Versão Inglês

Ano:  2007  Vol. 73   Ed. 4  - Julho - Agosto - (10º)

Seção: Artigo Original

Páginas: 513 a 522

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Comparação entre limiares de audibilidade e eletrofisiológico por estímulo tone burst

A comparison between hearing and tone burst electrophysiological thresholds

Autor(es): Fernanda Rodrigues Pinto 1, Carla Gentile Matas 2

Palavras-chave: eletrofisiologia, limiar auditivo, potenciais evocados auditivos, potenciais evocados auditivos de tronco encefálico

Keywords: evoked potentials, auditory, evoked potentials, auditory

Resumo:
Estudos referem compatibilidade entre limiares eletrofisiológicos obtidos com o estímulo acústico tone burst no Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (PEATE) e limiares para tons puros. Objetivos: Verificar a ocorrência das ondas I, III, V e seus respectivos tempos de latência para o tone burst em 500, 1000, 2000 e 4000 Hz a 80 dB NA, e comparar os limiares eletrofisiológicos para o tone burst com limiares de audibilidade e psicoacústico. Casuística e Métodos: Avaliação audiológica, psicoacústica e eletrofisiológica da audição de 40 indivíduos audiologicamente normais de 18 a 40 anos, de ambos os sexos. Resultados: Visualizou-se apenas a onda V a 80 dB NA, sendo que sua latência diminuiu com o aumento da freqüência em ambos os sexos. Em 1000, 2000 e 4000 Hz o sexo masculino apresentou maiores valores de latência da onda V a 80 dB NA e valores de limiares eletrofisiológicos mais elevados que o feminino em todas as freqüências. Em 500, 1000 e 2000 Hz, os limiares eletrofisiológico, de audibilidade e psicoacústico encontraram-se estatisticamente diferentes entre si. Conclusão: Apesar da aplicabilidade clínica dos PEATE com tone burst, são necessárias mais pesquisas a fim de padronizar as técnicas de realização do exame e resultados.

Abstract:
Studies have reported compatibility between hearing and electrophysiological thresholds in the auditory brainstem response (ABR) with tone burst stimuli. Aims: to verify waves I, III, V and their latency times for tone bursts at 500, 1000, 2000 and 4000 Hz and at 80 dB HL, and to compare tone burst electrophysiological thresholds with those obtained from audiological and psychoacoustic evaluations. Methods: audiological, psychoacoustic and electrophysiological evaluations of 40 male and female normal hearing individuals aged between 18 and 40 years were undertaken. Results: only wave V was visualized at 80 dB HL and its latency values decreased with increased frequencies in both genders. At 1000, 2000 and 4000 Hz male subjects presented higher electrophysiological thresholds values than females at all frequencies. At 500, 1000 and 2000 Hz, electrophysiological, hearing, and psychoacoustic thresholds were statistically different in both genders. Conclusion: although ABR with tone burst stimulus is clinically applicable, further research is needed to standardize test techniques and results.

INTRODUÇÃO

Durante as diversas funções exercidas pelo sistema nervoso central, são geradas atividades bioelétricas que podem ser captadas por eletrodos conectados ao couro cabeludo. Estes são potenciais de pequena amplitude (100 milivolts) que, ao serem amplificados, podem ser registrados e mensurados por técnicas apropriadas como a eletroencefalografia1.

Os Potenciais Evocados Auditivos podem ser classificados em precoces, médios e tardios2. O Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (PEATE) é um potencial precoce que ocorre de 0 a 10 milissegundos (ms) após a apresentação do estímulo acústico, sendo que a presença ou não deste permite avaliar a integridade da via auditiva no tronco encefálico3. As respostas são geradas mediante a apresentação de estímulo acústico por meio de um par de fones supra-aurais modelo TDH 39 e, a fim de captar da atividade elétrica proveniente das estruturas que compõem a via auditiva desde o nervo auditivo até o mesencéfalo, são utilizados eletrodos de superfície conectados ao couro cabeludo e mastóides ou lóbulos das orelhas.

Estas respostas consistem numa série de sete ondas geradas por uma ou mais estruturas ao longo da via auditiva com os seguintes sítios geradores: onda I: porção distal ao tronco encefálico do nervo auditivo; onda II: porção proximal ao tronco encefálico do nervo auditivo; onda III: núcleo coclear; onda IV: complexo olivar superior; onda V: lemnisco lateral; onda VI: colículo inferior; onda VII: corpo geniculado medial.4

O PEATE é utilizado rotineiramente na prática clínica, devido a sua reprodutibilidade e propriedades de localização. O principal objetivo é complementar os procedimentos audiológicos de rotina, auxiliando no diagnóstico de problemas auditivos difíceis de serem avaliados de forma confiável.

Vários tipos de estímulos acústicos podem ser utilizados a fim de desencadear as respostas elétricas do tronco encefálico. Atualmente, o mais empregado é o clique, por apresentar um espectro amplo de freqüências permitindo, dessa maneira, estimular uma quantidade maior de fibras, porém não permite uma seletividade de freqüências, enfatizando apenas as mais altas por volta de 3000 a 6000 Hz1. Para obtermos respostas específicas por freqüências, podem ser empregados estímulos acústicos como o tone burst e tone pip3.

O estímulo acústico tone burst permite obter respostas de faixas de freqüência relativamente estreitas, principalmente as freqüências mais baixas5.

Para alguns autores6, a utilização do estímulo tone burst no PEATE mostra-se uma técnica precisa e de utilidade clínica para estimar a sensibilidade auditiva nas freqüências de 500 a 4000 Hz em crianças e adultos, pois os limiares eletrofisiológicos obtidos com este estímulo são compatíveis com os limiares para tons puros, apesar de se apresentarem maiores para a freqüência de 500 Hz em relação à freqüência de 4000 Hz.

Por outro lado, diversos trabalhos7-10 ressaltam que a qualidade nas respostas do PEATE com estímulo tone burst é pobre, principalmente na freqüência de 500 Hz, apresentando ondas complexas, difíceis de serem visualizadas e com grande variabilidade de respostas. Nestes estudos7,9 foram encontrados poucos indivíduos com limiares eletrofisiológicos abaixo de 70 dB NA, tornando, portanto, a utilidade clínica deste estímulo questionável.

A qualidade das respostas obtidas com o estímulo tone burst em 1000 Hz parece ser um pouco melhor do que a obtida na freqüência de 500 Hz, porém ainda é necessário o uso de fator de correção de 30 a 40 dB NS nos limiares obtidos10, demonstrando desta forma que o tone burst parece não ser um bom estímulo para ser utilizado na rotina clínica, levando-se em consideração a compatibilidade entre limiar para tons puros e limiar eletrofisiológico.

Existem diversos estudos na literatura utilizando o estímulo clique para a obtenção do PEATE. Porém, há poucos estudos em relação à padronização das respostas obtidas com o estímulo tone burst.

Portanto, os objetivos do presente estudo foram verificar a ocorrência das ondas I, III, V e seus respectivos tempos de latência para o estímulo acústico tone burst em 500, 1000, 2000 e 4000 Hz a 80 dB NA em indivíduos audiologicamente normais, de 18 a 40 anos de idade, bem como comparar os limiares eletrofisiológicos para o estímulo acústico tone burst com os obtidos nas avaliações audiológica e psicoacústica.


CASUÍSTICA E MÉTODOS

O presente estudo foi aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projeto de Pesquisa - CAPPesq da Diretoria Clínica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em sessão de 27/01/05, sob o Protocolo de Pesquisa n° 1089/04.

Foram realizadas avaliações audiológica, eletrofisiológica e psicoacústica em 40 indivíduos adultos audiologicamente normais, sendo 20 do sexo feminino e 20 do sexo masculino, com idades variando entre 18 e 40 anos.

Os participantes assinaram um termo de consentimento, no qual estavam descritos todos os procedimentos a serem realizados. Após a realização da anamnese foi dado início à avaliação audiológica, composta pelos seguintes procedimentos: inspeção do meato acústico externo com o otoscópio da marca Heine, audiometria tonal e vocal, e medidas de imitância acústica, com os audiômetros modelos GSI 61 e GSI 68, e imitanciômetro modelo GSI 33, da marca Grason-Stadler. Foram considerados limiares de audibilidade normais os valores obtidos entre 0 e 25 decibéis nível de audição (dB NA) nas freqüências de 250 a 8000 Hz.

Na avaliação eletrofisiológica foi realizado o PEATE com estímulo tone burst nas freqüências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz. O equipamento utilizado foi o Modelo Traveler Express da Marca Biologic, calibrado de acordo com a norma ANSI S3.7-1996.

A limpeza de pele foi feita com pasta abrasiva e os eletrodos fixados à pele do indivíduo por meio de pasta eletrolítica e fita adesiva nas posições do vértex e mastóides direita e esquerda.

Verificou-se os valores de impedância dos eletrodos que deveriam situar-se abaixo de 5 quilo ohms (Kohms). O estímulo acústico foi apresentado por meio de um par de fones supra-aurais modelo TDH 39.

Inicialmente, a intensidade do estímulo acústico tone burst foi de 80 dB NA, na qual buscou-se identificar as ondas I, III, V e seus respectivos tempos de latência. Para pesquisa do limiar eletrofisiológico, a intensidade foi diminuída gradativamente, de 20 em 20 dB até a onda V não ser mais visualizada. Depois disso, aumentamos a intensidade de 10 em 10 dB até obtermos a menor intensidade na qual a Onda V aparecia em menor amplitude, sendo este ponto considerado o limiar eletrofisiológico. Foi apresentado um total de 1500 estímulos por estimulação. A estimulação foi feita duas vezes na mesma intensidade, a fim de verificar a ocorrência de reprodutibilidade do traçado, e conseqüentemente, presença de resposta3.

A pesquisa do limiar psicoacústico para o tone burst foi realizada durante a própria pesquisa do limiar eletrofisiológico. Esta pesquisa teve por objetivo verificar se o indivíduo estava escutando o estímulo acústico que estava sendo apresentado, mesmo na ausência de resposta no PEATE, sendo definido como limiar psicoacústico a menor intensidade na qual o indivíduo escutava o estímulo tone burst em 500, 1000, 2000 e 4000 Hz.


RESULTADOS

Para análise dos dados, foram utilizados os testes ANOVA e Igualdade de Duas Proporções. Para complementar a análise descritiva, utilizou-se a técnica de Intervalo de Confiança para a média e para a proporção.

O nível de significância adotado foi de 0,05 (5%) e os intervalos foram construídos com 95% de confiança estatística.

Não foram observadas as ondas I e III a 80 dB NA nas freqüências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz, em ambos os sexos.

Com relação à porcentagem de ocorrência da onda V a 80 dB NA nas orelhas direita e esquerda para as freqüências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz, não foram observadas diferenças proporcionais entre as orelhas em ambos os sexos. Portanto, foi realizada a comparação da ocorrência da Onda V entre os sexos para as diversas freqüências estudadas, considerando como ausência de resposta para uma determinada freqüência quando em pelo menos uma das orelhas não foi obtida resposta (Tabela 1). Em nenhuma das freqüências pesquisadas observou-se diferença proporcional entre os sexos para a ocorrência da onda V.




Com relação à latência da onda V, não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes entre as orelhas direita e esquerda nas freqüências avaliadas em ambos os sexos. A Tabela 2 mostra as médias de latência da Onda V a 80 dB NA tanto para o sexo feminino como para o sexo masculino, nas diversas freqüências analisadas.




Averiguamos que nas freqüências de 1000, 2000 e 4000 Hz, foram encontradas diferenças médias estatisticamente significantes entre os sexos feminino e masculino para a latência da Onda V (p-valores 0,010; 0,012; <0,001 respectivamente). Em todas estas freqüências, a média da latência da onda V para o sexo masculino foi maior do que a obtida para o sexo feminino.

Com relação aos de audibilidade, eletrofisiológico e psicoacústico nas freqüências testadas, observamos que não ocorreu diferença média estatisticamente significante entre as orelhas direita e esquerda tanto para o limiar de audibilidade como para os limiares eletrofisiológico e psicoacústico em ambos os sexos.

Portanto, foi possível agruparmos os dados obtidos em ambas as orelhas resultando em uma média final de limiares de audibilidade, eletrofisiológicos e psicoacústicos. A seguir, foi feita a comparação dos limiares de audibilidade, eletrofisiológico e psicoacústico entre os sexos nas freqüências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz (Tabelas 3, 4, 5 e 6).










Na freqüência de 500 Hz, a média dos limiares eletrofisiológico e psicoacústico do sexo masculino foi maior que a do sexo feminino (p-valor <0,001 e 0,037 respectivamente). Nas freqüências de 1000 e 2000 Hz, os indivíduos do sexo masculino apresentaram a maior média para o limiar eletrofisiológico (p-valor <0,001 em ambas as freqüências). Na freqüência de 4000 Hz a média para os limiares eletrofisiológico e auditivo do sexo masculino foi maior que a do sexo feminino (p-valor <0,001 e 0,029 respectivamente).

Na última análise os limiares eletrofisiológico, psicoacústico e de audibilidade foram comparados entre si, em cada freqüência avaliada, para os sexos masculino e feminino (Tabelas 7, 8, 9 e 10).










Para as freqüências de 500, 1000 e 2000 Hz, os três limiares (audibilidade, eletrofisiológico e psicoacústico) foram estatisticamente diferentes entre si, em ambos os sexos (p-valor <0,001 nas três freqüências analisadas). Na freqüência de 4000 Hz, o limiar eletrofisiológico foi estatisticamente diferente do limiar de audibilidade e psicoacústico (p-valor <0,001), porém estes dois limiares foram estatisticamente iguais entre si, para ambos os sexos.


DISCUSSÃO

No presente estudo, não foram verificadas as ondas I e III a 80 dB NA, o que está de acordo com Ribeiro (2002)11, que em estudo com recém-nascidos termo e pré-termo, também não verificou a presença das ondas I e III e os interpicos I-III, III-V e I-V, mesmo em intensidades fortes.

Não foram verificadas diferenças estatisticamente significantes entre as orelhas direita e esquerda em nenhuma das análises realizadas.

Na Tabela 1 observa-se a ocorrência da onda V a 80 dB NA, não sendo verificadas diferenças estatisticamente significantes entre os sexos.

No presente estudo a ocorrência da onda V nas freqüências de 1000 e 2000 Hz foi de 100% em ambos os sexos. Já em 500 Hz houve 90% de respostas para ambos os sexos e, em 4000 Hz, 97,5% de respostas para o sexo masculino e 100% para o sexo feminino. Embora, conforme relatado por Davis e Hirsh (1976)7; Laukli et al. (1988)9; Conijn et al. (1993)12; Ribeiro (2002)11; Stueve e O´Rourke (2003)13; Moreira et al. (2005)14, a onda V com estímulo tone burst seja um potencial de difícil visualização mesmo em intensidades elevadas, no presente estudo houve uma maior dificuldade na identificação da onda V na freqüência de 500 Hz do que nas demais freqüências, o que para Sininger e Abdala (1996)15, pode ser justificado pela menor sincronia neural nas freqüências mais baixas.

Com relação aos valores de latência da onda V a 80 dB NA descritos na Tabela 2, pode-se observar uma diferença estatisticamente significante entre os sexos nas freqüências acima de 1000 Hz, sendo que a média dos valores foi menor para o sexo feminino. Consultando a literatura especializada, Munhoz et al. (2003)16 afirmaram que as latências das ondas I, III e V no PEATE com estímulo clique tendem a ser mais precoce no sexo feminino. Para estes autores, a latência da onda V costuma ser em média 0,2ms mais precoce em mulheres. Estes achados podem ser justificados pelas respostas cocleares mais rápidas no sexo feminino, as quais influenciariam na precocidade observada no tronco encefálico (Don et al., 1994)17.

Pode-se observar ainda que, em ambos os sexos, o valor da latência da onda V diminuiu com o aumento da freqüência. Este dado esteve de acordo com os estudos de Neely et al. (1988)18 e Nagao e Matas (2001)19, os quais afirmaram que as freqüências baixas, por ocuparem o ápice da cóclea, percorrem uma distância maior que as altas, ocorrendo conseqüentemente um surgimento tardio das ondas do potencial evocado auditivo para sons de freqüências baixas. Portanto, justificaram uma maior latência da onda V nas freqüências baixas em relação às médias e altas. Em estudo com recém-nascidos, Ribeiro11 também encontrou valores de latência da onda V maiores para freqüências mais baixas.

No presente estudo pode-se observar, em ambos os sexos, que os limiares eletrofisiológicos diminuem com o aumento da freqüência (de 1000 para 2000 Hz, de 2000 para 4000 Hz), estando estes resultados de acordo com os trabalhos de Beattie et al. (1996)20 e Cone-Wesson et al. (2002)6, que também verificaram uma diminuição do limiar eletrofisiológico para as freqüências mais altas. Os altos valores dos limiares eletrofisiológicos para as freqüências mais baixas podem ser justificados, segundo Sininger e Abdala (1996)15, pela difícil visualização do traçado e a menor sincronia neural nestas freqüências.

Os dados encontrados demonstram que o sexo masculino apresentou valores de limiares eletrofisiológicos mais elevados que o sexo feminino em todas as freqüências, sendo esta diferença estatisticamente significante. Estes achados estiveram de acordo com o estudo de Sininger e Abdala (1998)21 que, em pesquisa com recém-nascidos e adultos audiologicamente normais, encontraram melhor limiar eletrofisiológico para o sexo feminino. As autoras justificaram este achado pelo menor comprimento da cóclea feminina e pela mais rápida deterioração auditiva no sexo masculino.

Os limiares eletrofisiológicos, de audibilidade e psicoacústicos foram comparados entre si nas quatro freqüências avaliadas (Tabelas 7, 8, 9 e 10). Foram encontradas diferenças estatisticamente significantes em 500, 1000 e 2000 Hz, entre os três limiares pesquisados em ambos os sexos. Na freqüência de 4000 Hz, os limiares de audibilidade e psicoacústico não foram diferentes entre si, porém ambos diferiram do limiar eletrofisiológico.

Comparando-se as médias dos limiares eletrofisiológico e psicoacústico nos sexos feminino e masculino verificou-se aumento da diferença entre os limiares com o aumento da freqüência. No nosso estudo, estes dados justificaram-se devido a maior diminuição do limiar psicoacústico com o aumento da freqüência quando comparado com a diminuição do limiar eletrofisiológico.

Comparando-se as médias dos limiares eletrofisiológico e de audibilidade nos sexos feminino e masculino, verificou-se que a diferença entre estes limiares diminui o aumento da freqüência, pois neste estudo o limiar de audibilidade apresentou valores constantes em todas as freqüências, enquanto que o limiar eletrofisiológico diminuiu. Consultando a literatura especializada, não foram encontrados estudos com as comparações realizadas neste trabalho entre os três limiares pesquisados. Portanto, os resultados foram comparados parcialmente de acordo com os achados de outros estudos.

Os achados deste estudo encontram-se semelhantes aos de Davis e Hirsh (1976)7; Laukli et al. (1988)9; Fjermedal e Laukli (1989)10; Sininger e Abdala (1996)15, os quais ressaltam uma diferença considerável entre o limiar de audibilidade e o limiar eletrofisiológico, tanto em indivíduos normais como em crianças, principalmente nas freqüências abaixo de 1000 Hz, sendo esta diferença menor para a freqüência de 2000 Hz9.

Nos trabalhos acima referidos7,9,10,15 esta diferença encontrou-se em torno de 30 a 40 dB NS, sendo que no presente estudo observou-se uma diferença maior, em torno de 40 a 50 dB NS para o sexo feminino e de 50 a 60 dB NS para o sexo masculino. O fato de terem sido encontrados resultados incompatíveis entre os limiares de audibilidade e eletrofisiológico pode ser justificado, segundo Sininger e Abdala (1996)15, pela menor sincronia neural na região de freqüências abaixo de 1000 Hz. Para estas autoras, este problema pode ser parcialmente solucionado com a calibração adequada do equipamento.

Também foram encontradas, nesta pesquisa, diferenças entre os limiares psicoacústico e de audibilidade, estando o limiar psicoacústico mais elevado. Isto pode ter ocorrido devido ao fato da sala em que foi realizado o PEATE e, conseqüentemente, obtido o limiar psicoacústico, não ser completamente isolada acusticamente, fazendo com que o ruído ambiental interferisse na obtenção dos resultados.

Além de a sala na qual os exames foram realizados não ser completamente isolada de ruídos externos, a maioria dos indivíduos avaliados encontrava-se acordado durante a realização do exame, o que pode ter levado a interferência elétrica, pois muitos se movimentavam durante o teste por impaciência, já que o mesmo demorava mais de 1 hora para ser finalizado. Acredita-se, desta forma, que estes problemas possam ter interferido na obtenção dos limiares pesquisados (eletrofisiológico e psicoacústico).

Conijn et al. (1993)12, Conijn et al. (1990)22, Stapells (2000)23, Beattie e Rochverger (2001)24 apontaram algumas dificuldades na realização do PEATE com tone burst, principalmente no que tange ao tipo de filtro passa-alto utilizado, isolamentos elétrico e acústico do ambiente, calibração do equipamento, longo tempo na determinação dos limiares eletrofisiológicos e estado de sono do paciente durante a avaliação, fazendo com que os limiares eletrofisiológicos sejam encontrados em níveis mais elevados quando comparados com os limiares de audibilidade, além de prejudicar a qualidade do traçado obtido.

Os problemas técnicos encontrados e a demora na obtenção dos limiares eletrofisiológicos com tone burst fazem com que esta técnica tenha pouca aplicabilidade clínica em adultos, fato não observado nos estudos de Ribeiro (2002)11, Stapells (2000)23, Stapells et al. (1995)25, os quais realizaram os testes com crianças, observando grande fidedignidade entre limiares de audibilidade e eletrofisiológico, provavelmente devido às condições mais favoráveis de realização do exame.


CONCLUSÕES

Frente aos resultados apresentados neste estudo foram obtidas as seguintes conclusões:

1- Não foram observadas as Ondas I e III a 80 dB NA nas freqüências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz, em ambos os sexos.

2- Nas freqüências de 1000 Hz e 2000 Hz a ocorrência da onda V foi de 100% para ambos os sexos. Em 500 Hz houve 90,0% de respostas para ambos os sexos e, em 4000 Hz, 97,5% de respostas para o sexo masculino e 100% para o sexo feminino.

3- A latência da Onda V e o limiar eletrofisiológico diminuíram com o aumento da freqüência, tanto para o sexo masculino como para o feminino.

4- O sexo masculino apresentou limiares eletrofisiológicos mais elevados que o sexo feminino em todas as freqüências. Os limiares psicoacústicos do sexo masculino foram mais elevados que os do sexo feminino na freqüência de 500 Hz.

5- Os limiares auditivo, eletrofisiológico e psicoacústico apresentaram diferenças estatisticamente significantes em 500, 1000 e 2000 Hz, em ambos os sexos. Na freqüência de 4000 Hz, os limiares auditivo e psicoacústico não diferiram entre si, porém ambos diferiram do limiar eletrofisiológico.

6- Embora a realização do PEATE com estímulo tone burst tenha grande aplicabilidade clínica, os resultados obtidos no presente estudo demonstraram uma diferença significativa entre os limiares eletrofisiológico e de audibilidade na população adulta. Portanto, mais pesquisas na área devem ser realizadas a fim de padronizar as técnicas de realização do exame e os resultados obtidos nos PEATE com estímulo tone burst.


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1 Fonoaudióloga, Bolsista de Capacitação Técnica pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP.
2 Profª Drª do Curso de Fonoaudiologia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Curso de Fonoaudiologia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP.
Endereço para correspondência: Rua Padre Corino Sani 225 São Paulo SP 02441-160 Lauzane.
Trabalho realizado no Laboratório de Investigação Fonoaudiológica em Potenciais Evocados Auditivos do Curso de Fonoaudiologia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP), Brasil, com financiamento FAPESP, processo nº 04/14300-7.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 30 de junho de 2006. cod. 2555.
Artigo aceito em 17 de novembro de 2006.

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