Ano: 2010 Vol. 76 Ed. 1 - Janeiro - Fevereiro - (23º)
Seção: Relato de Caso
Páginas: 137 a 137
Candidose hiperplásica em palato desenvolvida por contato à glossite romboide mediana
Hyperplastic candidosis on the palate developed as a
Autor(es): Vivian Cunha Galletta1, Márcia S Campos2, Silvio K Hirota3, Dante A Migliari4
Palavras-chave: candidíase bucal, diagnóstico bucal, doenças da língua.
Keywords: oral candidiasis, oral diagnosis, tongue diseases.
INTRODUÇÃO
Candidose crônica hiperplásica (CCH) afeta predominantemente homens adultos em áreas de comissura de mucosa jugal e menos frequentemente nas superfícies laterais da língua e palato. Fumo e fricção oclusal são os fatores locais mais comuns associados a CCH.1 Este artigo relata caso de CCH no palato resultante de candidose associada à glossite romboide mediana, caracterizando um evento incomum conhecido como lesão especular.
RELATO DE CASO
Paciente do gênero masculino, leucoderma, de 41 anos de idade foi encaminhado à clínica de Estomatologia com diagnóstico histopatológico de candidose hiperplásica com displasia moderada, em palato. Clinicamente havia presença de placa branca de cerca de 2 cm de diâmetro, com halo eritematoso, não removível à raspagem (Figura 1a). Além da lesão em palato, foi observada uma área atrófica eritematosa sobreposta por placa branca em dorso de língua, com formato similar à lesão em palato, sugestiva de candidose associada à glossite romboide mediana (Figura 1b). Exame citológico e coloração por PAS confirmaram a presença de hifas de Candida.
Figura 1. Apresentação inicial mostrando placa branca em mucosa de palato (A) e a lesão oposta no dorso de língua (B). Notar o contorno similar das lesões.
O paciente não apresentava antecedentes de doença sistêmica nem relatou uso de medicação sistêmica ou tópica. Exames laboratoriais foram negativos para anemia, diabetes e infecção por HIV. O paciente era usuário de prótese parcial removível que não tinha contato com a lesão do palato. Paciente era fumante, mas não etilista crônico.
Tratamento com gel oral de miconazol 20mg, 3 vezes por dia, durante 4 semanas, contribuiu para resolução significativa de ambas as lesões. Exames citológicos das duas áreas após o tratamento mostraram ausência de Candida, e nova biópsia da lesão residual em palato revelou hiperqueratose sem displasia.
DISCUSSÃO
CCH é uma variante distinta de infecção por Candida por normalmente apresentar displasia epitelial. Clinicamente, a CCH varia de lesões nodulares pequenas a placas brancas homogêneas não removíveis à raspagem. O tratamento para CCH é realizado com agentes antifúngicos seguido de reavaliação clínica periódica do paciente, já que este tipo de candidose tem sido relacionado à transformação maligna.1,2
Poucos relatos de infecção por Candida em palato associada à glossite romboide mediana são encontrados na literatura, embora a disseminação da infecção seria um evento esperado devido ao contato permanente da língua com a mucosa de palato.3 A tendência de não ocorrer a disseminação da infecção resulta provavelmente pela resistência da mucosa do palato à aderência e colonização de hifas associada à ação de lubrificação e limpeza da saliva.
Neste relato de caso o único fator local etiológico encontrado para a CCH no palato foi a candidose em dorso de língua associada à glossite romboide mediana. Apesar do hábito do fumo ter sido investigado como possível fator predisponente, acredita-se que o mesmo não causou a infecção fúngica, pois o paciente manteve o hábito durante 16 meses de acompanhamento clínico e não teve recorrência das lesões.4
COMENTÁRIOS FINAIS
O diagnóstico de CCH baseado em exame histológico é dificultado pelas características similares a leucoplasias infectadas por Candida. Ainda permanece controverso se a Candida possui papel primário na etiologia da CCH ou se invade uma lesão queratótica preexistente. Remissão total das lesões após tratamento antimicótico confirmaria o diagnóstico de CCH, embora lesões residuais com esbranquiçamento de mucosa em variadas intensidades têm sido descritas, especialmente em palato duro.5 O caso relatado apresentou redução significativa da lesão em palato após tratamento antimicótico, com redução da espessura do epitélio e ausência de displasia ou hifas de Candida.
Candidose do palato é normalmente causada por fatores locais (p.ex., próteses maxilares, higiene bucal deficiente ou inalação de esteroides), mas condições sistêmicas podem favorecer seu desenvolvimento.1 Uma vez estes fatores etiológicos mais comuns são excluídos, a presença de glossite romboide mediana associada à Candida deve ser investigada como possível causa da candidose em palato, caracterizando a denominada lesão "especular".6
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Sitheeque MAM, Samaranayake LP. Chronic hyperplastic candidosis/candidiasis (Candidal Leukoplakia). Crit Rev Oral Biol Med. 2003;14:253-67.
2. McCullough MJ, Savage NW. Oral candidosis and the therapeutic use of antifungal agents in dentistry. Aust Dent J. 2005;50(suppl 2):S36-S39.
3. Whitaker B, Singh BB. Cause of median rhomboid glossitis. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1996;81:379-80.
4. Soysa NS, Ellepola ANB. The impact of cigarette/tobacco smoking on oral candidosis: an overview. Oral Dis. 2005;11:268-73.
5. Lamey PJ, Lewis MAO, MacDonald DG. Treatment of candidal leukoplakia with fluconazole. Br Dent J. 1989;166:296-8.
6. Brown RS, Krakow AM. Median rhomboid glossitis and a "kissing" lesion of the palate. Oral Surg Oral Med Oral Pathol.1996;82:472-3.
1. Mestre Profissional em "Lasers em Odontologia", LELO-IPEN, Universidade de São Paulo, Doutoranda em Diagnóstico Bucal, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo.
2. Mestre em Ciências Biológicas, UNIVAP, Doutoranda em Patologia Bucal, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo.
3. Mestre em Diagnóstico Bucal, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, Doutorando em Diagnóstico Bucal, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo.
4.Livre-Docente pelo Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, Professor Associado, Disciplina de Semiologia Bucal, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo.
Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo.
Endereço para correspondência:
Vivian Galletta
Disciplina de Semiologia Bucal, Departamento de Estomatologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo
Av. Prof. Lineu Prestes, 2227 - Cidade Universitária
São Paulo - SP - Brasil - 05508-900.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 27 de julho de 2007. cod. 4686.
Artigo aceito em 11 de setembro de 2007.