Manifestações otorrinolaringológicas relacionadas à doença do refluxo gastroesofágico. Um tema inesgotável!!!
Otorhinolaryngological manifestations associated to gastroesophageal reflux. An ever present theme!!!
Autor(es): Regina Helena Garcia Martins
A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) é definida como "afecção crônica decorrente do fluxo retrógrado de parte do conteúdo gastroduodenal para o esôfago ou órgãos adjacentes a ele, acarretando um espectro variável de sintomas e/ou sinais esofágicos e/ou extraesofágicos associados ou não a lesões teciduais".
O tema começou ser abordado em 1946 quando Allison introduziu o termo esofagite de refluxo. Duas décadas após, Cherry e Margulies, em 1968, descreveram pela primeira vez o refluxo laringofaríngeo e a ocorrência de úlcera de contato. A partir da década de 80, observou-se grande avanço das pesquisas no desenvolvimento de técnicas diagnósticas mais precisas, época em que a pHmetria, passou a ser considerada padrão ouro no diagnóstico do refluxo. Paralelamente à procura do melhor método diagnóstico, as indústrias farmacêuticas se empenharam no desenvolvimento de drogas cada vez mais eficazes contra a doença, chegando às fórmulas revolucionárias dos inibidores de bomba de prótons, os quais têm-se mostrado eficazes na diminuição da secreção ácida, apresentando baixa toxicidade.
Pela abrangência do tema, as manifestações otorrinolaringológicas relacionadas ao refluxo gastroesofágico têm incentivado inúmeras pesquisas, tanto clínicas quanto experimentais. Alguns estudos apontam a prevalência de refluxo em 4 a 10% dos pacientes que procuram as clínicas otorrinolaringológicas. Os sintomas clássicos de refluxo, que correspondem à queimação retroesternal e à regurgitação, podem estar ausentes em até 50% dos casos nos pacientes com refluxo extraesofágico. Toda a extensão da via aérea pode estar comprometida, manifestando sintomas diversos como: salivação excessiva, otalgia, erosão do esmalte dentário, cáries, asma, bronquite, rinossinusite, tosse crônica, globus, dores de garganta, rouquidão, disfagia, laringoespasmo, secreção pós-nasal, halitose, fadiga vocal, câncer da laringe, estenose subglótica, estridor, roncos, apnéia noturna, dor torácica não cardíaca e morte súbita. De todos os sintomas do refluxo extraesofágico, a ronquidão é o mais freqüente, estando presente em, aproximadamente, 90% dos pacientes com laringite ácida.
Estudos experimentais têm demonstrado a ocorrência de lesões em mucosa laríngea quando exposta a mínimas doses de suco gástrico, mesmo por curto período de tempo.
No exame otorrinolaringológico, entre os diversos sinais encontrados, têm-se: hiperplasia das amígdalas linguais, língua saburrosa, eritema na comissura glótica posterior, irregularidades na mucosa das pregas vocais, eritema e/ou edema dos segmentos da árvore traqueobrônquica, granulomas, pseudosulco, úlcera de contato, hipertrofia de mucosa laríngea, nódulos vocais, pólipos vocais, estenose subglótica, leucoplasia e carcinoma.
Mesmo após 60 anos de investigação, tanto o diagnóstico quanto o tratamento da DRGE e do refluxo extraesofágico têm sido alvos de diversas pesquisas, pela polêmica que despertam. Assim, o próprio padrão ouro atribuído à pHmetria no diagnóstico, tem sido questionado por alguns autores, alegando-se que, além do teste não apresentar 100% de sensibilidade, a instalação dos eletrodos no trato digestivo, interfere nos hábitos alimentares do pacientes, prejudicando os resultados e, conseqüentemente, também o diagnóstico. Para alguns autores, o teste diagnóstico com inibidores de bomba tem-se mostrado mais eficaz e consiste na avaliação da resposta terapêutica com a utilização de altas doses do medicamento por curto espaço de tempo.
Na investigação da eficácia do tratamento da DRGE e de suas complicações, estudos atuais têm comparado os resultados clínicos e endoscópicos dos diferentes inibidores de bomba de prótons, avaliado a melhor posologia e os benefícios de sua associação com os antagonistas dos receptores H2. Os resultados controversos desses estudos despertam a realização de pesquisas adicionais, tornando o tema inesgotável.
Regina Helena Garcia Martins
Professora Livre-Docente da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Botucatu - Unesp