Versão Inglês

Ano:  2003  Vol. 69   Ed. 2  - Março - Abril - (20º)

Seção: Relato de Caso

Páginas: 273 a 276

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Condrossarcoma nasal: relato de caso

Nasal chondrosarcoma: a case report

Autor(es): Fábio de Rezende Pinna[1],
Christian Wiikmann1[],
Daniel Chung[2],
Marcus Miranda Lessa[2],
Richard Louis Voegels[3],
Ossamu Botugan[4]

Palavras-chave: condrossarcoma, neoplasia maligna nasal, condroma.

Keywords: chonsdrosarcoma, nasal malignous tumors, condroma.

Resumo:
O condrossarcoma é uma neoplasia maligna proveniente de tecido cartilaginoso, cuja incidência em região de cabeça e pescoço é rara. É mais freqüente em pacientes do sexo masculino, entre a terceira e quarta décadas, e na face localiza-se no seio e osso maxilar, sendo raro no septo nasal. Esse relato descreve o caso de uma paciente do sexo feminino, de 13 anos de idade, que apresentava queixa de deformidade facial em região malar direita acompanhada de dores esporádicas. Ao exame físico apresentava um abaulamento de aproximadamente 3 cm de diâmetro em região malar esquerda, não sendo notada nenhuma alteração à rinoscopia anterior. Foram realizadas tomografia computadorizada (TC) de seios paranasais, ressonância magnética de face e biópsia da lesão para estudo anatomopatológico, que inicialmente sugeria o diagnóstico de condroma. Após a exérese da massa, a paciente evoluiu com recidiva da lesão em apenas 5 meses. Diante deste fato surpreendente, foi requisitada a revisão da lâmina que evidenciou Condrossarcoma tipo I. Nova cirurgia foi realizada, visando a remoção do tumor, com tratamento radioterápico complementar. Atualmente, a paciente se encontra em acompanhamento ambulatorial, sem queixas álgicas e sem sinas de recidiva. Os condrossarcomas são tumores malignos de crescimento lento, mas localmente agressivos, tendo grande propensão a recidivas. A conduta é preferencialmente cirúrgica, uma vez que são pouco radiossensíveis e a quimioterapia é meramente paliativa. O objetivo deste estudo é apresentar um caso de condrossarcoma em seio maxilar, etmóide, esfenóide e septo, discutindo o quadro clínico, diagnóstico, fatores prognósticos e conduta.

Abstract:
Chondrosarcoma is a malignous cartilage tumor, which rarely involves Head and Neck. The tumor mainly affects males during the third and fourth decades of life. In the face, it's often situated in the maxillary sinus and bone and rarely found in the nasal septum. In this study, we describe a thirteen-year-old patient who was admitted because of a right malar facial deformity unusually painful. On the physical examination we found a 3cm-length deformity in the left malar, associated with a normal anterior rinoscopy. In order to diagnose this deformity, the patient was submitted to a paranasal sinus computadorized tomography (CT), face magnetic resonance and a lesion biopsy, which initially revealed condroma. This mass was surgically excised and reappeared five months later. Because of this unusual phenomenon, we requested a lamina revision, which revealed Chondrosarcoma type 1. Therefore, a new surgery was performed objecting total tumor excision. In addition, the patient was sent to radiotherapy sessions. One year later from the last surgery, the patient is still assimptomatic without any sign of tumor regrowth. Chondrosarcomas are malignous slow growing tumors, but locally aggressive. As a matter of fact, they are very likely to regrow. The treatment is often surgery, since they are low radiosensitive and chemiotherapy is merely palliative. The objective of this study is to show a chondrossarcoma case in the maxillas, etmoid and sphenoid sinus and septum, discussing its clinical presentation, diagnoses, treatment and prognoses.

Introdução

O condrossarcoma é uma neoplasia maligna de crescimento lento proveniente de tecido cartilaginoso. Apresenta localização pouco freqüente na região da cabeça e do pescoço, sendo mais comum em pelve, fêmur, costelas, úmero, escápula, fíbula, sacro e esterno1.

Acredita-se que apenas 10 a 12% dos condrossarcomas estejam situados na região de cabeça e pescoço2 e configuram apenas 4% de todos os tumores não epiteliais da cavidade nasal, seios paranasais e rinofaringe3. Apresenta uma incidência maior em pacientes do sexo masculino numa razão de 2:1, sendo geralmente diagnosticado ao redor da terceira e quarta décadas de vida1,2. Na face localiza-se mais freqüentemente no osso maxilar2, seio maxilar e mais raramente no septo1. Os situados no osso temporal apresentam maior sobrevida, enquanto que aqueles localizados no seio maxilar estão relacionados a pior prognóstico2.

Apresentação do caso clínico

Uma paciente do sexo feminino de 13 anos de idade procurou nosso Serviço com queixa de obstrução nasal bilateral progressiva há 2 anos. Não havia história de emagrecimento, epistaxe, disfagia, dispnéia e outras doenças. Um ano após o início do quadro, notou deformidade facial na região malar à direita, com dores fortes e esporádicas. Ao exame físico, além da deformidade facial de aproximadamente 3 cm de diâmetro que abaulava a região malar direita, observamos uma massa ocupando toda a fossa nasal direita. A tumoração não era visualizada na rinoscopia anterior, entretanto no exame nasofibroscópico notava-se uma massa de coloração pálida ocupando toda a porção posterior da fossa nasal e coana esquerda, que desviava o septo nasal a ponto de ocluir a outra coana.

Foram realizadas tomografia computadorizada (TC) e ressonância nuclear magnética (RNM) de seios paranasais. Tais exames revelaram a presença de lesão sólida com contornos bocelados nos 2/3 posteriores do septo nasal, seio maxilar, etmóide posterior e anterior, corpo do esfenóide e seio correspondente, além de preencher completamente ambas as coanas (Figuras 1 e 2). Junto ao corpo do esfenóide à direita notava-se uma solução de continuidade com o seio cavernoso. Havia também em meio ao componente sólido algumas calcificações que poderiam corresponder a matriz cartilaginosa. Na RNM, não era possível perceber invasão intracraniana nem de outras estruturas (Figura 3).

Optamos, então, pela realização da biópsia da massa que resultou em condroma nasal. Logo após o laudo anatomopatológico, programamos a exérese cirúrgica do tumor, que foi realizada pela via Caldwell-luc ampliada com remoção completa da massa em fragmentos. O tumor teve a sua porção medial descolada do septo e a supero-posterior do esfenóide. Macroscopicamente, o tumor era de consistência endurecida e de coloração esbranquiçada. Após 5 meses, notamos sinais de recidiva na TC de controle e decidimos então revisar o exame anatomopatológico. Desta vez, o diagnóstico firmado foi de Condrossarcoma grau I e optamos novamente pela exérese cirúrgica do tumor, retirando a porção médio posterior do septo nasal e realizando descolamento do tumor da parede lateral do seio esfenóide esquerdo, do assoalho da fossa nasal esquerda e da parede anterior do seio maxilar esquerdo. No sétimo dia pós-operatório evidenciamos, na TC de controle, uma lesão residual no seio esfenóide esquerdo e região póstero inferior do septo (Figuras 4 e 5). Foi feita uma última abordagem cirúrgica para a ressecção dos resquícios do tumor por via endonasal.

A paciente manteve-se assintomática desde então e na TC de controle, do sexto mês pós-operatório (Figuras 6 e 7), não havia sinais de recidiva. Logo após a cirurgia, a paciente foi encaminhada para realizar radioterapia e deverá realizar uma nova TC em 6 meses.

FIGURAS



Figura 1. TC de seios paranasais, corte coronal, pré-operatório.


Figura 2. TC de seios paranasais, corte axial, pré-operatório.


Figura 3. RNM de seios paranasais, corte coronal, pré-operatório.


Figura 4. TC de seios paranasais, corte coronal, logo após a segunda cirurgia.


Figura 5. TC de seios paranasais, corte axial, logo após a segunda cirurgia.


Figura 6. TC de seios paranasais, corte coronal, controle após a última cirurgia.


Figura 7. TC de seios paranasais, corte axial, controle após a última cirurgia.


Discussão

Os condrossarcomas são tumores malignos de crescimento lento, mas localmente agressivo, tendo uma grande propensão a recidivas. Representam 10 a 20% dos tumores malignos ósseos primários. Os fatores predisponentes principais não foram encontrados em nossa paciente e são a exostose múltipla hereditária, a doença de Ollier e a síndrome de Marfucci.2

O caso em questão merece notoriedade por diversas peculiaridades: O condrossarcoma é uma neoplasia rara em cabeça e pescoço, e menos freqüente ainda em mulheres. O quadro clínico é muito variado podendo apresentar obstrução nasal, dor local, epistaxe, sinusite, proptose, embaçamento visual e cefaléia. O seu aparecimento em septo nasal é uma condição muito rara, existindo apenas 12 casos descritos na literatura. Também não se tem descrito o aparecimento deste tumor na idade dessa paciente. Geralmente atinge pacientes variando entre 33 e 79 anos2.

O diagnóstico é dado pelo exame anatomopatológico. É característico do condrossarcoma o encontro de células cartilaginosas gigantes com pleomorfismo nuclear e hipercromatismo3, compostos por múltiplos nódulos que se interconectam com tamanhos variados. O espaço intercelular pode ser de origem condróide ou mixomatosa4. A presença de mitoses não é necessária para o diagnóstico, e calcificações e ossificações representam erosões ósseas e não produção osteóide por células malignas. Geralmente os condrossarcomas causam destruição local por efeito de massa antes de invadir tecidos vizinhos. A disseminação hematogênica ocorre tardiamente3. O condrossarcoma possui similaridades histológicas com diversos outros tumores. Dentre eles, temos: fibroma condromixóide5,6, ostersarcoma, fibrossarcoma7, condromas e cordomas2.

Os condrossarcomas estão divididos em três graduações histológicas.(graus I, II, III), de acordo com o grau de diferenciação celular1,2,7,8. Esses graus de diferenciação celular são classificados de acordo com a taxa de mitose, celularidade e tamanho nuclear. A paciente em questão teve o diagnóstico de condrossarcoma grau I que pode muitas vezes se assemelhar a neoplasias benignas. Este tipo histológico é caracterizado por núcleos pequenos e densos, espaço intercelular predominantemente condróide, calcificações freqüentes e atividade mitótica ausente2,4. No grau II, temos núcleos com proporções maiores e tamanho moderado, com pequena taxa de mitose e o espaço intercelular é comumente mixóide. No grau III são encontradas duas ou mais mitoses em dez campos.

A sobrevida em cinco anos para os graus I, II e II é de 90%, 81% e 43%, respectivamente. Quando se considera a sobrevida em dez anos esses números caem para 83%, 64% e 29%. Não é relatada metástase no grau I, porém o grau II e III apresentam taxas de 10 e 71%4.

O prognóstico no condrossarcoma está relacionado a três fatores: localização, grau do tumor e grau de ressecabilidade. Dentre os localizados na cabeça e no pescoço, aqueles que se situam na nasofaringe e na cavidade nasal posterior têm o pior prognóstico, porque podem invadir a base do crânio mais precocemente2,3,8. O grau de diferenciação também é muito importante, sendo pior o prognóstico nos tumores de maior grau2,8.

O tratamento de escolha para o condrossarcoma é preferencialmente a exérese cirúrgica em bloco do tumor1-3,8. Os pacientes com condrossarcoma em seio paranasal que tiveram ressecção completa do tumor têm uma sobrevida de 57 a 62%. É recomendado um acompanhamento mínimo de dez anos3. Os condrossarcomas são pouco radiossensíveis e a radioterapia está reservada para os casos de recidiva, apresentação extensa, grau elevado ou lesões irressecáveis. Tomando o exemplo do Princess Margaret Hospital, onde a radioterapia pós-operatória é reservada em casos de tumores irressecáveis e os com margens2. A quimioterapia é meramente um saída paliativa para tumores agressivos com invasão local ou metástases1.

Referências Bibliográficas

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[1] Médico Pós-Graduando da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
[2] Médicos Residentes da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
[3] Professor Doutor da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
[4] Professor Associado da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Trabalho realizado na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência: Daniel Chung - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 6°andar sala 6021 05403-000 São Paulo SP. - Tel (0xx11) 3069-6288 - Fax (0xx11) 270-0299

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