor desempenho quando o mesmo teste foi realizado sem a presença de ruído competitivo.

Mantelatto e Silva14 relatam que o aumento do nível do ruído provoca um maior esforço do indivíduo para identificar palavras, sendo provável que processos cognitivos e de memória estejam envolvidos nesta tarefa. E acrescentam que em uma situação de escuta difícil, a fala ouvida passa a ser determinada por outros fatores além do sinal acústico, dentre eles análise do contexto (frases), expectativa do ouvinte, os recursos de atenção e componentes de memória.

O reconhecimento de fala no ruído pode ser visto como uma tarefa que demanda tanto o uso da memória, como o da atenção seletiva, porque o ouvinte precisa focar a atenção na mensagem e guardar a informação de fala na memória, enquanto ignora a informação não relevante10.

Porém, durante a realização do teste, eventuais interferências na atenção do indivíduo podem ocorrer, comprometendo o seu desempenho ou aumentando a variabilidade dos resultados: a ansiedade diante de uma situação de teste; o cansaço dos indivíduos ou qualquer desconforto físico sentido pelos mesmos; e as falsas respostas positivas, onde o indivíduo responde corretamente por suplência mental16.

Na última aplicação do teste, após 14 horas de repouso acústico, nota-se que alguns indivíduos tiveram um decréscimo no resultado, podendo ter ocorrido pelos fatores já descritos anteriormente. Os mesmos, porém, apresentaram uma orelha melhor, confirmando o efeito de aprendizagem, devido à memória utilizada para gravar a palavra que lhe foi dita e repeti-la. Por isso, quanto mais vezes for realizado o teste, num determinado período de tempo, verificou-se que melhor desempenho terá o indivíduo.


CONCLUSÃO

Podemos concluir a partir dos dados obtidos que conforme a relação sinal/ruído (S/R) decresce, os indivíduos pioram o seu desempenho quanto à inteligibilidade de fala. E esse desempenho tende a piorar ainda mais depois que os mesmos são expostos a elevados níveis de pressão sonora.

Pode-se perceber também neste estudo que o sexo feminino teve um desempenho melhor na realização do IPRF sem presença de ruído competitivo e o sexo masculino teve melhor desempenho na realização do IPRF na presença de ruído competitivo nas duas relações S/R utilizadas: +5 e -5dB.

Verificou-se ainda o efeito de aprendizagem dos sujeitos na 3a aplicação do teste, pois todos apresentaram melhor desempenho, já que as listas foram repetidas várias vezes.

Ressalta-se deste modo à importância de pesquisas que incluam o uso de ruído competitivo nos testes de fala em indivíduos expostos a níveis elevados de pressão sonora, pois este representa a real desvantagem vivenciada pelos indivíduos nas situações de escuta cotidiana.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1. Especialista em Audiologia Clínica e Educacional pelo Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais - HRAC da Universidade de São Paulo - USP. Fonoaudióloga da Fundação para o Estudo e Tratamento das Anomalias Craniofaciais - FUNCRAF.
2. Mestre em Distúrbios da Comunicação, pela Universidade Tuiuti do Paraná. Docente do Curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário de Maringá - CESUMAR. Centro Universitário de Maringá - CESUMAR.

Endereço para correspondência:
Jéssica Kuchar
Av. Niepce da Silva, s/n, Centro
84620-000 Cruz Machado PR

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 17 de dezembro de 2006. cod. 3560
Artigo aceito em 11 de março de 2010

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