Ano: 2007 Vol. 73 Ed. 5 - Setembro - Outubro - (23º)
Seção: Relato de Caso
Páginas: 720 a 720
Tuberculose primária de glândula parótida
Primary tuberculosis of the parotid gland
Autor(es): Adriano Ulisses Caldart 1, Cíntia Felício Adriano 2, Arnoni Ulisses Caldart 3, Marcos Mocellin 4
Palavras-chave: aids, glândula parótida, tuberculose, tumor
Keywords: aids, parotid gland, tuberculosis, tumor
INTRODUÇÃO
A tuberculose em glândula parótida é uma doença infecciosa, que se manifesta por aumento de volume da glândula, de forma lobulada com linfoadenite associada. É rara, e os relatos na literatura são poucos. Com o aumento da incidência de doenças imunodepressoras, em especial a AIDS, as formas extrapulmonares têm estado em ascenção1. Vários autores comentam que a tuberculose de parótida embora incomum deve fazer parte de diagnóstico diferencial com tumores em aumento do volume da parótida2,3. O objetivo deste trabalho é relatar caso de tuberculose primária de glândula parótida, associada à AIDS simulando tumor.
APRESENTAÇÃO DO CASO
Paciente do sexo masculino, branco, tabagista, 46 anos, portador do vírus HIV, ainda sem tratamento clínico. Foi admitido no setor de otorrinolaringologia com história de dor e massa em região infra-auricular esquerda há 5 meses, afebril, com perda de peso e sudorese noturna ocasional.
Ao exame observou-se uma massa endurecida, de superfície irregular, nodulada, dolorosa à palpação, de aproximadamente 4 x 3 cm de diâmetro na topografia da região parotídea esquerda e linfonodomegalia cervical esquerda.
Exames laboratoriais de rotina sem alterações. Rx de tórax normal. À ultra-sonografia notou-se parótida com ecotextura heterogênea com áreas mal definidas e linfonodos intraglandulares e adjacentes cervicais. A tomografia computadorizada revelou assimetria de parótidas com aumento volumétrico da glândula esquerda, com maior heterogeneidade em sua borda superior, que era sugestivo de tumor misto com possível malignização e infiltração em linfonodos. Foi indicado PAAF que foi negativo para células neoplásicas.
Com base nesse quadro, hipótese diagnóstica inicial foi de tumor da glândula parótida e foi realizada parotidectomia parcial com excisão de linfonodo cervical.
O exame anatomopatológico demonstrou inflamação crônica granulomatosa caseosa, compatível com etiologia tuberculosa. À microscopia com coloração de ZIEHL, os cortes histológicos mostraram estruturas de microorganismos compatíveis com Bacilo de Koch (Figura 1).
Figura 1. ZIEHL 1000X: Histopatologia para pesquisa de BAAR, mostrando microorganismos com estruturas compatíveis com Bacilo de Koch.
Foi instituída terapia quimioterápica para tuberculose e AIDS. Houve boa evolução, com remissão da doença. O paciente está sendo acompanhado clinicamente em regime ambulatorial há 2 anos, não apresentando evidências de recidiva da doença.
DISCUSSÃO
A tuberculose é uma doença que atinge principalmente adultos jovens, sendo que, na maioria dos casos, compromete os pulmões. Nos casos de envolvimento da glândula parótida, geralmente existe um foco pulmonar primário e a disseminação hematogênica e linfática são as mais prováveis rotas de infecção das lesões secundárias. Ustuner4 definiu que se um foco primário da doença não for detectado, a infecção é clinicamente chamada de tuberculose primária da glândula, e o diagnóstico pode ser difícil, devido a sua semelhança com tumores na parótida. Holmes3 referiu que a raridade da doença pode ser devido a um efeito inibidor da saliva sobre as micobactérias. No caso relatado, constatamos que de acordo com a literatura tratava-se de um adulto jovem, portador de HIV, sem tratamento. Outra observação é que na ausência de história prévia de tuberculose ou achado de foco primário, como ocorreu neste paciente, a hipótese diagnóstica inicial foi de tumor de parótida, pois esta doença, como referiu a literatura, simulou uma neoplasia. A punção por biópsia aspirativa não contribui no esclarecimento e Bhargava2 referiu esta dificuldade de diagnóstico com PAAF, devido ao fato de que em grandes neoplasias existem muitas áreas necróticas. O diagnóstico final só foi possível com o exame anatomopatológico que foi de inflamação crônica granulomatosa caseosa, em linfonodo intraglandular, compatível com tuberculose.
COMENTÁRIOS FINAIS
A tuberculose de parótida, embora rara, deve ser considerada como parte do diagnóstico diferencial das massas de glândula parótida, principalmente em pacientes imunodeprimidos. O diagnóstico definitivo pode ser difícil, porém é importante, devido à semelhança desta doença com neoplasias que acometem este órgão.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Harrison TR. Medicina Interna, 14.ª ed. Rio de Janeiro: McGraw Hill; 1989.
2. Bhargava AK, Shenoy AM, Kumar RV. Parotid Tuberculosis simulating malignancy. J Laryngol Otol 1999;113(10):951-2.
3. Holmes S, Gleeson MJ, Cawson RA. Mycobacterial disease of the Parotid Gland. J Oral Maxillofac Surg 2000;90(3):292-8.
4. Ustuner TE, Sensoz O, Kocer U. Primary Tuberculosis of the Parotid Gland. Plast Reconstr Surg 1991;88(5):884-5.
1 Graduação, Médico residente do 3o. ano de Otorrinolaringologia do HC-UFPR.
2 Graduação, Médica residente do 3º ano de Otorrinolaringologia do HC-UFPR.
3 Mestrado, Médico Otorrinolaringologista - Mestre em Clínica Cirúrgica pela FURB/UFPR.
4 Doutorado, Professor Doutor Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da UFPR. Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do HC-UFPR.
Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná.
Endereço para correspondência: Rua General Carneiro 181 Bairro Centro Curitiba PR 80060-900.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 11 de julho de 2006. cod. 2696.
Artigo aceito em 2 de agosto de 2006.