Versão Inglês

Ano:  2007  Vol. 73   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - (10º)

Seção: Artigo Original

Páginas: 785 a 792

PDFPDF PT   PDFPDF EN
 

Aceitação de protetores auditivos pelos componentes de banda instrumental e vocal

Acceptance of hearing protection aids in members of an instrumental and voice music band

Autor(es): Maria Helena Mendes 1, Thais Catalani Morata 2, Jair Mendes Marques 3

Palavras-chave: músicos, perda auditiva induzida pela música, protetores auditivos

Keywords: musicians, music induced hearing loss, hearing protection

Resumo:
Existem barreiras para a efetiva proteção auditiva entre músicos. Objetivo: Verificar a aceitação de protetor auditivo pelos componentes de banda instrumental e vocal. Material e Método: Estudo prospectivo realizado com a Banda Municipal de Indaial, em 2005. O grupo de estudo consistiu de 34 componentes. Os níveis de pressão sonora foram mensurados durante um ensaio. Os sujeitos responderam questionários e realizaram audiometria tonal. Os limiares tonais dos componentes da banda foram comparados a um grupo controle. Ministrado palestra e distribuído protetores auditivos por 3 meses. Resultados: Os níveis de pressão sonora variaram de 96,4 dB(A) a 106,9 dB(A). As maiores queixas foram: incômodo a sons 58,8% e zumbido 47%. Ao compararmos a mediana dos limiares auditivos dos músicos com o grupo controle observou-se diferença significativa à direita nas freqüências de 4 e 6 kHz, e à esquerda nas freqüências de 3, 4 e 6 kHz. 77,1% referiram que a música pode ocasionar prejuízo auditivo. 56,2% referiram não ter gostado do protetor, 43,7% referiram ter gostado. Conclusão: Os sujeitos têm a informação sobre o risco, mas não há prevenção em relação aos efeitos auditivos, sugerindo a necessidade de campanhas periódicas e legislação específica aos profissionais ligados à música.

Abstract:
There are barriers to effective hearing protection among musicians. Aim: To investigate the acceptance of hearing protection aids in members of an instrumental and voice music band. Material and method: A prospective study of 34 members of the Municipal Indaial Band. Sound pressure levels were measured during a rehearsal, indicating mean levels ranging from 96.4 dB(A) to 106.9 dB(A). Subjects answered questionnaires and underwent audiometry. They attended a lecture in which folders and hearing protection aids were provided; subjects were asked to try using the protectors for 3 months. Results: At the end of the study period, 56.2% reported not liking hearing protection, while 43.7 % accepted such protection. The most common complaints were discomfort with sounds (58.8 %) and tinnitus (47%). 77.1% said that music might cause hearing impairment. A statistically significant difference was observed in the right ear at 4 and 6 kHz and at the left ear in 3, 4 and 6 kHz when median thresholds were compared with those from unexposed controls. Conclusion: Although most subjects seemed aware of the risk, few took preventive measures against hearing loss. This suggests the need for periodic educational campaigns and specific legislation tailored to music professionals.

INTRODUÇÃO

Geralmente não pensamos na música como sendo ruído, mas como um som agradável. Entretanto, quando tocada em intensidade forte, pode tornar-se uma ameaça potencial ao ouvido humano1.

Existem algumas distinções entre música e o ruído. Na música o padrão temporal é flutuante, as freqüências dominantes são baixas, mais atenuadas pelo estapédio, e geralmente é prazerosa. Já o ruído apresenta padrão temporal contínuo, as freqüências dominantes são altas e é indesejável ao ouvido humano.

A associação entre exposição ao ruído e perda auditiva ocupacional tem sido descrita há mais de um século, porém, somente a partir da década de sessenta alguns pesquisadores mostraram preocupação com os efeitos da música à audição2,3.

Estudos têm demonstrado perda auditiva em componentes de bandas de rock, trios elétricos, orquestras sinfônicas, bandas de baile, ou até mesmo em treinos instrumentais individuais4-8.

Medidas de prevenção da perda auditiva a músicos têm sido sugeridas em diversas pesquisas científicas, tais como: tratamento acústico dos ambientes de ensaio, acompanhamento audiológico e uso de proteção individual entre outros6-8.

Atualmente têm sido oferecidos aos músicos, nos mercados nacional e internacional, protetores auditivos específicos de inserção. Estes permitem um equilíbrio de atenuação de todas as freqüências, através da diminuição uniforme do som, evitando o efeito de oclusão e, conseqüentemente, a distorção do som. As opções vão desde modelos simples com tamanho padrão e que oferecem diferentes atenuações à música, até protetores com moldes personalizados.

A presente pesquisa tem por objetivo verificar a aceitação do uso de equipamento de proteção individual pelos componentes de banda instrumental e vocal durante seus ensaios e apresentações.


MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi realizado na cidade de Indaial, com os componentes da Banda Municipal. Esta banda é composta por 36 componentes, sendo 6 mulheres e 30 homens, com idade variando de 19 a 76 anos e idade média de 40 anos. O estudo teve o desenho de coorte histórica com corte transversal.

A banda é composta pelos seguintes naipes: vocal (8 pessoas), teclado (1), saxofone (5), bateria e percussão (3), clarinete (2), tuba (1), guitarra (1), contrabaixo (1), trombone (5), trompete (6), flauta transversal (1), maestro (1), mesa de som (1). A banda é remunerada pela Prefeitura Municipal de Indaial, e compromete-se com a mesma quatro vezes por mês entre ensaios e apresentações.

Houve a participação de 34 indivíduos que foram informados de todos os procedimentos da pesquisa e assinaram o consentimento pós-informado. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Tuiuti do Paraná, sob o número 001/2005.

Os participantes deste trabalho foram submetidos a um questionário com questões abertas e fechadas contendo: dados de identificação, tipo de instrumento tocado, tempo de atuação (como musicista, cantor, ou operador de mesa de som), freqüência de ensaios e apresentações, treinos individuais, exposição anterior ou concomitante a ruído industrial, queixas auditivas, antecedentes familiares com perda auditiva, doenças, uso de medicações e cuidados com a audição. O questionário foi aplicado pela pesquisadora anterior à avaliação audiológica.

A avaliação audiológica dos integrantes da banda foi realizada com repouso acústico de catorze horas, e o roteiro utilizado foi:

a) Inspeção visual do meato acústico externo: foi utilizado o otoscópio modelo Welch Allyn, com o objetivo de verificar alguma obstrução que impedisse a realização do teste. Nos casos de exame alterado, os sujeitos foram encaminhados para avaliação otorrinolaringológica e posterior retorno para avaliação audiológica.

b) Audiometria: A audiometria tonal limiar foi realizada em cabina acústica, com audiômetro clínico da marca MAICO, modelo MA-41, fone TDH39, aferidos de acordo com Norma ISO 8253-1 e Resolução 296/03 do Conselho Federal de Fonoaudiologia. O objetivo da audiometria tonal foi a determinação dos limiares auditivos por via aérea nas freqüências de 250, 500, 1000, 2000, 3000, 4000, 6000 e 8000 Hz, e via óssea nas freqüências de 500, 1000, 2000, 3000 e 4000 Hz.

Para classificação dos limiares auditivos dos componentes da banda, utilizaram-se os critérios de alteração audiométrica proposto por Fiorini (1994)9:

- Audiogramas sugestivos de audição normal: indivíduos que apresentaram todos os limiares obtidos bilateralmente em valores iguais ou inferiores a 25dBNA.

- Audiogramas sugestivos de perda auditiva induzida por ruído (PAIR): indivíduos que apresentaram configuração de perda auditiva (limiares maiores que 25dBNA) nas freqüências (6 e/ou 4 e/ou 3 kHz).

- Audiogramas com outras classificações: indivíduos que apresentaram perda auditiva (limiares maiores que 25 dBNA), cuja configuração audiométrica não era compatível com as classificações anteriores.

Para análise dos audiogramas foram excluídos 11 indivíduos (32,3%) expostos a outras atividades profissionais ruidosas não-ligadas à música (2 trompete, 1 trombone, 1 tuba, 1 clarinete, 2 saxofone), assim como indivíduos com perda auditiva condutiva (1 trompete, 1 clarinete), perda auditiva mista (1 bateria e percussão), e um indivíduo com perda auditiva neurossensorial profunda unilateral (1 bateria e percussão).

Da população estudada nesta análise restaram como grupo experimental 23 indivíduos (67,6%), expostos somente à música, que tiveram seus limiares auditivos comparados a um grupo controle, pareados de acordo com o sexo e idade.

Para o grupo controle foram selecionados 23 indivíduos sem exposição ao ruído, coletados no Laboratório de Audiologia da Universidade Tuiuti do Paraná10.

Realizou-se a mediana dos limiares auditivos em orelha direita e esquerda dos grupos experimental e controle.

Para comparação dos limiares auditivos do grupo experimental e controle em orelhas direita e esquerda realizou-se como método estatístico, o teste de Wilcoxon, considerando-se o nível de significância de 5% (a = 0,05).

Não houve diferença estatisticamente significante entre os dois grupos quanto à faixa etária dos indivíduos.

O nível de pressão sonora foi avaliado por um engenheiro em ensaio da banda. As medições foram feitas através de medidor de nível de pressão sonora modelo QUEST-2700, utilizando-se o modo de resposta rápida (F), e a escala dB (A), método de filtragem, que se aproxima das características receptivas da orelha humana.

A sala de ensaio de características reverberantes foi dividida em 18 pontos de medição localizados em: P1(maestro), P2 (retorno+clarinetes), P3 (retorno+trompetes), P4 (trombones), P5 (trombones), P6 (trombones+trompetes), P7 (trompetes), P8 (trompetes), P9 (saxofones), P10 (clarinetes+flauta), P11 (vocais), P12 (vocais+retorno), P13 (vocais+retorno), P14 (bateria), P15 (percussão+teclado+retorno), P16 (guitarra+retorno), P17 (contrabaixo+retorno), P18 (mesa de som). (Figura 1)


Figura 1: Esquema da Banda em Sala de Ensaio com os pontos de medição dos Níveis de Pressão Sonora



Enfatiza-se que a avaliação dos níveis de pressão sonora que os músicos são expostos é complexa e variável, pois depende das condições ambientais em que as apresentações da orquestra ocorrem. Logo, as medições realizadas têm caráter meramente ilustrativo do potencial risco de exposição para os músicos.

Foi ministrada uma palestra para os músicos com informações sobre as medições realizadas, riscos de prejuízo auditivo com a exposição periódica à música intensa, noções básicas de anatomia e fisiologia da audição, assim como orientação e treinamento para o uso de equipamento de proteção individual (EPI), durante os ensaios e apresentações.

Na oportunidade foi distribuído aos integrantes da banda, além do EPI, folheto informativo contendo todas as informações necessárias quanto ao uso do mesmo, informação de sua necessidade, e noções de anatomia e fisiologia da audição. Os músicos foram solicitados a utilizar o EPI pelo período de três meses. O conteúdo da palestra e do folheto informativo foi elaborado pela autora, com base em materiais educativos elaborados pela NHCA (National Hearing Conservation Association11-13 assim como por outros14-16.

O protetor auditivo selecionado foi o modelo ER-20 da E.A.R. Ultratech Earplugs (Figura 2). A Tabela 1 apresenta a sua atenuação por faixa de freqüência. Estes protetores foram distribuídos aos músicos, vocais e operador de mesa de som, sem custo aos mesmos.


Figura 2: Protetor tamanho único ER 20 E.A.R. Ultratech Earplugs
Fonte: http: www.drumchops.com





O critério de escolha deste equipamento de proteção individual para este estudo levou em consideração os seguintes aspectos: atenuação uniforme, tamanho único, não requer pessoal técnico para a sua confecção, o custo de aquisição é menor do que os protetores sob medida, e a proposta de atenuação oferecida pelo fabricante está adequada às necessidades do grupo estudado.

Ao final do período proposto de três meses para uso do EPI, em ensaios e apresentações, os participantes responderam novo questionário, aplicado pela pesquisadora, para verificar o uso do protetor auditivo e a aceitação do mesmo.


RESULTADOS

Em mensuração do nível de pressão sonora em sala de ensaio, observaram-se médias de 96,4 a 106,9 dB (A), sendo que os maiores níveis de pressão sonora estão no naipe dos trompetes, nas proximidades deste naipe e na execução dos trompetes durante a música. Os resultados das medições, com os pontos de medição referidos acima, assim como média dos valores obtidos, encontram-se na Tabela 2.




Dos 34 indivíduos desta pesquisa, 28 (80%) eram do sexo masculino e 6 (17,1%) do sexo feminino, com idade variando de 19 a 76 anos.

No Gráfico 1 (a), encontra-se ilustrado o tempo de atuação profissional em música dos participantes do estudo, enquanto no Gráfico 1 (b) encontra-se o tempo de atuação específico na atual banda, a Banda Municipal de Indaial.



Gráfico 1 - Distribuição dos Indivíduos Segundo (a)Tempo de Atuação Profissional e (b) Segundo Tempo de Atuação na Banda Municipal de Indaial



No Quadro 1 verifica-se a exposição dos indivíduos do estudo a outras atividades ligadas à música (23 sujeitos, 67,6%), assim como a outros cenários envolvendo exposição a níveis elevados de pressão sonora (11 sujeitos, 32,3%).




As queixas auditivas referidas pelos músicos, cantores e operador de mesa de som foram incômodo a sons (58,8%), zumbido (47%), perda auditiva (25,7%) e sensação de ouvido tapado (4%).

Quando questionados sobre a possibilidade da música ocasionar prejuízo auditivo, 27 indivíduos (77,1%) admitiram a possibilidade e 7 (20%) responderam negativamente. Adicionalmente 9 sujeitos (25,7%) referiram perda auditiva. Somente 9 indivíduos (25,7%) afirmaram ter algum tipo de cuidado em relação à audição, e 25 (71,4%) não têm nenhum cuidado. Entre os cuidados mais comumente mencionados estão; o uso de EPI na indústria, assim como na prática de tiro, uso de algodão durante exposição à música intensa, tocar em fraca intensidade, afastar-se do ruído intenso.

Calculou-se a mediana dos limiares auditivos em orelha direita e esquerda dos grupos experimental e controle, detalhados no Gráfico 2 (a) e (b). Foi realizado o Teste de Wilcoxon. Considerando-se o nível de significância de 5% (a = 0,05), existe diferença significativa entre os limiares nos dois grupos se p < a. Verifica-se que a diferença é significativa nas freqüências de 4 e 6 kHz na orelha direita, e nas freqüências de 3, 4 e 6 kHz na orelha esquerda, pois nesses casos p < a = 0,05.



Gráfico 2 - Medianas dos Grupos Controle e Experimental na Orelha Direita (a) e Orelha Esquerda (b)



Conforme critério de alteração audiométrica utilizado13 encontrou-se resultados sugestivos de perda auditiva, em participantes dos vocais (2), trompete (3), trombone (1), saxofone (2) e guitarra (1).

Para análise da aceitação no uso do protetor auditivo ou equipamento de proteção individual (EPI), participaram 32 indivíduos, dos 34 componentes da banda participantes do estudo, 2 indivíduos não estiveram presentes para responder o segundo questionário da pesquisa, logo, foram excluídos desta análise.

Quando questionados sobre terem gostado ou não de usar o protetor auditivo, 18 deles (56,2%) responderam que não, enquanto 14 (43,7%) que sim. Os motivos para terem gostado ou não do protetor foram expressos no Quadro 2.




Não houve diferença estatisticamente significante para uso ou não uso do protetor auditivo para os fatores faixa etária dos indivíduos, perda auditiva e naipe.


DISCUSSÃO

Dos 34 sujeitos que fizeram parte desta pesquisa, muitos deles já atuaram e/ou atuam em outros cenários musicais, assim como a outras atividades profissionais ruidosas ou em atividades de lazer, colaborando para a ocorrência de perda auditiva.

As queixas auditivas mais comumente encontradas no estudo foram: incômodo a sons 20 indivíduos (58,8%), zumbido 16 (47,06%) e perda auditiva 9 (25,71%), concordando com a literatura7,21-23.

Quando questionados sobre a possibilidade da música ocasionar prejuízo auditivo, 27 indivíduos (77,14%) responderam afirmativamente, embora somente 9 indivíduos (25,71%) afirmaram ter algum tipo de cuidado com sua audição em apresentações com amplificação sonora, exposição ao ruído em atividades de lazer e/ou na indústria. Observou-se que os sujeitos do estudo não sabiam ao certo como proteger sua audição, embora soubessem da possibilidade de prejuízo auditivo pela exposição à música em forte intensidade.

Análise da mediana das orelhas direita e esquerda demonstrou diferença significativa entre os grupos experimental e controle, sugerindo a presença de perda auditiva nos sujeitos da pesquisa expostos somente à música. Tais achados concordam com estudos anteriores6,7,20-22.

Dos 23 indivíduos expostos somente à música, 12 (52,1%) apresentaram perda auditiva, número superior ao encontrado em trabalho anterior da autora com a Banda Municipal de Blumenau com 13% de perda auditiva7.

Em outros estudos com músicos também foram observadas altas porcentagens de perda auditiva. Entre os membros da Orquestra Sinfônica de Chicago foram encontradas 42 pessoas (71%) com perda auditiva20. De 21 músicos de bandas de rock variadas, encontraram 11 (52,4%) com perda auditiva6. De 50 músicos dos blocos carnavalescos de frevo e maracatu, encontrando 42,1% dos componentes do grupo de frevo com perda auditiva e 16,1% dos componentes do grupo de maracatu21. Em avaliação dos componentes da Banda de Música da Polícia Militar de Santa Catarina, com especial ênfase ao grupo de sopro em metal, por ser o instrumento musical mais executado, encontraram 41% deste naipe com perda auditiva22.

No presente estudo realizou-se medição dos níveis de pressão sonora durante ensaio coletivo da banda, com média de 96,4 a 106,9 dB(A) NPS, com picos de até 110,9 dB(A) NPS, conforme esquema de medição apresentado.

Observou-se no levantamento da literatura que a medição do nível de pressão sonora para a música é complexa, devido a sua variabilidade de freqüência e intensidade, assim como pelo nível de exposição do músico, que depende do tempo de exposição em apresentações, local da apresentação, ensaios coletivos e individuais, estilo de vida, entre outros fatores.

Quando trabalhadores da indústria são expostos a um nível de pressão sonora superior a 85 dBA sabe-se que poderão desenvolver perda auditiva, dependendo do período de exposição23. Porém, ainda não está claro se as normas industriais são aplicáveis aos músicos, pelas seguintes razões1,2,6:

 na música, as freqüências dominantes são as baixas, menos prejudiciais, pois o estapédio atenua as freqüências baixas mais efetivamente; já na indústria, são as freqüências altas;

 na indústria o ruído é contínuo por quase todo o dia, enquanto que na música o padrão temporal é flutuante, a música é tocada por períodos mais curtos, com certos períodos de pico e pausas entre eles, onde o ouvido pode recuperar-se;

 sugere-se que os sons prazerosos são menos prejudiciais que aqueles indesejados.

No entanto, deve-se levar em conta que o músico será exposto à música durante toda sua carreira profissional, sendo primordial que apresente audição dentro dos padrões de normalidade. Qualquer perda auditiva é indesejável, pois dependendo da severidade, pode vir a dificultar a percepção para alguns tons, timbres, afetando o equilíbrio entre os instrumentos20,24,25.

No Brasil, ainda não existe legislação que proteja os músicos dos prejuízos ocasionados pela música em forte intensidade. Também a variabilidade de opiniões a respeito da periculosidade da música à audição dificulta a implementação de medidas preventivas da perda auditiva induzida pela música (PAIM) a este tipo de profissional.

Na Suécia atualmente existem duas recomendações de limites de segurança ocupacional, no que diz respeito ao ruído no trabalho e atividades musicais, tanto para músicos quanto para ouvintes18.

No Brasil não consta nas normas da A.B.N.T (Associação Brasileira de Normas Técnicas) nenhuma diretriz legislando sobre o controle do ruído em atividades de lazer21. Enfatiza-se ainda ser necessário que se discrimine em normas de segurança, além do número de dias de trabalho permitidos semanalmente, o número de horas diárias e os níveis de pressão sonora emitidos durante cada apresentação.

A falta de padronização legal para exposição sonora específica para músicos pode criar a falsa suposição de que este tipo de ambiente de trabalho está livre de riscos auditivos, uma vez que todos os músicos seriam beneficiados por um padrão específico de proteção auditiva26.

Dos 23 indivíduos expostos somente à música no grupo estudado, 12 sujeitos (52,1%) apresentaram perda auditiva, além de outros sintomas auditivos referidos.

Diversos estudos têm demonstrado a presença de perda auditiva induzida pela música (PAIM), assim como de outras desordens auditivas entre os músicos tais como zumbido, hiperacusia ou desconforto a sons intensos entre outras7,17,19,22,25,27, justificando a necessidade de programas de conservação auditiva neste meio.

Na literatura encontram-se algumas estratégias para prevenção de perda auditiva induzida pelo ruído neste tipo de local19:

 Promoção à saúde: Distribuição de material informativo sobre os danos da audição com música intensa, incluindo como alvos, escolas e universidades, lojas de música e equipamentos, shopping centers, produtores e promotores de concertos e centros médicos.

 Controles de engenharia: Manutenção do nível de pressão sonora em torno de 103dB(A) em concertos, atingida através de revestimento acústico, paredes acústicas e evitando amplificadores excessivos de alta freqüência.

 Educação: Programas educacionais aos técnicos de som sobre os riscos do ruído e medidas de prevenção para perda auditiva. Também encorajar os freqüentadores a permitir um repouso acústico de 16 horas aos ouvidos, após exposição a altos níveis de exposição sonora.

 Proteção individual: Promotores de concerto deveriam oferecer plugues de ouvido descartáveis nos concertos de rock. Freqüentadores assíduos de concerto de rock deveriam considerar o uso de protetores auditivos personalizados.

A prevenção de perda auditiva entre os músicos continua sendo uma difícil meta, pois os músicos ainda vêem o registro dos níveis de pressão sonora de forma contraditória, logo são relutantes ao uso da proteção auditiva27.

Laitinen (2005)25 realizou estudo com cinco orquestras, para descobrir as atitudes dos músicos em relação à proteção auditiva. O estudo mostrou que 94% dos participantes estavam preocupados com algum decréscimo de sua audição, zumbido, dor, diminuir o estresse e a fadiga. Todavia, somente 6% dos participantes sempre usavam EPI. O autor afirma que motivação e treino são necessários para melhorar o uso de protetores auditivos entre os músicos.

No meio industrial as campanhas estão tornando-se cada vez mais criativas, falando na linguagem dos trabalhadores de suas dificuldades do dia-a-dia, utilizando-se de estratégias como chamadas, cartazes e peças de teatro28.

No presente trabalho, a pesquisadora preocupou-se na execução de orientação e treinamento dos participantes no uso dos protetores auditivos, assim como na conscientização dos riscos de prejuízo auditivo com a exposição periódica à música intensa, mesmo assim encontrou resistência ao seu uso, como referido recentemente por outros autores8,25.

Muitas queixas apresentadas no estudo são semelhantes àquelas referidas por usuários de protetores auditivos convencionais: dificuldade de compreensão, dificuldade de ouvir o som de seus próprios instrumentos, impede a comunicação, sensação de isolamento, efeito de oclusão, entre outras, foram queixas registradas pelos componentes da banda com o protetor auditivo de atenuação uniforme utilizado no presente estudo.

Pode ter ocorrido no presente estudo efeito de sobre-atenuação, ou seja, o protetor pode ter oferecido atenuação acima da necessidade dos músicos, assim como efeito de oclusão resultante da distorção do som, e sensação de autofonia, ocasionados por atenuação não-uniforme a todas as freqüências do espectro sonoro.

Não se observou nível de significância estatística para os fatores: perda auditiva, faixa etária dos sujeitos e naipe para o uso ou não do protetor auditivo.


CONCLUSÃO

No presente estudo observou-se que os componentes da Banda Municipal de Indaial tinham conhecimento do risco auditivo da exposição à música em forte intensidade, porém não sabiam ao certo como proteger-se.

Os indivíduos pareceram interessados em experimentar o protetor auditivo de atenuação uniforme, porém o mesmo não ocorreu com o uso efetivo do protetor que foi pouco utilizado, tanto entre os indivíduos com perda auditiva comprovada através de avaliação audiológica, como entre aqueles com sintomas auditivos.

Percebeu-se também que muitas queixas referidas pelos sujeitos deste estudo foram semelhantes àquelas referidas por usuários de protetores auditivos convencionais, sugerindo a possibilidade da atenuação do protetor utilizado no estudo ter gerado atenuação superior à necessária, ou mesmo efeito de oclusão, ocasionado pela atenuação não-uniforme entre todas as freqüências do espectro sonoro.

Os indivíduos ficaram divididos quanto à permanência do uso do protetor auditivo em sua atuação profissional.

Acredita-se que, através do acompanhamento sistemático do grupo, realização de avaliação audiológica periódica, novos treinamentos e uso de outros protetores auditivos moldáveis individualmente, o grau de aceitabilidade do grupo poderia ser alterado. Porém, faz-se necessária uma legislação que ampare todos os profissionais ligados à música, gerando assim recursos financeiros para a manutenção deste trabalho.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Schmidt JM, Verschure J, Brocaar MP. Hearing loss in students at a conservatory. Audiology 1994;33:185-94.

2. Mcbride D, Gill F, Harrington M, Gardiner K, Attwell, C. Noise and classical musician. BMJ 1992;305:1561-3.

3. Palin SL. Does classical music damage the hearing of musicians? review of the literature. Occup Med 1994;44:130-6.

4. Russo ICP, Santos TMM, Busgaib BB, Osterne, FJV. Um estudo comparativo sobre os efeitos da exposição à música em músicos de trios elétricos. Rev Bras de Otorrinolaring 1995;61:477-84.

5. Early KL, Horstman SW. Noise exposure to musicians during practice. Appl Occup Environ Hyg 1996;9:1149-53.

6. Samelli AG, Schochat E. Perda auditiva induzida por nível de pressão sonora elevado em um grupo de músicos profissionais de rock-and-roll. Acta Awho 2000;19:136-43.

7. Mendes MH, Koemler LA, Assencio-Ferreira, VJ. A prevalência de perda auditiva induzida pelo ruído em músicos de banda instrumental. Rev CEFAC 2002;4:179-85.

8. Laitinen HM, Toppila EM, Olkinuora PS, Kuisma K. Sound exposure among the Finnish National Opera Personnel. Appl Occup Environm Hyg 2003;18:177-82.

9. Fiorini AC. Conservação auditiva: Estudo sobre o monitoramento audiométrico em trabalhadores de uma indústria metalúrgica. [dissertação]: São Paulo. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1994.

10. Daroit R. Estudo do registro das emissões otoacústicas em indivíduos com limiares audiométricos normais. [monografia]: Curitiba. Universidade Tuiuti do Paraná; 2005.

11. NHCA, National Hearing Conservation Association. Practical guide. Fitting hearing protection. Denver, USA. http:www.hearingconservation.com

12. NHCA, National Hearing Conservation Association. Practical guide. Hearing loss prevention for musicians. Milwaukee, USA. http:www.hearingconservation.com

13. NHCA, National Hearing Conservation Association. Practical guide. Selecting hearing protection. Denver, USA. http:www.hearingconservation.com

14. Gerges SNY. Protetores auditivos: recomendações para seleção, uso, cuidado e manutenção. Rev CIPA 1999;236:20.

15. Gerges SNY. Protetores auditivos para músicos. Rev CIPA 2003;282:76.

16. Graciolli LS. Desenvolvimento de uma estratégia para o uso correto de protetores auditivos em músicos. [qualificação doutorado] Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2003.

17. Marchiori LLM, Melo JJ. Comparação das queixas auditivas com relação à exposição ao ruído em componentes de orquestra sinfônica. Pró-Fono 2001;13:9-12.

18. Kähäri KR, Zachau G, Eklöf M, Sandsjo L, Müller C. Assessment of hearing and hearing disorders in rock/ jazz musicians. Int J Audiol 2003;42:279-88.

19. Bogoch II. House RA, Kudla I. Perceptions about hearing protection and noise-induced hearing loss of attendees of rock concerts. Can J Publ Health 2005;1:69-72.

20. Royster JD, Royster LH, Killion MC. Sound exposures and hearing thresholds of symphony orchestra musicians. J Acoust Soc Am 1991;89:2793-803.

21. Andrade AIA, Russo ICP, Lima MLLT, Oliveira LCS. Avaliação auditiva em músicos de frevo e maracatu. Rev Bras Otorrinolaringol 2002;5:714-20.

22. Antoniolli FB. Perfil audiométrico x banda de música - um estudo de caso.[monografia] Itajaí: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC; 2000.

23. Costa EA, Morata TC, Kitamura S. Patologia do ouvido relacionada com o trabalho. In: Mendes R. Patologia do Trabalho. São Paulo: Atheneu; 2003. p. 1254-82.

24. Teie PU. Noise-induced hearing loss and symphony orchestra musicians: risk factors, effects and managements. MMJ 1998;47:13-8.

25. Laitinen H. Factors affecting the use of hearing protectors among classical music players. Noise & Health 2005;7:21-9.

26. Owens DT. Sound pressure levels experienced by the high school band director. Med Probl Perform Art 2004;109-15.

27. Juman S, Karmody CS, Simeon D. Hearing loss in steelband musicians. Otolaryngol Head Neck Surg 2004;131:461-5.

28. Viegas, C. Melhorando a eficiência. Rev Prot 2004;148:37-54.






1 Mestre em Distúrbios da Comunicação, Fonoaudióloga.
2 Doutora em Distúrbios da Comunicação pela University of Cincinnati, Profa. Dra. Universidade Tuiuti do Paraná.
3 Doutor em Ciências Geodésicas pela Universidade Federal do Paraná, Prof. Dr. Universidade Tuiuti do Paraná.
Universidade Tuiuti do Paraná.
Endereço para correspondência: R. Benjamin Constant 1213 ap. 504B Escola Agrícola Blumenau SC 89.037-501.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 15 de julho de 2006. cod. 2922.
Artigo aceito em 8 de novembro de 2006.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial