Ano: 2008 Vol. 74 Ed. 5 - Setembro - Outubro - (25º)
Seção: Relato de Caso
Páginas: 794 a 796
Carcinoma adenóide cístico de conduto auditivo externo
Adenoid Cystic Carcinoma of the External Auditory Canal
Autor(es): Carolina Pimenta Carvalho1, Alano Nunes Barcellos2, Daniel Caldeira Teixeira3, Juliano de Oliveira Sales4, Rui da Silva Neto5
Palavras-chave: carcinoma adenóide cístico, glândulas salivares menores, meato acústico externo.
Keywords: carcinoma, adenoid cystic, salivary glands.
Resumo:
O carcinoma adenóide cístico é um raro tumor originado das glândulas salivares, principalmente quando se localiza no conduto auditivo externo. Apresenta alta taxa de invasão perineural e metástases, devendo ser tratado com combinação de cirurgia agressiva seguida de radioterapia. Relatamos um caso de carcinoma adenóide cístico de conduto auditivo externo em paciente de 77 anos com queixa de hipoacusia e otalgia. A mesma foi tratada com mastoidectomia radical e radioterapia.
Abstract:
Adenoid cystic carcinoma is a rare tumor originating from the salivary glands, especially when arise the external auditory canal. This tumor has high rate of perineural invasion and metastasis, then must be treated with aggressive surgery combined with postoperative radiation. We report a case of an adenoid cystic carcinoma arising the external auditory canal of 77 years old female patient, who complained hypoacusis and pain. She was treated by radical mastoidectomy and radiotherapy
INTRODUÇÃO
O carcinoma adenóide cístico é tumor raro, que corresponde cerca de 3-10% dos tumores de glândulas salivares e 1-4% de todas as neoplasias de cabeça e pescoço.1-4 É mais freqüentemente encontrado em glândulas salivares menores1-3, mas podem também ser vistos em glândulas lacrimais, árvore traqueobrônquica, mama, esôfago, além de conduto auditivo externo (CAE).2
A presença de tumores localizados no CAE é incomum, sendo o adenóide císticoa neoplasia de origem glandular mais freqüentemente encontrada.Manifesta-se com dor, hipoacusia, nodulação de crescimento lento. Caracteriza-se porinvasão perineural e metástases a distância, como outros adenóides císticos.5,6
CASO CLÍNICO
Trata-se de uma paciente de 77 anos com otalgia intensa à esquerda, há 6 meses, acompanhada de hipoacusia leve e nodulação em meato acústico externo a esquerda de crescimento progressivo. Ao exame, nota-se uma tumoração em parede superior do CAE, de consistência fibroelástica, doloroso à palpação, ocupando praticamente todo o diâmetro desse meato. Solicitada Tomografia Computadorizada de ossos temporais (Figura 1) que evidenciou lesão sólida, arredondada, de média densidade, com realce após injeção de contraste. Apresentava limites parcialmente definidos, medindo 1,46cm em seu maior diâmetro e localizada em região súpero-anterior do CAE esquerdo. Realizada cirurgia para ressecção tumor via intracanal. Anatomopatológico da peça mostrou tratar-se de carcinoma adenóide cístico, tipo histológico cribriforme e com margens comprometidas. Nova cirurgia foi realizada: mastoidectomia radical modificada, além exérese de todo conduto auditivo, incluindo região do tragus. O anatomopatológico desta vez mostrou-se livre de lesão. A paciente foi encaminhada para terapia complementar com radioterapia 4 semanas após cirurgia.
Figura 1. Carcinoma Adenóide Cístico de Conduto Auditivo Externo Esquerdo - Tomografia computadorizada de ossos temporais em cortes axiais (Sem e com contraste)
DISCUSSÃO
A existência de tumores em CAE é rara e apenas 20% destes são de origem glandular. A imensa maioria é composta por carcinomas de células escamosas. Porém, entre os glandulares, o adenóide cístico é o mais prevalente. Apresenta as mesmas características de carcinoma adenóide cístico de glândulas salivares menores,5,6 como crescimento insidioso, recorrência local, invasão perineural e metástases a distância tardias.1,3-5
Há divergência na literatura quanto ao sexo predominante: Triantafillidou K et al. afirmam ser mais freqüente em mulheres, enquanto Lucia A et al. mostra maior incidência de tumores no CAE no sexo masculino.1,5 Pode ocorrer em qualquer idade, porém há um pico na 5ª a 6ª década de vida.1 Manifestam-se com dor, hipoacusia, otorréia e nódulo no CAE, geralmente anos antes do diagnostico.5,6
O diagnóstico é feito através do exame anatomopatológico. Tem se avaliado o uso da punção aspirativa com agulha fina para auxiliar o diagnóstico pré-operatório.2
O tratamento de escolha é a mastoidectomia radical e ressecção de todo conduto auditivo com auxílio do congelamento para avaliar margens e invasão perineural.2,5,6 Deve-se ainda complementar com radioterapia pós-operatória, que aumenta muito a taxa de controle local do tumor (86% comparado com 11% da cirurgia isolada)1,3,4. Alguns autores preferem optar por radioterapia apenas em casos avançados, com invasão do tumor para base de crânio, metástases cervicais, invasão perineural, subtipo histológico sólido ou em tumores recorrentes.4-6
Esvaziamento cervical é reservado para os casos em que há nódulos positivos no pescoço, que ocorrem numa taxa de aproximadamente 4%.1,3,4 Metástases à distância são mais freqüentes, em torno de 48%, e ocorrem principalmente quando o tumor primário não foi adequadamente tratado.4 São comuns para pulmões, rins e vértebras.2 Apesar das metástases, os pacientes vivem por longos períodos, evidenciando a importância do controle local para diminuir a morbidade e manter a qualidade de vida do paciente.3
O prognóstico é pior quando há recorrência local, que é vista em 32% dos casos, quando há envolvimento perineural, da glândula parótida ou do tecido ósseo e em casos em que a margem é positiva ou tipo histológico sólido.1,2,4,6
CONCLUSÃO
O carcinoma adenóide cístico é tumor infreqüente, especialmente no CAE. Deve ser tratado com cirurgias radicais para aumentar chance de controle local da doença e até mesmo diminuir metástases à distância.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Triantafillidou K, Dimitrakopoulos J, Iordanidis F, Koufogiannis D. Management of Adenoid Cystic Carcinoma of Minor Salivary Glands. J Oral Maxillofac Surg 2006;64(7):1114-20.
2. Mohan H, Handa U, Amanjit, Kotwal AS, Dass A. Adenoid Cystic Carcinoma of the External Auditory Canal. A Case Report with Diagnosis by fine Needle Aspiration. Acta Cytol 2003;47(5):792-4.
3. Chen AM, Bucci MK, Weinberg V, Garcia J, Quivey JM, Schechter NR et al. Adenoid Cystic Carcinoma of Head and Neck Treated by Surgery with or without Postoperative Radiation Therapy: Prognostic Features of Recurrence. Int J Radiat Oncol Biol Phys 2006 1;66(1):152-9.
4. Santiago GS, Tapia JPR, Pendás JLL, Nieto CS. Factores Prognósticos en el Carcinoma Adenoide Quístico de Glândulas salivares. Acta Otorrinolaringol Esp 2005;56(8):361-7.
5. Lucia A, Gambardella T, Carra P, Motta G. A Case of Highly Aggressive Adenoid Cystic Carcinoma of the External Auditory Canal. Acta Otorhinolaryngol Ital 2004; 24(6):354-6.
6. Perzin KH, Gullane P, Conley J. Adenoid Cystic Carcinoma Involving the External Auditory Canal. A clinicopathologic sStudy of 16 cases. cancer 1982 15;50(12):2873-83.
1 Médica especializanda em otorrinolaringologia, 2º ano de especialização em ORL.
2 Médico especializando em otorrinolaringologia, 3º ano de especialização em ORL.
3 Médico especializando em otorrinolaringologia, 1º ano de especialização em ORL.
4 Médico especialista em otorrinolaringologia e cirurgia cérvico-facial, Preceptor da especialização de otorrinolaringologia do Hospital Socor.
5 Médico especialista em otorrinolaringologia, Chefe do serviço de otorrinolaringologia do Hospital Israel Pinheiro, IPSEMG. e preceptor de especialização de
otorrinolaringologia da Santa Casa de Belo Horizonte.
Hospital Socor.
Endereço para correspondência: Carolina Pimenta Carvalho - R. Augusto Moreira 237 apto. 202 Santa Amélia Belo Horizonte MG 31555-100.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 1 de outubro de 2007. cod.4834
Artigo aceito em 19 de fevereiro de 2008.