Refletindo sobre a "Declaração de Puebla"
Considerations about the "Puebla Statement"
Autor(es): Henrique Olival Costa
Palavras-chave: -
Keywords: -
"Considerando,
Que os setores da população deveriam participar das decisões que afetam à saúde individual e coletiva deles/delas;
Que é necessário multiplicar os espaços e oportunidades onde possam ser expressados interesses diferentes e onde consentimentos possam ser construídos em política de saúde;
Que a informação e o conhecimento ideal para a tomada de decisões para a promoção do bem-estar coletivo deveriam acontecer a partir de calendários formulados com participação cívica ampla;
Que a disseminação da informação técnica-científica e a diminuição das injustiças de acesso para a mesma são elementos essenciais para que as políticas de saúde sejam consolidadas;
Que as novas tecnologias de informação e comunicação baseadas na Internet, tem um papel fundamental na disseminação oportuna de informação pertinente para todos os cidadãos, também propiciando oportunidades de comunicação e troca entre eles;
Nos compremetemos,
A continuar construindo e promovendo a Biblioteca Virtual de Saúde (BVS) de um modo descentralizado e participativo, como uma plataforma dinâmica que facilite a produção, comunicação e uso de informação e conhecimento para apoiar à formulação e instalação de políticas públicas, no sentido de promover a saúde e combater a pobreza e as injustiças.
E, reconhecendo que as revistas Ibero-americanas e do Caribe não são muito representados nos bancos de dados internacionais, pretendemos desenvolver mecanismos apropriados de avaliação da produção científica nacional e regional.
Consideramos que alguns indicadores usados na atualidade não são satisfatórios para avaliar a investigação clínica e aplicada, em geral, em nossa região, e nos propomos a elaborar e aplicar os indicadores de qualidade de maneira a que considere nossa situação. Estes indicadores deverão ser difundidos nas BVS. E que a análise de indicadores de periódicos da produção científica promovida na região, seja feita a partir de bancos de dados regionais ou nacionais como LILACS e SciELO.
E, finalmente, considerando que a SciELO está selecionando e está representando as melhores revistas na área, aumentando notavelmente com isto sua acessibilidade e visibilidade, propomos que a inclusão das revistas científicas em SciELO um ponto de referência importante a ser considerado para a avaliação da produtividade científica e a qualidade das publicações originada por ela."
O que sintetizamos acima é parte do documento final de reunião regional para América Latina, Caribe, Portugal e Espanha que ocorreu no ínicio do mês de maio, em Puebla, no México, e que teve participação de diversos editores de revistas médicas de diversos países, além da presença maciça dos principais coordenadores e atores da atividade de banco de dados, indexação e avaliação de periódicos científicos de toda a região.
Como vemos, a tônica da reunião foi a capacidade que as revistas científicas apresentam em sustentar a tomada de decisões em saúde. Seja por sua qualidade e significância para quem delas se utiliza, como também pela capacidade dos investigadores e formuladores de políticas assistênciais e de saúde em acessa-las.
Esta tônica nos faz meditar sobre como a Revista Brasileira de Otorrinolaringologia vem se comportando nestes três aspectos e como os principais agentes do fomento à pesquisa como CAPES, CNPq e as diversas FAPEs têm se manifestado quanto à produção científica dentro das Instituições de Ensino Superior.
O primeiro dos ítens colocados em discussão é o fator qualidade. Fica bastante difícil argumentar quanto à qualidade do conteúdo das revistas em geral a partir dos índices colocados à nossa disposição nas agências internacionais, uma vez que o que temos, tanto no MEDLINE, quanto no ISI - as mais fortemente utilizadas e francamente favorecidas em nossas agências de fomento quando no julgamento da "qualidade" dos periódicos científicos e, consequentemente dos autores que lá publicam - não são índices baseados no conteúdo ou mesmo na maneira com que os editores asseguram a adequação do conteúdo publicado. O que estes índices mensuram é quantas vezes os artigos são citados em relação ao número total de artigos publicados pelo periódico por ano. Este índice, o fator de impacto (FI), foi criado por Garfield, no anos 60 do século passado, com o intuito meramente de avaliar o custo benifício para determinar o tamanho de uma revista, não sua qualidade.
Maneiras mais compreensivas de avaliar a qualidade de um periódico seriam a proporção de artigos recebidos e recusados, a transparência, qualidade e variedade de opiniões no sistema de revisão por pares e a avaliação sistemática da forma de estudo e sua qualificação metodológica por avaliadores externos. Nada disso é feito por qualquer sistema de avaliação. Na RBORL temos procurado evoluir na revisão por pares e hoje temos um grupo de mais de 100 revisores científicos, abarcando todas as áreas da ORL e a maioria dos Estados brasileiros. Contamos tanbém com editores associados específicos para diversas sub-áreas, que são utilizados nos momentos em que há divergência de opinião entre os dois revisores que avaliam cada um dos artigos originais e, na necessidade, traduzimos e enviamos os artigos para nossa editoria internacional. Atualmente, a nossa proporção de recusa tem se elevado, atingindo mais de 30% no ano de 2002.
Em relação ao aspecto significância, sabemos que existem diversos tipos de interesse quando se lê um artigo científico. Ele pode ser utilizado para apreensão de conceitos novos e corroboração de premissas científicas anteriores, assim como para sua refutação. Também podem ser usados na guiza de orientação pessoal da atividade profissional médica. Ambas são funções primordiais da informação científica. Além disso, não podemos deixar de lembrar do uso fundamental de informações científicas para a definição de políticas de saúde. Nestes três ítens percebemos que uma revista não só se constrói para atingir índices de citação, mas principalmente, deve visar fornecer subsídios e evidências para o desfruto de uma atividade priofissional bem abalizada.
Com o sistema atual de valorização de índices bibliométricos fornecidos por bancos de dados que não contemplam as revistas regionais (tabelas 1 e 2).Tabela 1 - Distribuição das revistas e artigos no ISI e Medlinefonte - ANÁLISIS DE LA PRODUCCIÓN CIENTÍFICA EN CIENCIAS DE LA SALUD DE LOS PAÍSES DE AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE PERÍODO 1999-2000. Mª. Teresa Fernández Muñoz.; Isabel Gómez Caridad; Rosa Sancho Lozano; Fernanda Morillo Ariza; Daniela De Filippo; Asunción Castro Rubio; Eva González González; Estefanía González Antonio.Tabela 2 - Distribuição das Revistas latino-americanas no ISI e Medline por país.fonte - ANÁLISIS DE LA PRODUCCIÓN CIENTÍFICA EN CIENCIAS DE LA SALUD DE LOS PAÍSES DE AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE PERÍODO 1999-2000. Mª. Teresa Fernández Muñoz.; Isabel Gómez Caridad; Rosa Sancho Lozano; Fernanda Morillo Ariza; Daniela De Filippo; Asunción Castro Rubio; Eva González González; Estefanía González Antonio.
Acabamos sendo forçados a validar informações provenientes de outras regiões como se fossem mais interessantes e corretas que as fornecidas pelos periódicos regionais. entretanto, sabemos que o leitor brasileiro lê a RBORL muito mais do que as revistas em inglês, seja pela facilidade da língua, seja pelo custo, mas, principalmente, por representar a informação mais próxima de sua realidade e produzida por autores conhecidos e de fácil julgamento. Portanto, a significância de revistas nacionais de bom conteúdo e grande abrangência é fundamental como referência prática dos atores de saúde. Neste tópico a RBORL tem se mantido na clara liderança nacional, fornecendo artigos originais na proporção de 75% do total de suas páginas e mais cerca de 10% de artigos de revisão (muito populares e bastante utilizados na produção de outros artigos, aqui no Brasil e no resto do mundo, gráfico 1) e sendo distribuída para cerca de 70% de todos os especialistas do país.Gráfico 1 - Representação das citações dos diversos tipos de artigo no decorrer do tempo (Luis Benítez Bribiesca)
Entretanto, devido a uma política de valorização das agências de fomento nacional dos índices de citação e impacto produzidos pelo MEDLINE e, principalmente pelo ISI (predominantemente anglo-saxões - 20 das 25 revistas indexadas no ISI são americanas), nossos artigos e autores são pouco considerados como produtividade científica, sendo igualados aos internacionais C (não ISI) e sequer igualadios aos ISI com índice de impacto menor que 0,5. Para se ter uma idéia do que isto significa, há cerca de 4 anos fizemos um índice de impacto de nossa revista para publicações brasileiras e nosso índice só perdia para o da Laryngoscope, no entanto, como não somos participantes do ISI (quadro 1) o governo brasileiro prefere subvaloriza-la, assim como várias outras revistas de grande valor.
Quadro 1- Revistas Latino-americanas e de Espanha e Portugal representadas em todas as bases de dados médicas - regionais e internacionais (Mariana Biojoni)
Biocell (Argentina)
Medicina - Buenos Aires (Argentina)
Arquivos de Neuro-Psiquiatria (Brasil)
Brazilian Journal of Medical and Biological Research (Brasil)
Revista de Saúde Pública (Brasil)
Biological Research (Chile)
Archivos de Bronconeumologia (España)
Drugs of Today (España)
Enfermedades Infecciosas y Microbiologia Clínica (España)
Histology and Pathology (España)
International Journal of Developmental Biology (España)
Journal of Physiology and Biochemistry (España)
Medicina Clínica (España)
Methods and Findings in Experimental and Clinical Pharmacology (España)
Neurocirugia (España)
Neurologia (España)
Revista Clínica Española (España)
Revista de Neurologia (España)
Revista Española de Cardiologia (España)
Revista Española de Enfermedades Digestivas (España)
West Indian Medical Journal (Jamaica)
Revista de Investigación Clínica (México)
Salud Pública de México (México)
Isto nos leva ao último aspecto que seria o de acessibilidade. Sabemos que a internet veio para favorecer aos procedimentos de busca, e com isso aumentar a visibilidade de quem seja acessável. Atualmente esta característica tem funcionado como uma faca de dois gumes nos procedimentos de pesquisa científica, uma vez que há grande privilégio para as revistas que estejam contempladas em bancos de dados de maior difusão, o que não ocorre com revistas não anglo-saxônicas. Por este caminho temos percebido que só é citado quem está nesta rede e só entra na rede quem é citado. A provável saída deste embrulho acadêmico seria a SciELO que além de dar visibilidade aos artigos de língua portuguêsa e espanhola, esta começando a gerar índices de impácto e citação que devem começar a ser divulgados em 3 a 4 anos de maneira regular. Por isso, a RBORL tem que estar preparada para apresentar índices favoráveis. A primeira medida para que isso ocorra é que nossos autores nacionais, ao escreverem seus artigos originais, citem os artigos da RBORL, isto aumenta o nosso índice de citação. Sabemos que nem sempre é fácil pois os artigos nem sempre são acessáveis eletronicamente. A revista já foi totalmente digitalizada, desde 1933, e deverá, em breve, ter um site eletrônico com a metodologia SciELO, com a revista em inglês e português. Além disso, já no congresso triológico do Rio de Janeiro, deveremos distribuir um CD com todos os volumes da RBORL desde seu número 1. Outra medida importante é termos contabilizados todos os acessos a revista pela internet em um único local. Para tanto, solicitamos aos leitores que procurem fazer suas pesquisas bibliográficas junto ao site de busca da Scielo (http://www.sborl.org.br/www.scielo.br) ou junto ao site da BIREME (http://www.sborl.org.br/www.bireme.br) pois aí teremos nossos acessos contados e validados pelas agências indexadoras. Também os links da SciELO junto à PUBMED e a ISI estão sendo implementados, e com isso todos os usuários destes instrumentos poderão fazer a pesquisa da RBORL dos números que constam na biblioteca SCIELO e LILACS.
O caminho está traçado. trilhamos a busca pela periodicidade, ampliação, aumento de competência científica e produção generosa de conhecimento. Atingimos um padrão de qualidade comparável ao de qualquer outro periódico de nossa área, aqui e no mundo. Temos lugar no melhor local da região para acesso e visibilidade e estamos construindo maneiras para que este acesso não encontre fronteiras na língua e no preconceito. Nos falta compreensão das autoridades que fomentam a pesquisa no Brasil para deixar esta política de colonizados de lado e assumam um papel de revitalizadores e valorizadores da cultura e inteligência nacional, sempre que de qualidade para que o pavimento para um país desenvolvido no plano científico esteja concluido.
Saudações,