Versão Inglês

Ano:  2009  Vol. 75   Ed. 4  - Julho - Agosto - (20º)

Seção: Artigo Original

Páginas: 593 a 615

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Fatores de risco associados ao Schwannoma do nervo vestibular: revisão sistemática

Risk factors associated with vestibulocochlear nerve schwannoma: systematic review

Autor(es): Ana Paula Corona1, Jacqueline Carneiro Oliveira2, Fábia Pinheiro Andrade de Souza3, Liane Viana Santana4, Marco Antônio Vasconcelos Rêgo5

Palavras-chave: fatores de risco, nervo vestíbulo-coclear, schwannoma.

Keywords: risk factors, vestibulocochlear nerve, schwannoma.

Resumo:
O Schwannoma do nervo vestibular (SV) é um tumor benigno que se origina da bainha de Schwann do VIII par craniano. É o tumor benigno intracraniano mais frequente, de baixa letalidade e etiologia obscura. Objetivo: Identificar fatores de risco associados ao SV. Desenho do estudo: Revisão sistemática. Material e Método: Identificação de estudos em bases de dados eletrônicos utilizando as palavras-chaves "risk", "risco", "schwannoma", "vestibular", "neuroma" e "acoustic". Incluíram-se artigos originais de pesquisa epidemiológica publicados em português, espanhol ou inglês, que referiam alguma medida de associação. Foram comparados e analisados aspectos metodológicos e resultados dos estudos. Resultados: Foram localizados 20 estudos do tipo casocontrole, sendo a maioria publicada nos Estados Unidos. A análise dos estudos revela como fatores de risco para o SV o nível educacional, renda familiar, ocupação, exposição à radiação ionizante e ao ruído, doença alérgica e uso de telefone celular e fixo sem fio. Conclusões: Limitações metodológicas e imprecisão dos achados impõem limites a conclusões definitivas sobre os fatores de risco associados ao SV. O presente estudo contribui com informações que podem subsidiar decisões metodológicas para novas investigações sobre fatores de risco para SV e, assim, colabora para o avanço do conhecimento na área.

Abstract:
The vestibulocochlear nerve schwannoma (VS) is a benign tumor that stems from the edge of the Schwann´s sheath. It is considered the most frequent intracranial benign tumor, of low lethality rate and unknown etiology. Aim: to identify risk factors associated with VS. Study design: systematic review. Methods: electronic search of studies using the following key words: "risk", "schwannoma", "vestibular", "neuroma" and "acoustic". All original articles on epidemiological studies published in Portuguese, English or Spanish describing measures of association were included. Results: twenty case-control studies were found, most of them published in the United States. The analysis of those studies shows educational level, household income, occupation, exposure to ionizing radiation and noise, allergic diseases as well as the use of both cellular and cordless phones as risk factors for the VS. Conclusion: methodological limitations and lack of precision in the findings impose limits to definitive conclusions concerning those risk factors. The current study contributes with information which can subsidize decisions related to the methodology to be used, having in mind new investigations on risk factors for VS. Therefore, it is of great help for knowledge improvement in this field.

INTRODUÇÃO

O Schwannoma do nervo vestibular (SV) é um tumor benigno que se origina da bainha de Schwann de um dos nervos vestibulares. É considerado o mais frequente dos tumores benignos intracranianos, representando 90% das lesões da região do ângulo pontocerebelar e 8 a 10% de todos os tumores cranianos. Em cerca de 95% dos casos é unilateral. Os casos bilaterais são geralmente relacionados à Neurofibromatose tipo II1-5. Esse tumor surge, na maioria dos casos, entre os 20 e 60 anos. Seu aparecimento não está relacionado a uma raça específica1,4,5 e é mais comum em mulheres, numa relação de 3:2. No entanto, a apresentação unilateral do tumor parece ser mais comum em homens6.

A taxa de incidência mundial varia de um a 20 por 1.000.000 de habitantes por ano. Nos Estados Unidos1,3 e Dinamarca7 a estimativa é de dez casos por 1.000.000 de habitantes/ano. No Brasil, não há estimativas de sua incidência. No entanto, considerando estas estatísticas, acredita-se que 1.700 casos novos por ano poderiam ser diagnosticados. Contudo, essa taxa pode ser maior, pois esses números referem-se apenas aos casos sintomáticos4.

Apesar de não ser um tumor maligno e apresentar baixa letalidade, a suspeita e a investigação diagnóstica ocorrem somente quando surgem os primeiros sinais e sintomas. No entanto, mesmo com o diagnóstico precoce, a extirpação cirúrgica do SV pode deixar sequelas, como a perda auditiva profunda e paralisia facial1,3,4.

A etiologia do SV ainda é obscura. Aparentemente, a única causa estabelecida é um defeito no gene NF-2 do braço longo do cromossomo 22, responsável por produzir a proteína schwannoniana, que regula a divisão das células de Schwann4. Esse defeito pode ser observado em pacientes com Neurofibromatose tipo II, mas ainda não foi comprovado em pacientes com SV unilateral.

Atualmente, diferentes fatores associados a tumores cerebrais têm sido investigados como possíveis causas para o SV. A condução de estudos com o intuito de identificar fatores associados ao desenvolvimento do SV é uma tarefa recente e não há relatos de investigações conduzidas no Brasil. Desta forma, o objetivo desta revisão sistemática é discutir os principais achados de estudos epidemiológicos que analisaram a associação entre fatores de risco diversos e SV.


MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo de revisão sistemática sobre fatores de risco associados ao SV. O objeto de estudo foi a produção científica existente em periódicos indexados em bancos de dados eletrônicos. Para a busca dos artigos foram acessadas as bases de dados eletrônicas Cohrane, Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), National Library of Medicine (MEDLINE) e SciELO, através do site http://www.bireme.br/php/index.php. A combinação dos termos "risk", "risco", "schwannoma", "vestibular", "neuroma" e "acoustic", nos resumos, foi utilizada para a identificação dos artigos. Após esta etapa, foi realizada a leitura de todos os resumos localizados, e selecionados os artigos de acordo com os critérios de inclusão e exclusão definidos para o estudo.

Foram incluídos apenas artigos originais de pesquisa epidemiológica, publicados em português, espanhol ou inglês, de 1966 a novembro de 2006, que investigaram fatores de risco associados ao SV e que referiam alguma medida de associação. Todos os artigos de revisão de literatura, relatos de caso ou cartas e editoriais, bem como os artigos que descreveram procedimento diagnóstico, técnica cirúrgica e complicações pós-operatórias foram excluídos. Os artigos de estudos epidemiológicos que investigaram fatores de risco para os tumores cerebrais e que apresentaram resultados para o SV agrupados com outro tipo de tumor também foram excluídos.

Para cada um dos artigos selecionados, foi realizada a descrição do delineamento do estudo obedecendo a um roteiro que incluiu local, período, desenho e base do estudo, população de estudo, origem e critérios para seleção da amostra, fator de risco investigado e aferição da exposição. Também foi realizada a análise dos aspectos metodológicos a fim de discutir aspectos relacionados com a validade, poder e vieses. Para tanto, também foi verificado o tamanho amostral, faixa etária dos participantes, taxa de resposta de participação, uso de respondentes substitutos, variáveis dos estudos e controle de variáveis de confusão. Esta avaliação foi realizada sem o auxílio de modelos já descritos na literatura, pois a partir da verificação dos aspectos a serem avaliados nesse estudo, observou-se que as propostas publicadas são mais adequadas para a análise de ensaios clínicos. Os resultados dos estudos selecionados que investigaram o mesmo fator de risco para o SV foram agrupados e desta forma, os valores mínimos e máximos das medidas de associação e intervalos de confiança foram apresentados. Para tanto, quando as variáveis dos estudos foram estratificadas de forma diferente foi necessária a criação de novos estratos de análise. Finalmente, os resultados obtidos nas investigações foram descritos e analisados através das medidas de associação e intervalos de confiança.


RESULTADOS

Foram identificados 265 artigos, dos quais 20 foram selecionados. Os principais motivos para exclusão dos artigos foram a abordagem de técnicas cirúrgicas (34%), revisão de literatura (13,9%) e relato de casos (12,7%).

Todos os estudos analisados foram do tipo casocontrole, sendo 11 de base hospitalar e nove de base populacional. O estudo de Inskip et al.8, caso controle multicêntrico de base hospitalar, deu suporte para o desenvolvimento de mais nove outros estudos (Brenner et al.9; De Roos et al.10; Inskip et al.11; Inskip et al.12; Rajaraman et al.13; Hill et al.14; Kleinerman et al.15; Rajamaran et al.16; De Roos, et al.17). Já o estudo de Lönn et al.18, caso controle de base populacional, propiciou mais uma investigação em relação a fatores de risco para o SV (Edwards et al.19) (Tabelas 1 e 2).







O primeiro artigo incluído nesta revisão foi publicado em 1989 e a maioria deles (75%) foi publicada a partir de 2003. Os Estados Unidos contribuíram com 12 artigos, a Suécia com seis artigos e a Dinamarca e a Grã-Bretanha, cada um deles, com um artigo.

Dezoito estudos incluíram somente casos incidentes. Muscat et al.20 e Forséen et al.21 não referiram essa informação. A maioria dos estudos (80%) descreveu que o SV foi confirmado histologicamente ou por exames de imagem. Em dois artigos (Lönn et al.18; Schoemaker et al.22), há apenas a informação de que os casos foram diagnosticados ou identificados através dos serviços de saúde e em um (Forséen et al.21) os casos foram recrutados com o auxílio do registro nacional de câncer.

Em sete estudos de base populacional a seleção dos controles foi realizada com a utilização de dados provenientes do registro populacional e em um destes foram também utilizados dados adicionais oriundos de clínicas médicas. Já no estudo de Rodvall et al.23, o registro paroquial foi utilizado para a seleção dos controles e no estudo de Preston-Martin et al.24 os vizinhos dos casos participaram da amostra. Da totalidade dos estudos de base populacional, somente cinco descrevem que os controles foram aleatoriamente selecionados. Para todos os estudos de base hospitalar foi observado que os indivíduos que compuseram o grupo controle foram admitidos nos mesmos hospitais dos casos com uma variedade de condições não-malignas.

Em dois estudos foi observado que a aferição da exposição não se restringiu às informações prestadas pelos indivíduos entrevistados. Preston-Martin et al.24 validaram as informações obtidas em relação à exposição a RX dentário pela comparação com registros odontológicos. Já para o ruído ocupacional, os mesmos autores, apenas consideraram expostos os indivíduos que relataram ocupações listadas pela pesquisa nacional de riscos ocupacionais dos Estados Unidos (NOHS) como aquelas que envolvem a exposição a elevados níveis de pressão sonora. No estudo de Rajamaran et al.13, em que a ocupação foi analisada como fator de risco para o SV, os 121 grupos ocupacionais criados foram baseados em manuais que codificam e classificam as ocupações no país.

O número mínimo de participantes foi de 36 e máximo de 793 para os casos e 44 e 101.762, respectivamente, para os controles. Na maioria dos estudos a média de idade dos casos e controles foi similar, variando, em geral, de 20 a 70 anos. A menor taxa de participação entre os casos foi observada no estudo de Rajamarn et al.16 (68%) e o estudo de Schoemaker et al.22 teve a menor taxa de resposta entre controles (61%). Nos demais estudos esta taxa oscilou de 76% a 98% (casos) e entre 64% a 86% (controles).

Em três estudos foi observada uma menor participação dos indivíduos do grupo controle, gerando uma diferença de indivíduos participantes superior a 20% em relação aos casos18,19,22 e em outros três estudos a taxa de participação dos casos de SV foi apresentada juntamente com a de outros tipos de tumor9,23,25. Respondentes substitutos foram entrevistados em oito estudos8,9,12-15,19,23 e em quatro deles a participação foi de no máximo 4%, e similar entre os grupos caso e controle8,9,12,14. Todos os estudos realizaram controle de variáveis de confusão, sendo que as variáveis sexo e idade foram testadas em todos eles.

Nas Tabelas 3 e 4 são apresentadas as associações positivas e negativas entre diversas variáveis e o SV, respectivamente. Observou-se, em relação às variáveis que revelaram associação negativa, que somente uma (colchão de água com aquecedor) foi estatisticamente significante.







A história familiar de câncer, investigada por Hill et al.14, não representa um fator de risco para o desenvolvimento do SV, pois somente foram encontradas no estudo de associações positivas não estatisticamente significantes (NES) (estômago, cólon, próstata, qualquer tumor maligno) ou associações negativas (pulmão e mama). O mesmo pode ser observado na investigação da lateralidade como fator de risco, ou seja, para indivíduos canhotos observase associação positiva (NES), e para os ambidestros ou ambidestros e canhotos, associação negativa.

Verificou-se que quanto maior o nível educacional e a renda familiar, maior a medida de associação (Inskip et al.12). Para os demais indicadores sociodemográficos (renda familiar auto-referida, tipo de seguro médico, estado civil, religião e local de nascimento) foram observadas associações positivas (NES) ou associações negativas.

Quanto à exposição ao RX dentário as estimativas do risco foram contraditórias; em um estudo observou-se associação negativa23 e em outro, aumento do risco24. Já, em relação à obturação foi observada somente associação negativa23.

A exposição a ruído revelou associação positiva com o SV. No entanto, quando foi considerada na análise a exposição ocupacional ou não-ocupacional foram observados achados não estatisticamente significantes23,24. Os autores também verificaram aumento do risco para o aparecimento do tumor tanto para a exposição a ruído contínuo como para o de impacto. O tempo de exposição ao ruído igual ou superior a 15 anos revelou associação positiva para mulheres23. Nos demais estratos e para homens foram observadas associações positivas (NES). A análise do período de latência revelou, para períodos inferiores a 13 anos, associação negativa e, para períodos iguais ou superiores a 13 anos, aumento do risco quanto maior o período de latência19.

A febre do feno, a alergia a outras substâncias (plantas, poeira ou animais) e a alergia alimentar também apresentaram risco para o aparecimento do SV9. Em relação à febre do feno, indivíduos que obtiveram o diagnóstico da doença alérgica com idade superior a 30 anos e aqueles em que a doença durou por um período inferior a 30 anos apresentaram medida de associação positiva. Para as demais alergias e doenças autoimunes analisadas foram observadas associações positivas (NES), ou associações negativas (eczema, alergia a medicamentos e produto químico, artrite reumatóide, lúpus eritematoso, diabetes e qualquer doença autoimune).

Forssén et al.21 conduziram estudo para a investigação do papel da exposição ocupacional a campos magnéticos de baixa frequência. Os resultados indicaram associações positivas (NES). No entanto, quando os autores estratificaram por sexo, associação negativa foi revelada para as mulheres expostas a até 0,30?T, considerando qualquer tempo de exposição. Kleinerman et al.15 investigaram o risco de exposição a ondas eletromagnéticas oriundas de aparelhos eletro-eletrônicos de uso domiciliar e observaram associações positivas (NES) para secador de cabelo, micro-ondas, escova de cachear, massageador e computador.

O polimorfismo de alguns genes (GST, CYP2E1, ALAD, EPHX1 e NQO1) foi estudado por De Roos et al.10,17 e Rajamaran et al.16, já que estes participam do metabolismo de várias substâncias químicas, como chumbo, hidrocarbonetos aromáticos e outros solventes, cujo papel na etiologia de diversos tumores cerebrais tem sido investigado. Os autores observaram associações (NES) ou associações negativas para todos os genes e variantes analisados. De Roos et al.10 também analisaram estes fatores de acordo com a idade e observaram associação positiva entre o polimorfismo do gene CYP2E1 Rsal em indivíduos com idade inferior ou igual a 40 anos (OR= 8,1; IC 95% 1,7 - 38,9). De Roos et al.17, no estudo conduzido em 2006, também realizaram análise de acordo com a idade incluindo as variáveis sexo e hábito de fumar e verificaram que o polimorfismo do gene NQO1 P187S CT ou TT apresenta risco para o SV em indivíduos do sexo masculino (OR= 4,8; IC 95% 1,8 - 12,8). Verificaram-se também associações positivas (NES) para três dos cinco genes analisados no estudo entre os fumantes (CYP1B1 V432L GG, EPHX1 Y113H CC e NQO1 P187S CT ou TT).

Rajamaran et al.13 estudaram o papel da ocupação na etiologia do SV. Para tanto, distribuíram os participantes em 121 grupos ocupacionais. Para esta revisão sistemática somente foram listados os grupos ocupacionais compostos por mais de cinco indivíduos. Para indivíduos que sempre trabalharam como atendentes de posto de gasolina, compradores, representantes de vendas, professores e instrutores foram observadas associações positivas com o SV. Já para mecânicos e ajudantes, serralheiros, recreadores e professores de educação física associações positivas (NES) foram reveladas. Foi observada associação negativa para cozinheiros e ajudantes de cozinha, administrador/gerente, enfermeira, assistente e atendente em hospital, auxiliar de escritório, profissionais de escritório, vendedores e caixas, garçom e barman.

Entre sete estudos, quatro descreveram associação negativa para o uso regular do telefone celular8,18,20,26. A análise do tempo, em anos, do uso regular do telefone celular nesses estudos revelou associações positivas, mas não estatisticamente significantes, ou associações negativas nos diferentes estratos considerados. Entretanto, se o tempo de uso for analisado considerando-se somente os estratos com menos de cinco anos e mais de cinco anos, os resultados são contraditórios. Os estudos de Lönn et al.18 e Christensen et al.26 revelam associação negativa para períodos inferiores há cinco anos e no estudo de Inskip et al.8 tanto associação negativa como positiva (NES).

O uso cumulativo do telefone celular foi analisado por Schoemaker et al.22 e Christensen et al.26 e os resultados para períodos inferiores ou superiores a cinco anos também são contraditórios, ora revelando associação negativa, ora indicando associação positiva (NES). Em 2003, Hardell et al.25 observaram que um período de latência superior a 10 anos para o uso do telefone celular analógico representa fator de risco para o SV. Já na publicação de 200527, os resultados indicam forte associação para períodos de latência inferiores há 10 anos. Em relação ao tempo de uso desde o primeiro uso regular do telefone celular analógico, os autores observaram associação positiva (NES), para os períodos iguais ou superiores a 10 anos. No entanto, considerando o período de 5 a 9 anos, o estudo de Lönn et al.18 revela associação positiva (NES), e a investigação conduzida por Schoemaker et al.22 revela associação negativa. Para o telefone celular de tecnologia digital foi verificada associação positiva somente para período de latência de cinco até 10 anos27.

A análise da associação entre o lado de utilização do telefone celular e o SV revelou aumento do risco independente do lado de utilização para aparelhos celulares analógicos25,27 e a utilização ipsi ou ipsi/contralateral para o telefone celular digital27. No entanto, nos estudos de Inskip et al.8 e Muscat et al.20, embora a tecnologia do telefone celular não tenha sido considerada na análise, não foi observada relação entre o lado de uso do telefone celular e o lado do tumor.

Na Tabela 5 são apresentados os casos, de acordo com o tempo de exposição, e as medidas de associação entre o SV e o telefone celular. Nenhum estudo avaliou um longo tempo de exposição ou um longo período de latência e todos têm reduzido número de casos nos estratos que representam maior período de exposição. As demais variáveis (média de uso diário em minutos, ano de início de uso, primeiro sistema tecnológico do telefone celular utilizado, uso cumulativo, e em anos, do número de chamadas) revelam associações positivas (NES) ou associações negativas.




Dois estudos analisaram o uso de telefone sem fio25,27. Para períodos de latência > 1 ano até 10 anos, foi observada associação positiva (NES) ou associação negativa de acordo com a nova categorização determinada para esta revisão sistemática. Entretanto, quando foi observada a estratificação original dos estudos para esta variável, foi verificado aumento do risco para períodos de latência maiores que cinco anos e inferiores a 10 anos no estudo de 2003 (OR= 1,3; IC 95% 1,01-1,7). No estudo de 200543 este achado não foi confirmado (OR= 1,4; IC 95% 0,6-3,2). Para períodos de latência superiores a 10 anos ambos os estudos indicaram associação negativa. Em relação ao lado de uso do telefone sem fio e a localização do tumor, foi observado que o uso ipsilateral revelou associação positiva com o SV somente na investigação conduzida no ano de 200527.


DISCUSSÃO

A etiologia do SV ainda é obscura e são raras as investigações conduzidas em relação a fatores de risco para este tumor. Dos 265 estudos identificados para a realização desta revisão sistemática, somente 7,5% representam investigações referentes a fatores de risco ambientais, ocupacionais ou genéticos para o SV.

Observa-se que a investigação de fatores de risco para o SV é uma tarefa recente e pode estar relacionada ao avanço dos recursos diagnósticos e consequente elevação da taxa de incidência, os quais ofereceram instrumentos para as investigações e despertaram para a lacuna no conhecimento em relação à etiologia desse tumor. O presente estudo restringiu-se a uma revisão sistemática, não sendo possível a realização de uma metanálise, pois as variáveis estudadas nas investigações selecionadas foram categorizadas de formas distintas ou em estratificações não comparáveis.

Associação entre fatores de risco e o Schwannoma do nervo vestibular

Nos 20 estudos analisados observou-se o papel de 15 diferentes exposições para o desenvolvimento do SV. Destas, somente sete se configuraram como fatores de risco para o tumor, isto é, revelaram pelo menos uma vez associação positiva estatisticamente significante (nível educacional, renda familiar, ocupação, febre do feno e a exposição à radiação ionizante e não-ionizante e a elevados níveis de pressão sonora).

Inskip et al.12 observaram que o nível educacional (igual ou superior a quatro anos do terceiro grau) e a renda familiar (igual ou superior a 25.000 dólares) representam fatores de risco para o SV. Estes resultados são questionáveis e devem ser interpretados com cautela, pois indivíduos com maior nível de escolaridade e situação econômica mais favorável geralmente têm maior acesso a informações de saúde. Consequentemente, pode-se imaginar maior capacitação para reconhecer sinais e sintomas de doenças e um maior esclarecimento em relação a tratamentos e seus benefícios, os quais refletem na busca por cuidados médicos. Desta forma, o nível educacional pode se configurar como uma variável de confusão e não é surpresa que em cinco dos estudos selecionados os resultados obtidos tenham sido ajustados por esta variável.

A proximidade da arcada dentária com o crânio tem levado à especulação de que a exposição ao RX dentário pode estar associada ao desenvolvimento de tumores cerebrais. Preston-Martin et al.24 investigaram essa exposição e observaram uma associação positiva para RX anual, antes ou depois dos 25 anos. Este achado corrobora o aumento de risco para tumores cerebrais, entre eles o SV, observado em estudos com sobreviventes da bomba atômica no Japão28 e com indivíduos que na infância receberam radiação ionizante para o tratamento de afecções do couro cabeludo, amígdalas e em outras áreas do crânio ou pescoço29.

Entretanto, os resultados de Preston-Martin et al.24 não foram confirmados no estudo de Rodvall et al.23, no qual associação negativa foi observada para indivíduos que realizaram RX dentário até uma vez ao ano. No entanto, os resultados de Rodvall et al.23 devem ser interpretados com prudência, pois além de uma amostra pequena de casos (36), os autores relataram que a qualidade dos dados de exposição foi comprometida em função da pobreza dos registros odontológicos dos indivíduos.

Estudos epidemiológicos sobre radiação ionizante instituem esta exposição como um fator etiológico para tumores em adultos. Segundo Harley30, a exposição à radiação ionizante frequentemente danifica a estrutura do DNA e este dano está diretamente ligado à dose de exposição e à estrutura química afetada. Estudos experimentais com células de mamíferos revelam que o dano ao DNA pode ocorrer pela ruptura de uma ou da dupla hélice do DNA e também pela quebra da ligação química entre as moléculas que o compõe.

Brenner et al.9 observaram associação positiva entre a febre do feno, a alergia a outras substâncias (plantas, poeira ou animais) e a alergia alimentar e o SV. Os autores discutem que a associação com a febre do feno pode estar refletindo uma maior investigação diagnóstica e consequente descoberta acidental do tumor devido à sintomatologia de disfunção tubária e otite média decorrente do quadro de rinite alérgica. No entanto, os autores não descartam a possibilidade de que o tratamento realizado para a febre do feno ou a própria alergia, em virtude da hiperestimulação do sistema imunológico, promovam o desenvolvimento do tumor. A associação observada entre alergia a outras substâncias e a alergia alimentar e o SV pode ser questionada, pois somente foi considerado na classificação de expostos e não expostos o auto-relato dos indivíduos. Não há relatos na literatura de outros estudos sobre o papel da história de doença alérgica para o desenvolvimento do SV. Entretanto, estudos anteriores31,32 descreveram uma redução de risco para glioma, mas não para meningioma, em indivíduos com história de doença alérgica.

Os estudos de Preston-Martin et al.24 apontam para a associação entre o SV e exposição ocupacional a ruído em homens. Da mesma forma, os resultados de Edwards et al.19, avaliando indivíduos de ambos os sexos, indicam aumento do risco para o tumor. Estes resultados dão suporte para a hipótese de que o trauma acústico, decorrente da exposição a elevados níveis de pressão sonora, contribui para a tumorogênese. Estudos experimentais com roedores têm demonstrado que o ruído de impacto causa dano mecânico ao órgão de Corti e tecidos vizinhos, incluindo o VIII nervo33,34 e as células de Schwan (JT Corwin, comunicação pessoal apud Edwards et al.19). Corwin & Cotanche35 e Ryals & Rubel36, em estudos com galinhas e codornas, confirmam que as células sensoriais do ouvido são destruídas e subsequentemente regeneradas após o trauma acústico. Desta forma, é plausível que o SV seja decorrente do trauma mecânico causado por exposição a níveis elevados de pressão sonora e do consequente processo de reparo celular, no qual a divisão de células determina a replicação de erros no DNA e propicia a proliferação desordenada de células.

Preston-Martin et al.24 e Edwards et al.19 também analisaram o tipo de ruído e observaram aumento do risco tanto para o ruído de impacto como para o ruído contínuo, sendo a medida de associação mais elevada para o primeiro. Os autores verificaram para períodos iguais ou superiores a 13 anos, aumento do risco quanto maior o período de latência. Estes achados podem ser explicados, por analogia aos danos causados pelo ruído ao sistema auditivo, pelo fenômeno observado por Hammernik et al.33 em estudos experimentais com roedores. Os autores verificaram que o ruído de impacto pode destruir instantaneamente 60% da cóclea, enquanto que o ruído contínuo só causaria tal efeito após longos anos de exposição e também pela observação de que o ruído de impacto causou mais danos ao nervo e tecidos adjacentes.

Mais de um bilhão de pessoas utilizam telefone celular em todo mundo e estes números vêm crescendo rapidamente37. No Brasil, de acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL)38, em maio deste ano a telefonia móvel alcançou a marca de 105.090.535 milhões de assinantes. Desta forma, há um interesse público em relação aos efeitos da exposição a ondas de radiofrequência sobre a saúde. Os estudos sobre a associação entre telefone celular e o SV são controversos. Muitos dos estudos realizados apresentam limitações metodológicas e os resultados devem ser interpretados com cautela. Observou-se que os autores analisaram diferentes características desta exposição e também estratificaram de forma diferente as variáveis estudadas. Este fato dificultou a análise deste fator de risco e pode ser exemplificado na análise da variável uso cumulativo em horas. A totalidade dos estudos que analisaram esta variável8,18,20,22,25,27 estabelecem estratos diferentes e assim, os resultados revelam contradição, isto é, analisando períodos de horas de um estudo que estariam contidos em um determinado estrato de outro estudo, ora a variável estudada revela associação negativa para o SV, ora revela associações positivas sem significância estatística.

A análise dos estudos aponta para a associação entre o uso do telefone celular analógico e o SV25,27. No entanto, os achados são contraditórios, pois Hardell et al.25 observaram aumento do risco para o SV em usuário de telefone celular analógico por um período de latência superior a 10 anos. Já no estudo realizado em 2005 os resultados indicam forte associação para períodos de latência inferiores a 10 anos27. Entretanto, para o telefone celular de tecnologia digital foi verificada associação positiva somente no período de latência de cinco até 10 anos27. Embora a medida de associação em ambos os estudos indique forte associação com o SV e o uso do telefone celular, os resultados devem ser interpretados com cautela, pois os intervalos de confiança são amplos devido ao pequeno tamanho da amostra.

As ondas de radiofrequência emitidas durante o uso de aparelhos de telefone celular são absorvidas pela pele e ossos ao redor do ouvido e podem elevar a temperatura dos tecidos39,40. Este fenômeno gerou especulações de que um mecanismo térmico desencadeie ou acelere o crescimento de tumores cerebrais subclínicos41,42. Entretanto, deve-se considerar, segundo Rothman et al.43, que este incremento na temperatura é pequeno, em torno de 0,1º a 0,2ºC, e que as ondas de radiofrequência são atenuadas rapidamente na passagem através dos tecidos, tanto que menos de 10% da energia emitida penetra até 4-6 centímetros no crânio.

Estudo recente dos efeitos da exposição a campos eletromagnéticos de radiofrequência44 revelou aberrações cromossômicas em fibroblastos e aumento de radicais livres intracelular. Estes achados permitem concluir que ondas de radiofrequência podem ativar genes que apresentam importante papel na divisão, proliferação e diferenciação celular e oferecem suporte para a hipótese de mutações genéticas no desenvolvimento de doenças crônicas, como o câncer, devido ao uso do telefone celular.

A análise da associação entre o lado de utilização do telefone celular e o SV revelou aumento do risco independente do lado de utilização para aparelhos celulares analógicos4125,27 e a utilização ipsi ou ipsi/contralateral para o telefone celular digital27. Em virtude do uso do telefone celular ser próximo à região temporal é plausível a hipótese que esta característica da exposição possa estar relacionada com o desenvolvimento do tumor. No entanto, os achados dos estudos não apontam somente o aumento do risco do SV com o uso do telefone celular ipsilateral ao lado do tumor. Desta forma, é pouco provável que a taxa de absorção explique a ocorrência contralateral do tumor. Os achados nestes estudos podem ter sido influenciados pela presença de perda auditiva e zumbido unilateral, característico da doença, pois esta pode alterar o padrão de uso e consequentemente, causar interferência nas respostas ao questionário.

Observou-se que todos os estudos que consideraram as variáveis tecnologia, latência e lado de uso do telefone celular simultaneamente, apresentaram resultados que indicam associação positiva com o SV18,22,25,27.

Os estudos que analisaram a exposição a telefone fixo sem fio e o risco para o SV também encontraram associação positiva de acordo com o período de latência e o lado de uso do aparelho (ipsilateral). No entanto, estas associações revelam contradição, pois enquanto comportam-se como fator de risco em um dos estudos27, no outro revelam associações negativas25. De acordo com Hardell et al.27 o uso de telefone fixo sem fio não tem sido discutido como um fator de risco para tumores cerebrais nos estudos conduzidos em relação à exposição à radiação não-ionizante. No entanto, os achados do autor, associação positiva estatisticamente significante com o uso ipsi lateral ao lado do tumor, não podem ser explicados por um viés de memória.

Os achados do estudo conduzido por Rajamarm et al.16, no qual a ocupação foi investigada, devem ser interpretados com cautela devido ao reduzido número de indivíduos em cada grupo ocupacional. Além disso, deve-se considerar que para as ocupações que revelaram associação positiva com o SV (atendentes de posto de gasolina, compradores, representante de vendas, professores e instrutores) os autores não discutem as prováveis exposições características que possam estar relacionadas ao desenvolvimento do tumor. Entretanto, observa-se que em todas estas ocupações os indivíduos apresentam um maior contato com o público e desta forma, pode-se supor que estes indivíduos podem obter maiores informações sobre sinais e sintomas de doenças e consequentemente refletir na busca por diagnóstico e na descoberta acidental do tumor.

Limitações metodológicas dos estudos epidemiológicos que investigaram fatores de risco associados ao Schwannoma do nervo vestibular

Dentre os estudos analisados, as limitações observadas para a obtenção de resultados conclusivos foram tamanho reduzido da amostra14,16,23, maior taxa de participação entre os casos18,19,22, utilização de controles hospitalares8- 10,12,13,15,17,22 e não cegamento de entrevistadores para a condição caso e controle dos indivíduos9,19,24.

Como o SV é uma doença relativamente rara1,3,4 o desenho de estudo eleito, em todos os artigos analisados, foi o caso-controle. Apesar da recomendação da escolha deste tipo de estudo para doenças de baixa incidência45, são frequentes as críticas em relação a este desenho em função da susceptibilidade aos vieses45,46.

Um dos aspectos a serem considerados na análise da consistência dos achados dos estudos é o tamanho amostral46,47. Nem sempre a determinação do tamanho da amostra é uma tarefa fácil e muito menos a obtenção do número desejável de indivíduos para conferir um bom poder estatístico ao estudo. Em três dos 20 estudos selecionados foi observado tamanho reduzido da amostra, e chamou a atenção que nenhum dos estudos analisados referiu a realização de cálculo para o tamanho amostral. Desta forma, os achados destas investigações são questionáveis e não esclarecem o papel dos fatores de risco estudados no desenvolvimento do SV.

A maior participação de indivíduos do grupo caso do que do grupo controle, como foi observado em outros três estudos, pode induzir um viés de seleção nos estudos, pois a premissa de representatividade da população a que o estudo se propõe não é contemplada46,47.

As limitações de memória, sempre presentes em qualquer estudo que busca informações sobre eventos que ocorreram no passado, estão diretamente relacionadas com as habilidades cognitivas dos respondentes. Em muitas situações é necessário contar com a participação de respondentes substitutos, o que torna a qualidade das informações questionável. Não há relatos na literatura que indiquem comprometimento cognitivo em portadores do SV48 e desta forma, a participação de respondentes substitutos pode ser minimizada, como foi observada em quatro dos estudos selecionados8,9,12,14.

O intervalo de tempo entre a exposição, o diagnóstico da doença e a época de realização da entrevista também podem influenciar na capacidade de recordação dos indivíduos. O SV apresenta crescimento, sinais e sintomas variáveis e, desta forma, o diagnóstico pode ser retardado e consequentemente determinar um intervalo de tempo maior entre a exposição e a doença. Dos estudos analisados, três relataram que a entrevista com os casos foi realizada logo após o diagnóstico14,15,27.

As informações em relação às exposições passadas também podem ser fragilizadas em virtude do significado emocional e social dos eventos investigados e pelo detalhamento requerido em relação a estes eventos. Essa suposição não foi observada nas investigações que testaram a associação do telefone celular e o SV, já que o detalhamento em relação à tecnologia, lado de uso e período de latência contribuíram para a determinação deste fator como de risco para a doença.

O diferencial de respostas obtidas no grupo caso e controle pode induzir a um viés de memória. Este pode ocorrer em virtude dos casos apresentarem, normalmente, mais motivação para o relato de possíveis exposições do que controles sadios e também pelo fato de os casos terem mais oportunidade de pensar sobre possíveis causas para a doença em função das consultas e exames médicos realizados. Em relação aos estudos de caso-controle de base hospitalar pode-se conjeturar que este viés de ruminação foi minimizado, pois os controles foram admitidos nos mesmos hospitais dos casos com uma variedade de condições não-malignas. No entanto, esta aparente vantagem pode também ser uma limitação46,47,49,50, pois os controles apresentam diagnósticos variados e fazem uso de medicações diversas que podem também de alguma forma estar relacionados com a doença em estudo. Por exemplo, Brenner et al.9, no estudo sobre a relação entre história de alergia e doença autoimune e SV, não investigaram a utilização de medicamentos e, desta forma, os autores não descartam a interferência destes nos resultados obtidos. O cuidado em excluir os controles que apresentam enfermidade que poderiam estar relacionadas com a hipótese do estudo foi observado em uma das investigações selecionadas16.

A realização de estudos de caso-controle com casos incidentes é recomendada para minimizar um possível viés de sobrevivência. A maioria dos estudos analisados (18) incluiu somente casos incidentes e em dois deles não há relato se os casos eram incidentes ou prevalentes. O SV é um tumor benigno que apresenta baixa taxa de letalidade1,2,4 e desta maneira não há risco de perda de indivíduos da amostra durante a realização da pesquisa e assim, casos prevalentes também podem ser incluídos.

Os juízos de conhecimentos e valores dos entrevistadores também podem interferir nas respostas dos indivíduos e gerar distorções nos resultados. Esta preocupação foi visível na maioria dos estudos analisados, pois foram realizados treinamentos com os entrevistadores e cegamento destes em relação à condição do entrevistado, isto é, se era caso ou controle. Estas medidas buscam minimizar o efeito de um possível viés de aferição. Nos estudos de Brenner et al.9, Preston-Martin et al.24 e Edwards et al.19 não foi possível o cegamento dos entrevistadores em relação à condição dos participantes. No entanto, no primeiro eles não foram informados sobre a hipótese do estudo e nos demais houve treinamento dos entrevistadores.

Problemas com a mensuração da exposição aos fatores de risco investigados

A aferição de fatos passados para estimar a exposição a um determinado fator de risco, além de sofrer a influência do viés de memória45, está diretamente relacionada com o instrumento utilizado e a técnica de coleta. A maioria dos estudos selecionados para esta revisão sistemática (14) utilizou somente questionários para a aferição da exposição e em apenas cinco as informações coletadas foram validadas empregando outras fontes de dados. Em 17 estudos realizaram-se entrevistas pessoais, o que possibilita a interação entre pesquisador e entrevistado e auxilia no esclarecimento quanto a possíveis dúvidas que possam surgir devido à dificuldade de compreensão por parte do entrevistado. Outra vantagem existente nesta técnica é que a aplicação dos questionários pelo pesquisador garante que todos eles serão preenchidos na íntegra minimizando a exclusão de indivíduos devido a dados incompletos.

Dos dois estudos que investigaram o fator de risco radiografia dentária para o SV, ambos utilizaram questionários para obter informações em relação ao número de radiografias realizadas e, em um deles, estes dados foram validados pelos registros odontológicos dos indivíduos. Entretanto, nenhum dos estudos apresenta dados em relação à dose de exposição à radiação.

A validação das informações prestadas pelos indivíduos também foi realizada em apenas um dos estudos que investigaram o risco da exposição a elevados níveis de pressão sonora para o SV. Para este estudo somente foram considerados expostos os indivíduos que relataram ocupações listadas pela pesquisa nacional de riscos ocupacionais dos Estados Unidos (NOHS) como aquelas que envolvem a exposição a elevados níveis de pressão sonora. Já no estudo em que a história familiar de câncer foi investigada, os autores não confirmaram os casos de câncer relatados pelos indivíduos.

Em relação à mensuração da exposição a elevados níveis de pressão sonora deve-se considerar ainda o fato de que trabalhadores expostos a ruído podem desenvolver perdas auditivas e, portanto, normalmente, realizam exames periódicos em maior número do que a população em geral. Este fato pode facilitar o diagnóstico e aumentar a taxa de incidência do tumor nesta população específica. Além disso, há a possibilidade destes indivíduos estabelecerem uma relação entre a exposição e a doença e desta maneira determinar uma maior precisão nas respostas. Na estimativa da exposição ao ruído, a investigação de potenciais confundidores ou modificadores de efeito também deve ser considerada, pois em muitas ocupações há exposição concomitante a produtos químicos. Esta preocupação foi observada em somente um dos estudos analisados que investigaram o fator de risco exposição ao ruído.

Os resultados obtidos nos estudos que investigaram o papel da história de doença alérgica e autoimune devem ser interpretados com cautela, pois os autores não realizaram a aferição da exposição a medicamentos utilizados pelos indivíduos, os quais podem atuar como confundidores ou modificadores de efeito das associações. Cabe salientar que para apenas uma das doenças alérgicas investigadas o diagnóstico médico foi considerado para a classificação dos expostos.

As investigações sobre telefone celular e telefone sem fio também utilizaram apenas questionários para a aferição da exposição. A inconsistência dos resultados e a contradição das evidências destes estudos podem estar relacionadas ao fato da recente introdução da telefonia móvel no mercado, ou seja, a relação temporal entre a mensuração da exposição e a doença pode não contemplar o período de latência para o desenvolvimento do tumor. Além disso, é provável que o reduzido número de indivíduos nos estratos com maior tempo de exposição também tenha contribuído para a dispersão e inconsistência dos resultados. Esta particularidade também foi observada no estudo que investigou a associação da ocupação e o SV, pois os autores criaram 121 grupos ocupacionais para a classificação da exposição e em muitos deles havia número reduzido de participantes.

Outro aspecto a ser analisado é a tecnologia do telefone celular utilizado pelos indivíduos. Nos primeiros anos, após a introdução da telefonia móvel no mercado, só estavam disponíveis ao consumidor aparelhos de tecnologia analógica e, atualmente, dispõe-se também da tecnologia digital. A banda de frequência de operação utilizada por celulares analógicos e digitais é diferente e informações precisas em relação ao uso de uma ou outra tecnologia é desejável. No entanto, a investigação desta exposição pode não ser precisa em função do desconhecimento da tecnologia utilizada pelo usuário e também pela dificuldade em recordar o tempo de utilização de cada uma das tecnologias. Ainda há de se considerar a possibilidade do uso de ambas, bem como a interrupção do uso do telefone celular, por um determinado período. Desta forma, é provável que uma maior precisão em relação à exposição ao telefone celular somente seja alcançada pela validação das informações prestadas pelos indivíduos com dados de operadoras de telefonia móvel. Considerando o fato de o SV ser um tumor geralmente unilateral, a caracterização da exposição ao telefone celular deve considerar o lado de utilização. Entretanto, a aferição desta exposição nem sempre é precisa, pois perdas auditivas ou zumbido unilaterais podem alterar o padrão de uso do telefone celular.

A exposição a ondas eletromagnéticas oriundas de aparelhos de uso domiciliar também foi investigada através de questionários que abordaram o tempo e a frequência de uso de diferentes equipamentos. Entretanto, na delimitação deste tempo não foi considerada a interrupção do uso, pois esta característica não foi investigada.

A investigação da lateralidade dígito manual como fator de risco para o SV foi realizada através de duas perguntas simples apresentadas pessoalmente aos participantes no momento de admissão nos hospitais. Nesta aferição de exposição deve-se considerar a influência de fatores socioculturais para a determinação ou modificação da lateralidade dígito-manual.

Em relação à aferição da exposição a diferentes indicadores sociodemográficos, além das respostas prestadas pelos indivíduos, dados censitários em relação à renda familiar foram considerados na classificação dos expostos e não expostos. Para os demais fatores investigados somente o relado dos entrevistados foi considerado para a classificação da exposição.


CONCLUSÕES

O nível educacional (igual ou superior a quatro anos do terceiro grau) e a renda familiar (igual ou superior a 25.000 dólares), ocupação, febre do feno e exposição à radiação ionizante e não-ionizante e a elevados níveis de pressão sonora representam fatores de risco para o SV, de acordo com as medidas de associação apresentadas nos estudos analisados. Entretanto, a análise da qualidade metodológica e da precisão dos achados, através do intervalo de confiança, bem como da plausibilidade biológica entre a exposição e o desfecho, sugerem como fatores de risco mais importantes as exposições à radiação ionizante (radiografia dentária) e não-ionizante (telefone celular) e a elevados níveis de pressão sonora. Embora os estudos que revelam estes fatores como de risco para o SV tenham sido mais bem conduzidos do ponto de vista metodológico e os achados revelem maior precisão, deve-se avaliar que o período de latência para o desenvolvimento do tumor, o número reduzido de expostos e os problemas com a aferição da exposição ainda não deixam claro o papel destes fatores na etiologia da doença. Desta forma, futuras investigações são necessárias para uma melhor compreensão dessa questão, cujos achados podem auxiliar na elaboração de ações preventivas, bem como contribuir para o diagnóstico precoce, anterior ao aparecimento de sinais e sintomas e, consequentemente, influenciar na redução de sequelas advindas da intervenção cirúrgica.


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1 Especialização, Professora do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal da Bahia.
2 Graduação, Fonoaudióloga clínica.
3 Graduação, Fonoaudióloga clínica.
4 Graduação, Fonoaudióloga clínica.
5 Doutorado, Professor Adjunto do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia.
Universidade Federal da Bahia.
Endereço para correspondência: Ana Paula Corona - Departamento de Fonoaudiologia, Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Bahia Avenida Reitor Miguel Calmon, s/n, Vale do Canela, Salvador BA 44110-000.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 19 de novembro de 2007. cod. 5275
Artigo aceito em 21 de fevereiro de 2008.

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