Ano: 2009 Vol. 75 Ed. 5 - Setembro - Outubro - (28º)
Seção: Relato de Caso
Páginas: 769 a 769
Tumor fibroso solitário da cavidade nasal
Solitary fibrous tumor of the nasal cavity
Autor(es): Gisele Alborghetti Nai1, Gabriel Cardoso Ramalho Neto2
Palavras-chave: cavidade nasal, epistaxe, tumor fibróide.
Keywords: nasal cavity, epistaxis, fibroid tumor.
INTRODUÇÃO
O tumor fibroso solitário (TFS) é uma neoplasia mesenquimal, descrita por Klemperer e Rabin1 em 1931. Acomete principalmente a pleura, mas tem sido descrito na bexiga urinária, extremidades, tórax e abdome, pulmão, rim, próstata, meninges, mediastino e cabeça e pescoço2.
Na cabeça e pescoço, pode acometer a órbita, glândulas salivares, partes moles, pálpebras, cavidade oral e nasal, nasofaringe, retrofaringe, orofaringe e tireóide 3,4.
Apresentamos o vigésimo quinto caso de TFS da cavidade nasal da literatura mundial e o segundo da literatura latino-americana.
APRESENTAÇÃO DO CASO
Homem de 54 anos com queixa de epistaxe. A tomografia computadorizada (TC) de crânio mostrou grande massa expansiva em fossa nasal (Figura 1).
Figura 1 - A - TC de crânio mostrando grande massa expansiva da fossa nasal (seta). B - Fotomicroscopia mostrando neoplasia fusocelular e colageinizada, com fendas vasculares (coloração de hematoxilia-eosina, aumento de 100x). C - Imunoistoquímica mostrando positividade das células neoplásicas para o marcador CD34 (aumento de 400x).
O paciente foi submetido à biópsia, porém devido ao intenso sangramento durante o procedimento, o material coletado foi escasso para diagnóstico. Posteriormente, realizou-se cirurgia com retirada total do tumor.
Macroscopicamente, a massa media 6x4x4 cm, era bem delimitada, branca e fibrosa; aos cortes, apresentava extenso infarto hemorrágico.
Microscopicamente, a neoplasia era hipocelular, constituída por células fusiformes, em meio a denso estroma colageinizado, com grande número de espaços vasculares (Figura 2). Não se observou atividade mitótica no tumor.
A imunoistoquímica definiu o diagnóstico de TFS, mostrando células neoplásicas positivas para os marcadores CD34 (Figura 3) e vimentina e negatividade para citoceratina AE1/AE3 (marcador epitelial), HHF35 (actina de músculo liso) e proteína S100 (marcador neural).
O paciente teve boa evolução clínica no pós-operatório, sem recidivas após um ano e meio da cirurgia.
DISCUSSÃO
O TFS é uma neoplasia incomum. Numerosos termos usados para descrevê-lo refletem as controvérsias iniciais sobre sua histogênese. Inicialmente foi considerado uma neoplasia de origem submesotelial1 ou mesotelial e atualmente é considerado um tumor mesenquimal com achados de diferenciação miopericítica, fibroblástica e miofibroblástica, justificando os casos extrapleurais.
O diagnóstico deste tumor pode ser difícil fora da pleura devido à variabilidade de sua histologia. Os achados microscópicos característicos são: padrão de crescimento estoriforme, células fusiformes sem atipias, alternância de áreas densamente celulares com áreas hipocelulares e vascularização ramificada proeminente semelhante à dos hemangiopericitomas. No estudo imunoistoquímico, expressam difusamente vimentina e proteína CD34, focalmente bcl-2 e CD99 e são negativos para marcadores de células musculares e epiteliais2.
O presente caso se enquadra nos aspectos referentes à incidência e tamanho dos TFS, que ocorrem em indivíduos adultos, sem preferência por sexo, com idade média de 50 anos e medem de 3 a 5 cm nos maiores eixos.
Os TFS nasais tipicamente levam à obstrução nasal e casualmente à epistaxe, rinorréia, anosmia, cefaléia, dor facial e distúrbios visuais por compressão da órbita3. Nosso paciente apresentava apenas queixa de epistaxe, sintoma este, ainda não descrito de forma isolada.
Baseado nos sintomas e nas imagens radiológicas, os diagnósticos diferenciais clínicos para os TFS da cavidade nasal são: fibrossarcoma, hemangiopericitoma e carcinoma nasofaríngeo.
No presente caso, devido à hipocelularidade do tumor, das extensas áreas colageinizadas, da ausência de atipias celulares e da idade do paciente, os principais diagnósticos diferenciais são: leiomioma, miofibroma/miofibromatose, fibroma e hemangiopericitoma. Os leiomiomas são caracterizados por células fusiformes arranjadas em fascículos anastomosantes uniformes e expressam, pela imunoistoquímica, HHF35; os miofibromas/miofibromatose e fibromas podem ser muito colageinizados, porém expressam vimentina, HHF35 e actina músculo específica e são negativos para CD34; os hemangiopericitomas são mais celulares e sua positividade para CD34 é focal e mais fraca do que nos TFS.
A ressecção cirúrgica completa é curativa na maioria dos casos. A possibilidade de sangramento profuso durante a ressecção ou em biópsias iniciais, como ocorreu em nosso caso, deve ser considerada.
A natureza predominantemente benigna dos TFS nasais e extrapleurais contrasta com o comportamento mais agressivo observado em 23% dos tumores pleurais3. Seu prognóstico pode ser baseado na presença ou ausência de achados histológicos de malignidade, como alta celularidade, índice mitótico maior que 4 mitoses por 10 campos de grande aumento, presença de necrose e pleomorfismo celular. Entretanto, estes achados não levam, necessariamente, a um comportamento maligno clinicamente. Apenas um caso de TFS nasal descrito na literatura apresentava achados de malignidade, mas foi ressecado sem recorrência4. No presente caso, os achados histológicos favoreciam um curso benigno do tumor, como ocorreu.
COMENTÁRIOS FINAIS
O TFS, embora incomum, deve ser lembrado no diagnóstico diferencial das neoplasias da cavidade nasal, sendo o diagnóstico definitivo realizado através de estudo imunoistoquímico associado à histopatologia compatível.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Klemperer P, Rabin CB. Primary neoplasm of the pleura: a report of five cases. Arch Pathol. 1931;11:385-412.
2. Morimitsu Y, Nakajima M, Hisaoka M, Hashimoto H. Extrapelural solitary fibrous tumor: clinicopathologic study of 17 cases and molecular analysis of p53 pathway. APMI. 2000;108(9):617-625.
3. Hicks DL, Moe KS. Nasal solitary fibrous tumor arising from the anterior cranial fosse. Skull Base. 2004;14(4):203-207.
4. Kohmura T, Nakashima T, Hasegawa Y, Matsura H. Solitary fibrous tumor of the paranasal sinuses. Eur Arch Otorhinolaryngol. 1999;256(5):233-236.
1 Especialista, Professora.
2 Especialista, Médico otorrinolaringologista.
Faculdade de Medicina - Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE)
Endereço para correspondência:
Gisele Alborghetti Nai
Laboratório de Anatomia Patológica - UNOESTE
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Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 13 de julho de 2007. cod. 4655.
Artigo aceito em 11 de setembro de 2006.